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EFEITOS CARDIO-RESPIRATÓRIOS DA ANESTESIA EPIDURAL EM CÃES NÃO PREMEDICADOS

CARDIO-RESPIRATORY EFFECTS OF THE EPIDURAL ANESTHESIA IN DOGS WITHOUT PREMEDICATION

Resumos

Neste experimento procurou-se aferir os efeitos da anestesia epidural sobre as freqüências cardíaca e respiratória, temperatura retal e pressão arterial média, sem que houvesse interferência de produtos empregados na pré-medicação. Foram utilizados 10 cães adultos, machos e fêmeas, com pesos compreendidos entre 7 e 12 kg. A cada animal foi administrado, no espaço epidural lombo-sacro, 1ml/5kg de peso corpóreo de cloridrato de lidocaína 2%. Os parâmetros vitais foram colhidos imediatamente antes e após a aplicação do fármaco, a intervalos de 10 minutos, durante 60 minutos. Os dados numéricos obtidos foram submetidos a análise estatística pelo método não paramétrico de Kruskal-Wailis. Como resultados, foram obtidas curvas cujas médias não mostraram diferenças significativas entre si. Concluiu-se que a aplicação de lidocaína por via epidural é isenta de risco, no que concerne aos parâmetros analisados.

anestesia epidural; lidocaína; anestesia no cão


The aim of this work was evaluate the effect of the epidural anesthesia in not premedicated dogs. To this was used ten crossbreed adult dogs, males and females, with average weight 7 to 12kg. To each dog was administered 1ml/5kg of lidocaine hidrochloride 2% in the epidural space (L7-S1), The hart rate, respiratory frequency, body temperature and mean blood pressure were observed before and after the aplication of the drug during 60 minutes at 10 minutes intervals. The values were submmitted to statistical analisis by the Kruskall-WaIlis method. The results did not show significant alterations. The anesthetic procedure was considerated safe to use in dogs.

epidural anesthesia; lidocaine; anesthesia in the dog


EFEITOS CARDIO-RESPIRATÓRIOS DA ANESTESIA EPIDURAL EM CÃES NÃO PREMEDICADOS1 1 Professor Assistente do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) UNESP, Campus d Jaboticabal. Rodovia Carlos Tonanini, Km 5 - 14870-000 - Jaboticabal, SP.

CARDIO-RESPIRATORY EFFECTS OF THE EPIDURAL ANESTHESIA IN DOGS WITHOUT PREMEDICATION

Newton Nunes1 1 Professor Assistente do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) UNESP, Campus d Jaboticabal. Rodovia Carlos Tonanini, Km 5 - 14870-000 - Jaboticabal, SP. Jorge Luiz Oliveira Costa2 1 Professor Assistente do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) UNESP, Campus d Jaboticabal. Rodovia Carlos Tonanini, Km 5 - 14870-000 - Jaboticabal, SP. Pedro Izidro da Nóbrega Neto3 1 Professor Assistente do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) UNESP, Campus d Jaboticabal. Rodovia Carlos Tonanini, Km 5 - 14870-000 - Jaboticabal, SP.

RESUMO

Neste experimento procurou-se aferir os efeitos da anestesia epidural sobre as freqüências cardíaca e respiratória, temperatura retal e pressão arterial média, sem que houvesse interferência de produtos empregados na pré-medicação. Foram utilizados 10 cães adultos, machos e fêmeas, com pesos compreendidos entre 7 e 12 kg. A cada animal foi administrado, no espaço epidural lombo-sacro, 1ml/5kg de peso corpóreo de cloridrato de lidocaína 2%. Os parâmetros vitais foram colhidos imediatamente antes e após a aplicação do fármaco, a intervalos de 10 minutos, durante 60 minutos. Os dados numéricos obtidos foram submetidos a análise estatística pelo método não paramétrico de Kruskal-Wailis. Como resultados, foram obtidas curvas cujas médias não mostraram diferenças significativas entre si. Concluiu-se que a aplicação de lidocaína por via epidural é isenta de risco, no que concerne aos parâmetros analisados.

Palavras-chave: anestesia epidural, lidocaína, anestesia no cão.

SUMMARY

The aim of this work was evaluate the effect of the epidural anesthesia in not premedicated dogs. To this was used ten crossbreed adult dogs, males and females, with average weight 7 to 12kg. To each dog was administered 1ml/5kg of lidocaine hidrochloride 2% in the epidural space (L7-S1), The hart rate, respiratory frequency, body temperature and mean blood pressure were observed before and after the aplication of the drug during 60 minutes at 10 minutes intervals. The values were submmitted to statistical analisis by the Kruskall-WaIlis method. The results did not show significant alterations. The anesthetic procedure was considerated safe to use in dogs.

