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Descrição de dois anos de atuação da Comissão de Ética no Uso de Animais do Setor de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Paraná

Two years description of the Animal Use Ethic Committee of the Agrarian Science Sector of the Federal University of Paraná

Resumos

A Comissão de Ética no Uso de Animais do Setor de Ciências Agrárias (CEUA-SCA) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) foi criada em 2005. Este artigo teve por objetivo estudar os dois primeiros anos do trabalho dessa Comissão, principalmente quanto à redução do sofrimento animal. Foram avaliadas a composição e a metodologia de trabalho da CEUA-SCA, além da efetividade na redução do sofrimento animal, pela razão emissão de certificados por projetos protocolados (C:P) e pelo estudo dos projetos que receberam ofícios. Foram avaliados 42 protocolos de pesquisa de 2006 e 24 de 2007. Animais vertebrados foram os mais usados, submetidos com maior frequência a procedimentos grau B de invasividade. Os resultados sugerem que a CEUA-SCA, no período estudado, colaborou para o controle do uso de animais nas pesquisas sob a responsabilidade do SCA-UFPR. Destaca-se a necessidade do preenchimento adequado dos formulários pelos proponentes, o aumento da pluralidade na composição da Comissão e a importância de um órgão federal que centralize informações relativas à atuação das CEUAs no Brasil.

bem-estar animal; deliberação; ensino; pesquisa; utilização de animais


The Animal Use Ethic Committee of the Agrarian Sciences Sector (CEUA-SCA) of the Federal University of Paraná (UFPR) was created in 2005. The objective of this research was to describe the first two years of CEUA-SCA's work, mainly regarding to the reduction of the animal suffering. The CEUA-SCA's composition and work methodology were studied, as well as the effectiveness to reduce the animal suffering, evaluated by the ratio of certificates emitted and projects registered (C:P) and by the observation of projects that received official letters. Forty two research protocols in 2006 and 24 in 2007 were evaluated. Animals used were mostly vertebrates being submitted more frequently to procedures considered B for invasiveness degree. The results show that the CEUA-SCA, in the studied period, collaborated to the control of the animal use under the responsibility of the SCA-UFPR. Further improvement relates to the need for proper formularies fulfilment by the proposers, the increase of plurality in the Committee composition and the importance of a federal agency centralizing the Brazilian CEUAs information.

animal use; animal welfare; deliberation; research; teaching


ARTIGOS CIENTÍFICOS

CLÍNICA E CIRURGIA

Descrição de dois anos de atuação da Comissão de Ética no Uso de Animais do Setor de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Paraná

Two years description of the Animal Use Ethic Committee of the Agrarian Science Sector of the Federal University of Paraná

Vanessa Carli Bones SillaI; Silmara Maldonado MarthosI; Carla Forte Maiolino MolentoII,1 1 Autor para correspondência.

IUniversidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil

IILaboratório de Bem-estar Animal (LABEA), Setor de Ciências Agrárias (SCA), UFPR, 80035-050, Curitiba, PR, Brasil. E-mail: carlamolento@yahoo.com

RESUMO

A Comissão de Ética no Uso de Animais do Setor de Ciências Agrárias (CEUA-SCA) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) foi criada em 2005. Este artigo teve por objetivo estudar os dois primeiros anos do trabalho dessa Comissão, principalmente quanto à redução do sofrimento animal. Foram avaliadas a composição e a metodologia de trabalho da CEUA-SCA, além da efetividade na redução do sofrimento animal, pela razão emissão de certificados por projetos protocolados (C:P) e pelo estudo dos projetos que receberam ofícios. Foram avaliados 42 protocolos de pesquisa de 2006 e 24 de 2007. Animais vertebrados foram os mais usados, submetidos com maior frequência a procedimentos grau B de invasividade. Os resultados sugerem que a CEUA-SCA, no período estudado, colaborou para o controle do uso de animais nas pesquisas sob a responsabilidade do SCA-UFPR. Destaca-se a necessidade do preenchimento adequado dos formulários pelos proponentes, o aumento da pluralidade na composição da Comissão e a importância de um órgão federal que centralize informações relativas à atuação das CEUAs no Brasil.

