Características da carcaça de bovinos Canchim e Aberdeen Angus e de seus cruzamentos recíprocos terminados em confinamento

Carcass traits of Canchim, Aberdeen Angus and reciprocal crosses finished in confinement

CARACTERÍSTICAS DA CARCAÇA DE BOVINOS CANCHIM E ABERDEEN ANGUS E DE SEUS CRUZAMENTOS RECÍPROCOS TERMINADOS EM CONFINAMENTO

CARCASS TRAITS OF CANCHIM, ABERDEEN ANGUS AND RECIPROCAL CROSSES FINISHED IN CONFINEMENT

Daniel Perotto¹ José Luiz Moletta² Antonio Carlos Cubas³

RESUMO

Foram analisadas quatorze características quantitativas das carcaças de 137 machos bovinos inteiros pertencentes aos grupos Canchim (Ca), Aberdeen Angus (Ab), 3/4Ca+1/4Ab, 3/4Ab+1/4Ca, 5/8Ca+3/8Ab e 5/8Ab+3/8Ca, nascidos na Estação Experimental Fazenda Modelo, em Ponta Grossa-PR, no período de 1988 a 1993. As médias para a idade e para o peso ao início do confinamento, duração do confinamento, idade e peso ao abate foram, respectivamente, 737 dias, 356kg, 97 dias, 834 dias e 468kg. Durante o confinamento, os garrotes receberam silagem de milho à vontade mais uma ração concentrada (79% de NDT, 17,8% de PB) fornecida à base de 1% do peso vivo do animal por dia. Os grupos Ca e Ab diferiram entre si para todas as características, exceto para percentagem de costilhar (PEC). O Ca foi superior ao Ab para peso de carcaça quente (PCQ), rendimento de carcaça quente (RCQ), área de olho de lombo (AOL), conformação, percentagem de músculos (PEM), peso da porção comestível da carcaça (PPC) e peso de carcaça quente por dia de vida ao abate (PCQ/DDV). O Ab superou o Ca quanto à espessura de gordura de cobertura (ECG) e à percentagem de gordura (PEG). Houve heterose para PCQ, RCQ, AOL, PPC e PCQ/DDV. As duas gerações avançadas de cruzamentos alternados Ca x Ab apresentaram desempenho superior à média das raças paternas para PCQ, RCQ, AOL, PPC e PCQ/DDV. O desempenho de um esquema alternado de cruzamentos entre Ca e Ab seria melhor que o de qualquer dessas duas criada isoladamente.

Palavras-chave: Canchim, Aberdeen Angus, cruzamentos, carcaça.

SUMMARY

Fourteen quantitative carcass traits of 137 Canchim; 5/8 Charolais + 3/8 Zebu, (Ca), Aberdeen Angus (Ab), 3/4Ca+1/4Ab, 3/4Ab+1/4Ca, 5/8Ca+3/8Ab and 5/8Ab+3/8Ca, born at Est. Exp. Fazenda Modelo, in Ponta Grossa-PR, Brazil, from 1988 to 1993, were analyzed. Averages for age at beginning of confinement, initial weight, length of confinement period, final age and final weight were, respectively, 737 days, 356kg, 97 days, 834 days and 468kg. During the confinement period the animals were fed corn silage ad libitum plus a concentrate ration (79% TDN, 17,8% CP) offered on the basis of 1% of animal live weight per day. The results showed that Ca and Ab differed with respect to all traits, except side cut percentage. Ca was superior to Ab for hot carcass weight (PCQ), dressing percentage (RCQ), area of eye muscle (AOL), conformation score, percentage of lean tissue (PEM), weight of eatable portion (PPC) and hot carcass weight per day of life at slaughter (PCQ/DDV). Ab animals had thicker fat cover over rib eye (EGC) and higher percentages of fat and of bones in the carcass than Ca animals. There was heterotic response for PCQ, RCQ, AOL, PPC and PCQ/DDV. The two advanced crisscross Ca x Ab generations performed better than parental average for PCQ, RCQ, AOL, PPC and PCQ/DDV. Performance of a rotational Ca x Ab crossbreeding system would be superior to that of any of the paternal breeds.

Key words: Canchim, Aberdeen angus, crossbreeding, carcass.

