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Uso do germoplasma da Embrapa nos programas de melhoramento de trigo no Brasil

Use of Embrapa's germplasm in Brazilian wheat breeding programs

Resumos

O programa de melhoramento genético de trigo da Embrapa tem papel importante na história da triticultura brasileira, tendo dado origem a mais de 100 novas cultivares para as diferentes regiões do Brasil, ao longo dos quase 40 anos de existência. Entretanto, não se pode atribuir sua importância somente ao número de cultivares criadas, mas também ao impacto de seu germoplasma nos programas de melhoramento genético de outras instituições. O trabalho teve como objetivo quantificar a importância do germoplasma da Embrapa nos programas de melhoramento genético de trigo no Brasil. Foram analisadas as genealogias de todas as cultivares de trigo indicadas para cultivo no País, no período de 2005 a 2012, por obtentor vegetal. No período estudado, a média de participação do germoplasma da Embrapa nas cultivares de outros obtentores é de 58,7%, com destaque para a Biotrigo Genética, a CCGL TEC e OR Melhoramento de Sementes Ltda, respectivamente, com média de uso de 100,0%, 97,5% e 87,7%.

Triticum aestivum; cultivares; mercado de sementes


The wheat breeding program of Embrapa has an important role in the history of this cereal in Brazil, releasing more than one hundred new cultivars to different regions of the country in almost forty years of existence. However, is not possible assign its importance only to the number of cultivars, but also the impact of their germplasm in other brazilian wheat breeding programs. The objective of this study was to quantify the importance of Embrapa's germplasm in the brazilian wheat breeding programs. Were analyzed the genealogies of all wheat cultivars indicated for growth since 2005 and 2012, by institution. During the study period, the average participation of Embrapa's germplasm on cultivars of other institutions was 58.7%, with emphasis to Biotrigo Genética, CCGL TEC and OR Melhoramento de Sementes Ltda, respectively, in which use was 100%, 97.5% and 87.7%.

Triticum aestivum; cultivars; seeds market


ARTIGOS CIENTÍFICOS

FITOTECNIA

Uso do germoplasma da Embrapa nos programas de melhoramento de trigo no Brasil

Use of Embrapa's germplasm in Brazilian wheat breeding programs

Eduardo CaierãoI,1 1 Autor para correspondência. ; Pedro Luiz ScheerenI; Márcio Só e SilvaI; Ricardo Lima de CastroI; Adeliano CargninI

IDepartamento de Melhoramento de Trigo, Embrapa Trigo (CNPT), 99001-970, Passo Fundo, RS, Brasil. E-mail: eduardo.caierao@embrapa.br

RESUMO

O programa de melhoramento genético de trigo da Embrapa tem papel importante na história da triticultura brasileira, tendo dado origem a mais de 100 novas cultivares para as diferentes regiões do Brasil, ao longo dos quase 40 anos de existência. Entretanto, não se pode atribuir sua importância somente ao número de cultivares criadas, mas também ao impacto de seu germoplasma nos programas de melhoramento genético de outras instituições. O trabalho teve como objetivo quantificar a importância do germoplasma da Embrapa nos programas de melhoramento genético de trigo no Brasil. Foram analisadas as genealogias de todas as cultivares de trigo indicadas para cultivo no País, no período de 2005 a 2012, por obtentor vegetal. No período estudado, a média de participação do germoplasma da Embrapa nas cultivares de outros obtentores é de 58,7%, com destaque para a Biotrigo Genética, a CCGL TEC e OR Melhoramento de Sementes Ltda, respectivamente, com média de uso de 100,0%, 97,5% e 87,7%.

Palavras-chave: Triticum aestivum, cultivares, mercado de sementes.

