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Conforto térmico para os seres humanos nas condições de ambiente natural em Santa Maria, RS, Brasil

Human thermic comfort in Santa Maria, RS, Brazil

Resumos

Foram determinadas as disponibilidades climáticas de conforto térmico para os humanos em Santa Maria, estado do Rio Grande do Sul - Brasil (29°42'S; 53°42'W; 95m). Utilizaram-se os dados diários da temperatura do ar das 9h, 15h e 21h, medidos nos termômetros de bulbo seco e de bulbo úmido, de um psicrômetro comum e das temperaturas máximas e mínimas diárias, período 1969-2011. Calcularam-se os valores do índice de Temperaturas Efetivas (TE) diários utilizando o método de THOM (1959). Em termos médios, as condições de desconforto por temperaturas baixas ocorreram pela manhã (9h), nos sete meses mais frios do ano, à noite (21h), nos seis meses mais frios do ano, à tarde (15h), nos quatro meses mais frios do ano e, por temperaturas elevadas, à tarde (15h), no mês de janeiro. Entretanto, o desvio padrão dos valores médios do índice TE variou de 1,8 a 4,1, evidenciando a elevada ocorrência de dias ou de horas do dia, com valores discordantes daqueles da média, principalmente nos meses mais frios do ano, quando a variabilidade é maior


The climatic availabilities for human thermal comfort in Santa Maria, RS -Brazil, were determined. The daily data of minimum and maximum air temperatures, and air and wet bulb temperatures at the standard local time (9h, 15h and 21h), were collected from 1969 to 2011 and were measured in a non aspirated psychrometer at the Meteorological Station located in Santa Maria - RS (29°42'S; 53°42'W; 95m). The index of daily Effective Temperatures was calculated using the method of THOM (1959). In average, the discomfort by the low temperatures occurs during the morning (9h) in the seven coldest month of the year, at night (21h) in the six coldest month of the year, and in the afternoon (15h) in four of the coldest months of the year, and, for high temperatures, in the afternoon (15h) in January. However, the standard deviation of the index varies from 4.1 to 1.8, indicating the occurrence of days or hours with discrepancy values from that of the average, mainly in the coldest months of the year, when the variability is greater

index of effective; temperature; discomfort


INTRODUÇÃO:

