Acessibilidade / Reportar erro

Desempenho de misturas pré-aquecidas de óleo de soja cru e diesel como combustível para motores agrícolas

Performance of preheated crude soybean oil-diesel blends as fuel in agricultural engines

Resumos

O óleo de soja é um dos óleos vegetais que têm potencial de uso como combustível para motores diesel, pois é renovável, seguro e de fácil utilização. Em temperatura ambiente, o óleo cru apresenta uma viscosidade cerca de dez vezes maior que a do óleo diesel. Para reduzir a viscosidade do óleo de soja a níveis aceitáveis, é necessária uma temperatura de aquecimento em torno de aproximadamente 60°C ou misturá-lo com óleo diesel. O objetivo deste estudo foi avaliar o desempenho do óleo de soja cru e suas misturas com óleo diesel, pré-aquecidas antes da bomba injetora entre 57°C e 68°C, como combustível para motores diesel. O desempenho das misturas combustíveis foi avaliado num motor monocilíndrico de injeção indireta e comparado com o obtido pelo óleo diesel. Os ensaios de curta duração foram conduzidos entre 1.800 e 2.800rpm, sob condição de plena carga em dinamômetro hidráulico. Ensaios realizados a 68°C apresentaram sempre os melhores valores para torque, potência e consumo específico de combustível do que a 57°C. Uma mistura composta por 70% de óleo de soja e 30% de óleo diesel, aquecida a 68°C, apresentou os melhores resultados.

biocombustíveis; motores diesel; combustíveis alternativos; pré-aquecimento


Crude soybean oil is one of the vegetable oils that have potential for use as fuel for diesel engines. Soybean oil is renewable, and is safe and easy to handle. At room temperature crude oil has a viscosity about ten times higher than that of diesel oil. To lower soybean oil's viscosity to the acceptable levels a heating temperature at least 60°C is needed or blending with diesel fuel. The objective of this study was evaluating the soybean oil and blends performance as a fuel for diesel engines. On both crude soybean oil and soybean oil blends were used pre-heating temperature levels on the range between 57°C and 68°C, before fuel pump. The performance of the fuel blends were evaluated in a single cylinder indirect injection diesel engine and compared with the performance with diesel fuel. Engine tests (short term) were conducted at a range speed from 1800 to 2800rpm under full load conditions on hydraulic absorption brake. The tests performed at 68°C showed always the best values of torque, power and specific fuel consumption that the tests at 57°C. The best experiment results were obtained with the blend containing 70% soybean oil and 30% diesel fuel, heated at 68°C.

biofuels; diesel engines; alternative fuels; pre-heating


ARTIGOS CIENTÍFICOS

ENGENHARIA RURAL

Desempenho de misturas pré-aquecidas de óleo de soja cru e diesel como combustível para motores agrícolas

Performance of preheated crude soybean oil–diesel blends as fuel in agricultural engines

José Fernando SchlosserI,1 1 Autor para correspondência. ; Paulo Romeu Moreira MachadoII; Miguel Neves CamargoII

IDepartamento de Engenharia Rural, Centro de Ciências Rurais (CCR), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), 97105-900, Santa Maria, RS, Brasil. E-mail: schlosse@ccr.ufsm.br

IIDepartamento de Engenharia Mecânica, Centro de Tecnologia (CT), UFSM, 97105-900, Santa Maria, RS, Brasil

