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Desempenho produtivo de leitoas alimentadas com dietas de gestação de baixo ou alto nível de casca de soja

Productive perfomance of gilts fed gestation diets with low or high soybean hulls level

Resumos

Leitoas foram alimentadas com dietas de gestação com inclusão de 7% (T1) e 35% (T2) de casca de soja, as quais continham níveis de 4,5 e 13,1% de fibra bruta, respectivamente. Após a inseminação, todas as fêmeas receberam 1,8kg da ração T1 (5470Kcal EM dia-1) até os 35 dias de gestação, quando foram separadas em dois grupos que receberam 2,4kg (7294Kcal EM dia-1) da ração T1 (n=108) ou 2,7kg (7249Kcal EM dia-1) da ração T2 (n=99). Aos 90 dias de gestação, as fêmeas T1 e T2 receberam respectivamente 3,0kg (9117Kcal EM dia-1) e 3,4kg (9129Kcal EM dia-1) de ração. As fêmeas T1 foram mais pesadas que as T2 aos 110 dias de gestação e ao parto (P<0,05). No entanto, o consumo diário médio de ração durante a lactação foi 5,3% maior para as fêmeas T2 (P=0,01) do que para as fêmeas T1. Não houve efeito dos tratamentos sobre a produção e composição do leite, a variação de peso das fêmeas durante a lactação e o intervalo desmame-estro (P>0,05). O número de nascidos totais, nascidos vivos, natimortos e mumificados foi semelhante (P>0,05) entre os tratamentos. O peso médio ao nascer foi maior (P=0,03) para os leitões das fêmeas T1, mas não houve diferença entre os tratamentos no peso médio da leitegada (P>0,05). O peso e número de leitões ao desmame não foram afetados pelos tratamentos (P>0,05). Os dois níveis de inclusão de casca de soja na dieta de gestação de leitoas resultaram em desempenho produtivo semelhante.

casca de soja; gestação; lactação; leitegada; leitoa


Gilts were fed gestation diets, with inclusion of 7% (T1) and 35% (T2) of soybean hulls which had fiber levels of 4.5 and 13.1%, respectively. After insemination, all females received 1.8kg of T1 diet (5470Kcal ME day-1) up to 35 days of gestation, when they were allocated to receive 2.4kg (7294Kcal ME day-1) of T1 (n= 108) or 2.7kg (7249Kcal ME day-1) of T2 (n= 99) diet. At 90 days of gestation T1 and T2 females started to receive 3.0kg (9117Kcal ME day-1) and 3.4kg (9129Kcal ME day-1) of T1 and T2 diets, respectively. The T1 females were heavier than T2 females, at 110 days of gestation and at parturition (P<0.05). However, the daily average feed intake during lactation was 5.3% higher for T2 (P=0.01) than for T1 females. There was no effect of treatments on milk production and composition, weight variation during lactation and weaning-to-estrus interval (P>0.05). Treatments were similar for total and born alive litter size, stillborn and mummified (P>0.05). The average birth weight was higher for T1 piglets (P=0.03), but litter weight was similar for treatments (P>0.05). Weaned litter size and weight did not differ for treatments (P>0.05). The two levels of soybean hulls in the gestation diets of gilts resulted in similar performance.

soybean hulls; gestation; lactation; litter; gilt


ARTIGOS CIENTÍFICOS

REPRODUÇÃO ANIMAL

Desempenho produtivo de leitoas alimentadas com dietas de gestação de baixo ou alto nível de casca de soja

Productive perfomance of gilts fed gestation diets with low or high soybean hulls level

Fabiane Pereira GentiliniI,1 1 Autor para correspondência. ; Djane DallanoraII; Carlos Henrique PeixotoIII; Mari Lourdes BernardiIV; Ivo WentzV; Fernando Pandolfo BortolozzoV

IMédico Veterinário, Doutora, Rua Emílio Jorge dos Reis, 374, 96020-440, Pelotas, RS. E-mail: fgentilini@bol.com.br

