Acessibilidade / Reportar erro

Caracterização química de frutos nativos do cerrado

Chemical characterization of native species of fruits from savanna ecosystem

Resumos

Diversos frutos do cerrado com potencial econômico são consumidos in natura ou processados pela população local. Entretanto, existem poucos trabalhos científicos a respeito de suas características químicas e do valor nutritivo. O objetivo do presente trabalho foi avaliar a composição centesimal, o valor energético total e o conteúdo de cálcio, ferro e zinco em alguns frutos nativos do cerrado: macaúba, caju-do-cerrado, araticum, murici, gabiroba, cagaita; mangaba, puçá, araçá, chichá e pitomba. As análises de umidade, proteína, lipídios totais, fibra alimentar total e resíduo mineral fixo foram realizadas utilizando-se metodologias consagradas na literatura especializada. Cálcio, ferro e zinco foram quantificados analiticamente e o valor energético total dos frutos in natura foi estimado conforme os valores de conversão de Atwater. A concentração de proteínas, lipídios e carboidratos dos frutos foi relativamente baixa, com exceção do chichá e da macaúba. O teor de fibra alimentar variou de 1,04 a 11,14g 100g-1, sendo os maiores valores encontrados em araçá, chichá, macaúba e murici. Quanto aos minerais, araticum, chichá, macaúba e mangaba apresentaram valores consideráveis de cálcio, ferro e zinco. Os frutos do cerrado investigados podem ser fontes alternativas de nutrientes. Dessa forma, sugere-se sua utilização em cardápios regionais e cardápios da merenda escolar.

composição centesimal; minerais; valor nutritivo; minerais


Various fruits of the savanna ecosystem with economic potential are consumed raw or processed by the natives. However, there are a few scientific studies on their chemical composition and nutritional values. The aim of this research was to evaluate proximate composition, caloric values, calcium, iron and zinc content from fruits found in the savanna ecosystem: macaúba; caju-do-cerrado; araticum; murici; gabiroba; cagaita; mangaba; puçá; araçá; chichá and pitomba. Moisture, protein, total fat, dietary fiber and ash were carried out by using methods traditionally used in the specific literature. Calcium, iron and zinc were analytically quantified and the total caloric value of raw fruits was estimated in accordance with Atwater´s conversion values. Protein, fat and carbohydrate concentration of fruits were relatively low, except for chichá and macaúba. The dietary fiber values ranged from 1.04 to 11.14g 100g-1, being the highest values for araçá, chichá, macaúba and murici. Calcium, iron and zinc were found in considerable concentration in araticum, chichá, macaúba and mangaba. The fruits of the savanna ecosystem investigated may be alternative sources of nutrients, thus attention will be turned to the possibility of their utilization in regional menu and snack for school children.

proximate composition; nutritive value; minerals


NOTA

TECNOLOGIA DE ALMENTOS

Caracterização química de frutos nativos do cerrado

Chemical characterization of native species of fruits from savanna ecosystem

Mara Reis SilvaI,1 1 Autor para correspondência. ; Diracy Betânia Cavalcante Lemos LacerdaII; Grazielle Gebrim SantosII; Denise Mendes de Oliveira MartinsIII

IFaculdade de Nutrição, Universidade Federal de Goiás (UFG). Rua 227, Q. 68, s/n, CP 131, Setor Universitário, 74605-080, Goiânia, GO, Brasil. E-mail: marareis@fanut.ufg.br

IIPrograma de Pós-graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos (UFG) Goiânia, GO, Brasil

IIICurso de Nutrição (UFG), Goiânia, GO, Brasil

RESUMO

Diversos frutos do cerrado com potencial econômico são consumidos in natura ou processados pela população local. Entretanto, existem poucos trabalhos científicos a respeito de suas características químicas e do valor nutritivo. O objetivo do presente trabalho foi avaliar a composição centesimal, o valor energético total e o conteúdo de cálcio, ferro e zinco em alguns frutos nativos do cerrado: macaúba, caju-do-cerrado, araticum, murici, gabiroba, cagaita; mangaba, puçá, araçá, chichá e pitomba. As análises de umidade, proteína, lipídios totais, fibra alimentar total e resíduo mineral fixo foram realizadas utilizando-se metodologias consagradas na literatura especializada. Cálcio, ferro e zinco foram quantificados analiticamente e o valor energético total dos frutos in natura foi estimado conforme os valores de conversão de Atwater. A concentração de proteínas, lipídios e carboidratos dos frutos foi relativamente baixa, com exceção do chichá e da macaúba. O teor de fibra alimentar variou de 1,04 a 11,14g 100g-1, sendo os maiores valores encontrados em araçá, chichá, macaúba e murici. Quanto aos minerais, araticum, chichá, macaúba e mangaba apresentaram valores consideráveis de cálcio, ferro e zinco. Os frutos do cerrado investigados podem ser fontes alternativas de nutrientes. Dessa forma, sugere-se sua utilização em cardápios regionais e cardápios da merenda escolar.

