Acessibilidade / Reportar erro

Parâmetros eletrocardiográficos de equinos Puro Sangue Árabe submetidos a exercício prolongado de enduro

Electrocardiographic parameters of Arabian horses submitted to prolonged exercise of endurance

Resumos

Foram estabelecidos os parâmetros eletrocardiográficos de 20 equinos Puro Sangue Árabe em repouso e após exercício prolongado de enduro. A frequência cardíaca média foi de 35,85bpm em repouso, com predominância do ritmo sinusal, e de 53,78bpm, com taquicardia sinusal após o exercício. Como variação fisiológica, observou-se marcapasso migratório, e como não fisiológica, complexo ventricular prematuro. No pós-exercício, ocorreu aumento da amplitude das ondas P, R, S e T, com onda P tendendo a se tornar única em 35% dos animais e bífida positiva em 65%, e a onda T monofásica positiva. Houve redução da duração das ondas, dos intervalos e dos segmentos, e alongamento do QTc; porém, o complexo QRS quase não se alterou. O eixo elétrico, no plano frontal, apresentou desvios à direita e à esquerda em repouso sugestivo de aumento de câmara e hipertrofia secundárias ao treinamento, ao passo que, após o exercício, demonstrou desvio extremo para a direita, indicando alterações eletrolíticas. O escore cardíaco médio foi de 128,45ms, o que caracteriza os animais como atletas, sendo reduzido a 118,60ms após o exercício.

eletrocardiograma; equino; fisiologia do esforço; enduro


Electrocardiographic parameters of 20 Thoroughbred Arabian horses were established at rest and after prolonged endurance exercise. The mean heart rate was 35.85bpm at rest with predominant sinus rhythm, and 53.78bpm with sinus tachycardia after exercise. As physiological variation, wandering pacemaker was observed, and as non physiological, premature ventricular complex was noted. At post-exercise there was an increase of the amplitude of waves P, R, S and T, with P wave tending to become single in 35% of the animals and bifid positive in 65%, and with monophase positive T wave. There was a reduction in the duration of the waves, intervals and segments, and elongation of QTc, but the QRS complex hardly changed. The electrical axis in the frontal plane showed deviations to the right and to the left at rest, suggesting chamber enlargement and hypertrophy secondary to training, while after the exercise it showed extreme deviation to the right, indicating electrolyte imbalances. The average heart score was 128.45ms, which features the animals as athletes, being reduced to 118.60ms after exercise.

electrocardiogram; equine; physiology of stress; endurance


ARTIGOS CIENTÍFICOS

CLÍNICA E CIRURGIA

Parâmetros eletrocardiográficos de equinos Puro Sangue Árabe submetidos a exercício prolongado de enduro

Electrocardiographic parameters of Arabian horses submitted to prolonged exercise of endurance

Cinthia Beatriz da Silva DumontI,1 1 Autor para correspondência. ; Ceci Ribeiro LeiteI; Júlia Miranda de MoraesII; Rosângela de Oliveira AlvesII; Roberta de Ferro GodoyI; Eduardo Maurício Mendes de LimaI

IInstituto Central de Ciências (ICC), Universidade de Brasília (UnB), Ala Sul, Campus Darcy Ribeiro, CP 4508, 70760-701, Brasília, DF, Brasil. E-mail: biavet05@gmail.com

IIUniversidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil

RESUMO

Foram estabelecidos os parâmetros eletrocardiográficos de 20 equinos Puro Sangue Árabe em repouso e após exercício prolongado de enduro. A frequência cardíaca média foi de 35,85bpm em repouso, com predominância do ritmo sinusal, e de 53,78bpm, com taquicardia sinusal após o exercício. Como variação fisiológica, observou-se marcapasso migratório, e como não fisiológica, complexo ventricular prematuro. No pós-exercício, ocorreu aumento da amplitude das ondas P, R, S e T, com onda P tendendo a se tornar única em 35% dos animais e bífida positiva em 65%, e a onda T monofásica positiva. Houve redução da duração das ondas, dos intervalos e dos segmentos, e alongamento do QTc; porém, o complexo QRS quase não se alterou. O eixo elétrico, no plano frontal, apresentou desvios à direita e à esquerda em repouso sugestivo de aumento de câmara e hipertrofia secundárias ao treinamento, ao passo que, após o exercício, demonstrou desvio extremo para a direita, indicando alterações eletrolíticas. O escore cardíaco médio foi de 128,45ms, o que caracteriza os animais como atletas, sendo reduzido a 118,60ms após o exercício.