RESUMO

O óleo de soja é um dos óleos vegetais que têm potencial de uso como combustível para motores diesel, pois é renovável, seguro e de fácil utilização. Em temperatura ambiente, o óleo cru apresenta uma viscosidade cerca de dez vezes maior que a do óleo diesel. Para reduzir a viscosidade do óleo de soja a níveis aceitáveis, é necessária uma temperatura de aquecimento em torno de aproximadamente 60°C ou misturá-lo com óleo diesel. O objetivo deste estudo foi avaliar o desempenho do óleo de soja cru e suas misturas com óleo diesel, pré-aquecidas antes da bomba injetora entre 57°C e 68°C, como combustível para motores diesel. O desempenho das misturas combustíveis foi avaliado num motor monocilíndrico de injeção indireta e comparado com o obtido pelo óleo diesel. Os ensaios de curta duração foram conduzidos entre 1.800 e 2.800rpm, sob condição de plena carga em dinamômetro hidráulico. Ensaios realizados a 68°C apresentaram sempre os melhores valores para torque, potência e consumo específico de combustível do que a 57°C. Uma mistura composta por 70% de óleo de soja e 30% de óleo diesel, aquecida a 68°C, apresentou os melhores resultados.

Palavras-chave: biocombustíveis, motores diesel, combustíveis alternativos, pré-aquecimento.

ABSTRACT

Crude soybean oil is one of the vegetable oils that have potential for use as fuel for diesel engines. Soybean oil is renewable, and is safe and easy to handle. At room temperature crude oil has a viscosity about ten times higher than that of diesel oil. To lower soybean oil's viscosity to the acceptable levels a heating temperature at least 60°C is needed or blending with diesel fuel. The objective of this study was evaluating the soybean oil and blends performance as a fuel for diesel engines. On both crude soybean oil and soybean oil blends were used pre-heating temperature levels on the range between 57°C and 68°C, before fuel pump. The performance of the fuel blends were evaluated in a single cylinder indirect injection diesel engine and compared with the performance with diesel fuel. Engine tests (short term) were conducted at a range speed from 1800 to 2800rpm under full load conditions on hydraulic absorption brake. The tests performed at 68°C showed always the best values of torque, power and specific fuel consumption that the tests at 57°C. The best experiment results were obtained with the blend containing 70% soybean oil and 30% diesel fuel, heated at 68°C.

Key words: biofuels, diesel engines, alternative fuels, pre-heating.

INTRODUÇÃO

A constante incógnita relacionada ao futuro dos combustíveis derivados de petróleo e a necessidade sempre presente de redução das emissões de contaminantes atmosféricos faz com que a substituição do óleo diesel convencional e da gasolina seja sempre orientada, em diferentes locais, pela busca de alternativas oriundas da biomassa. O ramo da agricultura que objetiva a produção e o aproveitamento da biomassa para fins energéticos denomina-se “agroenergética” (GONZÁLEZ, 1994). Segundo DELGADO (1994), essa é a alternativa mais viável pois o seu importante produto - a energia - é o único com demanda ilimitada. Potencializados como a melhor alternativa ao óleo diesel em motores de ignição por compressão, os óleos vegetais podem ser usados in natura, ou esterificados (biodiesel), ou ainda em misturas com o óleo diesel convencional. Tais formas de utilização já se constituem em realidade para alguns setores da agricultura e da estrutura de transportes no Brasil.

