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Produção e caracterização de anticorpos monoclonais contra toxina épsilon de Clostridium perfringens Tipo D

Production and characterization of monoclonal antibodies against Clostridium perfringens Type D epsilon toxin

Resumos

Clostridium perfringens tipo D é o agente etiológico da enterotoxemia em ruminantes, causada pela toxina épsilon e caracterizada por edema cardíaco, pulmonar, renal e cerebral. Anticorpos monoclonais contra toxina épsilon de C. perfringens tipo D foram produzidos a partir da fusão da linhagen de mieloma P3-X63-Ag8 653 com células do baço de camundongos Balb/c imunizados com o toxóide épsilon. Seis linhagens de híbridos secretores de anticorpos monoclonais das classes e IgM e IgG foram estabelecidas.

Clostridium perfringens; toxina épsilon; anticorpos monoclonais


Clostridium perfringens type D is the aetiological agent of enterotoxemia in ruminants. The disease is caused by epsilon toxin characterized by cardiac, pulmonary, kidney and brain edema. Monoclonal antibodies were produced by using myeloma cell line P3-X63-Ag8 653 fused with spleen cells from Balb/c mice, immunized with epsilon toxoid of C. perfringens type D. Six hybrids were established secreting monoclonal antibodies of the IgM class and IgG3 subclass.

Clostridium perfringens; epsilon toxin; monoclonal antibodies


NOTA

MICROBIOLOGIA

Produção e caracterização de anticorpos monoclonais contra toxina épsilon de Clostridium perfringens Tipo D

Production and characterization of monoclonal antibodies against Clostridium perfringens Type D epsilon toxin

Theonys Diógenes FreitasI; Luis Guilherme Dias HeneineII; Felipe Masiero SalvaraniI; Rodrigo Otávio Silveira SilvaI; Catarina Guimarães Rocha Dourado LimaI; Prhiscylla Sadanã PiresI; Ronnie Antunes de AssisIII; Francisco Carlos Faria LobatoI,1 1 Autor para correspondência.

ILaboratório de Bacteriose e Pesquisa, Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil. E-mail: flobato@vet.ufmg.br

IIFundação Ezequiel Dias (FUNED), Belo Horizonte, MG, Brasil

IIIMinistério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Laboratório NAcional Agropecuário (LANAGRO-MG), Setor de Clostridioses, Pedro Leopoldo, MG, Brasil

RESUMO

Clostridium perfringens tipo D é o agente etiológico da enterotoxemia em ruminantes, causada pela toxina épsilon e caracterizada por edema cardíaco, pulmonar, renal e cerebral. Anticorpos monoclonais contra toxina épsilon de C. perfringens tipo D foram produzidos a partir da fusão da linhagen de mieloma P3-X63-Ag8 653 com células do baço de camundongos Balb/c imunizados com o toxóide épsilon. Seis linhagens de híbridos secretores de anticorpos monoclonais das classes e IgM e IgG foram estabelecidas.

Palavras-chave:Clostridium perfringens, toxina épsilon, anticorpos monoclonais.

ABSTRACT

Clostridium perfringens type D is the aetiological agent of enterotoxemia in ruminants. The disease is caused by epsilon toxin characterized by cardiac, pulmonary, kidney and brain edema. Monoclonal antibodies were produced by using myeloma cell line P3-X63-Ag8 653 fused with spleen cells from Balb/c mice, immunized with epsilon toxoid of C. perfringens type D. Six hybrids were established secreting monoclonal antibodies of the IgM class and IgG3 subclass.

Key words:Clostridium perfringens, epsilon toxin, monoclonal antibodies.

Clostridium perfringens é classificado em cinco tipos, de A a E, com base na produção de quatro exotoxinas principais: alfa, beta, épsilon e iota. A toxina épsilon é a principal responsável pelo quadro de enterotoxemia em ruminantes, acometendo principalmente ovinos, mas também caprinos e bovinos. Produzida pelos tipos B e D, a toxina épsilon é secretada como protoxina e sua ativação ocorre pela atividade enzimática da tripsina, resultando em um pequeno peptídeo responsável pelas alterações patológicas (McCLAIN & COVER, 2007).

O diagnóstico de enterotoxemia tem como base a detecção desta toxina no conteúdo intestinal e o teste in vivo padrão utilizado é a soroneutralização em camundongos. Apesar de reconhecido pela sua sensibilidade e especificidade, é um método demorado e relativamente caro, pois requer o uso de grande número de animais, além de gerar discussões éticas por parte de grupos humanitários e pesquisadores que visam o bem-estar animal (PARREIRAS et al., 2002). Como alternativa, o ensaio imunoenzimático (ELISA) é um método in vitro sensível, específico, ético e rápido, que necessita de apenas quatro horas para obtenção dos resultados (UZAL et al., 2003).