Palavras-chave: eletrocardiograma, equino, fisiologia do esforço, enduro.

ABSTRACT

Electrocardiographic parameters of 20 Thoroughbred Arabian horses were established at rest and after prolonged endurance exercise. The mean heart rate was 35.85bpm at rest with predominant sinus rhythm, and 53.78bpm with sinus tachycardia after exercise. As physiological variation, wandering pacemaker was observed, and as non physiological, premature ventricular complex was noted. At post-exercise there was an increase of the amplitude of waves P, R, S and T, with P wave tending to become single in 35% of the animals and bifid positive in 65%, and with monophase positive T wave. There was a reduction in the duration of the waves, intervals and segments, and elongation of QTc, but the QRS complex hardly changed. The electrical axis in the frontal plane showed deviations to the right and to the left at rest, suggesting chamber enlargement and hypertrophy secondary to training, while after the exercise it showed extreme deviation to the right, indicating electrolyte imbalances. The average heart score was 128.45ms, which features the animals as athletes, being reduced to 118.60ms after exercise.

Key words: electrocardiogram, equine, physiology of stress, endurance.

INTRODUÇÃO

O cavalo é considerado o principal atleta entre os mamíferos, em função da máxima captação de oxigênio relativo à massa corpórea (YOUNG, 2003). Desenvolveu força e velocidade, permitindo seu emprego no enduro equestre, uma atividade esportiva predominantemente aeróbica de intensidade variável e esforço prolongado (DINIZ, 2006).

O exercício de enduro aumenta a carga de trabalho cardíaco e pode causar lesão miocárdica, agravada por distúrbios metabólicos (YOUNG, 2003) devido à perda de eletrólitos e fluidos (HOLBROOK et al., 2006). Assim, MUÑOZ et al. (1995) sugeriram que a avaliação cardiovascular deveria ser mais utilizada para outros fins além das afecções.

Nesse contexto, a eletrocardiografia tenta quantificar o treinamento e o desempenho atlético, por meio da determinação do escore cardíaco, além de estimar a massa cardíaca (MUÑOZ et al., 1995; YOUNG, 2003; LIGHTOWLER et al., 2004; ANDRADE et al., 2006; JOSE-CUNILLERAS et al., 2006; DINIZ et al., 2008; DOJANA et al., 2008). Desde que associado a exame cardiovascular criterioso, o eletrocardiograma (ECG) auxilia no diagnóstico de distúrbios de formação e condução do impulso elétrico por meio do coração e na avaliação da evolução de doenças cardíacas (WHITE II & RHODE, 1974). Outra contribuição importante, sugerida por BABUSCI & LÓPEZ (2006), é a possibilidade de detecção de distúrbios eletrolíticos.

STEWART (1981) e ILLERA & ILLERA (1987), em cavalos de corrida e de enduro, respectivamente, verificaram que o ECG foi eficaz na avaliação do desempenho, assim como na monitoração do treinamento. NIELSEN & VIBE-PETERSEN (1980) observaram relação entre a duração do complexo QRS e o desempenho de cavalos nas corridas. Dessa forma, o presente trabalho teve como objetivo retratar o comportamento dos parâmetros eletrocardiográficos de equinos da raça Puro Sangue Árabe submetidos a exercício prolongado de enduro.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados 20 equinos, 12 machos e oito fêmeas, da raça Puro Sangue Árabe (PSA), de seis a 12 anos de idade, com higidez comprovada por meio de exame físico e hemograma completo, submetidos a treinamento para enduro por no mínimo quatro anos, sendo participantes e finalistas de provas de velocidade livre curta B com distância de 90km durante campeonato regional da Federação Hípica de Brasília. As provas ocorreram durante os meses de julho, agosto, outubro e dezembro de 2009, englobando, assim, período seco com umidade relativa do ar de aproximadamente de 43% (abril-setembro) e no período chuvoso com umidade relativa do ar de cerca de 57% (outubro-março), e para os dois períodos a temperatura média foi de 25°C.