IIMédico Veterinário, Mestrando, Faculdade de Veterinária (FAVET), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Av. Bento Gonçalves, 9090, 91540-000, Porto Alegre, RS

IIIMédico Veterinário, Mestre, FAVET, UFRGS

IVMédico Veterinário, Doutor, Professor Adjunto, Faculdade de Agronomia, UFRGS

VMédico Veterinário, Doutor, Professor Adjunto, FAVET, UFRGS

RESUMO

Leitoas foram alimentadas com dietas de gestação com inclusão de 7% (T1) e 35% (T2) de casca de soja, as quais continham níveis de 4,5 e 13,1% de fibra bruta, respectivamente. Após a inseminação, todas as fêmeas receberam 1,8kg da ração T1 (5470Kcal EM dia-1) até os 35 dias de gestação, quando foram separadas em dois grupos que receberam 2,4kg (7294Kcal EM dia-1) da ração T1 (n=108) ou 2,7kg (7249Kcal EM dia-1) da ração T2 (n=99). Aos 90 dias de gestação, as fêmeas T1 e T2 receberam respectivamente 3,0kg (9117Kcal EM dia-1) e 3,4kg (9129Kcal EM dia-1) de ração. As fêmeas T1 foram mais pesadas que as T2 aos 110 dias de gestação e ao parto (P<0,05). No entanto, o consumo diário médio de ração durante a lactação foi 5,3% maior para as fêmeas T2 (P=0,01) do que para as fêmeas T1. Não houve efeito dos tratamentos sobre a produção e composição do leite, a variação de peso das fêmeas durante a lactação e o intervalo desmame-estro (P>0,05). O número de nascidos totais, nascidos vivos, natimortos e mumificados foi semelhante (P>0,05) entre os tratamentos. O peso médio ao nascer foi maior (P=0,03) para os leitões das fêmeas T1, mas não houve diferença entre os tratamentos no peso médio da leitegada (P>0,05). O peso e número de leitões ao desmame não foram afetados pelos tratamentos (P>0,05). Os dois níveis de inclusão de casca de soja na dieta de gestação de leitoas resultaram em desempenho produtivo semelhante.

Palavras-chave: casca de soja, gestação, lactação, leitegada, leitoa.

ABSTRACT

Gilts were fed gestation diets, with inclusion of 7% (T1) and 35% (T2) of soybean hulls which had fiber levels of 4.5 and 13.1%, respectively. After insemination, all females received 1.8kg of T1 diet (5470Kcal ME day-1) up to 35 days of gestation, when they were allocated to receive 2.4kg (7294Kcal ME day-1) of T1 (n= 108) or 2.7kg (7249Kcal ME day-1) of T2 (n= 99) diet. At 90 days of gestation T1 and T2 females started to receive 3.0kg (9117Kcal ME day-1) and 3.4kg (9129Kcal ME day-1) of T1 and T2 diets, respectively. The T1 females were heavier than T2 females, at 110 days of gestation and at parturition (P<0.05). However, the daily average feed intake during lactation was 5.3% higher for T2 (P=0.01) than for T1 females. There was no effect of treatments on milk production and composition, weight variation during lactation and weaning-to-estrus interval (P>0.05). Treatments were similar for total and born alive litter size, stillborn and mummified (P>0.05). The average birth weight was higher for T1 piglets (P=0.03), but litter weight was similar for treatments (P>0.05). Weaned litter size and weight did not differ for treatments (P>0.05). The two levels of soybean hulls in the gestation diets of gilts resulted in similar performance.

Key words: soybean hulls, gestation, lactation, litter, gilt.