Para a utilização de óleos vegetais crus, a elevada viscosidade é o fator limitante, sendo que, para reduzi-la, Büttner (1994) sugere o pré-aquecimento do combustível. Para tal, pode-se utilizar o aquecimento elétrico, trocadores de calor óleo combustível/óleo lubrificante, o fluido de arrefecimento do motor ou os gases de escapamento. Também Ishii & Takeuchi (1987) indicam que, para a operação de motores diesel com óleos vegetais puros ou misturados ao diesel, estes devem ter a viscosidade reduzida, pois a mesma afeta a qualidade da formação de mistura ar/combustível. Conduzindo um trabalho para a avaliação do potencial de óleo de dendê in natura como combustível, PIMENTEL & BELCHIOR (2002) informaram que a sua viscosidade é muito elevada, em temperatura ambiente, para que seja utilizado como combustível sem danos ao motor. Para atingir um valor de viscosidade próximo ao do diesel convencional, é necessário aquecer o óleo de dendê a temperaturas próximas dos 85°C, resultando em melhores condições de operação do motor. Em uma, pesquisa realizada por ALMEIDA et al. (2002), provou-se que o funcionamento de um gerador diesel pode ser adaptado para óleo de dendê puro, sendo que o uso de aquecimento foi fundamental para o funcionamento da instalação. Um trabalho de avaliação de diversas misturas binárias de óleos vegetais com óleo diesel, que LUNA (1990) conduziu em testes de curta e longa duração, concluiu que as misturas mostraram-se factíveis de uso como combustível em um motor arrefecido a ar e injeção direta. O comportamento de óleos vegetais como combustível foi diferente quando utilizados em motores com pré-câmara ou em motores de injeção direta, segundo relato de Riva & MÁRQUEZ (1994). Resgatando as experiências de Walton realizadas em 1938, nas quais se observaram, com óleos vegetais, potências bastante semelhantes àquelas produzidas pelo diesel convencional, FUENTES et al. (1994) citam também Martinez que, em 1944, afirmou obter com óleos vegetais potências superiores às do óleo diesel, com consumos específicos também superiores. A opção pelos óleos vegetais era, conforme relatado por Villamuellas (1994), apenas uma busca de alternativas para a substituição do óleo diesel; porém, começou a ser observadas sob outro enfoque, haja vista os óleos vegetais não causarem cargas adicionais de CO2 na atmosfera. O nome “atraso de ignição” é, para OBERT (1971), consignado ao tempo consumido pelos atrasos físico e químico na combustão. Para combustíveis leves, o retardo físico da combustão é pequeno, enquanto que para os combustíveis mais e pesados e viscosos o atraso físico pode ser o fator controlador da combustão.

No presente trabalho de pesquisa, buscou-se avaliar o desempenho de um motor de ignição por compressão, utilizando-se como combustível o óleo de soja puro ou em diferentes teores de mistura com o óleo diesel de petróleo. Os combustíveis foram submetidos a pré-aquecimento, como forma de redução da viscosidade das misturas.

MATERIAL E MÉTODOS

Todos os trabalhos e procedimentos que permitiram a avaliação de desempenho do motor alimentado pelas misturas combustíveis objeto desta pesquisa foram desenvolvidos no Laboratório de Motores de Combustão Interna do Centro de Tecnologia da Universidade Federal de Santa Maria, RS, Brasil. Para o presente estudo, utilizou-se o seguinte arranjo fatorial: proporção de óleo de soja em misturas com o óleo diesel e pré-aquecimento da mistura. As proporções de mistura representam os níveis do primeiro fator, com percentagens de óleo de soja e de óleo diesel na mistura, dados em termos de volume: tratamento 1 - 100% de óleo diesel (testemunha - diesel puro); tratamento 2 – mistura de 10% de óleo de soja e 90% de óleo diesel; tratamento 3 – mistura de 30% de óleo de soja e 70% de óleo diesel; tratamento 4 - mistura de 50% de óleo de soja e 50% de óleo diesel; tratamento 5 – mistura de 70% de óleo de soja e 30% de óleo diesel e tratamento 6 – 100% de óleo de soja (óleo de soja puro). No segundo fator - aquecimento da mistura - estabeleceram-se duas faixas de temperatura, que correspondem aos dois níveis, com o cuidado de não serem atingidos os pontos de fulgor dos combustíveis puros: nível 1 - 54 a 60°C, caracterizando neste trabalho como faixa de 57°C; nível 2 - 65 a 71°C, aqui caracterizado como faixa de 68°C. A primeira faixa foi utilizada para todos os combustíveis, enquanto que a segunda somente para frações superiores a 70% de óleo de soja na mistura. Não foi possível realizar os ensaios cujos tratamentos exigiam uma combinação de baixos teores de óleo de soja na mistura e elevada faixa de temperatura de pré-aquecimento do combustível, devido à formação de vapores combustíveis na sala do dinamômetro. O óleo diesel utilizado no experimento, para o ensaio testemunha e para composição das misturas, é o óleo combustível classificado pela ANP como sendo o Diesel Automotivo Interior ou tipo B, indicado para motores de ciclo diesel e instalações de aquecimento de pequeno porte.