Os traçados eletrocardiográficos foram obtidos durante 60 segundos utilizando-se o aparelho C10 TEB, sistema composto por eletrocardiógrafo digital de 12 canais e software ECGPC Veterinário versão 2.27. Foram registradas as derivações bipolares I, II e III e unipolares aumentadas aVR, aVF e aVL. A disposição dos eletrodos seguiu o sistema de derivação bipolar ápice-base, conforme PATTESON (1996), sendo fixados à pele por meio de condutores metálicos e umedecidos com álcool.

Foi promovida uma avaliação em repouso (M0) e outra imediatamente após a avaliação veterinária oficial (vet check) (MF). A avaliação no M0 ocorreu no próprio haras, em posição ortostática, com os membros paralelos entre si, em piso de cimento, todos com ferradura e sem tranquilização. Foram realizados exames físico, hematológico e mensuração do peso corpóreo por meio de fita de peso. A avaliação no MF seguiu o mesmo protocolo no local de realização da prova, ao término do último anel da competição, dentro de cinco minutos após a inspeção do vet check.

Nos diferentes momentos, foram determinados a frequência cardíaca e o ritmo e também foram realizadas análise morfológica de todo o traçado e análise sistemática, com derivação bipolar II, em velocidade de 25mm s-1 e sensibilidade de 1mV=1cm, sendo calculados a duração da onda P, do intervalo PR e do complexo QRS e o intervalo QT. Também foram realizados o nivelamento do segmento ST e valor do QTc, conforme proposto por SEVESTRE (1982), e a amplitude das ondas P, R, S e T positivas, negativas e bifásicas.

O eixo elétrico médio no plano frontal foi calculado avaliando-se o comportamento do complexo QRS na derivaçãos bipolar I e unipolares aumentada aVF por meio da intersecção de suas amplitudes, da mesma forma que WHITE II & RHODE (1974) e FERNANDES et al. (2004). O escore cardíaco foi determinado de acordo com o sugerido por STELL & STEWART (1974), STEWART (1981), PICCIONE et al. (2003), ANDRADE et al. (2006), BOFFI (2006) e DINIZ (2006), calculando-se a média aritmética do complexo QRS, incluindo as três derivações bipolares I, II e III, .

Para avaliação dos dados, aplicou-se teste de normalidade Kolmogorov-Smirnov e a partir de então estes foram submetidos à análise por meio do teste "T" pareado, com nível de significância de 5%.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Como resultados da avaliação física e hematológica, foram observados os seguintes valores, em repouso e após o exercício, respectivamente: frequência cardíaca (FC), 35,85±7,05bpm e 53,78±10,35bpm; temperatura retal, 34,8±8,5°C e 37,99±0,7°C; peso, 382,50±24,72kg e 373,55±25,85kg; hematócrito, 37,3±3,25% e 45,6±6,9%; proteína plasmática total, 7,24±0,4g dL-1 e 7,5±0,6g dL-1; plaquetas, 164.347,83±53.047,67mm-3 e 204.800±45448,90mm-3; e leucócitos 8.521,74±1.592,41mm-3 e 15.026,67±2.224,05mm-3.

A perda de peso corpóreo foi de 2,4%, com diferença estatística entre M0 e MF, estando próximo ao valor encontrado por SCHOTT et al. (1997) em cavalos que haviam realizado provas de 80 e 160km de distância, com perdas de 3 ou 4% e de DÜSTERDIECK et al. (1999), simulando provas de 60km em esteira, também com perdas de 3%. Contudo, essas perdas indicariam um processo de desidratação, visto que, para KINGSTON et al. (1997), a mensuração da perda de peso corporal seria uma forma confiável de se estimar a perda de fluidos por meio do suor em equinos submetidos a exercícios prolongados.

A FC, em M0, esteve dentro da faixa de normalidade de 22 a 45bpm (Tabela 1), conforme FREGIN (1982), para equinos adultos em repouso, corroborando FERNANDES (1994), que encontrou média de 39,3bpm em cavalos da raça Árabe de enduro, 49bpm em Mangalargas e 51bpm em animais mestiços. De outra forma, DINIZ (2006) mencionou média de 51bpm em cavalos de salto. Neste estudo, observou-se menor FC, sugerindo que tal característica ocorreu em função da adaptação cardíaca e vascular em decorrência do treinamento.