INTRODUÇÃO

A restrição da oferta de dietas concentradas baseadas em cereais, durante a gestação de fêmeas suínas, visa evitar o excessivo ganho de peso, a possível redução do consumo na lactação, o que diminuiria a produção de leite e aumentaria o intervalo desmame-estro (MEUNIER-SALAÜN et al., 2001). No entanto, a diminuição da saciedade induzida por esta restrição tem efeito negativo no bem-estar das fêmeas (DANIELSEN & VESTERGAARD, 2001). Por esta razão, tem crescido o interesse em utilizar alimentos volumosos para reprodutoras, especialmente em gestação. Os efeitos da fibra dietética têm sido estudados quanto aos aspectos nutricionais e metabólicos, e suas conseqüências no desempenho produtivo e reprodutivo (RAMONET et al., 1999).

A casca de soja, um subproduto obtido da industrialização da soja para extração do óleo, é uma película que reveste o grão, e que tem sido utilizada na alimentação animal. Consiste de uma fonte rica em fibra de baixa lignificação, com um teor de proteína bruta de cerca de 12% e um teor de fibra bruta ao redor de 36% (BLAS et al., 1999), constituindo 8% do peso da semente (KLOPFENSTEIN & OWEN, 1987).

KORNEGAY (1981) utilizou a casca de soja como fonte de fibra na dieta de suínos em crescimento-terminação e de porcas em gestação, e constatou que as fêmeas gestantes apresentaram uma melhor digestibilidade dos nutrientes da ração, com um melhor aproveitamento da fibra dietética, em comparação aos suínos em crescimento-terminação. Animais adultos apresentam seu trato gastrintestinal mais desenvolvido, o que propicia a atuação da microbiota do intestino grosso (cólon e ceco) sobre a fibra, produzindo ácidos graxos voláteis que são absorvidos e utilizados como fonte de energia por estes animais (NOBLET & SHI, 1993).

O objetivo deste estudo foi avaliar o efeito da inclusão de dois níveis de casca de soja, na dieta de leitoas em gestação, sobre o ganho de peso durante a gestação, o consumo de ração e a perda de peso durante a lactação, o número total de leitões nascidos, nascidos vivos, natimortos e mumificados, peso ao nascer dos leitões, além do intervalo desmame-estro das fêmeas. Avaliou-se, ainda, o efeito dos tratamentos sobre a composição e produção de leite das fêmeas, o número e peso dos leitões ao desmame.

MATERIAL E MÉTODOS

O estudo foi realizado em uma unidade produtora de leitões, localizada no oeste do estado de Santa Catarina, no período de janeiro a julho de 2001. Foram selecionadas leitoas da linhagem Cambourough 22®, com peso e idade médios de 135,1kg e 205 dias. As fêmeas foram inseminadas no terceiro estro (idade média de 220 dias), com doses de sêmen contendo três bilhões de espermatozóides, em intervalos médios de 12h. O diagnóstico de estro foi realizado duas vezes por dia, na presença do macho. Após a detecção do estro, as fêmeas foram imediatamente inseminadas, recebendo uma segunda e terceira doses em intervalos médios de 12 e 24h, da primeira.

Da inseminação até os 34 dias de gestação todas as fêmeas receberam uma dieta com inclusão de 7% de casca de soja (4,5% de fibra bruta), na quantidade de 1,8kg de ração/dia (5470Kcal EM dia-1). Aos 35 dias de gestação, 207 fêmeas foram distribuídas em dois grupos que passaram a receber rações com diferentes níveis de fibra bruta. A partir deste momento, a quantidade de ração oferecida foi ajustada, segundo o tipo de dieta, de modo que a ingestão de energia fosse semelhante para os dois grupos de fêmeas. As fêmeas T1 (n= 108) continuaram a receber a ração com 4,5% de fibra bruta na quantidade de 2,4kg de ração/dia (7294Kcal EM dia-1). As fêmeas T2 (n= 99) receberam a ração com inclusão de 35% de casca de soja (13,1% de fibra bruta), na quantidade de 2,7kg de ração/dia (7249Kcal EM dia-1). A partir dos 90 dias de gestação, as fêmeas T1 e T2 passaram a receber 3,0 e 3,4kg de ração/dia (9117 e 9129Kcal EM dia-1, respectivamente). Ambas as rações eram do tipo farelada e foram formuladas com base no NRC (1998), sendo a composição percentual das mesmas apresentada na Tabela 1. Os arraçoamentos foram realizados às 6 e às 14h, com ração seca, e toda a ração oferecida foi consumida pelas fêmeas. A água foi fornecida à vontade.