INTRODUÇÃO

Um dos aspectos mais importantes a ser melhorado na pecuária bovina de corte brasileira diz respeito às características determinantes da qualidade das carcaças produzidas no País. À medida que a demanda interna por carne bovina se expande, pelo aumento de renda das elites e pela inclusão, no mercado, de classes sociais que antes viviam alijadas do processo de consumo, as exigências quanto à qualidade do produto também aumentam. Por outro lado, para manter e ampliar a posição de país exportador de carne bovina, o Brasil precisa adequar sua produção aos padrões e exigências estabelecidos pelos importadores.

O valor comercial de uma carcaça bovina é determinado por um conjunto de características, destacando- se o peso, a conformação, o rendimento, a gordura de cobertura e o marmoreio. Estas e outras características da carcaça podem ser modificadas por decisões de manejo como a duração do confinameto (RESTLE et al., 1997), pelo sistema de terminação (LUCHIARI FILHO et al., 1985a,b), pela alteração da proporção volumoso : concentrado da dieta (EUCLIDES FILHO et al., 1997), pela seleção genética (PRESTON e WILLIS, 1974) e pelos cruzamentos (PEROTTO et al., 1998 - não publicado).

Características como o grau de acabamento em função do peso de abate, a percentagem ou o peso da porção comestível e o padrão de deposição de gordura podem ser manipuladas pela simples exploração das diferenças aditivas entre duas raças (CARPENTER, 1973). Por outro lado, a possibilidade de exploração da heterose para melhorar a carcaça bovina parece restringir-se a características associadas ao crescimento (CUNDIFF, 1970; PEROTTO et al., 1998 - não publicado).

Em trabalhos conduzidos no Brasil, LUCHIARI FILHO et al. (1985a,b) encontraram menor espessura de gordura de cobertura e maior proporção de traseiro especial, de área de olho de lombo e de peso da porção comestível em animais Canchim, comparativamente com animais Nelore. Resultados apresentados por PEROTTO et al. (1998 - não publicado) indicam que animais gerados por um esquema alternado de cruzamentos entre Charolês e Caracu mostraram-se superiores a qualquer das raças paternas para peso de carcaça quente e peso da porção comestível. Por outro lado, EUCLIDES FILHO et al. (1997) não encontraram diferenças entre animais Nelore e mestiços Nelore-Charolês, Nelore-Fleckvieh e Nelore-Chianina para várias características de carcaça analisadas, verificando, entretanto, que os Nelore tenderam a produzir carcaças com mais gordura que os mestiços.

Os dados utilizados neste trabalho são oriundos de um projeto de longa duração, que tem como objetivo geral a avaliação bioeconômica de um sistema alternado de cruzamentos entre as raças Canchim e Aberdeen Angus. No presente estudo, foram computadas estimativas de heterose em características quantitativas da carcaça de bovinos mestiços de três gerações recíprocas de cruzamentos. O objetivo específico desta análise foi estimar a heterose retida nas gerações avançadas do referido sistema de cruzamentos.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram analisadas observações de características quantitativas de carcaça de machos bovinos inteiros, terminados em confinamento, que eram oriundos de um projeto que se encontra em execução na Estação Experimental Fazenda Modelo, em Ponta Grossa, Paraná (PEROTTO et al., 1996). O plano de acasalamentos está delineado para produzir animais puros Canchim (Ca) e Aberdeen Angus (Ab), além das sucessivas gerações de mestiços gerados por um sistema alternado de cruzamentos entre Ca e Ab. Forneceram dados para esta análise, animais nascidos nos meses de junho a setembro de 1988 a 1993, exceto os nascidos em 1989, que foram comercializados antes dos 18 meses de idade.

Até a desmama, em fins de fevereiro ou início de março, os bezerros permaneciam com suas mães em pastagens nativas onde predominavam os gêneros Traquipogon, Andropogon e Paspalum. Após o desmame, os bezerros passavam dois a três meses em pastos de capim elefante e depois eram transferidos para pastagens de Hemarthria altissima, sendo suplementados durante o primeiro inverno (maio a agosto) com um concentrado, contendo 14,7% de PB e 73% de NDT, fornecido à base de 1 kg/cabeça/dia. Com aproximadamente dois anos de idade, os animais eram submetidos a um período de adaptação ao confinamento de 14 dias e, em seguida, eram confinados até atingirem peso de abate de aproximadamente 450kg. Animais que não atingiam esse peso eram abatidos ao completarem 130 dias de confinamento. Tal procedimento fez com que o período em que os animais permaceram confinados variasse entre e dentro de ano. As médias para a idade e para o peso ao início do confinamento, duração do confinamento, idade e peso ao abate foram, respectivamente, 737 dias, 356kg, 97 dias, 834 dias e 468kg. No confinamento, os garrotes receberam uma ração concentrada (79% de NDT, 17,8% de PB) fornecida à base de 1% do peso vivo do animal por dia, além de silagem de milho à vontade.

