Acessibilidade / Reportar erro

Dano devido à podridão vermelha da raiz na cultura da soja

Yield losses due sudden death syndrome in soybean

Resumos

A Podridão Vermelha da Raiz da soja (PVR) é uma das doenças mais preocupantes dentre as que ocorrem atualmente em soja no Brasil devido à sua dificuldade de controle. A doença é causada pelo fungo Fusarium solani f. sp. glycines sendo capaz de afetar a maioria das áreas de cultivo de soja nos Estados Unidos, Brasil e Argentina. O dano devido à PVR varia entre 20 e 80%, dependendo da cultivar e do estádio de desenvolvimento da cultura no momento da infecção. Foram realizados dois experimentos em área naturalmente infectada no município de Itaara-RS, no ano agrícola de 2000/2001. O dano no rendimento da cultura da soja devido à ocorrência da doença foi associado aos diversos níveis de incidência de PVR. Houve significativa redução no rendimento da cultura, e particularmente no número de vagens por planta.

Fusarium solani f. sp. glycines; rendimento; Glycine max


Sudden Death Syndrome (SDS) is a serious disease affecting soybean cultivars in Brazil being too difficult to control it. The causal agent is Fusarium solani f. sp. glycines. The disease affects large soybean growing areas in the United States, Brazil and Argentina. Yield losses ranged from 20 to 80% according to cultivar and weather conditions at early plant development stage when pathogen begins the infection process. Aiming to stablish yield losses due to the disease, two experiments were carried out in a field with natural incidence of SDS during summer 2000/2001. SDS infection on soybean cultivars can affect number of pods per plant, number of seeds per pod and yield.

Fusarium solani f. sp. glycines; Glycine max; yield


ARTIGOS CIENTÍFICOS

DEFESA FITOSSANITÁRIA

Dano devido à podridão vermelha da raiz na cultura da soja

Yield losses due sudden death syndrome in soybean

Tânia Márcia de Queiroz FreitasI; Rosana Ceolin MeneghettiII; Ricardo Silveiro BalardinIII,1 1 Autor para corrspondência.

IEngenheiro Agrônomo, Mestre em Agronomia, Departamento de Defesa Fitossanitária, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS

IIAluno do Curso de Graduação em Agronomia, UFSM, bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIBIC), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)

IIIEngenheiro Agrônomo, PhD, Professor Titular, Departamento de Defesa Fitossanitária, UFSM, 97105-340, Santa Maria, RS. Email: rsbalardin@balardin.com.br

RESUMO

A Podridão Vermelha da Raiz da soja (PVR) é uma das doenças mais preocupantes dentre as que ocorrem atualmente em soja no Brasil devido à sua dificuldade de controle. A doença é causada pelo fungo Fusarium solani f. sp. glycines sendo capaz de afetar a maioria das áreas de cultivo de soja nos Estados Unidos, Brasil e Argentina. O dano devido à PVR varia entre 20 e 80%, dependendo da cultivar e do estádio de desenvolvimento da cultura no momento da infecção. Foram realizados dois experimentos em área naturalmente infectada no município de Itaara-RS, no ano agrícola de 2000/2001. O dano no rendimento da cultura da soja devido à ocorrência da doença foi associado aos diversos níveis de incidência de PVR. Houve significativa redução no rendimento da cultura, e particularmente no número de vagens por planta.

Palavras-chave:Fusarium solani f. sp. glycines, rendimento, Glycine max.

ABSTRACT

Sudden Death Syndrome (SDS) is a serious disease affecting soybean cultivars in Brazil being too difficult to control it. The causal agent is Fusarium solani f. sp. glycines. The disease affects large soybean growing areas in the United States, Brazil and Argentina. Yield losses ranged from 20 to 80% according to cultivar and weather conditions at early plant development stage when pathogen begins the infection process. Aiming to stablish yield losses due to the disease, two experiments were carried out in a field with natural incidence of SDS during summer 2000/2001. SDS infection on soybean cultivars can affect number of pods per plant, number of seeds per pod and yield.

Key words:Fusarium solani f. sp. glycines, Glycine max, yield.

INTRODUÇÃO

A Podridão Vermelha da Raiz (PVR), também conhecida como Síndrome da Morte Súbita, é uma doença relativamente nova na cultura da soja. A doença é causada pelo fungo Fusarium solani f. sp. glycines e afeta a maioria das áreas de cultivo de soja nos Estados Unidos, Brasil e Argentina (HARTMAN et al., 1995). O fungo Fusarium solani (Mart.) Sacc. f. sp. glycines constitui-se na forma anamórfica, cuja fase teleomórfica corresponde ao ascomycete Nectria haematococca (ABNEY et al., 1993).