Key words: epidural anesthesia, lidocaine, anesthesia in the dog.

INTRODUÇÃO

A anestesia epidural tem sido recomendada por inúmeros autores que aconselham o uso da técnica nos casos em que o ato cirúrgico deva ser realizado em regiões mais caudais do paciente. Este procedimento anestésico é praticamente destituído de risco e apresenta baixo custo, o que aliado à facilidade de administração leva à aconselhar sua introdução na rotina clínico-cirúrgica.

Quando se recorre à literatura referente aos procedimentos usuais de anestesia epidural, costuma-se deparar com afirmações que podem desaconselhar o emprego da técnica em determinados pacientes, mormente os acometidos de patologia que esteja provocando ou que venha a provocar diminuição da pressão arterial (PA). Tal afirmação advém do fato de ter sido sempre observada, pêlos autores, diminuição da PA em pacientes submetidos à anestesia epidural. Uma análise crítica destes experimentos mostra, todavia, que todos os pacientes anestesiados foram submetidos à tranqüilização com uma gama variada de agentes antes da aplicação de anestésico local no espaço epidural. Deste modo, parece difícil afirmar que a queda da PA observada advenha do bloqueio epidural e não dos efeitos da pré-medicação.

Existem, evidentemente, complicações advindas da própria técnica de aplicação de anestesia epidural ou dos produtos empregados para tal, como por exemplo a síndrome de Schiff-Sherrington transitória (BRA DLEY et al, 1980), a paralisia respiratória proveniente de sensibilidade individual exacerbada ao anestésico (BLASS & SHIRES, 1986) ou até mesmo a falha do método em produzir o bloqueio desejado (BRADLEY et al, 1980). Alterações cardiovasculares também foram descritas por NOLTE et al (1983) que, empregando cloridrato de lidocaína em seis cães adultos pré-medicados com metadona e acepromazina, puderam observar mudanças discretas nos valores quando comparados às leituras basais.

Dados semelhantes foram obtidos por BLASS et al (1987) que empregaram a anestesia epidural associada à anestesia geral barbitúrica com a finalidade de se proceder as enteroanastomoses intestinais em cães.

HALLEY & RIEDESEL (1983) recomendam a anestesia epidural com cloridrato de lidocaína nas doses de 1ml para 3,4 a 4,5kg de peso corporal, para quaisquer procedimentos cirúrgicos caudais ao diafragma, mas alertam para o fato de que devem ser evitadas drogas bloqueadoras alfa-2 adrenérgicas ou outros grupos farmacológicos que possam causar diminuição da PA.

As alterações da pressão arterial observadas quando do emprego da anestesia epidural foram incriminadas ao bloqueio ganglionar, por MASSONE (1988), o que cita também o fato de que o débito cardíaco é diminuído devido ao bloqueio beta-receptor, advindo do emprego de agentes anestésicos locais e sugere o uso, nestes casos, de adrenalina desde que não se proceda também à anestesia inalatória com anestésicos halogenados. Apesar destas complicações eventuais foi recomendada a técnica em pacientes de maior risco e naqueles a serem submetidas à cesariana.

Com base nas assertivas dos autores consultados objetivou-se neste experimento verificar possíveis alterações nas freqüências cardíaca e respiratória, temperatura retal e pressão arterial em cães, submetidos à anestesia epidural pelo cloridrato de lidocaína, sem o adjuvante da pré-medicação.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados 10 cães sem raça definida, de ambos os sexos, com idade aproximada de 2 anos e pesos variando entre 7 e 12kg. Os animais foram mantidos em condições de internamento durante 60 dias. Ao longo deste período os mesmos foram conduzidos diariamente ao laboratório, onde eram submetidos a manipulações de modo a simular as condições do experimento. Findo o prazo de oito semanas os cães foram submetidos a jejum alimentar de 12 horas e imediatamente sujeitos ao protocolo experimental, como segue:

Inicialmente fez-se a punção da artéria metatarsiana através de dispositivo tipo "escalpe" nº 23 para administração de substâncias por via intravascular. Imediatamente, procedia-se o acoplamento do dispositivo a instrumental desenvolvido para leitura direta da pressão arterial média, que consistia em uma torneira de três vias, uma seringa descartável de 20ml, previamente preenchida com heparina em concentração de 5000UI/ml a e em seguida esvaziada, de modo que seu interior se apresentasse apenas umedecido com o produto. Completava-se então o volume total da seringa com solução salina a 0,9%. Constava também, do instrumental, um manômetro aproveitado de esfigmomanômetro de fabricação comercial, acoplado à torneira por meio de tubo plástico flexível. O equipamento modificado foi baseado na descrição de HALL & CLARKE (1987) (Figura 1).