Ao final do período de confinamento, os animais eram submetidos a um jejum de 14 a 16 horas antes de terem o peso de abate (PABTE) registrado. Logo após essa pesagem, os animais eram transportados de Ponta Grossa-PR até Alvorada do Sul-PR para serem abatidos nas instalações do Frigorífico Itimura. O abate era feito sempre na manhã seguinte ao dia da chegada ao frigorífico. Assim, entre a tomada do peso final e o abate transcorriam cerca de 24 horas. Na linha de abate, após a remoção da cabeça, couro, vísceras, cauda, músculo do diafragma e excessos de gordura, era tomado o peso da carcaça quente (PCQ). O rendimento de carcaça quente (RCQ) era determinado pela relação PCQ/PABTE. Depois da pesagem, as meias carcaças quentes eram lavadas a jato d’água e enviadas à câmara fria. Decorridas 24 horas, as meias carcaças eram retiradas da câmara fria para que se procedessem as avaliações seguintes.

Na meia carcaça direita, entre a 12ª e a 13ª costelas, fazia-se um corte para expor a seção transversal do músculo Longissimus dorsi. A partir desse corte, retirava-se uma peça para posterior separação e determinação dos componentes muscular, ósseo e adiposo da carcaça (HANKINS e HOWE, 1946). A área da seção transversal do músculo L. dorsi era desenhada diretamente por sobreposição de papel vegetal transparente. Determinava-se a espessura da camada da gordura de cobertura nessa mesma peça pela média de três medidas em pontos eqüidistantes realizadas com uso de um paquímetro.

Na meia carcaça esquerda, além de outras medidas como comprimento da carcaça e espessura do coxão, determinava-se a conformação da carcaça usando-se escala de um a 18 (MÜLLER, 1980). Esta meia carcaça era posteriormente separada em dianteiro, costilhar ou ponta de agulha e serrote ou traseiro especial. As três peças resultantes eram pesadas e seus pesos expressos percentualmente em relação ao peso da meia carcaça.

Foram analisadas 123 observações da área da seção transversal do músculo Longissimus dorsi (AOL) e 115 observações de peso de carcaça quente (PCQ), de rendimento de carcaça quente (RCQ), da raiz quadrada de (1+ EGC) (RQEGC), sendo EGC a espessura de gordura de cobertura, das percentagens de serrote (PES), de dianteiro (PED) e de costilhar (PEC), do escore de conformação da carcaça e das percentagens de ossos (PEO), de músculos (PEM) e de gordura (PEG) de 134 animais pertencentes aos grupos genéticos Canchim (Ca), Aberdeen Angus (Ab), 3/4 Ca + 1/4 Ab (3Ca1Ab), 3/4 Ab + 1/4 Ca (3Ab1Ca), 5/8 Ca + 3/8 Ab (5Ca3Ab) e 5/8 Ab + 3/8 Ca (5Ab3Ca). A raiz quadrada de (1 + EGC) foi usada para reduzir o coeficiente de variação e normalizar a distribuição da escala original. Tal transformação é recomendada sempre que a variável a ser submetida à análise de variância apresentar distribuição deformada, como a distribuição de Poisson (OSTLE & MENSING, 1975). As características PCQ, AOL, PEM e PEG foram utilizadas para computar outras variáveis de interesse, como peso da porção comestível da carcaça, área de olho de lombo/100kg de carcaça quente e peso de carcaça quente por dia de vida ao abate. A avaliação das carcaças foi feita conforme metodologia proposta por MÜLLER (1980) e descrita por MOLETTA (1990).