Nos Estados Unidos, há relatos de perdas variando entre 20 e 80%, dependendo da cultivar e do estádio de desenvolvimento da cultura no momento de infecção (RUPE et al., 1999). Em 1993, houve perdas de 20 a 46% no rendimento da soja em áreas com alta incidência dos sintomas nos Estados Unidos (SCHERM & YANG, 1996).

A PVR induz o sintoma foliar típico de folha carijó, com manchas cloróticas e necróticas internevais e a região das nervuras permanece com coloração verde normal (ALMEIDA et al., 1997). Este sintoma é mais evidente próximo à fase de florescimento e pode progredir causando completa desfolha das plantas. O sintoma de infecção na raiz inicia com uma mancha avermelhada, mais visível na raiz principal e geralmente localizada um a dois centímetros abaixo do nível do solo. Com a evolução da infecção, é observada uma expansão da lesão, que passa a circundar a raiz, assumindo coloração castanho-avermelhado escuro. A necrose situa-se no tecido cortical, enquanto o lenho da raiz adquire uma coloração castanho-clara, estendendo-se pelo tecido lenhoso da haste a vários centímetros acima do nível do solo. Na lesão, pode ser observada uma massa azulada de esporos do patógeno. Os sintomas foliares da PVR iniciam de duas a três semanas antes da floração estendo-se até o período de enchimento de grãos, quando normalmente é observada a morte da planta (RUPE & GBUR, 1995). Em plantas severamente afetadas, a desfolha ocorre prematuramente causando abortamento de vagens (ROY et al., 1989; RUPE, 1989; WRATHER et al., 1995; LUO et al., 1999).

Nas cultivares com ciclo precoce os sintomas dificilmente aparecem, ou quando aparecem os danos são pequenos, sendo que a doença é mais severa em baixas temperaturas e alta umidade (RUPE et al., 1991). Temperaturas superiores a 30ºC limitam a expressão da doença e seu desenvolvimento no campo ocorre quando a temperatura acumulada diariamente atinge 850 a 960 graus-dia (SCHERM & YANG, 1996). A presença do nematóide do cisto da soja (Heterodera glycines) é outro fator que acarreta aumento na severidade da PVR (HERSHMAN et al., 1990 e KILLEBREW et al., 1988).

O objetivo dos experimentos foi quantificar o dano sobre os componentes do rendimento relacionado a diversos níveis de incidência da Podridão Vermelha da Raiz na cultivar FT Saray de soja medido tanto em plantas isoladas quanto em populações de plantas em área naturalmente infectada.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram realizados dois experimentos em uma área naturalmente infectada com o Fusarium solani (Mart.) Sacc. f. sp. glycines no município de Itaara-RS, no ano agrícola de 2000/2001. A distribuição da Podridão Vermelha da Raiz ocorreu em manchas aleatoriamente distribuídas na área. O sistema de cultivo utilizado foi o de plantio direto cujo historico da área contempla a sucessão/rotação soja (1997/98), aveia (1998), feijão (1998/99), nabo/ervilhaca (1999), milho (1999/00), trigo (2000) e soja (2000/01). A cultivar semeada foi a FT Saray, de ciclo precoce, numa densidade de 200.000 plantas.ha-1.

No experimento 1, o dano foi determinado considerando o número de vagens por planta, o número de grãos por vagem e o peso de mil grãos. A escolha das plantas foi completamente aleatória e realizada em 10 linhas previamente demarcadas e com comprimento de 100m. Quando as plantas atingiram o estádio R5.1 (semente com 3mm de tamanho em uma vagem no quarto nó superior da haste principal e com folha completamente expandida), 10 plantas por linha foram amostradas e marcadas com tinta “spray” na sua base. Nesta amostragem, foram criados grupos de plantas com sintomas de PVR e grupos de plantas sem sintomas em cada uma das linhas. O grupo de plantas sem sintomas visíveis da doença se constituiu em padrão. Procurou-se obedecer a um distanciamento padrão entre plantas ao redor de 10m para que fosse evitada tendência na amostra de plantas dos dois grupos. No ponto de colheita (estádio R9), as plantas previamente marcadas foram individualmente colhidas e agrupadas de acordo com os grupos de 10 plantas por linha e de acordo com a presença de sintomas da PVR. Em cada uma das plantas, foi determinado o número de vagens, o número de grãos por vagem e o peso de mil grãos.