Aos 110 dias de gestação, as fêmeas foram transferidas para as salas de maternidade, onde permaneceram em média até 19º dia de lactação. Até o terceiro dia pós-parto, as fêmeas continuaram a receber as rações T1 e T2 de gestação e, a partir deste momento, todas passaram a receber ração de lactação, com níveis protéico e energético de 16,8% e 3.298,38Kcal kg-1, respectivamente. Durante o período de aleitamento, a ração foi fornecida na forma farelada seca, às 5:00, 8:00, 15:30 e 17:00h, em quantidades próximas de 1,5kg a cada arraçoamento. As fêmeas dispunham de livre acesso à água.

Uma semana após o início do experimento (42 dias de gestação), um grupo de fêmeas (T1= 56 e T2= 48) foi pesado, não tendo sido verificadas diferenças entre os tratamentos (P>0,05; T1= 165,35kg vs. T2= 165,09kg), evidenciando a homogeneidade dos grupos. Grupos de fêmeas de cada tratamento foram pesadas aos 70 (T1= 47 e T2= 39) e 110 (T1=101 e T2=94) dias de gestação. Após o parto, foram pesadas 91 fêmeas de cada tratamento.

Ao nascimento, foi avaliado o número total de leitões nascidos, nascidos vivos, natimortos e mumificados. Os leitões foram pesados individualmente ao nascer e as leitegadas foram padronizadas em até 48h pós-parto. A padronização das leitegadas foi feita entre fêmeas do mesmo tratamento, as quais permaneceram, em média, com 10 leitões/leitegada, de modo a evitar que um número desigual de leitões pudesse alterar as respostas de desempenho, tanto das fêmeas como dos leitões. No entanto, não foi possível padronizar o tamanho da leitegada em todas as fêmeas de cada tratamento, em virtude da diferença de datas de parto e/ou pelo número insuficiente de leitões. Assim, as fêmeas que ficaram com menor número de leitões não foram usadas para as avaliações efetuadas durante o período de lactação, mas os dados de todas as fêmeas que pariram foram usados nas análises de nascidos totais, nascidos vivos, natimortos e mumificados. Durante todo o período de aleitamento os leitões não receberam ração, de modo a efetuar uma avaliação do desempenho dos leitões em função do real potencial da fêmea e não de uma possível compensação pelo consumo de ração.

Na lactação, avaliou-se a perda de peso das fêmeas, do parto ao desmame (T1=67 e T2= 63), o consumo diário médio de ração (CDMR), a composição do leite e a produção diária média de leite (PDML). O CDMR foi medido em 114 leitoas (T1=56 e T2=58). A cada dois dias, um saco contendo uma quantidade fixa de ração era colocado em frente à cela parideira de cada fêmea, a partir do qual eram retiradas as quantidades fornecidas em cada arraçoamento. Por ocasião da reposição de ração eram pesadas as sobras que restaram no saco e, assim, calculada a quantidade ingerida naquele período, por cada fêmea. Após o desmame, avaliou-se também o intervalo desmame-estro (IDE). Com relação às leitegadas, avaliou-se o número de leitões desmamados e o peso médio dos leitões ao desmame.