Os dados foram analisados pelo método dos quadrados mínimos (SAS, 1994), ajustando-se inicialmente às distribuições de todas as características um modelo linear “completo” que incluiu os efeitos das covariáveis idade ao abate (IAB) e duração do período de confinamento (DPC), além dos efeitos fixos de grupo genético (GPO), ano de nascimento do animal (ANO) e das interações GPO*ANO, IAB*GPO e IAB*ANO. Posteriormente, cada característica foi analisada por modelos que excluíram as interações não significativas nas análises iniciais. Efeitos genéticos de interesse como heterose e diferença genética aditiva entre as raças foram computados como funções lineares do efeito de grupo genético e testados pelo teste t. Para examinar a relativa importância dos efeitos aditivos direto e materno bem como dos efeitos heterozigóticos individual e materno, sobre as características em estudo, foi usado também um modelo de regressão múltipla (ROBISON et al., 1981).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Juntamente com as principais estatísticas computadas a partir da análise de variânçia, a tabela 1 apresenta os níveis de significância do teste F para as fontes de variação utilizadas nas análises após terem sido excluídas do modelo completo as interações não significativas. A exclusão dessas interações do modelo de análise reduziu os valores do coeficiente de determinação estatística (R²), mas praticamente não alterou os valores do erro experimental, indicando que as fontes de variação foram testadas com a mesma segurança estatística. O grupo genético revelou-se estatisticamente importante (P<0,05 a P<0,001) para todas as características em estudo, à exceção da percentagem de gordura. O ano de nascimento do animal também mostrou forte influência (P<0,05 a P<0,001) sobre a maioria das características, exceto para a percentagem de costilhar. A interação GPO*ANO teve efeito significativo (P<0,01) para as percentagens de dianteiro e de serrote. Representados pela significância estatística da interação IAB*ANO, os coeficientes de regressão parcial da área de olho de lombo sobre a idade ao abate mostraram heterogeneidade através dos anos.

A duração do período de confinamento (DPC) influenciou o peso de carcaça quente, a conformação e as percentagens de dianteiro e de costilhar. Os respectivos coeficientes de regressão parcial foram: -0,511 ± 0,122 kg (P<0,001); -0,022 ± 0,008 (P<0,01); -0,017 ± 0,006% (P<0,01); e, 0,016 ± 0,005% (P<0,001). O efeito negativo da DPC sobre o PCQ pode ter resultado de algum confundimento parcial entre DPC e ANO. Foi observado que os anos (1988 e 1992) com DPCs mais longas (122 e 110 dias, respectivamente) tiveram PCQs mais baixos (237 e 249kg, respectivamente) porque, em 1988, o ganho médio diário e, conseqüentemente, o peso de abate, foram baixos e, em 1992, porque o RCQ foi mais baixo que nos demais anos. Por sua vez, a idade ao abate revelou efeito significativo sobre o PCQ (0,241 ± 0,083kg, P<0,01), a RQEGC (0,002 ± 0,0008mm, P<0,05) e a PED (0,010 ± 0,004%, P<0,01).

Na tabela 2, são encontradas as médias dos grupos genéticos para as características analisadas, exceto para as percentagens de dianteiro e de serrote. As médias dessas duas características não foram computadas em virtude da significância da interação GPO*ANO. As médias encontradas neste estudo para o grupo Canchim concordam plenamente com aquelas reportadas por LUCHIARI FILHO et al. (1985a) para animais da mesma raça terminados em confinamento e abatidos aos 26-27 meses de idade, com média de 473kg de peso vivo. No presente caso, os valores médios para a RQEGC variaram de 1,71mm para o Canchim a 2,00mm para o Aberdeen Angus. Convertidos para a escala original, tais valores corresponderiam, respectivamente, a espessuras de gordura de 2,92mm e 4,00mm, indicando que as carcaças produzidas pelos animais deste estudo atenderiam às exigências do mercado quanto a essa característica.

Na parte superior da tabela 3, são apresentadas estimativas de contrastes entre médias computadas a partir do modelo do efeito fixo de grupo genético. O contraste (Ca - Ab), que estima a diferença entre as duas raças quanto aos efeitos direto e materno confundidos, foi favorável ao Canchim para PCQ, RCQ, AOL (P<0,001), conformação (P<0,05) e PEM (P<0,01). O Aberdeen Angus superou o Canchim para a RQEGC (P<0,001) e PEG (P<0,05). Essas características são desejáveis porque estão associadas à palatabilidade da carne e à conservação da carcaça resfriada. Por outro lado, a maior PEO do Aberdeen Angus é desfavorável, porque se traduz em menor percentagem da porção comestível da carcaça. A média dos 3/4 recíprocos ((3Ca1Ab + 3Ab1Ca)/2) não diferiu (P>0,05) da média das raças paternas para qualquer das características em estudo, exceto para a AOL (P<0,01). Este contraste estima a heterozigose materna confundida com a metade da heterozigose individual. Já a média dos 5/8 recíprocos ((5Ca3Ab + 5Ab3CA)/2) superou a média das raças paternas para o PCQ, RCQ e PEM (P<0,05), bem como para a AOL (P<0,01). A maior manifestação heterótica nos animais 5/8 corresponde a um maior coeficiente de heterozigose individual e menor heterozigose materna nesses animais, em comparação aos 3/4, sugerindo conformidade do desempenho dos mestiços envolvidos no presente estudo com o postulado da ação gênica de dominância como causa da heterose. Na média, as duas gerações mestiças (3/4 e 5/8), contempladas nesta análise, têm como expectativa coeficientes de heterozigose individual e materna de 0,625 e 0,750, respectivamente. Como um esquema alternado de cruzamentos entre duas raças, em equilíbrio quanto às oscilações de composição racial de geração para geração, produz animais com coeficientes de heterozigose individual e materna de 0,67, a diferença entre a média das duas gerações mestiças e a média das raças paternas aproxima a estimativa da heterose que seria retida pelos animais desse esquema de cruzamentos. Os resultados, identificados pela coluna “heterose retida”, indicam que a média das duas gerações avançadas de mestiços superou a média das raças paternas para PCQ e RCQ (P<0,05) e para a AOL (P<0,001).