O pré-aquecimento dos combustíveis visou a estabelecer, por meio do aumento de sua temperatura, valores de viscosidade próximos aos valores indicados por Peterson et al. (1983), entre 5 e 15mm2 s-1, e utilizou-se também um valor de 57°C sugerido por Pryor et al. (1983). O sistema utilizado para produzir pré-aquecimento do combustível e o controle das temperaturas estabelecidas era composto por uma resistência elétrica com capacidade nominal de 3,0kW, monofásica, em 220V, comandada por chave magnética e montada no interior de um reservatório metálico. O tempo em que a resistência permanecia ligada era determinado por um controlador eletrônico que permite o ajuste da temperatura desejada e o tempo de histerese (diferencial de temperatura), atuando numa faixa de 50 até 99°C. A saída de combustível aquecido foi posicionada no fundo do reservatório, permitindo por meio de mangueiras plásticas a condução do mesmo para um sistema de registros de abertura rápida que promoviam a seleção do combustível que alimentava a bomba injetora.

O motor AGRALE, modelo M90, utilizado nos ensaios, de ciclo diesel a 4 tempos, monocilíndrico vertical, é de fabricação nacional e destinado às aplicações industrial, marítima e agrícola. Possui diâmetro nominal para o cilindro de 90mm e curso do pistão de 105mm, relação de compressão de 19:1, cilindrada total de 668cm3, sistema de injeção indireta, com câmara de pré-combustão, avanço de injeção de 21°APMS, rotação normal (STD) de 1.800 a 2.750rpm. A potência máxima nominal é de 8,826kW (12,0cv) a 2750rpm e o torque máximo nominal é de 35,3m.N (3,46m.kgf) a 1.800rpm. O motor foi ensaiado em um dinamômetro de absorção hidráulica marca JM - Motorpower, modelo 800V, cuja capacidade de absorção máxima é de 476,6kW, para uma máxima rotação de 9.999rpm e um torque máximo de 509,94m.N. O freio hidráulico possui indicador analógico de torque acionado por cilindro transdutor hidráulico. A indicação do número de rotações é feita por tacômetro digital (pick-up magnético) de 0-9999rpm, com fator de sensibilidade de 0,3%.

Para cada ensaio de avaliação de torque, potência e consumo do motor foram observadas e anotadas as condições atmosféricas (temperatura, pressão e umidade) para determinação e aplicação dos fatores de correção (redução) específicos, devido às variações ambientais, conforme determinam as normas de ensaio de motores. O registro de todos os dados se deu por meio da utilização de um sistema eletrônico de aquisição, composto por placas controladoras seriais de aquisição de dados conectadas a um microcomputador. Os valores de torque foram registrados por uma célula de carga de fabricação Kalvico Corporation, instalada a 200mm do indicador analógico de torque, na linha de pressão do cilindro transdutor hidráulico.

Para avaliação do consumo específico de combustível, utilizaram-se dois métodos. O primeiro método foi baseado na massa, em que se utilizou uma balança digital de fabricação KERN, modelo 440-53, sobre a qual foi posicionada uma proveta modificada que permitiu selecionar um fluxo contínuo de combustível para o motor através da mesma, ou a alimentação do motor apenas da proveta. O peso de combustível consumido durante um intervalo de tempo e o valor da potência a uma dada rotação, permitem a determinação do consumo específico de combustível. Os métodos de avaliação de consumo de combustível seguiram as determinações de ABNT (1985). O outro método utilizado foi baseado no volume de combustível injetado num recipiente calibrado e obtido num número definido de rotações do eixo virabrequim (200 revoluções). O método do número de ciclos de injeção foi utilizado para verificação do método da massa, não sendo observadas diferenças significativas entre os dois métodos.