No experimento 2, foi determinado o dano sobre o rendimento da cultivar FT Saray a partir de 12 parcelas com área de 20m2. Cada parcela foi arranjada de forma a, homogeneamente, apresentar uma incidência semelhante entre as plantas e, por outro lado, apresentar uma tendência de aumento progressivo na incidência de plantas com sintomas de PVR. Em seis parcelas, a incidência média foi inferior a 10% sendo considerada como baixa, enquanto que em outras seis parcelas, a incidência foi superior a 75% sendo considerada como alta. A incidência da PVR foi determinada através da percentagem de plantas que apresentaram sintomas foliares visíveis no estádio R5.5 (final do enchimento de grãos) em relação ao número total de plantas de cada parcela. As parcelas foram colhidas separadamente, os grãos pesados e a umidade corrigida para 13% de umidade o que permitiu a quantificação do rendimento (peso de grãos transformado em kg.ha-1). Foi avaliado o peso de mil grãos. A análise de variância foi realizada com aplicação do teste de comparação múltipla de médias através do teste de Tukey, em nível de 5% de probabilidade de erro.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No experimento 1, foram analisados o número de vagens por planta (Figura 1), número de grãos por vagem (Figura 2) e peso de mil grãos (Figura 3), obtidos de plantas individuais com ou sem sintomas visíveis da Podridão Vermelha da Raiz da soja.




A média dos valores no número de vagens foi de 34,01 vagens por planta com sintomas de PVR e de 63,70 vagens por planta sem sintomas, correspondendo a uma diminuição de 46,61%. Severidade elevada da PVR, durante os primeiros estádios reprodutivos, podem reduzir o rendimento devido ao abortamento de vagens (ROY, 1997). O progresso da PVR em cultivares com diferentes níveis de resistência mostrou resultados semelhantes, ou seja, cultivares resistentes apresentaram reduzida infecção inicial do sistema radicular ou uma lenta colonização das raízes. Em ambas as situações, foi observado dano mínimo associado à PVR. Entretanto, quando cultivares suscetíveis foram observadas foi observado redução significativa nos componentes de rendimento (LUO et al., 1999).

A média dos valores para plantas sem sintomas da PVR foi de 2,04 grãos por vagem e de plantas com sintomas da PVR foi de 1,96 grãos por vagem, representando uma redução de 3,93%. Este dado é suportado por NJITI et al. (1998) que contabilizaram uma diminuição do número de flores por plantas infectadas pela PVR, demonstrando que as perdas iniciam antes do aparecimento dos sintomas na parte aérea. Segundo RUPE & GBUR (1995), existe uma possível associação entre o ataque da PVR e alterações na fisiologia de plantas de soja durante o período de florescimento. No estádio de florescimento, o nível de infecção tende a acelerar já que existe um possível acumulo de etileno acarretando uma senescência antecipada e comprometendo tanto o número de flores como o número de grãos por vagem. Deste modo, a redução do número de vagens provavelmente tenha ocorrido antes do estádio R4. Por outro lado, quando a infecção é tardia, ocorrendo a partir do início de enchimento de grãos (R5.1), pode ocorrer uma diminuição no tamanho médio de grãos (NJITI et al., 1998). Foi observada uma redução de 26,8% no peso médio de mil grãos devido à infecção pelo PVR.

No experimento 2, foi avaliada a variação no rendimento de plantas de soja em parcelas considerando diversos níveis de incidência da PVR. Os resultados mostram que a incidência da doença foi negativamente correlacionada com o rendimento (Tabela 1). Nas parcelas com alta incidência da doença, foi observada uma redução média de 1423,03kg na produção de plantas de soja quando comparada à média do rendimento de plantas nas parcelas com baixa incidência. A variação observada no rendimento associado ao nível de incidência da PVR acarretou diminuição de 37,78% no rendimento (Tabela 1). Em experimento similar, HARTMAN et al. (1995) observaram diminuição no rendimento de 46,2% nas parcelas com alta incidência (acima de 50%) em relação àquelas de baixa incidência (até 3%). NJITI et al. (1998) observaram uma perda do rendimento estimada em 18% com base na análise de planta individual e 12% com base na parcela como um todo. LUO et al. (2000) relataram perda entre 18 e 29kg.ha-1 quando o índice de severidade da doença medido nas folhas aumentou em uma unidade.

A diminuição do rendimento de plantas de soja ao PVR está relacionado à velocidade de infecção da doença no sistema radicular, acarretando redução na absorção e água e nutrientes, interferindo na taxa fotossintética, afetando o florescimento e o enchimento de grãos.

Em função de a PVR apresentar um progresso estritamente relacionado à sua ecologia e epidemiologia, ainda há uma dificuldade para explicar a variação do aparecimento dos sintomas com os fatores ambientais, estádio da cultura e práticas de manejo (SCHERM & YANG, 1996). Este fato decorre do estabelecimento da doença ser influenciado pelas condições de umidade e temperatura do solo. Neste sentido, variações na resistência de cultivares de soja podem ser consideradas situações de escape determinando uma dificuldade adicional no manejo visando ao controle da PVR.