Para ser viável como estratégia de utilização de recursos raciais, um esquema de cruzamentos deve ser melhor que qualquer das raças paternas isoladamente. Com o propósito de verificar esta possibilidade, a média das duas gerações avançadas de mestiços ((3Ca1Ab + 3Ab1Ca + 5Ca3Ab + 5Ab3CA)/4), aproximando a média do esquema alternado Canchim x Aberdeen Angus, foi comparada com a média de cada raça paterna separadamente. Os resultados das duas últimas colunas da parte superior da tabela 3 mostram que, para as características de carcaça aqui estudadas, não houve diferenças entre o Canchim e o cruzamento alternado entre Canchim e Angus. Por outro lado, a diferença entre a média dos 5/8 e 3/4 e a média do Aberdeen Angus foi significativa para todas as características em estudo. Os sinais negativos das estimativas associadas à RQEGC (-0,15 ± 0,07) e à PEG (-1,4 ± 0,6) evidenciam a importância do Angus como raça para imprimir maior precocidade na terminação e melhores características de qualidade da carne como marmoreio. Uma vez que o Aberdeen Angus superou também o Canchim para essas duas características, os resultados sugerem que o cruzamento alternado deve proporcionar uma melhor combinação de características qualitativas e quantitativas do que a proporcionada por qualquer das raças paternas isoladamente.

A parte inferior da tabela 3 apresenta as estimativas dos efeitos genéticos geradas pelo modelo da regressão múltipla. Por definição, essas estimativas são coeficientes de regressão parcial do valor fenotípico da variável dependente sobre a fração esperada do efeito genético, no genótipo do animal pertinente (indivíduo ou mãe). Os dois modelos de análise aqui empregados são equivalentes, mas a regressão múltipla permite uma melhor dissecação dos resultados. Por exemplo, resultados equivalentes aos do contraste (Ca - Ab) podem ser aproximados pela soma (Ab^I + Ab^M). De maneira análoga, a heterose do 5/8 pode ser obtida pela expressão 0,75 AbCa^I + 0,5AbCa^M. As estimativas dos efeitos heterozigóticos individual e materno permitem uma análise mais minuciosa da estimativa da heterose retida. É possível observar que a heterose retida foi significativa para PCQ, RCQ e AOL porque, para essas características, praticamente não houve efeito da heterozigose materna. Por outro lado, para PEM e PEG, a heterozigose materna foi mais expressiva e, tendo sinal contrário ao da heterozigose individual, eliminou a heterose retida. De maneira geral, os resultados da análise pelo modelo da regressão revelaram pouca importância dos efeitos maternos sobre as características de carcaça estudadas. Contudo, revelaram- se significativos os efeitos aditivo materno sobre a PEC e heterozigótico materno sobre a PEG. Para o escopo do presente trabalho, seria mera especulação a tentativa de inferir sobre as causas biológicas desses resultados.