As disponibilidades climáticas de um local ou região estão entre os principais fatores que condicionam o comportamento humano e animal. Nos humanos, interferem principalmente na alimentação, na vestimenta e no tipo e intensidade das atividades. Os estudos realizados na área são direcionados geralmente para o conforto térmico no interior de ambientes residenciais e de trabalho (FROTA &amp; SCHIFFER, 2003FROTA, A.B.; SCHIFFER, S.R. Manual de conforto térmico. 2.ed. São Paulo: Studio Nobel, 1995. 243p.; NOGUEIRA, 2012NOGUEIRA, C.E.C. et al. Avaliação do conforto térmico nas residências convencional einovadora do "Projeto CASA", Unioeste, Campus de Cascavel. Acta Scientiarum Technology, v.34, n.1, p. 3-7, 2012.). São encontrados poucos estudos sobre conforto térmico humano para as condições de ambiente natural, principal local de atividade do trabalhador rural. No Brasil, existem estudos realizados para os humanos ao ar livre, em ambiente urbano, como os de SILVA &amp; RIBEIRO (2006)SILVA, E.N. da; RIBEIRO, H. Alterações da temperatura em ambientes externos de favela e desconforto térmico. Revista Saúde pública, v.40, n.4, p.663-670, 2006. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102006000500016>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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, SANTOS &amp; ANDRADE (2008)SANTOS, R.L.; ANDRADE, H.O. de. Avaliação quantitativa do conforto térmico de uma cidade em área de transição climática: Feira de Santana-Bahia, Brasil. Revista de Geografía Norte Grande, v.40, p.77-84, 2008. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.40 67/S0718-34022008000200005> . Acesso em: 14 ago. 2014.
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,COSTA et al. (2010)COSTA, E.R. da et al. Análise do conforto térmico do Parque Itaimbé-Santa Maria/RS em condições atmosféricas de domínio da massa polar atlântica no inverno. Geografia: Ensino &amp; Pesquisa, v.14, n.2, p.16-26, 2010., MOURA et al. (2010)MOURA, M. de O. et al. Conforto térmico em Fortaleza-CE. Revista da ANPEGE, v.6, n.6, p.177-189, 2010. Disponível em: <http://www.google.com.br/url?url=http://anpege.org.br/revista/ojs-2.2.2/index.php/anpege08/article/download/57/j&frm=1&q=&esrc=s&sa=U&ei=cwLuU4HHCvTIsAThloGYCQ&ved=0CBQQFjAA&sig2=Lzmg25qW1_Dmp4duS8eAiA&usg=AFQjCNHyvTWsRqCmb8QrY7VvsgnTk-1HbQ>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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e SOUZA et al. (2010)SOUZA, A. de. et al. Modelo de Thom para o zoneamento bioclimáticio de Mato Grosso do Sul. Revista de Geografia Norte Grande, v.46, p.137-147, 2010. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.4067/S0718-34022010000200008>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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e, em ambiente rural, como aqueles de OLIVEIRA et al. (2006)OLIVEIRA, L.M.F. de et al. Zoneamento bioclimático da Região Sudeste do Brasil para o conforto térmico animal e humano. Engenharia Agrícola, v.26, n.3, p.823-831, 2006. <http://www.scielo.br/pdf/eagri/v26n3/20.pdf>. Acesso em: 14 ago. 2014.
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e SOUZA et al. (2010)SOUZA, A. de. et al. Modelo de Thom para o zoneamento bioclimáticio de Mato Grosso do Sul. Revista de Geografia Norte Grande, v.46, p.137-147, 2010. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.4067/S0718-34022010000200008>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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. Nestas condições, a interação dos seres humanos com os elementos meteorológicos é direta e pode resultar em desconforto térmico prejudicial ao rendimento do trabalho e à saúde, aumentando os riscos de acidentes (FROTA &amp; SCHIFFER, 2003FROTA, A.B.; SCHIFFER, S.R. Manual de conforto térmico. 2.ed. São Paulo: Studio Nobel, 1995. 243p.; HONJO, 2009HONJO, T. Thermal confortin outdoor environment. Global Environmental Researh, v.13, p.43-47, 2009. Disponível em: <http://scholar.google.com.br/scholar?q=Thermal%20Comfort%20in%20Outdoor%20Environment>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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; IIDA, 2005IIDA. I. Ergonomia: projeto e construção ou produção. 2.ed. São Paulo: Blücher, 2005. 614p. ; SOUZA et al., 2010SOUZA, A. de. et al. Modelo de Thom para o zoneamento bioclimáticio de Mato Grosso do Sul. Revista de Geografia Norte Grande, v.46, p.137-147, 2010. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.4067/S0718-34022010000200008>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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). Nos animais, a expressão de seu potencial produtivo depende da interação entre genética, nutrição, sanidade e conforto térmico.

Os principais elementos meteorológicos que condicionam o comportamento dos seres humanos são: temperatura e umidade do ar, evaporação, velocidade do vento e radiação. A combinação destes elementos e os mecanismos fisiológicos fazem com que o principal condicionante para conforto térmico seja a combinação temperatura e umidade do ar (FALCO, 1997FALCO, J.E. Bioclimatologia animal. Lavras: UFLA, 1997. 57p.; PAGNOSSIN et al., 2001PAGNOSSIN, E.M. et al. Influência dos elementos meteorológicos no conforto térmico humano: bases biofísicas. Disciplinarum Scientia. Série: Ciências Biológicas e da Saúde, v.2, n.1, p.149-161, 2001. Disponível em: <http://sites.unifra.br/Portals/36/CSAUDE/2001/influencia.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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; HONJO, 2009HONJO, T. Thermal confortin outdoor environment. Global Environmental Researh, v.13, p.43-47, 2009. Disponível em: <http://scholar.google.com.br/scholar?q=Thermal%20Comfort%20in%20Outdoor%20Environment>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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; IIDA, 2005IIDA. I. Ergonomia: projeto e construção ou produção. 2.ed. São Paulo: Blücher, 2005. 614p. ; FROTA &amp; SCHIFFER, 1995FROTA, A.B.; SCHIFFER, S.R. Manual de conforto térmico. 2.ed. São Paulo: Studio Nobel, 1995. 243p.).

