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Deposição do enxofre atmosférico no solo pelas precipitações pluviais e respostas de culturas à adubação sulfatada em sistema plantio direto

Soil sulphur atmospheric depositions by pluvial precipitations and crops responses to sulfated fertilization in no-tillage system

Resumos

Entre vários fatores que podem mascarar a ocorrência de respostas das plantas ao enxofre, destaca-se a deposição atmosférica via água da chuva. O objetivo deste trabalho foi avaliar a quantidade de sulfato presente na água das chuvas e as respostas de diferentes culturas à adubação sulfatada. Foi utilizado um experimento instalado a campo, em 2002, sobre um Argissolo Vermelho distrófico arênico, em sistema plantio direto, num esquema bifatorial com quatro doses de sulfato e duas sucessões de culturas. No período de julho de 2002 a dezembro de 2003, foram realizados três cultivos, aplicando-se as doses de 0, 15, 30 e 60kg de S-SO4-2 ha-1 no primeiro cultivo, 1/3 dessas doses no segundo cultivo e no terceiro não foi aplicado S-SO4-2. A partir de maio de 2004, foi avaliado mais um ciclo de três cultivos (aveia preta/feijoeiro/trigo e aveia preta/soja/canola), para os quais as doses de S-SO4-2 foram reaplicadas antes da implantação das culturas, exceto a da aveia preta. Durante o período de setembro de 2004 a novembro de 2005, quantificou-se o aporte de enxofre via água das chuvas. Somente o feijoeiro respondeu à aplicação de sulfato. A ausência de resposta das demais culturas pode estar relacionada com a deposição atmosférica pela água da chuva, cujo valor determinado foi de 3,2kg de enxofre ha-1 ano-1, e com a mineralização dos resíduos culturais, que devem ter sido suficientes para atender a demanda das plantas.

sulfato; aporte de enxofre; percolação


Some factors, such as atmospheric sulphur deposition by rain, may mask the crops response to fertilizers containing sulphur. This experiment was carried out to study (a) crop yields response to sulphur, and (b) sulphur deposition by rain. An experiment was installed in 2002 Winter, and cultivated to three crops sequences until December 2003, with sulfate rate of 0, 15, 30, and 60kg ha-1 for the first crop, 1/3 rates for the second crop and nil on the third. From May 2004 to October 2005, it was cultivated two new cultures in each crops system (black oat / bean / wheat and black oat / soybean / colza). The same sulfate rates applied in 2002 were again applied to second and third crops. The atmospheric sulphur deposition was evaluated by sampling all rain events from September 2004 to November 2005. Only bean responded to sulfate application. No response observed to other crop yields may be attributed to the sulphur atmospheric deposition and organic matter mineralization. The sulphur atmospheric deposition was 3.2kg ha-1 year-1 which is equivalent to almost 10kg ha-1 year-1 of sulfate.

sulfate; sulfur supply; percolation


ARTIGOS CIENTÍFICOS

CIÊNCIA DO SOLO

Deposição do enxofre atmosférico no solo pelas precipitações pluviais e respostas de culturas à adubação sulfatada em sistema plantio direto

Soil sulphur atmospheric depositions by pluvial precipitations and crops responses to sulfated fertilization in no-tillage system

Benjamin Dias Osório FilhoI; Danilo dos Santos RheinheimerII,1 1 Autor para correspondência. ; Leandro Souza da SilvaII; João KaminskiII; Graziele Feltrin DiasIII

IPrograma de Pós-graduação em Ciência do Solo, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS, Brasil

IIDepartamento de Solos, UFSM, 97105-900, Santa Maria, RS, Brasil. E-mail: danilo@ccr.ufsm.br