Palavras-chave: bem-estar animal, deliberação, ensino, pesquisa, utilização de animais.

ABSTRACT

The Animal Use Ethic Committee of the Agrarian Sciences Sector (CEUA-SCA) of the Federal University of Paraná (UFPR) was created in 2005. The objective of this research was to describe the first two years of CEUA-SCA's work, mainly regarding to the reduction of the animal suffering. The CEUA-SCA's composition and work methodology were studied, as well as the effectiveness to reduce the animal suffering, evaluated by the ratio of certificates emitted and projects registered (C:P) and by the observation of projects that received official letters. Forty two research protocols in 2006 and 24 in 2007 were evaluated. Animals used were mostly vertebrates being submitted more frequently to procedures considered B for invasiveness degree. The results show that the CEUA-SCA, in the studied period, collaborated to the control of the animal use under the responsibility of the SCA-UFPR. Further improvement relates to the need for proper formularies fulfilment by the proposers, the increase of plurality in the Committee composition and the importance of a federal agency centralizing the Brazilian CEUAs information.

Key words: animal use, animal welfare, deliberation, research, teaching.

INTRODUÇÃO

A implantação de Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUAs) começou a ser verificada nos Estados Unidos, a partir dos anos 70, ampliando-se internacionalmente a partir dos anos 80. Um dos países pioneiros foi a Suécia (PAIXÃO, 2004), país no qual a obrigatoriedade da existência das CEUAs data de 1979 (FORSMAN, 1998). No Brasil, os primeiros relatos de CEUAs datam da década de 90 (CHAVES, 2000). A partir de 2007, o Colégio Brasileiro de Experimentação Animal iniciou uma campanha de cadastramento de instituições, biotérios e CEUAs (FRAJBLAT, 2007). Em 2008, o Conselho Federal de Medicina Veterinária publicou a Resolução 879, visando o cadastramento de CEUAs em instituições de ensino e pesquisa, nas áreas de medicina veterinária e zootecnia (CFMV, 2008). Além disso, a partir de 2008, a Lei Federal n° 11.794, além de outras providências, passou a determinar a manutenção de um cadastro nacional das CEUAs institucionais (BRASIL, 2008). No Estado do Paraná, a análise de projetos científicos por tais comissões é exigência legal desde 2003 (PARANÁ, 2003).

As CEUAs têm a função de julgar o uso de animais em ensino e pesquisa. FISHER (2005) destacou como função das CEUAs, adicionar a dimensão social à interface entre a ciência e os animais, assim como entre a ciência e a comunidade em geral. De acordo com PAULA (2004), uma comissão decide se o sofrimento causado aos animais pode ser justificado pelos benefícios do projeto. Segundo PODOLSKY & LUKAS (1999), as CEUAs variam quanto à forma de trabalho, mas todas direcionam esforços para que os animais sob sua supervisão sejam utilizados de maneira humanitária. Porém, antes de assegurar o uso humanitário, as CEUAs devem deliberar sobre a utilização ser ou não justificada, com base no mérito científico do projeto (PAIXÃO, 2004; EVANS, 2005) e no sofrimento a ser imposto aos animais, concretizando a ação na esfera ética.

Publicações sobre o funcionamento das CEUAs podem colaborar para o desenvolvimento de uma melhor consideração da senciência animal no âmbito da pesquisa (MOLENTO, 2006). Tais trabalhos são escassos no Brasil, destacando-se as publicações da Universidade Paranaense-UNIPAR (CIFFONI et al., 2001), Universidade São Judas Tadeu-USJT (BARBOSA, 2005) e Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG (OLIVEIRA, 2008). Este trabalho teve o objetivo de estudar os dois primeiros anos de funcionamento da CEUA do Setor de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Paraná (CEUA-SCA-UFPR), visando contribuir para a construção de literatura referente à atuação das CEUAs no Brasil.