A partida do motor em sua fase fria, durante aquecimento e no processo de parada ao final de uma jornada de testes eram realizadas com óleo diesel para evitar o acúmulo de óleo vegetal próximo à entrada da bomba injetora. As variáveis-resposta analisadas foram: torque, potência e consumo específico de combustível. Todos os ensaios contaram com três repetições, de 1.800 até 2.800rpm, em intervalos de 50rpm. Para a análise estatística dos resultados, foi utilizado o pacote estatístico SAS System. Deve-se ressaltar que os resultados foram submetidos a testes de normalidade da distribuição dos dados, pois são necessários para a aplicação da análise de variâncias, apesar de não ser a forma de distribuição esperada para dados de desempenho de motores de combustão. Um grau de significância de 5% foi utilizado para realização da análise estatística dos resultados. A avaliação dos dados obtidos foi pela análise de variância (ANOVA) não paramétrica, utilizando-se os testes de Wilcoxon e de Kruskal-Wallis. A idéia na análise da variância, segundo SOUZA (2002), é comparar a variância devida aos tratamentos com a variação devida ao acaso ou a resíduo. A ANOVA é um poderoso método para identificação de diferenças entre médias populacionais, devido a várias causas, atuando simultaneamente sobre os elementos da população.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Preliminarmente, foram realizados os ensaios do motor em sua concepção original, alimentado por óleo diesel convencional e sem pré-aquecimento, em que os resultados apresentaram torque máximo de 34,4m.N a 2000rpm, potência máxima de 8,65kW a 2.600rpm e consumo específico mínimo de 214,6g kW-1 h-1 a 2.000rpm. O valor de reserva de torque apresentado pelo motor nessas condições de ensaio foi em torno de 15%, valor característico desta classe de motor. As pequenas diferenças entre os valores encontrados no ensaio testemunha e os valores nominais fornecidos pelo fabricante encontram-se dentro das tolerâncias normais e aceitáveis de uma produção em série. Todos os valores apresentados estão corrigidos (reduzidos) pelos fatores atmosféricos. Os resultados da análise estatística dos dados demonstraram que existiram diferenças significativas entre os tratamentos do experimento. A mistura composta por 70% de óleo vegetal e 30% de diesel. com aquecimento na faixa de 68°C, apresentou torque médio superior em 8,5% em relação à média do ensaio testemunha e, em elevados regimes de rotação, superou os 12,0% (Figura 1), comprovando que a combinação de pré-aquecimento e a mistura com óleo diesel reduzem a viscosidade do óleo de soja para níveis de formação do adequado jato de combustível, promovendo um bom desenvolvimento do processo de combustão. O valor da reserva de torque para essa mistura, apresentado nos ensaios, foi de aproximadamente 15%, sem diferença significativa em relação à testemunha. Os resultados obtidos para elevadas rotações devem ser atribuídos à maior turbulência do ar admitido nessas condições, confirmando o descrito por GIACOSA (1964) e por OBERT (1971). A turbulência é fundamental para minimizar os efeitos do demasiado retardo da combustão apresentado pelo óleo de soja, promovendo uma combustão mais completa, que compensa o menor poder calorífico deste. O óleo de soja puro, a 68°C, mostrou, ao longo de toda a faixa de rotações, torque superior à testemunha, porém com um valor de reserva de torque inferior próximo a 11%, mas significativo ainda para a classe do motor utilizado no experimento. Os valores de torque foram inferiores àqueles apresentados pela mistura 70% de óleo de soja e 30% de óleo diesel a 68°C. Assim, a ausência do óleo diesel na mistura sugere que houve redução do poder calorífico do combustível, da mistura ou má formação do jato combustível quando em relação à mistura com 70% de óleo de soja. O aumento de torque advindo do uso de óleos vegetais foi relatado por ISHII & TAKEUCHI (1987). A mistura com 10% de óleo vegetal, a 57°C, apresentou valores de torque ligeiramente superiores à testemunha, ao longo de toda da faixa de rotações, e com o mesmo valor para reserva de torque (15%). A presença de uma fração de óleo de soja na mistura pode promover a redução do blow-by na bomba injetora, conforme verificado por PIMENTEL & BELCHIOR (2002) e também por ALMEIDA et al. (2002), e o pré-aquecimento, embora numa faixa inferior, mostra seus efeitos benéficos sobre o desenvolvimento da combustão.