IIICurso de Agronomia, UFSM, Santa Maria, RS, Brasil

RESUMO

Entre vários fatores que podem mascarar a ocorrência de respostas das plantas ao enxofre, destaca-se a deposição atmosférica via água da chuva. O objetivo deste trabalho foi avaliar a quantidade de sulfato presente na água das chuvas e as respostas de diferentes culturas à adubação sulfatada. Foi utilizado um experimento instalado a campo, em 2002, sobre um Argissolo Vermelho distrófico arênico, em sistema plantio direto, num esquema bifatorial com quatro doses de sulfato e duas sucessões de culturas. No período de julho de 2002 a dezembro de 2003, foram realizados três cultivos, aplicando-se as doses de 0, 15, 30 e 60kg de S-SO4-2 ha-1 no primeiro cultivo, 1/3 dessas doses no segundo cultivo e no terceiro não foi aplicado S-SO4-2. A partir de maio de 2004, foi avaliado mais um ciclo de três cultivos (aveia preta/feijoeiro/trigo e aveia preta/soja/canola), para os quais as doses de S-SO4-2 foram reaplicadas antes da implantação das culturas, exceto a da aveia preta. Durante o período de setembro de 2004 a novembro de 2005, quantificou-se o aporte de enxofre via água das chuvas. Somente o feijoeiro respondeu à aplicação de sulfato. A ausência de resposta das demais culturas pode estar relacionada com a deposição atmosférica pela água da chuva, cujo valor determinado foi de 3,2kg de enxofre ha-1 ano-1, e com a mineralização dos resíduos culturais, que devem ter sido suficientes para atender a demanda das plantas.

Palavras-chave: sulfato, aporte de enxofre, percolação.

ABSTRACT

Some factors, such as atmospheric sulphur deposition by rain, may mask the crops response to fertilizers containing sulphur. This experiment was carried out to study (a) crop yields response to sulphur, and (b) sulphur deposition by rain. An experiment was installed in 2002 Winter, and cultivated to three crops sequences until December 2003, with sulfate rate of 0, 15, 30, and 60kg ha-1 for the first crop, 1/3 rates for the second crop and nil on the third. From May 2004 to October 2005, it was cultivated two new cultures in each crops system (black oat / bean / wheat and black oat / soybean / colza). The same sulfate rates applied in 2002 were again applied to second and third crops. The atmospheric sulphur deposition was evaluated by sampling all rain events from September 2004 to November 2005. Only bean responded to sulfate application. No response observed to other crop yields may be attributed to the sulphur atmospheric deposition and organic matter mineralization. The sulphur atmospheric deposition was 3.2kg ha-1 year-1 which is equivalent to almost 10kg ha-1 year-1 of sulfate.

Key words: sulfate, sulfur supply, percolation.

INTRODUÇÃO

O enxofre (S) é um macronutriente com poucos relatos na literatura de ocorrência de deficiência em solos agrícolas. Isto é atribuído à utilização de fertilizantes que contêm S, como os superfosfatos simples e sais de sulfatos com micronutrientes ou de amônio, além de que, no solo, a maior fonte é a matéria orgânica do solo (MOS), que garantiria o fornecimento gradual dessas plantas por causa da mineralização. Entretanto, com o uso mais freqüente de fertilizantes fosfatados e nitrogenados concentrados, como superfosfato triplo ou uréia, há uma diminuição no seu fornecimento, tornando provável a necessidade de adições de S para corrigir possíveis deficiências (JORDAN & ENSMINGER, 1958; ELKINS & ENSMINGER, 1971). Da mesma forma, atualmente é freqüente o cultivo em áreas com baixos teores de MOS e/ou obtenção de altas produtividades com altas extrações desse nutriente, aumentando a probabilidade de o solo apresentar limitações no fornecimento de enxofre às plantas cultivadas, especialmente em cultivos contínuos. Além disso, há fatores climáticos, ou de formas de manejo das culturas, que podem interferir na disponibilidade do S (ALVAREZ, 1988). Nesse contexto, há necessidade de se estudar a disponibilidade deste nutriente às plantas e avaliar a resposta das culturas à adubação sulfatada.