A técnica da produção de anticorpos monoclonais baseia-se na hibridização celular, na qual as células fusionadas passam a exibir características de ambas as células originais. Com isso, por meio da fusão de linfócitos B de animais imunizados com células de mieloma, é possível obter híbridos imortais que produzam anticorpos de especificidade determinada (ANTCZAK, 1982). O teste de ELISA desenvolvido com anticorpos monoclonais (AcMo) diminui a possibilidade de reação cruzada, uma vez que estes são capazes de identificar um único epítopo antigênico. Além disso, os AcMo podem ser utilizados em testes in vitro para controle de qualidade de vacinas contendo toxóides clostridiais, substituindo os testes in vivo utilizados atualmente. Desse modo, o presente estudo teve como objetivos produzir e caracterizar anticorpos monoclonais antitoxina épsilon de C. perfringens tipo D.

Para produção da toxina épsilon, foi utilizada uma amostra de Clostridium perfringens tipo D, fornecida pelo Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária (INTA, Bariloche – Argentina). A toxina foi produzida de acordo com PARREIRAS et al. (2002).

O soro controle positivo foi obtido pela imunização de cinco camundongos da raça Suíço Albino, como descrito por EL IDRISSI & WARD (1992). O soro controle negativo foi obtido a partir da sangria de cinco camundongos, também da linhagem Suíço Albino (PERCIVAL et al., 1990). Para obtenção dos linfócitos, 10 camundongos Balb/c foram imunizados de acordo com EL IDRISSI & WARD (1992). Os soros foram obtidos semanalmente por punção da veia caudal e foram avaliados por ELISA indireto, conforme descrito por UZAL et al. (1997). Os animais cujos soros apresentavam concentração de anticorpos, estabelecida por densidade ótica, maior que 1,0 em leitura a 492nm receberam a última imunização quatro dias antes da fusão. Após este período, os baços dos camundongos sacrificados foram processados para obtenção das células esplênicas e foi realizada a fusão destas, como descrito por DE STGROTH & SCHEIDEGGER (1980), com células de mieloma da linhagem P3-X63-Ag8 653 adquiridas da American Type Culture Collection (ATCC, Rockvile, Maryland, EUA). Em seguida, foram adicionados macrófagos com o objetivo de estimular o crescimento dos híbridos e fazer a limpeza das culturas. Estes foram obtidos por meio da lavagem peritoneal com meio RPMI-1640 (Sigma Chemical Co., St. Louis, EUA) de um camundongo não-imunizado.

Após a lavagem, as células foram transferidas para as placas de 96 poços e foram incubadas por 48 horas a 37ºC (HARLOW & LANE, 1988). Os híbridos foram selecionados por meio da detecção de imunoglobulinas antitoxina épsilon no sobrenadante das culturas pelo ELISA indireto (UZAL et al., 1997). Para clonagem destes, utilizou-se o método da diluição limitante (HARLOW & LANE, 1988) e os clones que apresentavam crescimento foram expandidos para obtenção de sobrenadante de cultura e líquido ascítico, como descrito por PERCIVAL et al. (1990).

A caracterização isotípica dos anticorpos monoclonais foi realizada por meio de um ELISA indireto antígeno mediado, seguindo o protocolo do Kit Mouse Monoclonal Antibody Isotyping Reagents (Sigma Chemical Co., St. Louis, EUA). A partir do sobrenadante da cultura dos híbridos e do líquido ascítico, os AcMo foram purificados por meio da técnica de cromatografia líquida, utilizando a coluna HiTrap IgM Purification HP (Amersham Biosciences) para IgM e cromatografia em coluna de proteína A Sepharose CL-4B, ativada com brometo de cianogêneo (Sigma Chemical Co., St. Louis, EUA) para IgG. Depois desse processo, foi realizada a dosagem protéica (HARLOW & LANE, 1988). A capacidade dos AcMo purificados de identificar a toxina épsilon foi avaliada por meio da realização de um Western Blot (PERCIVAL et al., 1990).

O rendimento médio da protoxina foi de 426µg ml-1 e o peso molecular observado na eletroforese foi de 36.898kDa, resultados que corroboram os trabalhos anteriores (SAKURAI et al., 1997; PARREIRAS et al., 2002). Os soros dos camundongos imunizados com o toxóide épsilon apresentaram concentração de anticorpos, estabelecida por densidade ótica, maior que 1,0 em leitura a 492nm. Este resultado foi similar ao obtido por PERCIVAL et al. (1990), que utilizaram concentrações de 10 a 20mg do toxóide épsilon na imunização de Balb/c para produção de híbridos produtores de AcMo antiépsilon toxina e afirmaram que essas concentrações são ideais para a obtenção de uma boa resposta imune.

Após a hibridização das células do baço com as células da linhagem de mieloma, foram testados ao todo 288 poços quanto à produção de imunoglobulinas antitoxina épsilon de C. perfringens tipo D. Destes, 19 (6,6%) foram positivos, resultado superior ao relatado por HORIGUCHI et al. (1985), que encontraram uma positividade de 1,5% dos poços testados.