ABSTRACT

The wheat breeding program of Embrapa has an important role in the history of this cereal in Brazil, releasing more than one hundred new cultivars to different regions of the country in almost forty years of existence. However, is not possible assign its importance only to the number of cultivars, but also the impact of their germplasm in other brazilian wheat breeding programs. The objective of this study was to quantify the importance of Embrapa's germplasm in the brazilian wheat breeding programs. Were analyzed the genealogies of all wheat cultivars indicated for growth since 2005 and 2012, by institution. During the study period, the average participation of Embrapa's germplasm on cultivars of other institutions was 58.7%, with emphasis to Biotrigo Genética, CCGL TEC and OR Melhoramento de Sementes Ltda, respectively, in which use was 100%, 97.5% and 87.7%.

Key words:Triticum aestivum, cultivars, seeds market.

INTRODUÇÃO

O melhoramento de trigo no Brasil começou de fato em 1919, quando o atual Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento criou as estações experimentais em Alfredo Chaves (hoje Veranópolis/RS) e em Ponta Grossa/PR. A partir de então, começaram a ser disponibilizadas as primeiras cultivares de trigo obtidas por meio de seleção em germoplasma introduzido nas áreas coloniais (SOUSA, 1998). Na década de setenta, a pesquisa em trigo se desenvolveu significativamente a partir da criação de centros de pesquisa por cooperativas agrícolas no Rio Grande do Sul (CEP/Fecotrigo - atual CCGL TEC) e no Paraná (Ocepar); da criação do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR); da ampliação do trabalho do Instituto Agronômico de Campinas (IAC); e da criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa. Como consequência, a cultura do trigo se expandiu, alcançando o norte e oeste do Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul (SOUSA, 1998). Nos últimos anos, a produção brasileira de trigo tem oscilado entre 5 a 6 milhões de toneladas, quantidade suficiente para abastecer ao redor de 50% da demanda nacional (CONAB, 2012).

Em quase quarenta anos de existência, mais de uma centena de cultivares de trigo foram desenvolvidas pela Embrapa, sendo que muitas delas com importância ímpar na história da triticultura recente. Cultivares como 'Trigo BR 23' (de 1990 a 1994); 'Embrapa 16' (de 1995 a 1998); 'BRS 179' (2002 e 2003), além de 'BRS Guamirim' (2009), foram os trigos mais cultivado nas respectivas regiões de indicação. A importância da Embrapa no melhoramento do trigo no Brasil não se restringe, apenas, ao lançamento de cultivares, mas também à presença de seu gemoplasma na genealogia das cultivares de outros obtentores. Esse papel é notório em instituições públicas internacionais, como o Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo (Cimmyt), já que suas linhagens são usadas em seleções e hibridações pelo mundo, embora não existam cultivares comerciais (HEISEY et al., 2002).

Desde a década de 70, paralelamente ao desenvolvimento de cultivares comerciais, a Embrapa tem um programa de desenvolvimento de germoplasma básico que viabilizou o criação de linhagens com tolerância ou resistência a muitos dos principais estresses bióticos e abióticos para as diferentes regiões tritícolas do Brasil, desde o sul até o cerrado brasileiro, tanto em regime de sequeiro como irrigado. Atualmente, a Embrapa conta com mais de 15.000 acessos de germoplasma de trigo em seu Banco Ativo de Germoplasma (BAG), que tem importância imensurável para os programas de melhoramento (CARGNIN, 2011).

A Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale realiza, anualmente, a atualização e publicação de um documento denominado 'Informações Técnicas para a cultura do Trigo e Triticale', em que são descritas todas as informações técnicas norteadoras da produção desses cereais no Brasil. Um dos segmentos mais importantes dessa publicação refere-se à descrição de todas as cultivares indicadas para cultivo no ano agrícola posterior ao ano da publicação, incluindo suas características agronômicas e genealogia.

