ESTUDO DA QUALIDADE DAS CARCAÇAS E DA CARNE DE VACAS DE DESCARTE DE DOIS GRUPOS GENÉTICOS

STUDY OF THE CARCASS AND MEAT QUALITY OF CULL COWS FROM TWO GENETIC GROUPS

Resumos

Foram analisados os dados da qualidade de carcaça e da carne de 49 vacas de descarte, 25 da raça Charolês (C) e 24 Nelore (N) pertencentes ao rebanho experimental do Departamento de Zootecnia, UFSM. Após o abate e resfriamento por 24 horas à uma temperatura de 2°C, foram realizadas avaliações subjetivas e objetivas das carcaças. De cada meia carcaça direita foi retirada uma secção entre a 10ª e 12ª costela que, uma vez congelada foi transportada ao Laboratório de Carnes do Departamento de Zootecnia, para posterior avaliação organoléptica. De cada secção, foram retirados dois bifes que foram assados até a temperatura interna de 70°C, sendo um deles utilizado para o painel de avaliação sensorial e o outro para a determinação da maciez através do aparelho Warner-Bratzler shear (WB shear). As vacas C apresentaram carcaças de melhor conformação e menor deposição de gordura. A maciez da carne, tanto pelo painel quanto pelo WB shear, favoreceu as vacas C, ao passo que as vacas N foram julgadas como apresentando carne de melhor palatabilidade. Não houve diferença significativa quanto à maturidade fisiológica, textura e cor da carne entre as duas raças.

vacas de descarte; carcaça; carne

ESTUDO DA QUALIDADE DAS CARCAÇAS E DA CARNE DE VACAS DE DESCARTE DE DOIS GRUPOS GENÉTICOS¹

STUDY OF THE CARCASS AND MEAT QUALITY OF CULL COWS FROM TWO GENETIC GROUPS

Zeno Veríssimo Perobelli² Lauro Müller³ João Restle³

RESUMO

Foram analisados os dados da qualidade de carcaça e da carne de 49 vacas de descarte, 25 da raça Charolês (C) e 24 Nelore (N) pertencentes ao rebanho experimental do Departamento de Zootecnia, UFSM. Após o abate e resfriamento por 24 horas à uma temperatura de 2°C, foram realizadas avaliações subjetivas e objetivas das carcaças. De cada meia carcaça direita foi retirada uma secção entre a 10^a e 12^a costela que, uma vez congelada foi transportada ao Laboratório de Carnes do Departamento de Zootecnia, para posterior avaliação organoléptica. De cada secção, foram retirados dois bifes que foram assados até a temperatura interna de 70°C, sendo um deles utilizado para o painel de avaliação sensorial e o outro para a determinação da maciez através do aparelho Warner-Bratzler shear (WB shear). As vacas C apresentaram carcaças de melhor conformação e menor deposição de gordura. A maciez da carne, tanto pelo painel quanto pelo WB shear, favoreceu as vacas C, ao passo que as vacas N foram julgadas como apresentando carne de melhor palatabilidade. Não houve diferença significativa quanto à maturidade fisiológica, textura e cor da carne entre as duas raças.

Palavras-chave: vacas de descarte, carcaça, carne.

SUMMARY

Forty-nine cull cows, 25 Charolais (C) and 24 Nelore (N), were used for carcass and meat quality evaluation. The work was conducted at "Departamento de Zootecnia", "UFSM" and in a nearby Packing Plant. After slaughter and chill of carcasses for 24h at 2°C. objective and subjective evaluations were performed. A portion of the loin from the 10 and 12th rib was removed from the right side, frozen and transported to the Meat Laboratory of the University. Two steaks from each sample were roasted to an internal temperature of 70°C: one for the panel and the other for objective determination of tenderness through the use of Warner-Bratzler shear device. Charolais carcasses presented better conformation and lower external and intramuscular fat deposition. The meat from the N group were judged less tender both by the panel and objective determination, but more palatable than C group. No significam difference were found for physiological maturity, texture and color of the lean.

Key words: cull cows, carcass, meat.