JORDAN & ELMINGER (1958) classificam as plantas cultivadas de acordo com os teores de S no tecido foliar. Assim, liliáceas e brassicáceas são consideradas exigentes porque acumulam mais S que as gramíneas, por isso estas últimas seriam pouco exigentes. As leguminosas ocupariam uma posição intermediária. Conseqüentemente, o cultivo de espécies exigentes em solos arenosos (baixos teores de matéria orgânica) deveria indicar a necessidade de suplementação de S. Isto foi observado por RHEINHEIMER et al. (2005), quando obtiveram maior produção de matéria seca da canola (Brassica napus L. var. napus) usando adubação sulfatada em casa-de-vegetação com amostras da camada 0-20cm de um Argissolo de textura superficial arenosa. Entretanto, estes mesmos autores, em experimento de campo, sobre o mesmo tipo de solo, não obtiveram resposta em canola, enquanto que o nabo forrageiro (Raphanus sativus L.) foi responsivo à fertilização com S. HICORE & GALLO (1972) encontraram incrementos na produtividade da cultura da soja (Glycine max L.) em Latossolo argiloso, e MIYASAKA et al. (1964) obtiveram resultados positivos com aplicação de baixas doses de S para soja em solos arenosos, derivados do arenito Botucatu. Contrariamente, NOGUEIRA & MELO (2003) não obtiveram resposta dessa cultura em dois anos agrícolas num Latossolo argiloso, e ALVAREZ (2004) não observou resposta para a soja em casa-de-vegetação e no campo em Argissolo arenoso. NASCIMENTO & MORELLI (1980) relataram respostas positivas para a alfafa (Medicago sativa), em alguns solos do Rio Grande do Sul (Argissolo Vermelho, Chernossolo Ebânico, Latossolo Vermelho, Luvissolo Crômico e Planossolo Hidromórfico), estabelecendo o teor de 5,6mg dm-3 como teor crítico para estes solos, muito embora tenham realizado o trabalho em casa-de-vegetação.

Apesar de as gramíneas estarem classificadas como culturas que necessitam de baixas quantidades de S, existem casos em que elas responderam às adições desse nutriente, como em situações com grande produção de massa seca e, conseqüentemente, elevada demanda por S. Assim, RHEINHEIMER et al. (2005), num Argissolo Vermelho distrófico arênico, em experimento com milho (Zea mays L.) irrigado, produzindo cerca de 10 toneladas de grãos, constataram resposta ao S. Entretanto, os mesmos autores, ao cultivarem milho na safra seguinte, quando ocorreu deficiência hídrica, alcançaram cerca da metade da produtividade da safra anterior, não obtendo resposta à adubação sulfatada. Para as outras gramíneas, também persistem as contradições nas respostas à adição de fertilizantes sulfatados e nem sempre estão relacionadas aos teores de sulfato numa determinada camada de solo, pois muitos fatores podem afetar a mineralização do enxofre orgânico, a distribuição do sistema radicular no perfil do solo e até a deposição atmosférica desse nutriente. Nesse sentido, RHEINHEIMER et al. (2005) não encontraram resposta para o trigo, cultivado em solo deficiente em sulfato, e CAMARGO et al. (1975) observaram altas respostas dessa cultura quando cultivada em solos ácidos e com baixos teores de MOS.

De acordo com os resultados obtidos pelos diferentes trabalhos, não existe uma condição específica que determine a resposta das culturas às adições de S, mas há circunstâncias em que solos podem apresentar menor disponibilidade e exibir resultados favoráveis à adubação com S. Por outro lado, parecem haver dificuldades de se estabelecer um teor crítico no solo pelos métodos de análise usados, quer seja pela ineficiência do próprio método ou porque outros fatores podem mascarar a ocorrência de respostas. Eles podem estar associados à ocorrência de formas de S não-acessadas pelo método de extração, às taxas de dessorção compatíveis com a necessidade da planta, à absorção de camadas mais profundas, às taxas de mineralização dos resíduos vegetais e mesmo da MOS e à entrada de sulfato dissolvido na água da chuva ou de irrigação.