A temperatura fisiológica humana depende da intensidade do seu metabolismo e taxas de trocas de calor com o ambiente e isto varia com os indivíduos, de acordo com a constituição física geral, peso, tipo de vestuário, atividade física, dieta, fisiologia e grau de ajustamento às condições meteorológicas predominantes. Para manter o equilíbrio térmico, o calor metabólico produzido pelo corpo humano mais as trocas de calor por radiação, evaporação e convecção devem se anular. Assim, a temperatura fisiológica é uma função das condições térmicas do ambiente e da eficiência e velocidade da evaporação. A condição térmica do ambiente é determinada pelo balanço de radiação e a velocidade de evaporação em resposta à umidade relativa do ar, velocidade do vento e exposição a ele, exposição da superfície corporal à radiação solar e à radiação térmica das superfícies do entorno (FANGER, 1970FANGER, P. Thermal confort. New York: McGraw-Hill Book, 1970. 244p.; AYOADE, 1996AYOADE, J. Introdução à climatologia para os trópicos.4.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996. 332p.; IIDA, 2005IIDA. I. Ergonomia: projeto e construção ou produção. 2.ed. São Paulo: Blücher, 2005. 614p. ).

Em ambiente natural, a quantificação do conforto térmico geralmente é realizada utilizando-se a temperatura e a umidade do ar, em função da dificuldade de determinação das outras variáveis e por serem facilmente modificadas pelo vestuário e sombreamento, especialmente devido à mobilidade humana (GREGORCZUK &amp; CENA, 1967GREGORCZUK, M.: CENA, K. Distribution of effective temperature over the surface of the earth. International Journal of Biometeorogy, v.11, n.2, p.145-149, 1967. Dispinível em: <http://download.springer.com/static/pdf/832/art%253A10.1007%252FBF01426841.pdf?auth66=1408277640_ac47762339b3443d02de44311f15859f&ext=.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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).

Dentre os índices de quantificação do conforto térmico para os humanos, o índice de Temperatura Efetiva (TE) (THOM, 1959THOM, E.C. The discomfort index. Weatherwise, v.12, n.1, p.57-60, 1959.) é bastante utilizado por ponderar o efeito da umidade e da temperatura do ar. Sua simplicidade permite a aplicação em estudos climatológicos, especialmente em locais onde não existem informações de longo prazo dos outros elementos meteorológicos. Este índice tem sido mencionado em LANDSBERG (1979)LANDSBERG, H.E. El tiempo y la salud. Buenos Aires: Editorial Universitária de Buenos Aires, 1979. 175p., AYOADE (1996)AYOADE, J. Introdução à climatologia para os trópicos.4.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996. 332p. e PAGNOSSIN et at. (2001)PAGNOSSIN, E.M. et al. Influência dos elementos meteorológicos no conforto térmico humano: bases biofísicas. Disciplinarum Scientia. Série: Ciências Biológicas e da Saúde, v.2, n.1, p.149-161, 2001. Disponível em: <http://sites.unifra.br/Portals/36/CSAUDE/2001/influencia.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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como sendo adequado para a determinação das disponibilidades do conforto térmico humano. No Brasil, ele foi utilizado na quantificação das condições do conforto térmico para os humanos por OLIVEIRA (2006)OLIVEIRA, L.M.F. de et al. Zoneamento bioclimático da Região Sudeste do Brasil para o conforto térmico animal e humano. Engenharia Agrícola, v.26, n.3, p.823-831, 2006. <http://www.scielo.br/pdf/eagri/v26n3/20.pdf>. Acesso em: 14 ago. 2014.
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, MOURA et al. (2010)MOURA, M. de O. et al. Conforto térmico em Fortaleza-CE. Revista da ANPEGE, v.6, n.6, p.177-189, 2010. Disponível em: <http://www.google.com.br/url?url=http://anpege.org.br/revista/ojs-2.2.2/index.php/anpege08/article/download/57/j&frm=1&q=&esrc=s&sa=U&ei=cwLuU4HHCvTIsAThloGYCQ&ved=0CBQQFjAA&sig2=Lzmg25qW1_Dmp4duS8eAiA&usg=AFQjCNHyvTWsRqCmb8QrY7VvsgnTk-1HbQ>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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; e SOUZA et al. (2010)SOUZA, A. de. et al. Modelo de Thom para o zoneamento bioclimáticio de Mato Grosso do Sul. Revista de Geografia Norte Grande, v.46, p.137-147, 2010. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.4067/S0718-34022010000200008>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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.

