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Propagação de Thunbergia mysorensis (Wight) por estaquia

Thunbergia mysorensis (Wight) propagation by cutting stem

Resumos

A estaquia é um método muito eficiente de propagação de plantas. Objetivando avaliar o efeito da época de coleta do material (verão e primavera) e concentrações de ácido indolbutírico (AIB: 0; 1500; 3000; 6000mg L-1) no enraizamento de estacas de Thunbergia mysorensis, foram coletadas estacas com dois nós e um par de folhas desenvolvidas, sendo a base destas imersa por 10 segundos nos tratamentos, procedendo-se à imediata estaquia em bandejas com substrato casca de arroz carbonizada, as quais foram mantidas em casa de vegetação com nebulização intermitente. O delineamento foi em blocos ao acaso, com quatro repetições de nove (Verão) e doze (Primavera) estacas por parcela. Os resultados demonstram que a melhor época para o enraizamento é na primavera e que, em ambas as épocas, as concentrações de AIB não influenciaram o percentual de enraizamento. Entretanto, para a primavera, houve um acréscimo do volume de raízes formadas na maior dose de AIB.

produção de mudas; floricultura; enraizamento; AIB.


Cutting stem is a very efficient method of plant propagation. With the objective of evaluating the effect of timing of sample collection (spring and summer) and concentrations of indole-3-butyric acid (IBA: 0; 1500; 3000; and 6000mg L-1) on rooting, cuttings of Thunbergia mysorensis were collected with two nodes and a pair of leaves. Treatments with growth regulator were applied by immersion of the base of the cuttings for 10 seconds, proceeding the cutting in cell trays with substrate of rice hulls carbonized, which were kept in a greenhouse under intermittent mist. The experimental design was a randomized block with four repetitions and nine cuttings per share to summer and twelve for spring. The results show that the best time for rooting is in the spring. IBA concentrations did not influence rooting percentage, however for spring there, was an increase in the volume of roots formed.

scion production; floriculture; cutting stem; IBA.


O sapatinho-de-judia [Thunbergia mysorensis (Wight)] é uma Acanthaceae, originária da Índia. É uma liana volúvel, com inflorescências longas e pendentes de flores com sépalas de cor vermelho intenso e pétalas amarelas, com manchas nas bordas da mesma cor. Por sua grande beleza, muito atrativa inclusive aos pássaros, e seu hábito de crescimento, é uma planta ideal para cobertura de pergolados, os quais devem ser altos, permitindo que as inflorescências possam ficar livres e penduradas (LORENZI & SOUZA, 2008LORENZI, H.; SOUZA, H.M. de. Plantas ornamentais no brasil; arbustivas, herbáceas e trepadeiras. 4.ed. Nova Odessa-SP: Instituto Plantarum, 2008. 1120p.).

Apesar de possuir elevado potencial ornamental, a utilização de sapatinho-de-judia é pouco expressiva, pela indisponibilidade de mudas nos pontos de comercialização e pela baixa publicidade entre o mercado consumidor. Não existem estudos científicos sobre a produção de mudas dessa espécie. Portanto, o presente estudo teve por objetivo avaliar os efeitos de diferentes concentrações de AIB no enraizamento de estacas herbáceas, de sapatinho-de-judia em casa de vegetação, em duas épocas de coleta.

A pesquisa foi conduzida no Laboratório de Biotecnologia em Horticultura do Departamento de Horticultura e Silvicultura da Faculdade de Agronomia da UFRGS, em Porto Alegre-RS. O material vegetal foi coletado de matrizes adultas, com aproximadamente quatro anos, de um pergolado do Hotel Vila Ventura, em Viamão-RS, no dia da instalação de cada experimento. As plantas estavam floridas nas datas das coletas. O experimento foi conduzido em duas épocas, "Verão", de 21/01 a 16/03/2010 (plantas com muitas brotações jovens e em final de floração) e "Primavera", de 02/12/10 a 25/01/2011 (plantas em início para meados da floração).

Estacas herbáceas de posição intermediárias dos ramos foram preparadas, de forma a conterem dois nós e um par de folhas apicais desenvolvidas. No nó basal, foi realizado um corte em bisel, expondo o tecido do câmbio e, no apical, as folhas foram cortadas ao meio. O tamanho das estacas variou de 8 a 15cm de comprimento, uniformizadas de acordo com seu comprimento e utilizadas em diferentes blocos. As estacas foram mantidas imersas em água limpa até a aplicação dos tratamentos, evitando o ressecamento do tecido exposto pelo corte.