Assim como a pressão arterial (PA), os valores referentes à temperatura retal (TR), freqüências cardíaca (FC) e respiratória (FR), foram colhidos antes e após a aplicação da técnica anestésica, a intervalos de 10 minutos durante 60 minutos.

Finda a colheita inicial procedia-se à aplicação de cloridrato de lidocaína 2% b num volume aproximado de 1ml/5kg de peso corporal no espaço epidural lombo-sacro de acordo com a técnica tradicional.

Os valores numéricos obtidos foram submetidos à análise estatística pelo método não paramétrico de KRUSKAL-WALLIS, sendo que as médias observadas foram apresentadas graficamente.

RESULTADOS

Todos os animais apresentaram analgesia, com evidente relaxamento muscular esfinctérico e dos membros posteriores e cauda decorridos aproximadamente 5 minutos da aplicação do anestésico, no espaço epidural lombo-sacro.

A curva obtida com leitura das médias da freqüência cardíaca mostra tendência inicial de queda, com posterior recuperação, sendo que ao final do experimento a FC se apresentava ligeiramente aumentada em relação ao valor basal. A análise estatística, entretanto, não mostrou variação significativa (Figura 2).


A FR diminuiu ao longo do experimento, sendo que neste caso foi mínima a tentativa de recuperação do valor inicialmente observado. A exemplo da FC, não houve variação estatística significativa (Figura 3).


A TR também decresceu, embora discretamente, mantendo-se sempre dentro dos limites fisiológicos. Neste caso as médias não mostraram variações significativas à luz da estatística (Figura 4).


A PA decresceu ligeiramente nos primeiros 20 minutos, podendo ser observada uma reação do parâmetro, sendo que, a partir dos 30 minutos, as médias assumiram valores maiores que os basais, permanecendo assim até o final do experimento. Os valores, neste caso, também mostraram-se indiferentes à estatística (Figura 5).


DISCUSSÃO

Como ficou demonstrado pêlos resultados apresentados, não parece haver qualquer alteração digna de nota nos parâmetros analisados. A possível argumentação a respeito de modificações sensíveis nas médias colhidas, advindas do fato de os animais estarem plenamente conscientes, o que poderia levar, por exemplo, ao aumento da FC, FR e PA por medo ou excitações indesejáveis cai por terra, pois o período prévio de internamento e as simulações de experimento, fazem com que os cães assumam temperamento dócil e cooperativo diante da equipe de trabalho.

Parece, portanto, passível de sugestão esta metodologia, nos casos em que haja necessidade dos animais estarem em estado de vigília e livres de condições que propiciem estresse. Pode também ser sugerida a seleção de pacientes mais dóceis quando da realização deste tipo de modelo experimental.

Quanto ao emprego da técnica de colheita dos dados referentes à PA, o método proposto foi adequado, sendo considerado preciso e de baixo custo. O uso de uma segunda torneira de três vias, proposto por HALL & CLARKE (1987) não se fez necessário.

Não foram notadas complicações como as descritas por BRADLEY et al (1980) e BLASS & SHIRES (1986), tal fato pode ser explicado pelo emprego de doses de lidocaína dentro dos limites terapêuticos recomendados (HALLEY & RIEDESEL, 1983), além de os cães selecionados não apresentarem, aparentemente, sensibilidade exacerbada ao fármaco.

As alterações encontradas por NOLTE et al (1983) confirmaram-se, sendo que as diferenças observadas no presente experimento, ao contrário daquele, não se traduziram por significância à luz da estatística, o que corrobora a assertiva de serem tais alterações advindas da pré-medicação à qual os animais foram submetidos. O mesmo pode ser dito com relação ao experimento de BLASS et al (1987), sendo que neste caso pode-se incriminar o barbitúrico como produtor das alterações observadas, cabendo à técnica de anestesia epidural e ao fármaco empregado papel mínimo na obtenção de tais resultados.