A contribuição da água da chuva no suprimento de S às plantas foi relatada por diversos autores. Na revisão de JORDAN & ENSMINGER (1958), já havia constatação de que consideráveis quantidades anuais de S podem ser depositadas nos solos através das precipitações, podendo, contudo, variar em função do local e da época do ano. ALWAYS et al. (1937) observaram contribuição na ordem de 112kg de S ha-1 ano-1 em Mineapolis - EUA, mas valores inferiores a 6kg ha-1 ano-1 nas regiões menos industrializadas do mesmo país. Estudos na China mostram que as contribuições podem variar de 16,5 a 397kg de S ha-1 ano-1, dependendo da região de coleta da água (CHEN, 1993; WANG et al., 2004). No Rio Grande do Sul, há dados para a região metropolitana de Porto Alegre, onde GUEDES (1985) estimou uma contribuição de 99,2kg de S ha-1 ano-1 para áreas urbanas e industriais, enquanto que, para áreas rurais, esta contribuição foi de até 39,4kg de S ha-1 ano-1. Como se observa, a contribuição pela água da chuva pode alcançar valores consideráveis, inclusive podendo suprir as necessidades das culturas, ou mesmo acumular-se no solo.

O objetivo deste trabalho foi avaliar a contribuição da deposição de enxofre atmosférico pela água da chuva e as respostas de brassicáceas, leguminosas e gramíneas à adubação sulfatada.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento utilizado foi instalado na área experimental do Departamento de Solos da Universidade Federal de Santa Maria. O solo é classificado como Argissolo Vermelho distrófico arênico (EMBRAPA, 1999) e foi intensivamente cultivado nas décadas de 60 a 70. Entre meados da década de 70 até 1994, permaneceu sem cultivo e houve o crescimento de vegetação espontânea. Em 1994, aplicou-se calcário em dose suficiente para elevar o pH do solo a 6,0, estimado pelo SMP (6,4Mg ha-1 de calcário dolomítico PRNT 100%), e superfosfato triplo a fim de elevar a disponibilidade de fósforo acima do teor crítico (140kg P2O5 ha-1) a lanço, seguido de incorporação por uma aração e duas gradagens. A partir daí, foi adotado o sistema plantio direto. Em março de 2002, o solo da camada 0-10cm apresentava 14% de argila, 1,28% de MO, pH 5,2, índice SMP de 6,0, 3,4; 0,8 e 0,2cmolcdm-3 de Ca, Mg e Al+3, respectivamente, e 20,0 e 44mg dm-3 de P e K, respectivamente. Antes da instalação do experimento, foi reaplicado calcário objetivando elevar o pH a 5,5 (1,6Mg ha-1 de calcário dolomítico PRNT 100%), seguido de uma escarificação a 30cm de profundidade. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso com quatro repetições, com as parcelas medindo 9,5 x 11m e as subparcelas 9,5 x 5,5m. Na parcela, foram adicionadas quatro doses de sulfato (0, 15, 30 e 60kg de S-SO4-2 ha-1, como superfosfato simples) e as subparcelas consistiram de duas sucessões de culturas.

Entre julho de 2002 e dezembro de 2003, RHEINHEIMER et al. (2005) realizaram três cultivos em cada uma das duas sucessões de culturas. No primeiro cultivo (nabo forrageiro e aveia preta), foram aplicadas as doses de 0, 15, 30 e 60kg de S-SO4-2 ha-1; no segundo cultivo (milho e soja), adicionou-se o equivalente a 1/3 das doses iniciais e, no terceiro (trigo e canola), não foi aplicado S-SO4-2. Em maio de 2004, iniciou-se mais um ciclo de três cultivos com a sucessão 1: aveia preta/feijoeiro/trigo e a sucessão 2: aveia preta/soja/canola. As doses integrais de S-SO4-2 foram reaplicadas antes da implantação de todas as culturas, exceto a da aveia preta. O sulfato foi aplicado manualmente, na forma de superfosfato simples, na linha de semeadura, e cinco centímetros abaixo das sementes, padronizando a dose de fósforo com o uso de superfosfato triplo.