Para análise da composição do leite utilizou-se 64 leitoas (T1=34 e T2=30), com média de 10 leitões/leitegada (9 a 11 leitões/leitegada). A coleta de amostras de 250mL de leite foi realizada através da ordenha manual, no 10º dia de lactação, após aplicação intramuscular de 1,5mL de ocitocina. As amostras foram armazenadas a –20°C para análise posterior. Foram determinadas a densidade, matéria seca total, gordura, lactose e proteína pelo uso de termolactodensímetro, processo indireto de Fleischmann, métodos de Gerber, de Felhing e micro-Kjeldahl, respectivamente, descritos pelo INSTITUTO ADOLFO LUTZ (1985).

Para medir a produção diária média de leite (PDML) utilizaram-se 49 fêmeas (T1= 25 e T2= 24). A estimativa da produção leiteira das porcas foi feita no 14o dia de lactação através do método descrito por LEWIS et al. (1978), de pesagem da leitegada imediatamente antes e após a mamada, sendo a diferença de peso observada considerada como a quantidade de leite (em gramas) obtida pelos leitões e, portanto, a produção por mamada. O procedimento teve início com a separação da fêmea e sua leitegada, no interior da gaiola parideira, não permitindo o contato físico entre a porca e a sua leitegada. No entanto, os leitões dispunham de livre acesso à água e ao escamoteador. Passados 55 a 60 minutos, a leitegada foi pesada e colocada para mamar. No momento em que os dois primeiros leitões afastaram-se da glândula mamária, ao redor de 2 a 3 minutos após o início da mamada, toda a leitegada foi retirada e pesada novamente. Foram acrescentados 5 e 10g por leitão que defecou ou urinou, respectivamente, durante o período da mamada. Este procedimento foi repetido seis vezes em intervalos de 55 a 60 minutos. Das seis medidas realizadas, as duas primeiras foram descartadas por serem consideradas adaptativas para a fêmea e sua leitegada. Portanto, para o cálculo da produção diária de leite da fêmea, utilizou-se a média das quatro últimas medidas, sendo multiplicada por 24, estimando-se assim a produção diária de leite.

Os dados foram analisados pelo procedimento GLM (SAS, 1999) sendo as médias comparadas pelo teste t, com um nível de significância de 5%. As variáveis ganho de peso durante a gestação, perda de peso durante a lactação, número total de leitões nascidos, nascidos vivos, composição e produção de leite, número de leitões desmamados e intervalo desmame-estro foram analisadas conforme o seguinte modelo estatístico:

Yij = µ + CSi +eij

onde,

Yij = observação realizada em cada fêmea, leitão ou amostra de leite;

µ = média geral;

CSi = efeito do nível de inclusão de casca de soja i;

eij = erro experimental j associado com a observação.

Neste mesmo modelo, foi incluída a duração da lactação como covariável para a análise do consumo de ração durante a lactação e do peso médio dos leitões ao desmame. Para a variável peso ao nascer, o número total de nascidos foi incluído como covariável. Os números de natimortos e de mumificados foram submetidos à análise não-paramétrica pelo procedimento NPAR1WAY (SAS, 1999) sendo os rankings médios comparados pelo teste de Wilcoxon-Mann-Whitney. As taxas de parto ajustadas foram comparadas pelo teste Qui-quadrado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Das 207 fêmeas submetidas aos tratamentos, a partir dos 35 dias de gestação, não houve diferença na taxa de parto ajustada (P>0,05) entre as dietas baixa (T1) e alta (T2) fibra (Tabela 2). Após o início dos tratamentos, algumas fêmeas retornaram ao estro (n=6), abortaram (n=4) ou morreram (n=2), não sendo, portanto, analisadas em termos de desempenho.

Não houve diferença (P>0,05) no peso aos 70 dias de gestação entre as fêmeas T1 e T2 (Tabela 2). As fêmeas T1 pesaram mais aos 110 dias de gestação (P=0,05), quando comparadas às T2. Contudo, durante a lactação, verificou-se que as fêmeas T2 consumiram 5,3% (310g/dia, em média) a mais de ração (P=0,01), do que as T1, semelhante à diferença observada por MATTE et al. (1994), entre dietas com alto e baixo teor de fibra. Mesmo recebendo dietas com mesma quantidade de energia metabolizável (EM), no presente estudo, o aumento da taxa de passagem do alimento pelo trato gastrintestinal, diminuindo a digestibilidade dos demais nutrientes da dieta, principalmente da energia (POLLMANN et al., 1979), provavelmente seja a razão do menor ganho de peso das fêmeas que ingeriram maior quantidade de fibra.