Houve predomínio de ritmo sinusal em 90% dos animais (Figura 1A) em M0, coincidindo com FERNANDES et al. (2004) e DINIZ et al. (2008), o que corroborou PATTESON (1996), que o considerou como ritmo fisiológico. De outra forma, um dos animais (5%) apresentou bradicardia sinusal (Figura 1B), caracterizada como fisiológica em virtude da elevação da atividade parassimpática em repouso (PATTESON, 1996) e considerada transitória na maioria dos equinos monitorados por holter, conforme RAEKALLIO (1992).


Em repouso, um animal apresentou uma extrassístole isolada, ou seja, complexo ventricular prematuro (CVP), bem como a presença de marcapasso migratório (Figura 2). O marcapasso migratório foi tido como benigno e fisiológico em função do estímulo parassimpático (McGUIRK & MUIR, 1985). Para MARTIN et al. (2000), o CVP foi uma das causas de queda de desempenho, juntamente com complexo atrial prematuro (CAP), taquicardia ventricular e obstrução mecânica das vias aéreas, sugerindo que esse achado justificaria o monitoramento desse animal por meio de holter, mesmo verificando que este não teve queda de desempenho, pois o CVP poderia indicar lesão miocárdica, mesmo sem sinais clínicos de doença cardiovascular pré-existente (MITTEN, 1996).


No MF, 80% dos animais apresentaram taquicardia sinusal (Figura 3), pois estavam em fase inicial de retorno aos valores de FC de repouso, sendo considerada normal quando associada à dor, à excitação ou ao exercício (FREGIN, 1982; PATTESON, 1996). Em 20% dos animais, o ritmo sinusal foi semelhante ao verificado em repouso, sugerindo que estes apresentavam bom condicionamento físico. Entretanto, houve a manutenção do marcapasso migratório e do CVP no mesmo animal que apresentou tais características em repouso, coincidindo assim em parte com o proposto JOSÉ-CUNILLERAS et al. (2006) e YONEZAWA et al. (2009), quando observaram a predominância de despolarização prematura durante a recuperação e nos primeiros trinta minutos após os animais terem sido submetidos a exercício em esteira, sem comprometimento de performance, corroborando SENTA et al. (1970), que o consideraram benigno após a atividade física, pois este seria induzido por reajuste do sistema nervoso autônomo. A duração e amplitude de ondas, intervalos e complexos (Tabela 1) estiveram em conformidade com os modelos de PATTESON (1996) nos dois momentos. Esses achados foram semelhantes às citações de FREGIN (1982) em cavalos de corrida.


A onda P em M0 foi 91% bífida monofásica positiva (+ +); 4,5% bífida bifásica (- +) (Figura 4) e 4,5% única positiva (+). O componente P1 foi positivo em 95,3% e negativo em 4,7%, ao passo que P2 foi positivo em 100% dos animais. Esses comportamentos foram considerados fisiológicos em função da mudança do foco da atividade do marcapasso no átrio direito, conforme AYALA et al. (1998). Nos animais investigados, a onda P no MF foi 65% bífida (+ +) e 35% única (+), com aumento significativo de sua amplitude (Figura 3), corroborando PICCIONE et al. (2003) e DOJANA et al. (2008) em avaliações de animais atletas. De outra forma, DOJANA et al. (2008) observaram uma onda P anormal em 10% de cavalos sem treinamento e em 5% de cavalos após cinco meses de treinamento, sendo bifásica e negativa, sugerindo uma instabilidade neurovegetativa, semelhantemente ao encontrado por LANDOLSI et al. (1997), ao observarem diminuição no desempenho atlético de alguns cavalos treinados. Esses arranjos mostraram-se como respostas fisiológicas em virtude do esforço a que foram submetidos, sobretudo isso não interferiu no desempenho atlético do animal.


Houve redução com diferença estatística da duração do intervalo PR no MF em comparação com o M0, resultante da elevação da atividade simpática ligada ao aumento da FC necessária para a manutenção da volemia, corroborando ROSE et al. (1979) e PICCIONE et al. (2003).