O trabalho teve como objetivo quantificar a importância do germoplasma da Embrapa nos programas de melhoramento de trigo no Brasil, considerando o período de 2005 a 2012.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi baseado nas cultivares indicadas pela Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale (ou Comissão Sul-Brasileira/Comissão Centro Sul-Brasileira/Comissão Centro Brasileira - conforme o ano) de 2005 a 2012 (COMISSÃO, 2012; COMISSÃO, 2011; COMISSÃO, 2010; COMISSÃO, 2009; COMISSÃO, 2008; COMISSÃO, 2007; COMISSÃO, 2006; COMISSÃO, 2005a; COMISSÃO, 2005b). Foram consideradas para o estudo as cultivares dos seguintes obtentores vegetais: Cooperativa Central Gaúcha Ltda - Unidade de Tecnologia (CCGL TEC), OR Melhoramento de Sementes Ltda (OR Sementes), Biotrigo Genética (Biotrigo), Cooperativa Central de Pesquisa Agrícola do Estado do Paraná (Coodetec), Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado de Minas Gerais (EPAMIG), Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio Grande do Sul (FEPAGRO), Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Escola Técnica Federal do Paraná (UFTPR).

A metodologia do trabalho foi baseada nos seguintes dados, obtidos a partir de cada publicação oriunda da Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale: a) número total de cultivares de trigo indicadas; b) número de cultivares de trigo indicadas pela Embrapa; e c) número de cultivares de trigo indicadas por cada obtentor. A genealogia de cada cultivar foi analisada até a terceira geração, tendo em vista a presença ou não de germoplasma da Embrapa, conforme o referencial bibliográfico das próprias Indicações de Pesquisa de Trigo (2005 a 2012) e outras publicações técnicas (SOUSA, 1998; SOUSA, 2004).

O Uso do Germoplasma da Embrapa (UGE) foi classificado em três índices, conforme a geração em que foi empregado. O Índice de Uso Geral (% UGE - Geral) pressupôs a existência de germoplasma da Embrapa em qualquer geração avaliada (1a, 2a ou 3a). O Índice de Uso Direto (% UGE - Direto) pressupôs a ocorrência de germoplasma da Embrapa na primeira geração. Por fim, o Índice de Uso Indireto (% UGE - Indireto) pressupôs a existência do germoplasma da Embrapa na segunda ou terceira geração. Como o germoplasma da Embrapa pode estar presente na primeira e/ou na segunda e/ou na terceira geração de cada cultivar, os somatórios desses percentuais não são cumulativos. Na tabela 1, são apresentados exemplos da metodologia empregada.

No primeiro exemplo da tabela 1, a participação do germoplasma da Embrapa na composição da cultivar 'OR 1' foi considerada "Direta", uma vez que a cultivar 'Embrapa 27' aparece em primeira geração. Nos exemplos 2 e 3 (Tabela 1), temos a participação indireta do germoplasma da Embrapa na composição das cultivares 'Quartzo' e 'Ônix'. Tal classificação foi estabelecida em segunda geração pela existência das cultivares 'Embrapa 27' e 'Embrapa 27' + 'BR 3', respectivamente. No terceiro exemplo, também há a participação indireta; contudo, em terceira geração dos genótipos BR 3 e Embrapa 27. Seguindo este padrão de classificação, foram detalhadas todas as genealogias de todas as cultivares indicadas para cultivo desde 2005, dando origem aos dados consolidados de todos os obtentores (Tabela 2) e os dados individualizados por obtentor (Tabelas 3 e 4).

A determinação de cada um dos três índices foi efetuada a partir dos quocientes entre o número de cultivares com germoplasma da Embrapa (em 1ª, 2ª ou 3ª geração) com o número total de cultivares indicadas por cada obtentor, em cada ano, expresso em percentual.