Como o consumo alimentar durante a fase de aleitamento é mais comprometido em primíparas, é de grande interesse que, durante a lactação, o volume estomacal desta categoria possa ser aumentado, o que fez com que vários autores adicionassem alimentos fibrosos à dieta destas fêmeas, no período gestacional (POLLMANN et al., 1979; NUZBACK et al., 1984; POND et al., 1985; YAN et al., 1995; EWAN et al., 1996). Em várias espécies, incluindo suínos, o volume, o peso e a capacidade do trato digestivo aumentam com a elevação da porcentagem de fibra na ração (COEY & ROBINSON, 1954; HANSEN et al., 1992), sugerindo que o fornecimento de uma ração rica em fibra durante a gestação pode levar a um aumento do estômago e, conseqüentemente, a um maior consumo durante a subseqüente fase de lactação.

MATTE et al. (1994), trabalhando com três níveis de FB na dieta de gestação (2,2; 10,1 e 20,4mg kg-1 de matéria seca, respectivamente), durante dois ciclos reprodutivos consecutivos, constataram que as fêmeas que receberam a dieta altamente fibrosa (20,4mg kg-1) ganharam menos peso durante a gestação e consumiram 5% a mais durante a lactação. Outros autores (FARMER et al., 1996; DANIELSEN & VESTERGAARD, 2001) também observaram que as fêmeas que receberam dieta rica em fibra, durante a gestação, consumiram mais durante a lactação.

Não foram observadas diferenças entre os tratamentos nas variáveis perda de peso da fêmea na lactação e IDE (P>0,05). Resultados semelhantes foram obtidos por VESTERGAARD & DANIELSEN (1998) quando compararam duas dietas ricas em fibra, de diferentes fontes (polpa de beterraba e mistura de alimentos fibrosos) com a dieta padrão (milho e farelo de soja).

Os tratamentos não afetaram o total de leitões nascidos, nascidos vivos, natimortos e mumificados (P>0,05). REESE (1997) sugere que o aumento do nível de fibra na dieta de gestação levaria ao aumento do tamanho da leitegada, o que foi constatado por CARTER et al. (1987). No entanto, outros autores (MATTE et al., 1994; VESTERGAARD & DANIELSEN, 1998; DANIELSEN & VESTERGAARD, 2001) não verificaram efeito de dietas com diferentes teores e fontes de fibra sobre o tamanho da leitegada.

O peso médio dos leitões, ao nascerem, diferiu entre os tratamentos, tendo sido menor para os leitões nascidos das fêmeas T2 (P=0,03). Quando considerado o peso médio da leitegada, no entanto, não houve diferença entre os tratamentos (P>0,05). DANIELSEN & VESTERGAARD (2001) observaram que fêmeas submetidas à dieta rica em polpa de beterraba (446g fibra dietética kg-1) produziram leitões mais leves, quando comparadas às fêmeas que receberam dietas controle (176g fibra dietética kg-1) ou uma mistura de alimentos fibrosos (344g fibra dietética kg-1). O provável menor aporte energético, causado pela maior inclusão de fibra, o que reduz a digestibilidade da energia e outros nutrientes da dieta (KORNEGAY, 1981), deve ter sido o fator responsável pelo menor peso ao nascer dos leitões nascidos de fêmeas submetidas à dieta rica em fibra. Tem sido mostrado que o peso médio ao nascer dos leitões depende dos níveis energéticos na gestação (HENRY & ETIENNE, 1978). Para um dado nível alimentar, o peso ao nascer dos leitões diminuiu quando a porcentagem de feno de alfafa aumentou de 0 para 95% na dieta de gestação (CALVERT et al., 1985). Segundo MEUNIER-SALAÜN et al. (2001), quando dietas ricas em fibra são usadas, o tamanho da leitegada e o peso ao nascer dos leitões podem variar em função da fonte de fibra ou da sua taxa de inclusão na dieta de gestação.