As condições meteorológicas da região de Santa Maria, na parte central do estado do Rio Grande do Sul, são muito variáveis ao longo do ano. Mesmo ao longo do dia, ocorrem variações térmicas e higrométricas de grande magnitude, exigindo das pessoas adaptações rápidas às diferentes situações ambientais. Nessa região, em função especialmente do relevo, a temperatura e a umidade relativa do ar podem variar em curtas distâncias no espaço geográfico. Assim, para a orientação do comportamento e atividade humana, é importante que as condições de conforto ambiental na região sejam quantificadas, a fim de planejar as atividades humanas ao ar livre, principalmente na agricultura, pecuária e naquelas tipicamente urbanas, como na construção civil.

Neste trabalho, o objetivo foi quantificar o conforto térmico para os seres humanos nas condições de ambiente natural de Santa Maria, estado do Rio Grande do Sul - RS.

MATERIAL E MÉTODOS:

A quantificação do conforto térmico foi realizada utilizando-se o método de THOM (1959), conforme aequação 1:

em que TE é o índice de Temperatura Efetiva de THOM (1959)IIDA. I. Ergonomia: projeto e construção ou produção. 2.ed. São Paulo: Blücher, 2005. 614p. , e Ts e Tu são as temperaturas do ar e de bulbo úmido, respectivamente, obtidas num psicrômetro comum. Consideram-se valores de TE≤18,9 como indicadores de estresse ao frio e de TE≥25,6 de estresse ao calor.

Foram utilizados os dados diários das temperaturas medidas às 9h, 15h e 21h na estação meteorológica de Santa Maria, pertencente ao 8° Distrito de Meteorologia - 8°DISME do Instituto Nacional de Meteorologia - INMET (29°42' S; 53°42' W; 95m), período de observação de janeiro de 1969 a dezembro de 2011, num total de 15.705 dias. Foram utilizados, também, os dados diários de temperatura mínima e máxima para o cálculo da amplitude térmica diária e calculada a média, o desvio padrão e o coeficiente de variação mensal e anual de todas as variáveis utilizadas.

O índice TE foi calculado para cada horário de leitura (9h, 15h e 21h) e dia do período estudado e, a partir destes valores, calculada a média mensal (TEm) para cada horário de leitura:

em que TEh é o valor de TE de cada dia no horário indicado h; e n é o número de dias da série considerada.

Os resultados foram avaliados por meio dos desvios padrão do índice TE para cada horário de leitura, do porcentual de dias com valores de TE≤18,9 e ≥25,6 e de tabelas de frequência de TE, em dias, com intervalos de classe de 3,35 unidades.