Conclui-se que a PVR causa danos no rendimento de plantas de soja devido à infecção do patógeno no sistema radicular das plantas. Em condições de um processo infeccioso rápido atingindo um nível elevado ainda no período de florescimento é observada uma interferência no processo de formação de vagens e formação de grãos. Por outro lado, se a infecção ocorrer de forma lenta ou tardia, atingindo seu máximo no período de enchimento de grãos, é observada redução no número de vagens por planta, número de grãos por vagem e peso de mil grãos. Práticas de controle que retardem a infecção inicial da PVR são importantes para uma redução de seu impacto sobre os componentes do rendimento de plantas de soja.

Recebido para publicação 23.09.02

Aprovado em 14.01.03

  • ABNEY, T.S.; RICHARDS, T.L.; ROY, K.W. Fusarium solani from ascospores of Nectria haematococca causes Sudden Death Syndrome of soybean. Mycologia, v.85, n.5, p.801-806, 1993.
  • ALMEIDA, A.M.R. et al. Doenças da soja. In: KIMATI, H. et al. Manual de fitopatologia 3.ed. São Paulo : Ceres, 1997. Cap.61, p.642-664.
  • HARTMAN, G.L.; NOEL, G.R.; GRAY, L.E. Ocurrence of sudden death syndrome in east-central Illinois and associated yield losses. Plant Disease, v.79, n.3, p.314-318, 1995.
  • HERSHMAN, D.E. et al. Influence of planting date and cultivar on soybean Sudden Death Syndrome in Kentucky. Plant disease, v.74, n.10, p.761-766, 1990.
  • KILLEBREW, J.F. et al. Greenhouse and field evaluation of Fusarium solani pathogenicity to soybean seedlings. Plant Disease, v.72, n.12, p.1067-70, 1988.
  • LUO, Y. et al. Root colonization of soybean cultivars in the field by Fusarium solani f. sp. glycines Plant Disease, v.83, n.12, p.1155-1159, 1999.
  • LUO, Y. et al. Soybean yield loss to sudden death syndrome in relation to symptom expression and root colonization by Fusarium solani f. sp. glycines Plant Disease, v.84, n.8, p.914-920, 2000.
  • NJITI, V.N. et al. Relationship between soybean sudden death syndrome disease measures and yield components in F6 derived lines. Crop Science, v.38, p.673-678, 1998.
  • ROY, K.W. Fusarium solani on soybean roots: nomenclature of the causal agent of sudden death syndrome and identity and relevance of Fusarium solani form B. Plant Disease, v.81, n.3, p.259-266, 1997.
  • ROY, K.W. et al. Sudden death syndrome: Fusarium solani as incitant and relation of Heterodera glycines to disease severity. Phytopathology, v.79, n.2, p.191-197, 1989.
  • RUPE, J.C. Frequency and pathogenicity of Fusarium solani recovered from soybeans with Sudden Death Syndrome. Plant Disease, v.73, n.7, p.581-584. 1989.
  • RUPE, J.C.; GBUR, E.E.; MARX, D.M. Cultivar responses to sudden death syndrome of soybean. Plant disease, v.75, p.47-50, 1991.
  • RUPE, J.C.; GBUR JR. E.E. Effect of plant age, maturity group and environmental on disease progress of Sudden Death Syndrome of Soybean. Plant Disease, v.79, n.2, p.139-143, 1995.
  • RUPE, J.C., HIRREL, M.C.; HERSHMAM, D.E. Sudden death syndrome. In: HARTMAN, G.L. et al. Compendium of soybean diseases 4.ed. St. Paul: Aps, 1999. p.37-39.
  • SCHERM, H.; YANG X.B. Development of sudden death syndrome of soybean in relation to soil temperature and soil water matric potential. Phytopathology, v.86, n.6, p.642-649, 1996.
  • WRATHER, J.A. et al. Effects of tillage, cultivar, and planting date on percentage of soybean leaves with symptoms of Sudden Death Syndrome. Plant Disease, v.79, n.6, p.560-562, 1995.
  • 1
    Autor para corrspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Ago 2004
    • Data do Fascículo
      Ago 2004

    Histórico

    • Recebido
      23 Set 2002
    • Aceito
      14 Jan 2003
    Universidade Federal de Santa Maria Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Ciências Rurais , 97105-900 Santa Maria RS Brazil , Tel.: +55 55 3220-8698 , Fax: +55 55 3220-8695 - Santa Maria - RS - Brazil
    E-mail: cienciarural@mail.ufsm.br