O complexo QRS se comportou de duas formas distintas na derivação bipolar II: a primeira em 60% dos traçados na forma RS, e a segunda em 40%, para QRS, diferindo dos achados de DINIZ (2006), mas semelhante aos de FERNANDES et al. (2004), devido à utilização da derivação bipolar ápice-base, que foi a mesma utilizada por este segundo pesquisador. O aumento da amplitude de S (Figura 3) em MF (Tabela 1) sugeriu hipertrofia cardíaca transitória induzida pelo exercício (WHITE II & RHODE, 1974; HOLMES & REZAKHANI, 1975), o que foi considerado por PICCIONE et al. (2003) e DOJANA et al. (2008) como adaptação positiva ao nível de treinamento. Não foi observado, em nenhuma das duas avaliações, desnivelamento do segmento ST significativo acima de 0,3mV, coincidindo com FERNANDES et al. (2004).

Modificações espontâneas no seu traçado e diferentes conformações podem ser aceitas como fisiológicas para as ondas T (PATTESON, 1996; SHEARD, 1998), porém o conhecimento de sua morfologia padrão foi importante na identificação de hipóxia ou infarto do miocárdio. Entretanto, neste estudo, o aumento discreto da onda T no MF (Tabela 1) foi tido como fisiológico, segundo HOLMES & REZAKHANI (1975), PICCIONE, et al. (2003) e DOJANA et al. (2008) em resposta ao exercício, devido à redução do aporte sanguíneo pelas coronárias durante a diástole em frequências cardíacas elevadas. Em M0, essa onda foi bifásica (- +) (Figura 4), em 68% dos animais, e monofásica positiva (+), em 32%, e em MF foi monofásica positiva (+) em 55% e bifásica (- +) em 45%. Contudo, alterações da onda T e o aumento da sua amplitude foram considerados por SHEARD (1998), PICCIONE, et al. (2003) e DOJANA et al. (2008) como resposta fisiológica ao treinamento físico.

Embora BABUSCI & LÓPEZ (2006) considerarem o QTc como impreciso para avaliação de desempenho e efeitos do treinamento, neste estudo, esse índice apresentou diferença estatística entre M0 e MF. Em acordo, SEVESTRE (1982) encontrou valor médio de 390ms em repouso, com aumento significativo e permanente desse índice em casos de fadiga miocárdica ou miocardite, sendo diretamente proporcional ao estado de fadiga do animal, podendo atingir 550ms em casos de fadiga excessiva e permanecendo entre 450ms e 500ms em fadiga leve. Assim, sugere-se que os animais estudados estariam em fadiga leve e retornando aos índices verificados em repouso.

Para DINIZ (2006), o eixo elétrico expressou a condição cardíaca relacionada ao tipo de treinamento e à modalidade a que os animais eram submetidos. Durante M0 e MF, esse eixo foi negativo, diferindo do encontrado por FERNANDES et al. (2004) e AYALA et al. (1998), que observaram predominância de positividade no eixo. Entretanto, em M0, o desvio do eixo para a esquerda (55%) poderia sugerir hipertrofia do ventrículo esquerdo, assim como o desvio para a direita, hipertrofia do ventrículo direito (45%), sendo ambos condizentes com treinamento, denominada por WHITE II & RHODE (1974) de "hipertrofia cardíaca atlética", porém somente o exame ecocardiográfico seria capaz de comprovar esse achado, coincidindo assim com LIGHTOWLER te al. (2004) e DOJANÃ et al. (2008). BABUSCI & LÓPEZ (2006) afirmaram que o exercício submáximo de longa duração não só promoveu hipertrofia, mas também determinou o aumento das câmaras. Em MF, foi observada rotação do eixo elétrico com desvio extremo para a direita, sugerindo aumento da câmara cardíaca e dos distúrbios eletrolíticos, tal como encontrada por WHITE II & RHODE (1974).

O escore cardíaco médio no M0 foi de 128,45±11,75ms, estando dentro da faixa de 120 a 136ms, de acordo STEEL & STEWART (1974) e ANDRADE et al. (2006), que correlacionaram o escore com o desempenho e condicionamento do animal, indicando boa capacidade e potencial atlético. ROSE et al. (1979) observaram que, em provas de 100 km, os animais mais rápidos apresentavam escore maior que os menos rápidos. Neste estudo, apesar de não haver diferença estatística, o escore diminuiu a 118,60±14,55ms após o exercício, o que pode ter ocorrido em função do grau de desidratação decorrente do exercício, pois, mesmo não havendo citações na literatura consultada sobre essa correlação, a redução do escore foi diretamente proporcional ao aumento do hematócrito, que se elevou de 37 para 46%.