RESULTADOS E DISCUSSÃO:

Na tabela 1, estão apresentadas as estatísticas descritivas das variáveis utilizadas. Constata-se que as temperaturas médias do ar (termômetro de bulbo seco) nos meses mais quentes do ano encontram-se em condições de conforto às 9h e 21h e, nos meses frios, às 15h. Pelos resultados do desvio padrão e o coeficiente de variação, observa-se que, nos meses mais frios do ano, a variabilidade das temperaturas médias mensais é maior do que nos meses mais quentes.

Tabela 1:
Médias mensais e anuais das temperaturas observadas no termômetro de bulbo seco e úmido e das temperaturas máximas e mínimas para Santa Maria, RS, período 1969 a 2011.

Em termos médios, às 9h é o horário de maior desconforto, tanto em valores como em duração ao longo do ano, em comparação às 15h e às 21h (Figura 1). No horário das15h, com exceção de junho, julho e agosto, em todos os outros meses, os valores de TE permanecem entre os limites de 18,9 e 25,6. É o horário de maior conforto, tanto em magnitude como em número de meses ao longo do ano. No horário das 21h, os valores de TE são intermediários entre aqueles das 9h e das15h, pois, nesse horário, ocorre o resfriamento da superfície.

Figura 1:
Médias mensais do índice de Temperatura Efetiva (TE) de THOM (1959), calculadas a partir das temperaturas diárias do ar das 9h, 15h e 21h e limite inferior e superior da faixa de conforto, do período de observação de janeiro de 1969 a dezembro de 2011. Santa Maria, RS, 2012.

No horário das 15h, somente em janeiro, ocorre desconforto por temperaturas elevadas (Figura 1). Entretanto, ao observar os valores do desvio padrão de TE (Tabela 2), sempre superiores a 2,0, o que indica grande variabilidade dos dados e, com as médias quase atingindo o limite de 25,6 TE, deduz-se que, não somente em janeiro, mas também nos meses de fevereiro, março e dezembro ocorrem condições de desconforto por calor excessivo com frequência.

Tabela 2
: Médias (md) e desvios padrão (s) mensais do índice de Temperatura Efetiva (TE) de THOM (1959), calculado para os horários das 9h, 15h e 21h, do período de observação de janeiro de 1969 a dezembro de 2011. Santa Maria, RS.

Nos três horários de observação da temperatura do ar, a variabilidade do índice TE é importante, sendo mais elevada nos meses mais frios do ano. O maior valor do desvio padrão de TE é 4,1 e ocorreu nos meses de junho e julho no horário das 9h e o menor, 1,8, no mês de janeiro, no horário das 21h. Isto é um indicativo de que ocorrem desvios de TE importantes em relação à média. Esses resultados estão coerentes com aquelas contidos na tabela 1.

Verificou-se que, em 25,9% dos dias não foi registrado desconforto térmico em nenhum dos três horários de observação e em 29,7% o desconforto foi observado num só horário, em 19,7% em dois horários e em 24,7% nos três horários. Dos dias em que houve desconforto térmico, em 52,2% delesocorreram às 9h, sendo que em 50,2% foi por temperatura baixa e em 2,0% por temperatura alta; em 45,7% deles, houve desconforto às 15 horas, sendo 24,8% por temperatura baixa e 20,9% por temperatura alta; e 21 horas em 45,2% dos dias, sendo 42,5% por temperatura baixa e 2,7% por temperatura alta. Constatou-se, ainda, que, em 78 dias, ou seja, em 0,5% dos dias, ocorreu desconforto por temperatura baixa às 9h e por temperatura alta às 15h no mesmo dia (entrada de uma massa de ar quente) e, em 5 dias (0,03%), por temperatura alta às 15h e por temperatura baixa às 21h (entrada de uma frente fria). O período de observação dos dados utilizados foi de 15.705 dias.