As cultivares indicadas pela Embrapa, em cada ano, foram consideradas somente para fins de contextualização, uma vez que foram lançadas pela própria Embrapa e fizeram parte da totalização de indicações em cada Reunião da Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

De 2005 a 2012, o número de cultivares de trigo indicadas para cultivo no Brasil só foi inferior a uma centena em 2009 (Tabela 2). Nesse período, o número de cultivares indicadas para cultivo pela Embrapa oscilou de 31 (2009 e 2010) a 41 (2005 a 2008), enquanto o número de cultivares indicadas pelos outros obtentores variou de 63 a 77 (Tabela 2). Tendo em vista o quociente entre o número de cultivares indicadas por outros obtentores que apresentavam germoplasma da Embrapa em sua genealogia (NCIOO com GE) e o número absoluto de cultivares de outros obtentores indicados em cada ano (NCIOO), o índice de uso geral do germoplasma da Embrapa (% UGE - Geral) oscilou de 50,8% (em 2008) a 66,2% (em 2012), com média de 58,7%, o que evidencia a importância da instituição como geradora de germoplasma. Além da média de uso ser próxima a 60%, o percentual de UGE - Geral apresentou tendência crescente desde 2008 (Tabela 2). As frações Índice de Uso Direto (% UGE - Direto) e Índice de Uso Indireto (% UGE - Indireto) evidenciam a preponderância do uso em primeira geração em detrimento do uso em segunda ou terceira geração (Tabela 2). Isso evidencia que o germoplasma da Embrapa apresenta características agronômicas para uso imediato em combinações, muito pela complexidade de resistências agrupadas ao longo das décadas de pré-melhoramento realizado. Apesar disso, observa-se uma tendência decrescente no Índice de UGE - Direto (de 55,6% em 2005 para 40,3% em 2012) e crescente no Índice de UGE - Indireto (de 11,1% em 2005 para 35,1% em 2012).

A decomposição dos Índices de UGE por instituição obtentora evidencia resultados distintos, correlacionados com os sítios de seleção usados pelos programas e influenciados por condições ambientais variadas, seja de clima, de solo ou mesmo de doenças (Tabelas 3 e 4). Na tabela 3, estão apresentados os resultados dos obtentores com base principal de pesquisa nos estados de São Paulo e do Paraná, enquanto que, na tabela 4, constam os resultados dos obtentores com base principal de pesquisa no estado do Rio Grande do Sul.Pelos resultados obtidos, a instituição obtentora que apresenta o menor Índice de UGE - Geral é o IAC, seguido pelo IAPAR (Tabela 3). Das cultivares indicadas pelo IAC, de 2005 a 2012, a participação da Embrapa na composição das cultivares nunca foi superior a 15%, sendo que, em 2012, foi nula. Considerando o IAPAR, o percentual oscilou de 42,9% (em 2005 e 2006) a 10% (em 2010), chegando a 25% em 2012. Em ambas as instituições, o UGE concentra-se, quase que exclusivamente, de forma direta. Os programas do IAC e IAPAR estão localizados, respectivamente, em São Paulo e norte do Paraná e sempre tiveram influência significativa do germoplasma mexicano, oriundo do Cimmyt (RIEDE et al., 2011). Isso porque nessas regiões não existem problemas de solos ácidos e há excelente adaptação do germoplasma daquele país, especialmente no que tange ao tipo de planta, ao potencial de rendimento de grãos e à qualidade dos grãos. Embora a Coodetec também tenha sua base de seleção no norte/oeste do Paraná, mais precisamente nos municípios de Cascavel e Palotina, e também tenha influência importante do germoplasma do México, o UGE - Geral é maior quando comparado ao IAC e IAPAR, apresentando média de 40,7% no período estudado (Tabela 3). O maior percentual de uso foi observado em 2011, totalizando 52,6%, enquanto o menor foi observado em 2007, com 33,3%. Pela análise individualizada realizada em cada genótipo da Coodetec, percebe-se que, quando as cultivares desenvolvidas pela empresa são indicadas para os Estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, o uso do germoplasma da Embrapa é mais comum, visando incorporar em seus genótipos as resistências presentes no germoplasma da Embrapa.