Apesar do menor peso ao nascer para os leitões oriundos das fêmeas T2, o nível de fibra não afetou o peso médio dos leitões ao desmame (P>0,05), confirmando observações de outros autores (POND et al., 1985; DANIELSEN & VESTERGAARD, 2001). O maior consumo de ração das fêmeas T2, juntamente com a mobilização de reservas, durante a lactação, foram suficientes para garantir o crescimento dos leitões e compensar seu menor peso ao nascer, semelhante ao verificado por MATTE et al. (1994).

A produção de leite no suíno é bastante variável, sendo que a ordem de parição, o número de leitões mamando e/ou nascidos, o nível nutricional, a raça, o estágio de lactação, a estação do ano, o ambiente social e o fotoperíodo são alguns dos fatores responsáveis por esta variação (SPEER & COX, 1984). No presente estudo, a composição do leite, no 10º dia de lactação, não foi afetada pelo nível de inclusão de casca de soja na ração de gestação (P>0,05). Não se observou diferença (P>0,05) na produção diária de leite, no 14º dia de lactação (tabela 3), entre as fêmeas dos dois tratamentos. FARMER et al. (1996) também não observaram diferença na produção de leite, no 29º dia de lactação, de leitoas submetidas a dietas de gestação com dois níveis distintos de FB (4,1 e 15,3%).

Segundo MATTE et al. (1994), as exigências de nutrientes não tão elevadas por parte das fêmeas gestantes tornam o uso de dietas com ingredientes fibrosos de baixo custo possível e economicamente atrativo, ao mesmo tempo que minimiza os possíveis efeitos adversos da restrição do volume de alimento oferecido no período gestacional. O custo dos ingredientes utilizados na ração variam de uma época para outra, além de sua disponibilidade ser variável de uma região para outra, o que implica em possíveis oscilações do custo final da ração. No presente estudo, os dados de desempenho de um ciclo produtivo das fêmeas não foram favoráveis a nenhum dos níveis de casca de soja utilizados, indicando que tanto o nível baixo como o elevado poderiam ser usados.

A decisão de usar ou não dietas de gestação com alto teor de fibra deve, no entanto, além dos aspectos relativos ao desempenho, considerar também os possíveis efeitos benéficos no aumento da saciedade, na redução da incidência de comportamentos esteriotipados e consequente melhoria do bem-estar das fêmeas, conforme observado por vários autores (ROBERT et al., 1993; RAMONET et al., 1999; MEUNIER-SALAÜN et al., 2001). Segundo MEUNIER-SALAÜN et al. (2001), o uso de dietas com alto teor de fibra pode ser limitado pelo baixo valor nutricional de alguns ingredientes fibrosos, a dificuldade no manuseio e armazenamento de rações mais volumosas e o maior volume de dejetos sólidos produzidos. Estes aspectos evidenciam a necessidade de maiores informações que permitam adequar a formulação e a quantidade fornecida de dietas ricas em fibra para um aumento do bem-estar animal ao mesmo tempo que satisfaça as exigências ambientais e econômicas.

CONCLUSÃO

É possível usar casca de soja até 35%, correspondendo a 13% de fibra bruta, na dieta de gestação de leitoas, sem afetar o seu desempenho durante um ciclo produtivo.

Recebido para publicação 07.03.03

Aprovado em 22.10.03

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    Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Ago 2004
    • Data do Fascículo
      Ago 2004

    Histórico

    • Recebido
      07 Mar 2003
    • Aceito
      22 Out 2003
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