INTRODUÇÃO

Nos países desenvolvidos, grande parte da carne de vacas de descarte é destinada para a produção de carne industrializada. Somente os cortes nobres são destinados à venda no varejo e seu preço é diferenciado da carne de novilho, sendo o consumidor informado do produto que está consumindo.

No Brasil, a carne de vaca é comercializada principalmente no mercado interno, já que apresenta limitações de qualidade para o mercado externo.

No Rio Grande do Sul, uma das raças mais exploradas é a Charolês. Esta preferência reside no rápido ganho de peso, grande desenvolvimento muscular e reduzida deposição de gordura. Essas características fazem com que seja, não apenas criada como raça definida mas, muito utilizada em cruzamentos com outras raças europeias. Dos zebuínos, o Nelore é atualmente a raça de maior expressão no Rio Grande do Sul, sendo utilizada principalmente em cruzamentos, nos quais se procura aliar a rusticidade do zebú com as características produtivas e de qualidade da carne do gado europeu.

O número de pesquisas, que comparam a qualidade da carcaça e da carne do gado europeu e zebuíno, é reduzido em nosso País, principalmente, no que diz respeito a qualidade da carcaça de vacas de descarte.

Trabalhos realizados no exterior, utilizando novilhos e comparando a qualidade da carne de zebuínos com a de raças europeias, têm mostrado que os zebús apresentam carne menos macia (CARPENTER et al.. 1955 e PALMER et al., 1961).

No nosso meio, FELTEN et al. (1988), FELTEN et al. (1989) e RESTLE et al. (1993), comparando novilhos Charolês com Nelore, concluiram que as carcaças de Charolês apresentaram melhor conformação, ao passo que as de Nelore apresentaram maior espessura de gordura.

MOLLETA et al. (1987), em cujo trabalho foram comparados novilhos Nelore, Aberdeen Angus, Charolês e búfalos Mediterrâneo, concluíram que os Nelore apresentaram carne menos macia que os outros três grupos de bovídeos. QUADROS et al. (1989), utilizando novilhos cruzas Hereford x Nelore, com diferentes graus de sangue, concluíram que o incremento de sangue com zebuíno, a carne tornou-se menos macia.

Utilizando 20 vacas das raças Charolês e Nelore, RESTLE et al. (1990), verificaram que a carne de Nelore foi menos macia quando avaliada pelo WB shear.

Comparando a carne de vacas Brahman com raças britânicas (Hereford e Aberdeen Angus), MÜLLER et al. (1990) também concluíram que as Brahman apresentaram carne mais dura e menos palatável que as britânicas.

Este trabalho foi desenvolvido com o objetivo de avaliar e comparar a qualidade das carcaças e da carne de vacas de descarte das raças Charolês e Nelore.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizadas 49 vacas de descarte, pertencentes ao rebanho experimental do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Santa Maria, UFSM, sendo 25 da raça Charolês e 24 da raça Nelore, criadas exclusivamente em campo nativo e submetidas ao mesmo sistema de manejo. Os animais foram abatidos, com idade variando entre 7 e 15 anos pesando entre 623 e 365kg, em 1989 e 1991, nos frigoríficos da Cooperativa Regional Castilhense de Carnes Ltda e Silva S.A., respectivamente.

No frigorífico, após o resfriamento das carcaças a uma temperatura de aproximadamente 2°C por 24 horas, foi medida a espessura de gordura (EspG) que recobre o lombo na altura da 12^a costela e realizadas avaliações subjetivas de conformação (Conf). maturidade fisiológica (Mfis), cor (Cor), textura da carne (Text) e marmoreio (Marm), seguindo os critérios estabelecidos por MÜLLER (1987).