Após seleção dos híbridos, os 10 que apresentaram maior concentração de anticorpos, medida por densidade ótica a 492nm no ELISA indireto, foram submetidos a sucessivas clonagens por diluição limitante com objetivo de obter apenas um clone secretor por poço. Foram obtidos seis híbridos secretores de AcMo, número semelhante ao descrito por PERCIVAL et al. (1990). Porém, não foi possível estabelecer uma linhagem com apenas um clone secretor, sendo que todos os híbridos obtidos foram secretores simultaneamente de IgM e de IgG3. As linhagens estabelecidas receberam a identificação P e um número de 1 a 6.

Para continuidade do trabalho, foi selecionada aleatoriamente a linhagem P2. No processo de purificação, foram obtidos 15µg mL-1 de IgG3 e 21,52µg mL-1 de IgM. Os resultados estão de acordo com GODING (1996), o qual relata que o rendimento da produção de AcMo, em sobrenadantes de cultura celular, varia de 5 a 50µg mL-1, dependendo de fatores como desenvolvimento individual do clone e densidade celular da cultura. Porém, o resultado obtido é inferior ao descrito por WNEK et al. (1985) na produção de AcMo antienterotoxina de C. perfringens. Essa menor produção pode estar relacionada com o fato de a cultura apresentar mais de um clone, ocasionando uma redução na produção de ambas as classes de imunoglobulina do cultivo (BOARER et al., 1988).

No Western Blot, os AcMo das classes IgM e IgG3 purificados foram capazes de identificar a toxina épsilon com peso molecular de 34,2kDa (Figura 1), resultado semelhante a estudos anteriores (BOARER et al., 1988; HAUER e CLOUGH, 1999), confirmando a especificidade dos AcMo produzidos.


Os anticorpos monoclonais produzidos no presente estudo podem ser utilizados no desenvolvimento de métodos alternativos de controle de vacinas contendo o toxóide épsilon, na elaboração de kits de diagnóstico, no estudo da estruturação antigênica e ativação da toxina épsilon de Clostridium perfringens tipo D. Esse parece ser o primeiro relato no Brasil de produção de anticorpos monoclonais contra toxinas de bactérias do gênero Clostridium.

Recebido para publicação 02.04.08

Aprovado em 18.07.08

  • ANTCZAK, D.F. Monoclonal antibodies: tecnology and potencial use. Journal of American Medical Association, v.181, p.1005-1011, 1982.
  • BOARER, C.D. et al. The production and evaluation of monoclonal antibodies to Clostridium perfringens type D epsilon toxin. Journal of Biological Standardization, v.16, p.207-218, 1988.
  • DE STGROTH, S.F.; SCHEIDEGGER, D. Production of monoclonal antibodies: strategy and tactics. Journal of Immunological Methods, v.35, n. 1-2, p.1-21, 1980.
  • HARLOW, E.D.; LANE, D. Antibodies: a laboratory manual New York: Cold Spring Harbor Laboratory, 1988. 726p.
  • EL IDRISSI, A.H.; WARD, G.E. Evaluation of enzyme-linked immunosorbent assay for diagnosis of Clostridium perfringens enterotoxemias. Veterinary Microbiology, v.31, p.89-99, 1992.
  • GODING, J.W. Monoclonal antibodies: principles and practice London: Academic, 1996. 544p.
  • HAUER, P.J.; CLOUGH, N.E. Development of monoclonal antibodies suitable for antigen quantification potency tests for clostridial veterinary vaccines. Developments in Biological Standardization, v.101, p.85-89, 1999.
  • HORIGUCHI Y. et al. Production and characterization of monoclonal antibodies to Clostridium perfringens Enterotoxin. Infection and Immunity, v.52, n.1, p.31-35, 1985.
  • MCCLAIN, M.S.; COVER, T.L. Functional analysis of neutralizing antibodies against Clostridium perfringens epsilon-toxin. Infection and Immunity, v.75, n.4, p.1785-1793, 2007.
  • PARREIRAS, P.M. et al. Production and purification of epsilon prototoxin produced by Clostridium perfringens type D. Arquivos Brasileiros de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.54, p.328-330, 2002.
  • PERCIVAL, A.D. et al. Anti-Idiotypic antibody-induced protection against Clostridium perfringens type D. Infection and Immunity, v.58, n.8, p.2487-2492, 1990.
  • SAKURAI, J. et al. Major toxins of Clostridium perfringens Journal of Toxicology, v.16, n.4, p.195-214, 1997.
  • UZAL, F.A. et al. Detection of Clostridium perfringens type D epsilon antitoxin in serum of goats by competitive and indirect ELISA. Veterinary Microbiology, v.57, p.223-231, 1997.
  • UZAL, FA. et al. Comparison of four techniques for the detection of Clostridium perfringens type D epsilon toxin in intestinal contents and other body fluids of sheep and goats. Journal of Veterinary Diagnostic Investigation, v.15, n.2, p.94-99, 2003.
  • WNEK, A.P. et al. Production and characterization of monoclonal antibodies against Clostridium perfringens type A enterotoxin. Infection and Immunity, v.50, n.2, p.442-448, 1985.
  • 1
    Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Set 2008
    • Data do Fascículo
      Fev 2009

    Histórico

    • Aceito
      18 Jul 2008
    • Recebido
      02 Abr 2008
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