As culturas receberam irrigação por aspersão, via pivô central, o qual era acionado em função da demanda de água pela planta e pelo balanço de água no solo, através do sistema Irriga, do Departamento de Engenharia Rural. Usaram-se agrotóxicos para o controle de pragas e doenças, de acordo com as indicações técnicas. As plantas invasoras foram controladas por capina manual. A adubação com N, P e K foi realizada seguindo as recomendações técnicas para cada cultura, segundo a CQFS-RS/SC (2004), usando uréia, superfosfato triplo e cloreto de potássio, respectivamente. Não foram adicionados micronutrientes.

A parte aérea das plantas de aveia foi colhida em pleno florescimento, cortada rente ao solo numa área de dois metros quadrados, sendo feitas três avaliações por parcela. A matéria verde foi secada em estufa com circulação de ar forçada (65°C), até peso constante, pesada e retirada uma amostra para análise da composição mineral do tecido. Nos demais cultivos, avaliou-se a produtividade de grãos, numa área de 21m2 por parcela. Os grãos foram pesados e a produtividade expressa relativa a 13% de umidade, da qual foi retirada uma alíquota para análise de teor de S.

Após a colheita das plantas, foram coletadas amostras de solo nas camadas de 0-10, 20-30 e 50-60 cm, abrindo-se duas trincheiras de 30 x 30 x 60cm em cada unidade experimental, coletando o solo com auxílio de pá-de-corte. As amostras foram secadas em estufa (55°C), peneiradas em malha de 2mm e determinado o teor de S-SO4-2 disponível pelo extrator Ca(H2PO5)2 500 mg de P L-1 (TABATABAI & BREMNER, 1970). A concentração de SO4-2 foi quantificada por turbidimetria com o auxílio de um espectrofotocolorímetro, no comprimento de onda de 440nm.

A água da chuva foi coletada no período de setembro de 2004 a novembro de 2005 através de um coletor instalado na área do experimento. O coletor consistia de um tubo de PVC de 100mm de diâmetro, com bordas cortantes, contendo um funil 200mm abaixo da borda e uma proveta de 1000ml. Os valores de precipitação pluvial foram obtidos na Estação Climatológica da Universidade Federal de Santa Maria, localizada aproximadamente a 1km da área experimental. As amostras de água foram acondicionadas em vidros “snap-caps” e armazenadas em geladeira e, em menos de três dias, foi estimado o teor de S pela mesma técnica utilizada no extrato de solo.

O tecido vegetal e os grãos foram secados, pesados, moídos e digeridos com ácido nítrico e ácido perclórico (TABATABAI & BREMNER, 1970). O enxofre total no extrato foi determinado por turbidimetria, seguindo a mesma técnica usada na análise de solo. O teor de SO4-2 nas amostras de água foi determinado diretamente por turbidimetria e transformado em kg de SO4 ha-1.

Os dados de matéria seca, produtividade de grãos, teor de enxofre no tecido e nos grãos e quantidade de enxofre reciclada pela palha e exportada pelos grãos foram submetidos à análise de variância em esquema bifatorial (doses de sulfato e sucessões de culturas), em blocos ao acaso. Quando a variação das médias foi significativa a 5% de probabilidade, ajustaram-se regressões polinomiais de até segundo grau em função das doses de enxofre aplicadas (aceito até 15% de probabilidade). Os dados de sulfato extraído do solo foram analisados segundo um esquema trifatorial (doses de sulfato, sucessões de culturas e camadas amostradas), considerando a não-aleatoriedade das camadas de solo. Similarmente às demais avaliações, quando houve efeito significativo dos tratamentos, ajustaram-se regressões polinomiais em função das doses de enxofre aplicadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A produtividade de matéria seca da parte aérea da aveia preta, o teor de S no tecido e a quantidade de S acumulada não apresentaram diferenças significativas em relação à testemunha (Tabela 1). A palha da aveia preta foi mantida na superfície do solo e a quantidade de S acumulada pelas plantas variou entre 12 e 18kg de S ha-1 (Tabela 1), que passou a compor as formas potencialmente disponíveis para o ciclo seguinte de cultivo. A avaliação da disponibilidade de sulfato pela CFQS-RS/SC (2004) apenas se refere ao enquadramento dos valores extraídos em classes de probabilidade de respostas das culturas, sem referenciar a doses recomendadas para corrigir a possível deficiência. Destaca-se que, para as espécies mais exigentes (liliáceas, brassicáceas e leguminosas), os teores no solo devem ser superiores a 10mg dm-3 e, para as demais espécies, o nível de suficiência é de 5mg dm-3, especialmente para as gramíneas. No presente experimento, os teores de sulfato no solo, em todas as camadas avaliadas, foram próximos de 5mg dm-3 na testemunha e inferiores a 10mg dm-3 nos tratamentos com as maiores doses residuais aplicadas por RHEINHEIMER et al. (2005), o que poderia explicar a falta de resposta da aveia, por ser esta uma cultura menos exigente.