Muito embora não houvesse variação estatística significativa entre as médias colhidas, a tendência mostrada pelas curvas levantadas dos parâmetros pode levar a tecer algumas considerações. Neste particular, a ligeira diminuição inicial da FC indica ser verdadeira a assertiva de MASSONE (1988), segundo a qual existe ação da lidocaína sobre o débito cardíaco por bloqueio beta-receptor. A observação das considerações tecidas pelo autor com relação ao bloqueio ganglionar produzido pêlos fármacos utilizados em anestesia epidural também podem explicar a queda das médias colhidas de PA nos momentos iniciais do trâmite anestésico.

A tendência destas curvas mostra, também, que tais efeito:" perduram por um período relativamente curto, situando-se ao redor de 20 minutos decorridos da aplicação do anestésico. Tal fato pode ser explicado pela ação fugaz da lidocaína sobre os receptores responsáveis pêlos efeitos descritos, embora não possa ser descartado o fato de que decorrido determinado período de tempo os animais tendem a tornarem-se impacientes, o que pode colaborar para a elevação das curvas de FC e PA.

A FR também decresceu ao longo do tempo, a partir da aplicação da lidocaína, quando uma queda sensível do parâmetro foi observada. Encontra-se explicação para o fenômeno na afirmação de BLASS & SHIRES (1986), segundo a qual o comprometimento da função respiratória baseia-se no bloqueio da inervação da musculatura responsável pela respiração. Embora tenham sido empregadas, no presente experimento, doses adequadas e a via de administração tenha sido baixa o suficiente para, na maioria dos pacientes, serem evitados bloqueios mais altos, não deve ser descartada a hipótese de que, em alguns animais, o fármaco possa atingir pontos mais craniais do espaço pendurai, mormente se tanto a velocidade de administração como a pressão exercidas sobre o êmbolo da seringa forem elevadas.

Embora a TR tenha diminuído ao longo do experimento seus valores encontram-se perfeitamente dentro dos parâmetros fisiológicos, sendo que a queda observada pode dever-se ao fato do experimento ser conduzido em ambiente refrigerado. A estatística mostra, contudo, inexistência de significância quando comparadas as médias entre si.

CONCLUSÕES

Da metodologia empregada e dos resultados obtidos conclui-se que a aplicação de cloridrato de lidocaína no espaço epidural lombo-sacro em cães não pré-medicados, não produz alterações significativas de freqüência cardíaca, freqüência respiratória, temperatura e pressão arterial.

FONTES DE AQUISIÇÃO

a - Liquemine - Roche Produtos Químicos e Farmacêuticos S.A.

b - Xilocaína 2% s/ vasoconstritor - Merrel Lepetít

2Médico Veterinário, Residente do Hospital Veterinário "Governador Laudo Natel", FCAV.

3Professor Auxiliar do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal da Paraíba Campus Vil. Bairro do Jatobá s/nº. 58700-970 - Patos, PB.

Recebido para publicação em 29.04.93. Aprovado para publicação em 16.06.93.

  • BLASS, C. E., SHIRES, P. K Respiratory paralisys secondary to epidural anesthesia in a dog. J Am Vet Med Assoc, v. 189, n. 3, p. 315-316, 1986.
  • BLASS, C.E., KIRBY, B.M, WALDRON, D.R., et al. The effect of epidural and general anesthesia on the healing of colonic anastomoses. Vet Surg, v. 16, n. 1, p. 75-79, 1987.
  • BRADLEY, R.L, WITHROW, S.P., HEATH, R.B, et al. Epidural analgesia in the dog. Vet Surg, v. 9, n. 4, p. 153-156, 1980.
  • HALL, L.W., CLARKE, KW. Anestesia veterinária 8. ed. São Paulo: Manole, 1987. 415 p.
  • HALLEY, L.E., RIEDESEL, D. H. Epidural analgesia in the dog. lowa State Vet, v. 45, n. 1, p. 45-48, 1983.
  • MASSONE, F. Anestesiologia veterinária Farmacologia e técnicas Rio de Janeiro: Guanabara, 1988. 235 p.
  • NOLTE, l., WATNEY, G.C.G., HALL, LW. Cardiovascular effects of epidural blocks in dogs. J Small Anim Pract, v. 24, p. 17-21, 1983.
  • 1
    Professor Assistente do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) UNESP, Campus d Jaboticabal. Rodovia Carlos Tonanini, Km 5 - 14870-000 - Jaboticabal, SP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Set 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 1993

    Histórico

    • Recebido
      29 Abr 1993
    • Aceito
      16 Jun 1993
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