MATERIAL E MÉTODOS

A CEUA-SCA-UFPR foi criada em abril de 2005. Faziam parte dessa comissão professores do SCA das áreas de medicina veterinária, zootecnia e fitotecnia, além de um membro da sociedade civil. Em 2007, essa comissão contou com o auxílio voluntário de uma aluna de pós-graduação. A composição da CEUA foi comparada às recomendações pertinentes, representadas pela Resolução 879 do CFMV (CFMV, 2008), pelo Código Estadual de Proteção aos Animais do Estado do Paraná (PARANÁ, 2003) e pela Lei Federal n° 11.794 (BRASIL, 2008).

Os descritivos da CEUA SCA são: (1) finalidade de zelar para que os princípios de ética no uso de animais sejam observados nas atividades de ensino, pesquisa e extensão sob a responsabilidade do SCA-UFPR, minimizando o sofrimento animal; (2) a aplicação dos Três Rs (RUSSEL & BURCH, 1992) e da Lei de Crimes Ambientais, especialmente no que tange à criminalização do uso de animais em procedimentos para os quais existem alternativas (BRASIL, 1998); (3) o método dos três mundos (GRACIA, 2005): mundo dos fatos, dos valores e dos deveres, adotado para deliberação sobre os projetos. O Potencial Invasivo (PI) dos procedimentos realizados nos projetos foi classificado pelo proponente e avaliado posteriormente pela CEUA-SCA, em cinco níveis, conforme o Conselho Canadense de Cuidados aos Animais (CCAC, 2006). O grau A abrange experimentos de menor invasividade em animais invertebrados e o grau E, aqueles de maior potencial invasivo.

Informações relativas aos dois primeiros anos de trabalho da CEUA-SCA, incluindo projetos, formulários de submissão de projeto, parecer para relato interno da CEUA-SCA e de inexistência de alternativas, foram pesquisadas nos arquivos da Comissão e analisadas entre agosto e dezembro de 2007. Foram avaliados objetivos do uso dos animais; área de conhecimento; local de realização dos projetos; proporção de protocolos que obtiveram certificados; grupos taxonômicos e números de animais listados; período de manutenção dos animais; duração dos projetos; PI dos procedimentos; termos de ciência de reenquadramento de PI; e emprego de formulário de inexistência de alternativas, conforme SHAPIRO (1999), exigido pela CEUA-SCA nos casos em que o sofrimento animal envolvido é substancial. O preenchimento de tal formulário ocorre após a aprovação do mérito científico da pesquisa e exige que o proponente faça uma revisão bibliográfica dos métodos propostos e da possibilidade de aplicação de alternativas. A existência de publicações científicas com métodos alternativos sugere a não aprovação do projeto, por risco de se ferir a Lei de Crimes Ambientais n° 9.605 (BRASIL, 1998). Além disso, foi estudado o beneficiário do avanço no conhecimento, buscando saber quantos trabalhos propunham benefício intraespecífico, interespecífico e para a produção animal; informações obtidas a partir da análise dos objetivos e ou da seção de introdução dos projetos.

A cronologia nos trabalhos da Comissão foi avaliada em três situações: tempo em dias entre a data do protocolo e a emissão do certificado (PC), incluindo projetos que receberam oficios e certificados e aqueles que receberam apenas certificado; tempo em dias entre a data do protocolo e a emissão do primeiro ofício ao proponente (PO1); e tempo em dias entre a data do protocolo e a emissão do segundo ofício, o qual dependia de uma resposta ao primeiro pelo proponente (PO2).