De cada meia carcaça direita, retirou-se uma amostra do músculo Longissimus dorsi compreendendo a 10^a, 11^a e 12^a costelas. As amostras foram identificadas, acondicionadas, congeladas e conduzidas ao Laboratório de Carnes do Departamento de Zootecnia - UFSM, onde ficaram estocadas a -18°C para posterior avaliação organoléptica da carne, conforme MÜLLER (1987). De cada amostra ainda congelada foram retirados dois bifes de 2,5cm de espessura que, após descongelamento por aproximadamente 15 horas em refrigerador doméstico, foram assados até atingirem a temperatura interna de 70°C. Um dos bifes foi utilizado pelo painel composto por 5 degustadores previamente treinados para a avaliação da maciez (Maciez), palatabilidade (Palat) e suculência (Sucul; MÜLLER. 1987). O outro bife foi usado para a determinação objetiva da maciez através da força de cisalhamento (Fcis) medida pelo aparelho WB shear. Avaliou-se também a perda de líquidos tanto no descongelamento quanto na cocção, sendo expressas como quebra no descongelamento (QDesc) e quebra na cocção (QCoc).

O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado. Os resultados foram submetidos à análise de variância, utilizando o programa estatístico SAS (SAS, 1989).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As avaliações subjetivas das carcaças são apresentadas na Tabela 1. As vacas Charolês apresentaram melhor conformação (P < 0,01), menor deposição de gordura externa e de marmoreio (P < 0,01) que as Nelore. Estes dados estão de acordo com as características normais do Charolês, raça que apresenta um grande desenvolvimento muscular e reduzida deposição de gordura.

As carcaças das vacas Nelore apresentaram uma pior conformação que é o reflexo da menor expressão muscular desta raça. No entanto, tiveram uma maior deposição de gordura externa e maior quantidade de gordura intramuscular.

Não foi encontrada diferença (P > 0,05) para a maturidade fisiológica, coloração e textura da carne entre as duas raças.

Os resultados deste trabalho se assemelham aos encontrados por FELTEN et al. (1988), FELTEN et al. (1989) e RESTLE et al. (1993), que comparando novilhos Charolês e Nelore, verificaram que os Charolês apresentaram melhor conformação e menor deposição de gordura. Resultados semelhantes também foram encontrados por MÜLLER et al. (1990) e por RESTLE et al. (1990), em carcaças de vacas de descarte.

Na Tabela 2 são apresentados os resultados referentes às características organolépticas da carne. Observa-se que as vacas Charolês apresentaram carne mais macia tanto pelo painel como pela avaliação objetiva (P < 0,01). A menor maciez da carne de animais Bos indicus é documentada pela literatura científica (CARPENTER et al.. 1955; PALMER et al.. 1961; MÜLLER et al., 1982; MOLLETA et al., 1987; QUADROS et al., 1989).

MÜLLER et al. (1990) sugeriram que a falta de maciez poderia residir no menor grau de fragmentação da fibra muscular. WHIPPLE et al. (1990), encontraram um índice de fragmentação da fibra muscular de zebuínos inferior às raças britânicas. Estes autores examinando as enzimas que se encontram normalmente na carne, verificaram que os zebuínos possuem uma enzima inibidora de proteases muito ativa, de forma a prejudicar o processo de maturação da carne e consequente amaciamento da mesma.

A palatabilidade da carne das vacas Nelore foi julgada superior em relação a carne das Charolês. Isto pode ser um reflexo do maior marmoreio que as Nelore apresentaram. As perdas no descongelamento e cocção foram superiores às encontradas por MÜLLER et al. (1984) para ambas as raças, mas semelhantes às do trabalho de RESTLE et al. (1990).

CONCLUSÕES

- As vacas da raça Charolês apresentam carcaças de melhor conformação e com menor deposição de gordura.

- A carne das vacas Nelore é menos macia, porém de melhor palatabilidade.

²Zootecnista, MSc.

³Engenheiro Agrônomo, PhD, Pesquisador do CNPq, Professor Titular do Departamento de Zootecnia - UFSM, 97119-900 - Santa Maria, RS.

Recebido para publicação em 23.02.94 Aprovado em 12.07.94

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¹

Parte de Dissertação de Mestrado apresentada pelo primeiro autor junto ao Curso de Pós-Graduação em Zootecnia, área de Produção Animal, da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  25 Ago 2014
• Data do Fascículo
  Dez 1994

Histórico

• Aceito
  12 Jul 1994
• Recebido
  23 Fev 1994