A importância do germoplasma de trigo da Embrapa nas cultivares indicadas pela CCGL TEC, OR Sementes e Biotrigo (Tabela 4) é muito superior quando comparada com as instituições anteriores e pode ser explicada, em primeira análise, pela localização de seus programas de melhoramento genético de trigo. A OR sementes e a Biotrigo situam-se em Passo Fundo/RS (da mesma forma que a Embrapa Trigo), e a CCGL TEC, localiza-se em Cruz Alta/RS (município próximo a Passo Fundo). Esses dois ambientes estão sujeitos a mesma pressão de inóculo de doenças, como giberela (Giberela zeae) e ferrugem da folha (Puccinia triticina), a solos ácidos e às condições de precipitação pluvial elevadas, características da região sul do Brasil (estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina), favorecendo o uso do germoplasma da Embrapa, tradicionalmente conhecido como de boa tolerância às principais doenças foliares e de espiga do trigo.

Especificamente para a CCGL TEC (Tabela 4), o percentual do Índice de UGE Geral oscilou de 92,9% (2005 e 2006) a 100% no período de avaliação. Merece destaque o fato de que, desde 2008, 100% das cultivares de trigo indicadas por essa instituição possuíam germoplasma da Embrapa em sua genealogia. Essa é uma tendência recente, já que, no início de seu programa, a principal influência foi de germoplasma do México (SVOBODA, 2009). Seguindo o mesmo comportamento observado para a Coodetec, a principal fração de UGE na CCGL TEC é Direta, totalizando, em média, 94,9% em comparação com a média de 12,5% do Índice de UGE Indireto. Ao encontro dos dados da análise efetuada para o obtentor Coodetec, também se observa tendência de crescimento do uso indireto do germoplasma da Embrapa.

A criação da empresa OR Sementes foi concretizada em 1989, pelo pesquisador Otoni Rosa, aposentado da Embrapa Trigo. Em seus trabalhos na linha de correção de defeitos de cultivares de trigo, executado na Embrapa, foi gerada a cultivar 'Embrapa 27', que desempenhou papel ímpar na composição das cultivares da OR Sementes a partir de sua fundação (SOUSA, 2004). O uso de germoplasma da Embrapa por essa empresa nunca foi inferior a 80% e atingiu 100% em 2012, totalizando média de 87,7% (Tabela 4). Diferentemente do observado para outras instituições, na OR Sementes, parte significativa do uso de materiais da Embrapa ocorre de forma indireta, alcançando o Índice de 85,7% em 2012, contra 42,9% do Índice de UGE Direto. Isso pode ser explicado pelo uso do germoplasma da cultivar de trigo 'Embrapa 27' nas primeiras cultivares geradas pela empresa e, posteriormente, uso das próprias cultivares da OR Sementes como geradoras das demais, mas que tinham o genótipo Embrapa 27 como ideotipo de planta inicial.

Em 2010, foi criada a Biotrigo, empresa derivada da OR Sementes. Como o germoplasma foi dividido no momento de sua criação, toda a herança genética característica da OR Sementes também foi transferida para a Biotrigo, o que pode ser observado pela manutenção elevada do Índice de UGE Geral nessa instituição (Tabela 4). Nos dois anos em que indicou novas cultivares de trigo para cultivo (2011 e 2012), o germoplasma da Embrapa esteve presente em todas, totalizando média de UGE - Geral de 100%; porém, essa presença deve-se, unicamente, ao uso do germoplasma de forma indireta (1ª, 2ª ou 3ª geração).

O germoplasma da Embrapa também esteve presente nas cultivares de outras instituições, tais como Fepagro e Epamig. Contudo, devido ao pequeno número de cultivares geradas por essas instituições e o pequeno impacto comercial das mesmas, a análise particularizada dessas instituições foi preterida em relação aos obtentores IAC, Iapar, CCGL TEC, Coodetec, OR Sementes e Biotrigo.