Na cultura do feijoeiro, houve aumento no rendimento de grãos (Rendimento = 2553 + 15,19 dose – 0,10 dose2 – R2 = 0,86), cuja produtividade máxima estimada seria de 3.130kg ha-1,obtida com a aplicação de 76kg SO4-2 ha-1). Com o aumento das doses, também ocorreu incremento linear do teor de S no tecido e, consequentemente, na quantidade de S exportação pelos grãos (Tabela 2), mostrando haver uma absorção acima de suas necessidades, caracterizada como “absorção de luxo”. No cultivo subseqüente de trigo, não houve resposta significativa mesmo repetindo-se a adubação sulfatada na linha de semeadura (Tabela 2), como anteriormente observado por RHEINHEIMER et al. (2005), na mesma área experimental. Isso contrasta com os resultados obtidos com essa cultura em solos ácidos e com baixos teores de matéria orgânica (CAMARGO et al. , 1975).

A cultura da soja também não alterou o rendimento de grãos em decorrência da adubação sulfatada (Tabela 2). NOGUEIRA & MELO (2003), em São Paulo, em solo com teor de sulfato próximo ao nível de suficiência, e RHEINHEIMER et al. (2005), em cultivo anterior nesse mesmo experimento, também não obtiveram respostas da soja à adição de sulfato, mesmo que o teor de sulfato no solo da camada 0-10cm estivesse abaixo do teor crítico recomendado pela CQFS-RS/SC (2004). Além de não incrementar a produtividade de grãos, a adição de sulfato não aumentou o teor de S nos grãos. O rendimento de grãos de canola também não apresentou aumentos significativos em função da fertilização sulfatada (Tabela 2), repetindo o comportamento de quando foi cultivada na mesma área experimental por RHEINHEIMER et al. (2005), embora seja uma cultura de elevada exigência por este nutriente. A CQFS (2004) indica baixa probabilidade de resposta à utilização de adubação sulfatada para as culturas de soja e de canola sempre que o teor no solo for acima de 10mg dm-3, condição esta nunca alcançada em nenhuma das situações (Tabela 3). No entanto, pode ser também que o método que usa fosfato monocálcico como extrator não seja suficientemente adequado para estimar a sua disponibilidade.

Não houve interação significativa entre as doses de sulfato aplicadas, as sucessões de culturas e as camadas amostras quanto aos teores de sulfato extraídos pelo método oficial adotado no RS e em SC. Somente houve incrementos significativos em função das doses aplicadas nas coletas feitas após os cultivos de feijoeiro, trigo e canola para as camadas de 0-10, 20-30 e 50-60cm, respectivamente (Tabela 3). Na camada 0-10cm, os valores médios de sulfato disponível (das quatro doses de sulfato) foram de 6,1, 5,7, 6,6 e 6,7mg dm-3 após os cultivos de feijoeiro, soja, trigo e canola, respectivamente (Tabela 3), estando na faixa ótima para a aveia preta e o trigo e abaixo do ótimo para a canola, o feijoeiro e a soja (CQFS-RS/SC, 2004). O mesmo comportamento foi observado para o solo das camadas mais profundas (20-30 e 50-60cm), com tendência a valores menores do que 5mg dm-3 no tratamento testemunha, indicando que o sulfato percola no perfil, como já mostrado por outros autores (CAIRES & FONSECA, 2000).