A mistura composta por 70% de óleo vegetal e 30% de óleo diesel com pré-aquecimento na faixa de 68°C apresentou uma potência média, superior em 8,7% em relação à média da testemunha e, em elevados regimes de rotação, foi superior em 14,0% (Figura 2). Tais valores são conseqüências dos torques maiores produzidos pela mistura ao longo de toda a faixa de rotações do experimento, haja vista que a potência é obtida pelo produto do torque pela rotação do motor. O óleo de soja puro a 68°C apresentou, em todas as faixas de rotação, um valor médio de potência superior à testemunha em torno de 6,7% e, em altas rotações superou em 12,7%. A análise dos valores de torque produzidos pelo óleo de soja puro pré-aquecido é suficiente para explicar as diferenças de potência. Os resultados obtidos confirmam o relato de FUENTES et al. (1994). A mistura com 10% de óleo vegetal, a 57°C, apresentou um valor médio de potência ligeiramente superior à testemunha e, em médias e altas rotações, superou a testemunha em cerca de 4,0%; porém, a melhor característica dessa mistura foi o menor consumo específico de combustível apresentado em relação à testemunha, sugerindo sua utilização prática sem alterações significativas no motor.


A mistura com 70% de óleo vegetal, aquecida a 68°C, mostrou um consumo específico médio, inferior em 4,5% com relação à média da testemunha e, em elevados regimes de rotação, a diferença superou os 9,2% (Figura 3). O consumo específico de combustível denota, em última análise, o grau de transformação da energia do combustível em trabalho mecânico.


Portanto, as rotações em que apresentarem-se os maiores valores de torque e de potência para uma rotação específica corresponderão aos menores consumos específicos de combustível. O óleo de soja puro, a 68°C, não apresentou, na média dos valores de consumo específico, diferença significativa em relação à média da testemunha para todas as faixas de rotação do experimento. Porém, verifica-se a tendência de redução do consumo com o crescimento da rotação. Isto pode ser atribuído à turbulência do ar, a qual promove um melhor desenvolvimento da combustão e conseqüente produção de maiores valores para potência. A mistura com 10% de óleo vegetal e 90% de óleo diesel, aquecida a 57°C, apresentou um valor de consumo específico médio ligeiramente inferior à testemunha, em torno de 1,5%. A diferença de valores obtidos para consumo específico acentuava-se sempre no sentido de redução de consumo específico, à medida que a rotação do motor crescia. Um consumo específico menor que o da testemunha foi a melhor característica apresentada por esta mistura.

Em relação ao óleo vegetal puro, pode-se observar que o mesmo produziu, para a faixa de temperatura de 57°C, com consumo específico médio superior em torno de 13%, uma potência média igual à potência média da testemunha e um torque médio igual ao torque médio da testemunha. Já para a faixa de temperatura de 68°C, o óleo vegetal puro produziu, com o mesmo consumo específico médio da testemunha, uma potência média superior em 6,7% e também um torque médio superior em 6,6% ao valor apresentado pela testemunha.

CONCLUSÕES

O bloco de testes conduzidos à faixa de temperaturas caracterizada por 68°C apresentou sempre valores médios de torque e potência superiores àqueles conduzidos a 57°C, sempre com consumo específico inferior. Os melhores resultados foram obtidos pela mistura composta por 70% de óleo de soja e 30% de óleo diesel a 68°C, pelo óleo de soja puro a 68°C e pela mistura composta por 10% de óleo de soja e 90% de óleo diesel a 57°C, nesta ordem.