Ao se avaliar os porcentuais médios do número de dias com condições de conforto e desconforto térmico para cada mês (Figura 2), calculados a partir dos valores diários de TE, verifica-se que às 9h a frequência de dias com desconforto por valores de TE≤18,9 é mínimanos meses estivais (dezembro, janeiro e fevereiro), entre 5% e 10%, e máximos nos meses invernais (junho, julho e agosto), entre 85% a 90% dos dias;às 15h ocorrem somente de março a novembro, sendo máximo em julho (em torno de 65% dos dias); às 21h os resultados são semelhantes àqueles das 9h: tem frequência mínima em dezembro, janeiro e fevereiro (3% a 5% dos dias) e máxima em junho a agosto (80% a 90% dos dias)

Figura 2
: Percentagem médiamensal do número de dias com condições de desconforto térmico por alta e por baixa temperatura separadamente às 9h (a), 15h (b) e 21h (c), calculados a partir dos valores diários do índice de Temperatura Efetiva (TE≤18,9 e TE≥25,6), e porcentual do número de dias (d) com condições de desconforto, tanto por baixa como por alta temperatura (TE≤18,9 e/ou TE≥25,6.

Valores de TE≥25,6, às 9h, são mais frequentes nos meses estivais (em torno de 8% dos dias), enquanto que, de abril a outubro, não ocorrem ou ocorre um valor próximo de 0%; às 15h, ocorrem predominantemente nos meses estivais (em torno de 55% dos dias) e são menos frequentes nos meses invernais (aproximadamente 3% dos dias); enquanto que às 21h a frequência é mais elevada nos meses estivais (8% a 10% dos dias) e, de abril a outubro, praticamente não ocorrem. A maior frequência de dias em que o desconforto ocorre em pelo menos um horário e, também, a maior variação ao longo do ano (Figura 2d), ocorre no horário das 9h, com valores máximos nos meses mais frios do ano e mínimos nos meses de verão. A menor variação de frequência mensal ocorre no horário das 15h.

Pelos resultados apresentados, constata-se que, em Santa Maria, os valores de TE têm importantes variações ao longo do dia, podendo passar das condições de desconforto pela manhã para o conforto à tarde e, novamente para condições de desconforto à noite, nos meses mais frios do ano e, do conforto pela manhã ao desconforto à tarde e novamente ao conforto à noite, nos meses mais quentes do ano. Isto pode ser percebido pela análise dos dados da amplitude térmica diária (Figura 3), em que se verificam amplitudes diárias de até 24,0°C. As maiores frequências, em número de dias, ocorrem no intervalo de amplitudes térmicas diárias de 9,1ºC a 12,0°C. As frequências também são elevadas nos intervalos de 6,1ºC a 9,0ºC e 12,1°C a 15ºC. Assim, as pessoas que exercem atividades no ambiente natural, nestas condições de variações térmicas, devem prevenir-se, principalmente com vestimenta apropriada, para não expor o seu corpo às intempéries, ocorrendo o risco de serem acometidas por doenças (LANDSBERG, 1979LANDSBERG, H.E. El tiempo y la salud. Buenos Aires: Editorial Universitária de Buenos Aires, 1979. 175p.; IIDA, 2005IIDA. I. Ergonomia: projeto e construção ou produção. 2.ed. São Paulo: Blücher, 2005. 614p. ).

Figura 3
: Frequência do número de dias ao longo do ano (%) com diferentes valores de amplitude térmica (a) e de Temperatura Efetiva (TE) no horário das 9h (b), 15h (c) e 21h (d) para Santa Maria, RS, no período de observação de 1969 a 2011. Santa Maria, 2012.

Na figura 3, são representadas as frequências de dias com diferentes valores de TE, com intervalos de classe de 3,35. A maior frequência nos horários das 9h e 21h se situa nos intervalos de 18,9 a 22,3 e, no horário das 15h, no intervalo de 22,3 a 25,6. As menores frequências estão representadas nos intervalos de 2,2 a 5,5 para as 9h e de 5,5 a 8,9 para as 15h e 21h. Constata-se, assim, que a classe com maior frequência de dias, para todos os horários de observação, ocorre na faixa de conforto.