CONCLUSÃO

Conclui-se que o exame eletrocardiográfico mostrou-se de simples realização, de baixo custo e bem tolerado pelos animais, caracterizando-se como método auxiliar não invasivo na avaliação das modificações adaptativas do coração diante do esforço a que esses animais foram submetidos, assim como na monitoração do condicionamento físico. Foi observado que o ECG de repouso retratou características particulares de animais atletas com atividade predominantemente aeróbia e no pós-exercício demonstrou quadro sugestivo de desidratação decorrente do esforço.

Recebido para publicação 04.01.10

Aprovado em 17.08.10

Devolvido pelo autor 02.09.10

CR-2975

  • ANDRADE, A.F.C. et al. Relação entre escore cardíaco e o condicionamento físico de equinos da raça Mangalarga. Revista Brasileira de Ciência Veterinária, v.13, n.2, p.125-130, 2006.
  • AYALA, I. et al. Modifications of the form and amplitud of the electrocardiographic QRS complex during growth in Spanish-bred horses. Zentralblatt für Veterynärmedizin, Reihe, v.45, p.309-317, 1998.
  • BABUSCI, M; LÓPEZ, E.F. Sistema cardiovascular. In BOFFI, F.M. Fisiologia del ejercicio en equinos Buenos Aires: Inter-Médica, 2006. Cap.4, p.61-85.
  • BOFFI, F.M. Fisiologia del ejercicio en equinos Buenos Aires: Inter-Médica, 2006. 302p.
  • DINIZ, M.P. Perfil eletrocardiográfico de equinos de salto criados em São Paulo 2006. 135f. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária) - Curso de Pós-graduação em Medicina Veterinária, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.
  • DINIZ, M.P. et al. Estudo eletrocardiográfico de equinos da raça Mangalarga Marchador. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.60, n.3, p.536-542, 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=10.1590/S0102-09352008000300003&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 25 nov. 2009. doi: 10.1590/S0102-09352008000300003.
  • DOJANA, N. et al. Electrocardiographic parameters of the sport horse. Lucrari sintiintifice Zootehnie si Biotehnologii, v.41, n.1, p.397-401, 2008.
  • DUSTERDIECK, K.F. et al. Electrolyte and glycerol supplementation improve water intake by horses performing a simulated 60km endurance ride. Equine Veterinary Journal Supplement, v.30, p.418-424, 1999.
  • FERNANDES, W.R. Alterações dos parâmetros do eletrocardiograma e da crase sanguínea em equinos das raças Árabe e Mangalarga, bem como de Mestiços, submetidos à prova de enduro 1994. 21f. Tese (Doutorado em Medicina Veterinária) - Curso de Pós-graduação em Medicina Veterinária, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.
  • FERNANDES, W.R. et al. Características eletrocardiográficas em equinos clinicamente normais da raça Puro Sangue Inglês. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.56, n.2, p.143-149, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=10.1590/S0102-09352004000200002&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 13 set. 2009. doi: 10.1590/S0102-09352004000200002.
  • FREGIN, G.F. The equine electrocardiogram with standardized body and limb positions. Cornell Veterinary, v.72, n.3, p.304-324, 1982.
  • HOLBROOK, T.C. et al. Endurance exercise is associated with increased plasma cardiac troponin I in horses. Equine Veterinary Journal Supplement, v.36, p.27-31, 2006.
  • HOLMES, J.R.; REZAKHANI, A. Observations on the T wave of the equine electrocardiogram. Equine Veterinary Journal, v.1, n.2, p.55-62, 1975.
  • ILLERA, J.C.; ILLERA, M. Electrocardiography and heart score of horses competing in an endurance ride. Australian Veterinary Journal, v.64, p.88-89, 1987.
  • JOSE-CUNILLERAS, L.E. et al. Cardiac arrhytmias during and after treadmill exercise in poorly performing Thoroughbred racehorses. Equine Veterinary Journal Supplement, v.36, p.163-170, 2006.
  • KINGSTON, J.K. et al. Use of dew point hygrometry, direct sweat collection and measurement of body water losses to determine sweating rates in exercising horses. Equine Veterinary Journal Supplement, v.22, p.108-113, 1997.