As quantidades de S exportadas pelos grãos das culturas (entre 3 e 10kg de S ha-1 - Tabela 2) foram inferiores às apresentadas na revisão de SCHERER (2001), sendo que, por exemplo, em trabalhos feitos na Escócia, foram estimadas exportações de 20 a 30kg de S ha-1 para as oleaginosas e de 10 a 15kg de S ha-1 para os cereais. As diferenças nas quantidades exportadas podem estar associadas com as altas produtividades obtidas no continente europeu (trigo > 8Mg ha-1 e canola > 4Mg ha-1) e com eventuais acúmulos de S nos grãos acima das necessidades das culturas (“consumo de luxo”). A manutenção dos resíduos vegetais na superfície do solo, iniciando-se com a aveia preta cujas quantidades de S reciclado pela parte aérea variaram de 12 e 18kg ha-1 (Tabela 1), pode liberar quantidades suficientes às plantas cultivadas em sucessão. A contribuição do sulfato oriundo da mineralização dos resíduos vegetais não é estimada pelo método de diagnose da disponibilidade desse elemento às plantas e pode dificultar o estabelecimento de um nível de suficiência em áreas sob sistema plantio direto, ou há outras formas de fornecimento que não são acessadas pelo extrator, ou contribuem tão discretamente que podem ser de difícil detecção.

Outro modo de fornecimento de sulfato às plantas é a entrada via água da chuva. O monitoramento desse aporte de sulfato, no período de setembro de 2004 a outubro de 2005, está apresentado na figura 1. A concentração de SO4-2 na água da chuva apresenta grande variação ao longo do tempo. No mês de março de 2005, a concentração de SO4-2 na água da chuva foi superior a 2,6mg L-1, enquanto que no mês de novembro de 2004, foi de 0,1mg L-1 (Figura 1), sendo a média anual de 0,9mg L-1. Neste período, a quantidade de SO4-2 depositada no solo pela água da chuva variou de 0,1 a 1,8kg ha-1 mês-1, sendo o valor mínimo obtido nos meses de novembro de 2004 e julho de 2005, e os máximos nos meses de setembro de 2004 e outubro de 2005, época de estabelecimento das culturas de primavera/verão. A chuva pode ser considerada como um “sistema de limpeza” da atmosfera se os elementos presentes estiverem acima dos níveis normais (poluentes atmosféricos). Quando os teores de sulfato na água da chuva forem altos (geralmente maiores do que 100mg L-1), essa apresenta baixos valores de pH, caracterizando a chuva ácida. Dessa forma, a movimentação das massas de ar é um dos fatores preponderantes para explicar a variação do aporte de enxofre atmosférico.


A média mensal da quantidade de SO4-2 que entra no sistema solo pela água da chuva, a partir do período avaliado, é de 0,8kg ha-1. Multiplicando-se este valor por doze meses, tem-se um valor de 9,6kg de SO4-2 ha-1 ano-1 na área experimental, correspondendo a um aporte 3,2kg de S ha-1 ano-1. Tomando-se como base a deposição de S pela chuva na região de realização do experimento e extrapolando-se para as demais regiões do Rio Grande do Sul, esta fonte seria suficiente para repor a quantidade exportada por aproximadamente 40 sacas de soja ha-1. Isso evidencia que somente o aporte de S atmosférico seria insuficiente para repor a exportação quando obtidas altas produtividades e, principalmente, quando se fazem dois ou mais cultivos comerciais por ano.

CONCLUSÃO

A ausência de resposta ao enxofre adicionado ao solo pode estar relacionada com o aporte de enxofre atmosférico pela água da chuva, mesmo quando se trata de culturas mais exigentes deste nutriente.

AGRADECIMENTOS

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela concessão de bolsa em produtividade em pesquisa aos pesquisadores Rheinheimer e Kaminski e de iniciação científica à acadêmica Dias. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela concessão de bolsa ao mestrando Osório Filho.

Recebido para publicação 06.07.06

Aprovado em 18.10.06

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    Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Maio 2007
    • Data do Fascículo
      Jun 2007

    Histórico

    • Aceito
      18 Out 2006
    • Recebido
      06 Jul 2006
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