Na tabela 2, não são apresentadas as médias dos grupos genéticos para PED e PES. Isso se deve ao efeito significativo da interação GPO*ANO. Como indica o valor dos graus de liberdade na tabela 1, a distribuição heterogênea dos grupos, através dos anos, não permitiu que todos os níveis dessa interação fossem estimados. Para se examinar o efeito dessa interação sobre essas duas características com maior profundidade, foram computadas as médias dos grupos Canchim e Aberdeen Angus segundo o ano de nascimento do animal (tabela 4). Para cada uma das características, as comparações entre grupos dentro do ano podem ser lidas nas linhas (sobrescritos maiúsculos) enquanto as comparações entre anos, dentro do grupo, são lidas nas colunas (sobrescritos minúsculos). Os resultados dessa tabela, embora restritos a dois grupos, são suficientes para ilustrar as interações. Para PED, as diferenças entre os dois grupos foram significativas (P<0,05) em 1988 e em 1992. Para PES, o Canchim foi superior (P<0,05) ao Angus em 1988, 1991 e 1992. Os resultados mostram ainda que o Aberdeen Angus não diferiu através dos anos para qualquer das duas características, ao passo que o Canchim apresentou maior percentagem de dianteiro em 1993 e maior percentagem de serrote em 1988. Um exame mais minucioso dos dados revelou que quando os pesos de abate dos dois grupos foram comparáveis (442kg para o Ca contra 420kg para o Ab em 1988 e 426kg para o Ca contra 430kg para o Ab em 1992), o Aberdeen apresentou maior PED e menor PES que o Canchim. Nos anos em que houve grande diferença entre os pesos ao abate dos dois grupos (558kg para o Ca contra 489kg para o Ab em 1990 e 497kg para o Ca contra 374kg para o Ab em 1993), não foram detectadas diferenças quanto às percentagens de dianteiro nem de serrote. Como essas duas raças têm diferentes curvas de crescimento, é possível que as interações entre grupo genético e ano para as duas características em discussão sejam reflexo de diferenças nos graus de acabamento quando os abates ocorrem em pesos próximos. No caso do Canchim, as maiores percentagens de dianteiro parecem ter ocorrido nos anos em que o peso de abate foi mais elevado.

Para melhor comparar grupos genéticos, sistemas de manejo ou estratégias de cruzamentos, alguns autores (LUCHIARI FILHO et al., 1985a,b; RESTLE et al., 1997) têm recorrido à criação de variáveis compostas, como peso ou percentagem da porção comestível da carcaça, área de olho de lombo/ 100kg de carcaça quente ou peso de carcaça quente/ dia de vida ao abate. Tais variáveis suscitam interesse porque sintetizam duas ou mais características importantes numa só e assim facilitam as comparações entre diferentes alternativas de uso de recursos genéticos e/ou ambientais. No presente estudo, foram computados o peso da porção comestível da carcaça (PCC), a área de olho de lombo/100kg de carcaça quente (AOL/ PCQ) e o peso de carcaça quente por dia de vida ao abate (PCQ/DDV). As médias dessas três características para os seis grupos genéticos são apresentadas na Tabela 2. Contrastes lineares entre médias apropriadas demonstraram que a diferença Ca- Ab foi significativa (P<0,001) para o PCC (31,4 ± 7,7kg) e para o PCQ/DDV (0,041 ± 0,010kg/dia). Para essas mesmas características foram significativos os contrastes que estimaram a heterose da geração 5/8, a heterose retida nas duas gerações avançadas de mestiços e a diferença entre a média dessas duas gerações e a média do Aberdeen Angus. Por outro lado, nenhum dos contrastes entre médias foi significativo para a área de olho de lombo por 100kg de peso vivo ao abate.

CONCLUSÕES

Pode-se concluir que Canchim e Aberdeen Angus diferem entre si quanto a importantes características de carcaça . O Canchim é melhor que o Aberdeen Angus para peso de carcaça quente, rendimento de carcaça quente, área de olho do lombo, conformação, percentagem de músculos, peso da porção comestível da carcaça e peso de carcaça quente por dia de vida ao abate. Por outro lado, o Aberdeen Angus supera o Canchim quanto à espessura de gordura de cobertura, percentagem de gordura e percentagem de ossos.

A adoção de um esquema alternado de cruzamentos entre Canchim e Aberdeen Angus deve produzir carcaças cujas combinações de características qualitativas e quantitativas são melhores que aquelas das carcaças de qualquer dessas duas raças criadas isoladamente.

² Zootecnista, MSc., Pesquisador do IAPAR, Ponta Grossa, PR.

³ Médico Veterinário, MSc., PhD., Professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Dourados, MS.

Recebido para publicação em 18.05.98. Aprovado em 09.09.98

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  15 Dez 2006
• Data do Fascículo
  Jun 1999

Histórico

• Recebido
  18 Maio 1998
• Aceito
  09 Set 1998