  • LANDOLSI, F. et al. Paramèters électrocardiographiques de chevaux du syndrome épistaxis induit par l'effort. Revue de Médecine Vétérinaire, v.148, n.12, p.969-974, 1997.
  • LIGHTOWLER et al. Echocardiography and electrocardiography as means to evaluate potential performance in horses. Journal Veterinary Science, v.5, n.3, p.259-262, 2004.
  • MARTIN, B.B. et al. Causes of poor performance of horses during training, racing, or showing: 348 cases (1992-1996). Journal of the American Veterinary Medical Association, v.216, n.4, p.554-558, 2000.
  • McGUIRK, S.M.; MUIR, W.W. Diagnosis and treatment of cardiac arrhythmias. Veterinary Clinics of North America: Equine Practice, v.1, p.353-370, 1985.
  • MITTEN, L.A. Cardiovascular causes of exercise intolerance. Veterinary Clinics of North America: Equine Practice, v.12, p.473-494, 1996.
  • MUÑOZ, A. et al. Electrocardiographic alterations in Andalusian horses associated with training. Journal of Equine Veterinary Science, v.15, n.2, p.72-79, 1995.
  • NIELSEN, K.; VIBE-PETERSEN, G. elationship between QRS-duration (heart score) and racing performance in totters. Equine Veterinary Journal, v.12, n.2, p.81-84, 1980.
  • PATTESON, M.W. Equine cardiology Oxford: Blackwell Science, 1996. 254p.
  • PICCIONE et al. Electrocardiographic changes induced by physical exercise in the jumper horse. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.55, n.4, p.397-404, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid= 10.1590/S0102-09352003000400003 &lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 15 de agosto de 2009. doi: 10.1590/S0102-09352003000400003.
  • RAEKALLIO, M. Long term ECG recording with holter monitoring in clinically healthy horses. Acta Veterinaria Scandinavica, v.33, p.71-75, 1992.
  • ROSE, R.J. et al. Electrocardiography, heart score and haematology of horses competing in an endurance ride. Australian Veterinary Journal, v.55, p.247-250, 1979.
  • SCHOTT II, H.C. et al. Body weight, fluid, electrolyte and hormonal changes in horses competing in 50 and 100 mile endurance rides. American Journal Veterinary Research, v.58, p.303-309, 1997.
  • SENTA, T. et al. Effects of exercise on certain eletrocardiographic parameters and cardiac arrhythmias in the horse. A radiotelemetric study. Cornell Veterinarian, v.60, p.552-569, 1970.
  • SEVESTRE, J. A eletrocardiografia no cavalo. A Hora Veterinária, n.10, p.28-36, 1982.
  • SHEARD, P.W.P. Enfermidades del aparato cardiovascular. In: COLAHAN, P.T. Medicina y cirurgia equina 4.ed. Buenos Aires: Inter-Médica, 1998. v.1, cap.5, p.151-307.
  • STEEL, J.D.; STEWART, G.A. Electrocardiography of the horse and potencial performance ability. Journal of the South African Veterinary Association, v.45, n.4, p.263-268, 1974.
  • STEWART, G.A. The heart score theory in the racehorse. Australian Veterinary Journal, v.57, p.422-28, 1981.
  • WHITE II, N.A.; RHODE, E.A. Correlation of electrocardiographic findings to clinical disease in the horse. Journal of the American Veterinary Medical Association, v.164, p.46-56, 1974.
  • YONEZAWA, L.A. et al. Exame eletrocardiográfico em equinos da raça puro sangue árabe submetidos ao exercício em esteira de alta velocidade e à suplementação com vitamina E. Archives of Veterinary Science, v.14, n.3, p.134-142, 2009.
  • YOUNG, L.E. Equine athletes, the equine athlete's heart and racing success. Physiological Society Symposium - The Athlete's Heart. Newmarket. Experimental Physiology, v.88, n.5, p.659-663, 2003.
  • 1
    Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Aceito
      17 Ago 2010
    • Recebido
      04 Jan 2010
    Universidade Federal de Santa Maria Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Ciências Rurais , 97105-900 Santa Maria RS Brazil , Tel.: +55 55 3220-8698 , Fax: +55 55 3220-8695 - Santa Maria - RS - Brazil
    E-mail: cienciarural@mail.ufsm.br