Pelo número de projetos e certificados foi possível determinar a razão emissão de certificados por projetos protocolados (C:P), um dos indicadores da efetividade da CEUA-SCA para a redução do sofrimento animal. Quanto mais próxima a C:P for de um, maior o número de certificados emitidos por protocolos avaliados e menor a restrição do uso de animais. Um índice igual a um significa a aprovação de todos os projetos. Também se calculou o percentual de projetos que receberam ofícios, representando solicitações adicionais determinadas pela CEUA-SCA aos proponentes. Esse porcentual constitui um indicador de potenciais transformações nos projetos, no sentido de garantir maior grau de bem-estar aos animais usados, redução do número de animais ou severidade de procedimentos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Ao analisar a composição da CEUA-SCA em relação à Resolução 879 (CFMV, 2008), verificou-se que a quantidade de profissionais é adequada. Porém, com exceção de um membro, todos eram pesquisadores e a indicação é de que 50% dos membros sejam dessa categoria. Segundo o Código Estadual de Proteção aos Animais do Estado do Paraná (PARANÁ, 2003) e a Lei Federal n° 11.794 (BRASIL, 2008), todos os requisitos para composição são cumpridos. A CEUA-SCA demonstra uma preocupação no sentido de apresentar uma composição pluralista, conforme definido por PAIXÃO (2008), pois, além de cientistas, existe um membro da sociedade civil comprometido com o bem-estar animal; entretanto, sua pluralidade é extremamente tímida. As possíveis áreas de melhoria para a CEUA-SCA em termos de constituição, referem-se ao ajuste em relação à Resolução 879 do CFMV e ao aumento da pluralidade de membros.

Foram analisados todos os projetos protocolados na CEUA-SCA, sendo 42 referentes ao ano de 2006 e 24 de 2007. Observa-se um maior número de projetos em 2006 em comparação ao ano de 2007, possivelmente pelo fato de o primeiro ano ter recebido projetos que já estavam em andamento quando a comissão foi instituída. A maioria referiu-se a pesquisas de mestrado nas áreas de produção animal e patologia veterinária e foi realizada nos departamentos de Medicina Veterinária e Zootecnia do SCA-UFPR. De 42 projetos protocolados em 2006, 36 receberam certificado. Em cinco casos os certificados não foram emitidos e um se encontrava em situação pendente. Em 2007, de 24 protocolos, 23 receberam certificado e um estava pendente. A pendência refere-se a projetos para os quais foram emitidos ofícios e a resposta não foi submetida. Em 2006, a razão C:P da CEUA-SCA foi de 0,86 e em 2007, foi de 0,96. Os valores dessa razão também podem ser observados em outras CEUAs. Na comissão da Universidade Positivo, em Curitiba, Paraná (PR), a relação foi de 0,83 em 2007 (TORRES & ZAITTER, 2008). No Setor de Ciências Biológicas da UFPR foram relatados valores de 1 em 2007, 1 em 2006, 0,97 em 2005, 1 em 2004 e 1 em 2003 (FILADELFI & ACCO, 2008). Já a comissão de ética do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo-IBUSP- relatou valores de 0,44 em 2007, 1 em 2006, 1 em 2005 e 1 em 2004 e 2003 em conjunto (TRAJANO et al., 2008). O processo de emissão de certificados está relacionado ao método de deliberação, que talvez explique as diferenças entre as razões C:P das diferentes CEUAs. O aumento da razão C:P da CEUA-SCA de 2006 para 2007 pode estar relacionado ao fato de que a atuação da Comissão tenha promovido reflexões aos proponentes, aumentando as chances de aprovação do trabalho proposto, assim como pode indicar a necessidade de estímulo aos membros participantes para que se mantenha a qualidade dos trabalhos.

Na tentativa de avaliar a quantidade de alterações que a CEUA-SCA exerceu sobre os projetos, analisou-se o número de ofícios emitidos. Em 2006, 24 projetos receberam ofícios (57,1%) e em 2007, foram 10 ofícios (41,7%). Publicações ou um cadastro centralizado constando o número de ofícios emitidos pelas CEUAs seriam importantes, pois a comunicação entre CEUA e proponente indica restrições ao sofrimento animal.