APRESENTAÇÃO

Este artigo é parte da dissertação apresentada pelo autor Machado à Universidade Federal de Santa Maria para obtenção do título de Mestre em Engenharia Agrícola/Mecanização Agrícola.

Recebido para publicação 10.07.06

Aprovado em 17.01.07

  • ALMEIDA, S.C.A. et al. Performance of a diesel generator fuelled with palm oil. Fuel, v.81, p.2097-2102, 2002.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Motores alternativos de combustão interna de ignição por compressão (Diesel) ou ignição por centelha (Otto) de velocidade angular variável Rio de Janeiro, 1985. 8p. Ensaio: NBR 5484.
  • BÜTTNER, D. Carburantes de origen vegetal: el punto de vista del sector productor de motores. In: DELGADO, L.M. Los cultivos no alimentarios como alternativa al abandono de tierras Madrid, España: Agricola Española, 1994. p.111-125.
  • DELGADO, L.M. Los cultivos no alimentarios como alternativa al abandono de tierras Madrid, España: Agricola Española, 1994. 127p.
  • FUENTES, J. et al. Aceite de oliva, soja y algodón como combustible diesel España: John Deere, 1994. p.161-170.
  • GIACOSA, D. Motores endotérmicos Trad. González-Vallés. Barcelona, España: HOEPLI- Científico-Medica, 1964. 722p.
  • GONZÁLEZ, J.F. Cultivos energéticos para la Península Ibérica. In: DELGADO, L.M. Los cultivos no alimentarios como alternativa al abandono de tierras Madrid, España: Agricola Española, 1994. p.27-41.
  • ISHII, Y.; TAKEUCHI, R. Vegetable oils and their effect on farm engine performance. Transactions of the ASAE, v.30, n.1, p.02-06, 1987.
  • LUNA, J.F. Aceites vegetales y motores diesel. Maquinas y Tractores, n.2, p.40-46, 1990.
  • OBERT, E.F. Motores de combustão interna Porto Alegre, RS: Globo, 1971. 618p.
  • PETERSON, C.L. et al. Vegetable oil substitutes for diesel fuel. Transactions of the ASAE, v.26, n.2, p.322-327, 1983.
  • PIMENTEL, V.S.B.; BELCHIOR, C.P.R. Análise e diagnose de diesel geradores operando com óleo de dendê in natura, SP, 2002. In: AGRENER Encontro de Energia no Meio Rural 4., 2002, Campinas. Anais... Campinas: UNICAMP, 2002. 10p.
  • PRYOR, R.W. et al. Soybean oil fuel in a small diesel engine. Transactions of the ASAE, v.26, n.2, p.333- 337, 1983.
  • RIVA, G.; MÁRQUEZ, L. Utilización energética de la producción agrícola comunitaria con especial referencia a las oleaginosas. In: DELGADO, L.M. Los cultivos no alimentarios como alternativa al abandono de tierras Madrid, España: Agricola Española, 1994. p.57-80.
  • SOUZA, A.M. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA. Centro de Ciencias Naturais e Exatas. Projetos de Experimentos Santa Maria: Ponto gráfico, 2002. 78p.
  • VILLAMUELAS, M.C. Combustibles de origen biológico para motores agricolas Madrid, Espana: John Deere, 1994. p.83-185.
  • 1
    Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Ago 2007
    • Data do Fascículo
      Out 2007

    Histórico

    • Aceito
      17 Jan 2007
    • Recebido
      10 Jul 2006
    Universidade Federal de Santa Maria Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Ciências Rurais , 97105-900 Santa Maria RS Brazil , Tel.: +55 55 3220-8698 , Fax: +55 55 3220-8695 - Santa Maria - RS - Brazil
    E-mail: cienciarural@mail.ufsm.br