Em análise mais profunda, não basta participar da genealogia de cultivares de outras instituições se essas não forem cultivadas em área expressiva. Assim, a base genética de genealogias usadas no período de estudo foi comparada com os resultados da pesquisa de área semeada das cultivares de trigo em 2011, executada pelo Kleffmann Group (KLEFFMANN, 2012). Segundo a pesquisa, 15 cultivares representavam 85% da área de trigo no Brasil. Desse percentual, as cultivares de trigo da Embrapa perfaziam 20%, enquanto 50% era composto por cultivares de outras instituições, com a participação do germoplasma da Embrapa. Apenas 15% da área eram cultivadas com cultivares que não apresentavam descendência do germoplasma da Embrapa. Em 2009, em pesquisa realizada pela mesma instituição (KLEFFMANN, 2010), as cultivares da Embrapa perfaziam 21%; as cultivares de outros obtentores com germoplasma da Embrapa perfaziam 40% e as cultivares de outros obtentores que não tinham parentesco com os materiais da Embrapa totalizavam 24%. A Embrapa, portanto, praticamente manteve seu percentual de participação no mercado de cultivares próprias (21 e 20%) e elevou de 40 para 50% sua participação (em termos de germoplasma) nas cultivares lançadas por outras instituições no período de 2009 a 2011.

Analisando essa contextualização comercial, apesar da Embrapa ter participação significativa nas cultivares de outros obtentores (maior ou menor, conforme a região e sua influência), suas próprias cultivares (que detém em primeiro plano seu germoplasma) não tem expressado esse potencial em termos de participação de mercado, pelo menos nos últimos anos. Há hipóteses que podem justificar tal fenômeno. Uma delas diz respeito ao perfil da empresa. A Embrapa não é uma empresa finalística (de comercialização) e, portanto, não consegue ser efetiva e ágil nas ações de difusão e fomento de suas cultivares, comparando-se com empresas de caráter privado, como, por exemplo, OR Sementes e Biotrigo. Décadas atrás, quando a concorrência pelo mercado de trigo era menor, essas evidências estruturais não eram salientes e a Embrapa ainda se mantinha em patamares de participação de mercado superiores aos observados hoje. Dificuldades no posicionamento de algumas cultivares também pode ser uma hipótese plausível para esse "razoável" percentual de participação no mercado de sementes, essencialmente nos últimos anos, quando a aptidão qualitativa passou a ter peso destacado. Outra característica de importância diz respeito ao pequeno volume de semente disponibilizado pela Embrapa no momento do lançamento de uma nova cultivar de trigo, o que impacta diretamente no menor uso dessa semente. Apesar da menor agilidade no marketing e na entrega de suas cultivares em volume de sementes competitivo com cultivares de ouros obtentores, há, sem dúvida, um componente cíclico em termos do maior ou menor sucesso das cultivares dos diferentes obtentores.

A Embrapa tem papel importante na produção de trigo no Brasil, seja como balizadora de mercado, a partir do lançamento de cultivares, ou seja pelo desenvolvimento de germoplasma, que pode ser usado por outros obtentores no desenvolvimento de seus genótipos.

CONCLUSÃO

Diferentemente do que ocorre para outras comodities no Brasil, a Embrapa ainda tem papel importante no mercado de sementes de trigo no Brasil. A Embrapa caracteriza-se por ser uma instituição criadora de germoplasma, presente em proporção significativa das cultivares de outros obtentores de trigo, princimalmente CCGL TEC, OR Melhoramento e Biotrigo.

Recebido 04.04.13

Aprovado 28.07.13

Devolvido pelo autor 11.10.13

CR-2013-0461.R1

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  • 1
    Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Nov 2013
    • Data do Fascículo
      Jan 2014

    Histórico

    • Recebido
      04 Abr 2013
    • Aceito
      28 Jul 2013
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