Quanto ao grupo taxonômico constante nas propostas avaliadas, em 2006, os mais usados foram peixes (10.772), frangos de corte (5.585), suínos (1.117), cães (716), bovinos (713), ovinos (350), gatos (309), outras aves (118), caprinos (39), equinos (35), coelhos (21) e crustáceos (10) (Figura 1-2006). Em 2007, foram suínos (536), bovinos (274), frangos de corte (262), ovinos (196), peixes (140), outras aves (122), cães (71), crustáceos (62), gatos (35), equinos (16) e coelhos (cinco) (Figura 1-2007). Considerando apenas os projetos certificados, em 2006, o número de frangos de corte foi menor e bovinos passaram a ocupar a terceira posição dos animais mais usados. Em 2007, modificaram-se os dados referentes aos crustáceos, diminuindo para 12 animais. Do total de projetos, em sete (cinco em 2006 e dois em 2007) as informações quanto à taxonomia ou ao número de animais estavam ausentes e não foram incluídas nos dados acima. Este é um ponto que merece uma ação educativa por parte da CEUA-SCA, dada a sua importância na deliberação ética e na aplicação dos Três Rs (RUSSEL & BURCH, 1992). Cabe ressaltar que houve a possibilidade de obter tais informações pois a submissão à CEUA exige que o projeto completo conste em anexo. Em cinco casos em 2006 e três em 2007 foram utilizados dois ou mais grupos taxonômicos de animais simultaneamente no mesmo projeto. Em 2006, foram avaliados projetos com 19.935 animais, dos quais 19.925 (99,9%) eram vertebrados. Em 2007, foram 1.719 animais, sendo 1.657 (96,4%) vertebrados. Considerando apenas projetos que receberam certificados, em 2006 foram utilizados 17.408 animais, dos quais 17.398 (99,9%) eram vertebrados e em 2007 foram 1.669 animais, sendo 1.657 (99,3%) vertebrados. A quase totalidade de vertebrados presentes nos projetos avaliados e aprovados pela CEUA-SCA merece uma reflexão ética profunda, pois vertebrados apresentam alta probabilidade de senciência (KIRKWOOD, 2006). Considerando-se a importância do Brasil em termos de números de vertebrados utilizados para pesquisa (SILLA, 2008), é recomendável a revisão de tais números pelas CEUAs e a disponibilização de tais dados à comunidade científica e à sociedade em geral.


Quanto ao período de manutenção dos animais, em 2006, 20 projetos apresentaram essa informação em dias (mediana de 21 dias, mínimo de um e máximo de 120), em sete havia outras especificações, como o peso corporal a ser atingido pelos animais. Em 15 casos esse item do formulário não foi preenchido. Em 2007, 15 projetos informaram os dias de manutenção (mediana de 28 dias, mínimo de um e máximo de 180), sete citaram outras formas, como o número de partos. Em dois protocolos não constaram tais dados. O tempo médio de duração dos projetos em dias em 2006 foi de 270 e em 2007 foi de 184. Em quatro projetos de 2006 e quatro de 2007 esse campo não foi preenchido. O tempo de duração dos projetos, na maioria dos casos, é maior do que o tempo de manutenção dos animais em experimento, uma vez que esta é parte do desenvolvimento total do projeto, referindo-se somente à quantidade de tempo em que efetivamente foram utilizados animais para a obtenção de resultados.