Palavras-chave: composição centesimal, minerais, valor nutritivo, minerais.

ABSTRACT

Various fruits of the savanna ecosystem with economic potential are consumed raw or processed by the natives. However, there are a few scientific studies on their chemical composition and nutritional values. The aim of this research was to evaluate proximate composition, caloric values, calcium, iron and zinc content from fruits found in the savanna ecosystem: macaúba; caju-do-cerrado; araticum; murici; gabiroba; cagaita; mangaba; puçá; araçá; chichá and pitomba. Moisture, protein, total fat, dietary fiber and ash were carried out by using methods traditionally used in the specific literature. Calcium, iron and zinc were analytically quantified and the total caloric value of raw fruits was estimated in accordance with Atwater´s conversion values. Protein, fat and carbohydrate concentration of fruits were relatively low, except for chichá and macaúba. The dietary fiber values ranged from 1.04 to 11.14g 100g-1, being the highest values for araçá, chichá, macaúba and murici. Calcium, iron and zinc were found in considerable concentration in araticum, chichá, macaúba and mangaba. The fruits of the savanna ecosystem investigated may be alternative sources of nutrients, thus attention will be turned to the possibility of their utilization in regional menu and snack for school children.

Key words: proximate composition, nutritive value, minerals.

A flora do cerrado possui diversas espécies frutíferas com grande potencial de utilização agrícola, que são tradicionalmente utilizadas pela população local. Os frutos, em geral, são consumidos in natura ou na forma de sucos, licores, sorvetes, geléias e doces diversos (ALMEIDA, 1998a; SILVA et al., 2001). Os frutos do cerrado apresentam sabores sui generis e elevados teores de açúcares, proteínas, sais minerais, ácidos graxos (SILVA et al., 2001), vitaminas do complexo B e carotenóides (AGOSTINI-COSTA & VIEIRA, 2000). Informações a respeito das características químicas e do valor nutricional dos frutos do cerrado são ferramentas básicas para avaliação do consumo e formulação de novos produtos. No entanto, poucos dados estão disponíveis na literatura especializada com relação à composição química destes frutos e sua aplicação tecnológica, ressaltando a necessidade de pesquisas científicas sobre o assunto. Este trabalho teve por objetivo determinar as características químicas de diversos frutos do cerrado em relação à composição centesimal, ao valor energético total e aos minerais.

Os frutos in natura utilizados para análises físicas e químicas foram: macaúba (Acrocomia aculeata Mart), caju-do-cerrado (Anacardium othonianum Rizz), araticum (Annoma crassiflora Mart), murici (Byrsonima verbascifolia Rich), gabiroba (Compomanesia cambessedeana Berg), cagaita (Eugenia dysenterica Dc), mangaba (Hancornia speciosa Gómez), puçá (Mouriri pusa Gard), araçá (Psidium araca Raddi), chichá (Sterculia striata A. St. Hil. & Naud) e pitomba (Talisia esculenta Radlk). Os frutos foram adquiridos, na época de frutificação e colheita, em feiras populares e em comércios locais de cidades que apresentam grande produção dos mesmos nos Estados de Goiás (araçá, araticum, cagaita, caju-do-cerrado, chichá, gabiroba, mangaba, macaúba e puçá) e Piauí (murici e pitomba), e acondicionados em freezer a -18ºC até o momento de realização das análises.

A análise de umidade (g 100g-1) da polpa dos frutos foi feita em estufa a 105°C até peso constante (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 1985). A proteína (g 100g-1) foi determinada pelo método Kjeldhal (AOAC,1990) e o fator 6,25 usado para converter o teor de nitrogênio em proteína bruta. A determinação dos lipídios totais (g 100g-1) foi realizada de acordo com a técnica descrita por BLIGH & DYER (1959) e o teor de fibra alimentar total (g 100g-1) por meio do método enzímico-gravimétrico de PROSKY et al. (1988). A análise do resíduo mineral fixo (g 100g-1) foi realizada por incineração em mufla a 550°C até peso constante (AOAC, 1990) e o teor de carboidratos (g 100g-1) foi determinado por diferença. A concentração de cálcio, ferro e zinco (mg 100g-1) foi quantificada analiticamente segundo o método descrito pela AOAC (1995). Todas as análises físicas e químicas foram realizadas em três replicatas/amostra, com exceção da análise de fibra alimentar total, realizada em quatro replicatas/amostra. Os valores das análises físicas e químicas foram expressos através de média e desvio padrão.

O valor energético total (kcal 100g-1) dos frutos in natura foi estimado conforme os valores de conversão de Atwater de 4kcal.g-1 de proteínas, 4kcal g-1 de carboidratos e 9kcal g-1 de lipídios, segundo MERRIL & WATT (1973).

O teor de umidade dos frutos (Tabela 1) foi superior a 70g 100g-1, com exceção de chichá e macaúba. O valor mais baixo de umidade foi observado em chichá. A parte comestível do chichá é classificada como semente (ALMEIDA, 1998b), caracterizada pelo baixo teor de umidade (TOLEDO, 1977).