Os resultados obtidos neste trabalho são representativos principalmente da área do município de Santa Maria, localizada na Depressão Central, e não daquela do Rebordo do Planalto e do Planalto, com altitude superior a 200m. É importante, ainda, considerar que para esses resultados supõem-secondições ambientaisde vento calmo, em torno de 0,2m s-1 e atividade corporal leve (GRANDJEAN, 1998GRANDJEAN, E. Manual de ergonomia: adaptando o trabalho ao homem. 4.ed. Porto Alegre: Artes Médicas. 1998. 338p.; IIDA, 2005IIDA. I. Ergonomia: projeto e construção ou produção. 2.ed. São Paulo: Blücher, 2005. 614p. ). Por exemplo, com vento de 1,0m s-1 a zona de conforto poderá variar em torno de 1,5 TE e, com vento de 3,0m s-1, cerca de 3,0 TE (LANDSBERG, 1979LANDSBERG, H.E. El tiempo y la salud. Buenos Aires: Editorial Universitária de Buenos Aires, 1979. 175p.). Com o aumento do esforço físico, também as condições de conforto se alteram: a temperatura ambiente recomendada para as condições de trabalho leve e o indivíduo sentado é de 19,0°C e de trabalho muito pesado, de 15 a 16ºC (GRANDJEAN, 1998GRANDJEAN, E. Manual de ergonomia: adaptando o trabalho ao homem. 4.ed. Porto Alegre: Artes Médicas. 1998. 338p.). Os limites de conforto usados neste estudo foram determinados para os Estados Unidos. É importante determinar quais são os limites térmicos mais adequados para as pessoas que habitam o estado Rio Grande do Sul, pois isto pode variar com as condições da região geográfica. Foi constado, para as pessoas que habitam o norte da Finlândia, que esses limites são de 14,3ºC a 17,3ºC e, em Atenas, de 22,7ºC a 25,7ºC (KEATINGE et al., 2000KEATINGE, W.R. et al. Heat related mortality in warm and cold regions of Europe: observational study. British Medical Journal, v.321, p.670-673, 2000. Disponível em: <http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC27480/>. Acesso em: 15 ago. 2014.
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).

Entende-se que os limites da zona de conforto, aqui representados pelos resultados obtidos com a utilização do método de THOM (1959)THOM, E.C. The discomfort index. Weatherwise, v.12, n.1, p.57-60, 1959., referem-se às reações médias de um grande grupo de pessoas, pois cada indivíduo tem um conceito diferente do que é conforto: crianças e anciões necessitam de uma faixa de conforto mais estreita do que adultos jovens; o estado de nutrição, a saúde, o sedentarismo, a alta atividade metabólica e a obesidade também são fatores que atuam na sensação de conforto (LANDSBERG, 1979LANDSBERG, H.E. El tiempo y la salud. Buenos Aires: Editorial Universitária de Buenos Aires, 1979. 175p.). Além disso, em ambiente aberto, o desconforto por frio pode ser facilmente contornado com o uso de vestimentas apropriadas, o que não é possível quando ocorre desconforto por calor.

CONCLUSÃO:

Em termos médios, em Santa Maria, RS, o desconforto por temperaturas baixas ocorre nas manhãs (9h), nos sete meses mais frios do ano (de abril a outubro), à noite (21h), nos cinco meses mais frios do ano (de maio a setembro), e à tarde (15h), nos três meses mais frios do ano (junho a agosto); por temperaturas elevadas, à tarde (15h), no mês mais quente do ano (janeiro). A variabilidade dos valores médios mensais do índice de temperatura efetiva é elevada, ocorrendo, assim, em qualquer época do ano, desvios importantes em relação aos valores médios e, em função da elevada amplitude térmica diária, num mesmo dia, podem ocorrer momentos com condições térmicas de conforto, passando a condições de desconforto e, novamente, a condições de conforto ou vice-versa.

AGRADECIMENTOS

Trabalho realizado com recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Vagner Cazorla Bressan- Bolsista de Iniciação Científica.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2015

Histórico

  • Recebido
    18 Nov 2013
  • Aceito
    19 Jun 2014
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