A análise do PI demonstra que em 2006 os procedimentos de três projetos foram enquadrados no grau A, 25 foram enquadrados no grau B, oito foram enquadrados no grau C, quatro foram enquadrados no grau D, nenhum foi enquadrado no grau E e em um essa informação não foi apresentada (Figura 2-2006). O projeto que não classificou o PI dos procedimentos não recebeu certificado. Em 2007, dois projetos foram enquadrados no grau A, 15 foram enquadrados no grau B, seis foram enquadrados no grau C, nenhum foi enquadrado no grau D e um foi enquadrado no grau E (Figura 2-2007). Considerando apenas projetos aprovados, em 2006, três foram enquadrados no grau A, 22 foram enquadrados no grau B, sete foram enquadrados no grau C, quatro foram enquadrados no grau D e nenhum foi enquadrado no grau E. Em 2007 houve modificação apenas no número de projetos de grau A, passando de dois para um. Tanto em 2006, quanto em 2007, o grau B de PI foi o mais frequente, demonstrando que a maioria dos procedimentos aprovados e realizados com animais sob a responsabilidade da CEUA-SCA promoveu baixo grau de sofrimento. Um protocolo de 2007 pertencia ao grau E. Segundo ROLLIN (2000), experimentos que envolvam grau E devem ser desencorajados. O protocolo grau E relacionava-se a estudo em frigorífico e buscava estudar os procedimentos padrões e as alternativas para tornar o abate mais humanitário; portanto, foi julgado como justificado. Houve seis projetos em 2006 e dois em 2007 cujos graus de PI informados pelos proponentes foram inferiores àqueles considerados adequados pela CEUA-SCA; estes sofreram reenquadramento de PI, procedimento registrado em um termo de ciência assinado pelos proponentes. Além disso, um caso considerado grau D pelo proponente foi reenquadrado para grau B pela comissão. Para um projeto em 2006 a CEUA-SCA solicitou a apresentação do formulário de inexistência de alternativas. Tal formulário, conforme proposto por SHAPIRO (1999), exige ampla revisão de literatura especificamente sobre os métodos a serem empregados, no sentido de garantir contato com métodos alternativos, caso existam na literatura internacional. O preenchimento de tal formulário é exigido em casos especiais em que o sofrimento animal é alto; dessa forma a CEUA-SCA aumenta as chances de cumprimento da Lei de Crimes Ambientais (BRASIL, 1998), que proíbe a realização de experimentos para os quais existam métodos alternativos.


Sob a perspectiva da decisão ética, como se baseia em análise utilitarista, deliberando em função da comparação entre custos e benefícios, parece importante considerar sobre quem recaem os benefícios do avanço no conhecimento. Dos projetos analisados pela CEUA-SCA, 24 em 2006 e 15 em 2007 beneficiariam a própria espécie animal utilizada nas pesquisas, quatro projetos em 2006 e um em 2007 corresponderam a benefícios interespecíficos, incluindo seres humanos ou outras espécies animais e 14 projetos em 2006 e oito em 2007 referiram-se à produção animal. Um projeto em 2007 e um em 2006 envolveram tanto benefícios intraespecíficos, quanto interespecíficos. O benefício para a própria espécie utilizada experimentalmente, como na maioria dos projetos analisados, sugere um benefício mais direto, pois ou dispensa validações posteriores, no caso de animais como modelos experimentais, ou denota uso menos antropocêntrico, no caso de experimentos para produção animal.

Algumas características estudadas referentes à atuação da CEUA-SCA apresentaram falhas no preenchimento pelos proponentes, sugerindo a necessidade de melhorias, tais como: grupos taxonômicos e números de animais usados (14,3% dos projetos em 2006 e 8,3% em 2007), período de manutenção dos animais no experimento (38,1% em 2006 e 8,3% em 2007), duração do projeto (11,9% em 2006 e 16,7% em 2007) e PI dos procedimentos (2,4%e m 2006). Essas informações foram solicitadas via ofício e, quando não fornecidas, não houve emissão de certificados.

CONCLUSÃO

Os indicadores estudados sugerem que a CEUA-SCA, no período entre 2006 e 2007, colaborou para o controle do uso de animais nas pesquisas conduzidas no SCA da UFPR, o que pode ser observado pela razão C:P e pela frequência de comunicação via ofícios entre a CEUA-SCA e os proponentes. Destaca-se a necessidade da publicação de relatórios anuais por parte das CEUAs de todo o Brasil, colaborando para o processo de controle do uso de animais em ensino e pesquisa. A necessidade de efetivação de um órgão federal que centralize e disponibilize tais informações ficou clara, dada a escassez de dados disponíveis e a relevância dessas informações para auxiliar o funcionamento da CEUA-SCA e das CEUAs no Brasil. Somente com a organização de critérios, coerência de atuação e disponibilização de informações, as CEUAs poderão promover um sólido avanço ético na utilização de animais para ensino e pesquisa.

Recebido para publicação 31.10.08

Aprovado em 03.05.09

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    Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      Out 2009

    Histórico

    • Aceito
      03 Maio 2009
    • Recebido
      31 Out 2008
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