A densidade energética da maioria dos frutos foi baixa, à exceção dos frutos com quantidade considerável de macronutrientes (chichá e macaúba), com valor energético acima de 280kcal 100g-1. A concentração de proteínas dos frutos analisados foi abaixo de 3g 100g-1, exceto para o chichá, com cerca de 19g 100g-1. O teor de lipídios foi relativamente baixo (menor que 4g 100g-1), entretanto, chichá e macaúba apresentaram valores acima de 14g 100g-1. Verificou-se, na maioria dos frutos, teores de carboidratos abaixo de 13g 100g-1. A concentração de fibra alimentar foi elevada em alguns frutos, com valores superiores a 6g 100g-1. No entanto, foram observados teores reduzidos em cagaita e gabiroba (Tabela 1).

Quanto à concentração de resíduo mineral fixo, chichá e gabiroba apresentaram maior e menor teor, respectivamente, o que pode ser confirmado em parte pela concentração de cálcio, ferro e zinco destes frutos (Tabela 2). O fruto com maior concentração de cálcio foi macaúba, seguida pelo chichá. Para o zinco, foram constatadas as maiores concentrações em chichá e macaúba. Houve variação considerável para os valores de ferro (0,02 a 8,13mg 100g-1), sendo o maior valor encontrado no chichá. Em geral, as sementes podem ser consideradas fontes de ferro, embora a biodisponibilidade do ferro não-heme presente em alimentos de origem vegetal seja inferior à do ferro heme encontrado em carnes (CARPENTER & MAHONEY, 1992).

A caracterização física e química destes frutos não é suficiente para considerá-los de alto valor nutricional, já que a biodisponibilidade dos nutrientes é essencial na determinação do valor nutritivo do alimento. Estudos acerca das características de frutos do cerrado são escassos na literatura, sendo necessárias mais pesquisas que determinem a composição em macronutrientes, vitaminas e minerais, a biodisponibilidade destes nutrientes e a utilização dos frutos no processamento de alimentos com elevado valor agregado.

Os frutos do cerrado analisados podem contribuir em proporções consideráveis com a ingestão dietética recomendada, sendo fontes alternativas de nutrientes.

Recebido para publicação 29.05.07

Aprovado em 30.01.08

  • AGOSTINI-COSTA, T.; VIEIRA, R.F. Frutas nativas do cerrado: qualidade nutricional e sabor peculiar, 2000. Capturado em: 25 fev. 2005. Online. Disponível na internet http://www.ambientebrasil.com.br/composer.php3?base=./biotecnologia/index.html
  • ALMEIDA, S.P. cerrado: aproveitamento alimentar. Planaltina: Embrapa-CPAC, 1998a. 188p.
  • ALMEIDA, S.P. Frutas nativas do cerrado. In: SANO, S.M.; ALMEIDA, S.P. cerrado: ambiente e flora. Planaltina: Embrapa-CPAC, 1998b. p.244-285.
  • AOAC. (ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS). Official methods of analysis 15.ed. Washington: AOAC, 1990.
  • AOAC. (ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS). Official methods of analysis 16.ed. Washington: AOAC, 1995.
  • BLIGH, E.G.; DYER, W.J. A rapid method of total lipid extraction and purification. Canadian Journal Biochemistry and Physiology, Ottawa, v.37, n.8, p.911-917, 1959.
  • CARPENTER, C.E.; MAHONEY, A.W. Contributhions of heme and noheme iron to human nutrition. Critical Reviews in Food Science and Nutrition, Philadelphia, v.31, n.4, p.333-367, 1992.
  • INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Normas analíticas do Instituto Adolfo Lutz: métodos químicos e físicos para análise de alimentos. 2.ed. São Paulo: Instituto Adolfo Lutz, 1985. 533p.
  • MERRIL, A.L.; WATT, B.K. Energy value of foods: basis and derivation. Washington: United States Department of Agriculture, 1973. 105p.
  • PROSKY, L. et al. Determination of insoluble, soluble, and total dietary fiber in foods and food products: interlaboratory study. Journal of the Association of Official Analytical Chemistry, Arlington, v.71, n.5, p.1017-1023, 1988.
  • SILVA, D.B. et al. Frutas do cerrado Brasília: Embrapa Informação Tecnológica, 2001. 179p.
  • TOLEDO, F.F. Composição química das sementes. In: ______. Manual das sementes: tecnologia da produção. São Paulo: Agronômica Ceres, 1977. p.45-50.
  • 1
    Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Nov 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2008

    Histórico

    • Recebido
      29 Maio 2007
    • Aceito
      30 Jan 2008
    Universidade Federal de Santa Maria Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Ciências Rurais , 97105-900 Santa Maria RS Brazil , Tel.: +55 55 3220-8698 , Fax: +55 55 3220-8695 - Santa Maria - RS - Brazil
    E-mail: cienciarural@mail.ufsm.br