Os tratamentos foram aplicados por imersão da base das estacas, por 10 segundos, em: 0; 1500; 3000; e 6000mg L-1 de AIB em solução de etanol 48%. Imediatamente após a aplicação dos tratamentos, foi realizada a estaquia, em bandejas com células de 90 cm3 cada, com substrato de casca de arroz carbonizada umedecida. As bandejas foram mantidas em casa de vegetação, com irrigação intermitente por nebulização, mantendo a umidade relativa do ar no ambiente em torno de 80%.

O delineamento experimental foi de blocos ao acaso, utilizando o comprimento das estacas como fator bloqueado, com quatro repetições e nove estacas por parcela para Verão e 12 para Primavera. Ao final do período, foi avaliado o percentual de: folhas restantes das folhas originais no momento da estaquia (%FR); estacas enraizadas (%EE), e, por estaca enraizada, a média de: volume de raízes (VR); número de raízes (NR); a massa da matéria seca de raízes (MSR) e brotações (MSB) e a massa da matéria seca média por raiz (MSMR). A contagem de NR foi realizada somente na época Primavera, possibilitando o cálculo da MSMR somente nessa mesma época. Os dados volumétricos foram mensurados em proveta, os de massa em balança de precisão e os de comprimento com régua.

Os resultados foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Tukey em nível de 5% de probabilidade de erro ou pela análise de regressão linear. Ainda foi realizada análise de correlação de Pearson entre as variáveis.

Em ambas as épocas, as concentrações de AIB não influenciaram o percentual de enraizamento (Tabela 1), sendo que, na primavera, este foi, em média, de 96%, bem superior ao período de verão (52%). HUSSEIN (2008HUSSEIN, M.M.M. Studies on the rooting and the consequent plant growth on the stem cuttings of Thunbergia grandiflora, (Roxb ex Rottl.) Roxb: 1- Effect of different planting dates. World Journal Of Agricultural Sciences, v.4, n.2, p.125-132, 2008. Disponível em: <http://www.idosi.org/wjas/wjas4%282%29/1.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2015.
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), avaliando épocas de estaquia de Thunbergia grandiflora obteve o melhor percentual de enraizamento quando a estaquia foi realizada no início da primavera. Este autor também verificou que o menor percentual de enraizamento ocorreu na época Verão, mostrando que as reservas de carboidratos nas estacas em cada época foram diretamente proporcionais ao resultado obtido no enraizamento.

Tabela 1:
Percentual de estacas enraizadas (%EE), volume de raízes por estaca enraizada (VR), matéria seca média de raízes por estaca enraizada (MSR), matéria seca média de brotações por estaca enraizada (MSB) e percentual de folhas restantes (%FR) em estacas de Thunbergia mysorensis, coletadas em duas estações (Verão e Primavera) e tratadas com 0, 1500, 3000 e 6000mg L-1 de ácido indolbutírico (AIB). Faculdade de Agronomia/UFRGS, Porto Alegre, 2010/11.

Ocorreu elevada correlação, para época Verão, entre o percentual de estacas enraizadas (%EE) e o percentual de folhas restantes (%FR) (r=0,89), demonstrando que a permanência das folhas durante o enraizamento é um fator importante, visto que são órgãos produtores de auxinas, receptores de luz solar e produtores e armazenadores de carboidratos (TAIZ & ZEIGER, 2004TAIZ, L.; ZEIGER, E. Fisiologia vegetal. 3.ed. Porto Alegre: Artmed, 2004. 719p.) e, para este caso em particular, a permanência das folhas nas estacas se demonstrou ainda mais importante quando as estacas foram coletadas em uma época menos favorável ao enraizamento (Verão). Na época Primavera, a correlação entre %EE e %FR não foi significativa, possivelmente pelo %EE ter sido muito próximo entre todos os tratamentos, aliado a uma queda das folhas pouco expressiva (apenas 33%). A presença de folhas nas estacas também foi importante no enraizamento de estacas de pingo-de-ouro (Duranta repens L.), segundo AMARAL et al. (2012AMARAL, G.C. et al. Produção de mudas de Duranta repens L. pelo processo de estaquia. Revista de Ciências Agrárias, v.35, n.1, p.134-142, 2012. Disponível em <http://www.scielo.mec.pt/pdf/rca/v35n1/v35n1a13.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2015.
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).

A correlação na época Verão entre massa da matéria seca média de brotações (MSB) e volume de raízes (VR) foi de 0,94, e entre MSB e massa da matéria seca média de raízes (MSR) de 0,74, sugerindo que, após o início do enraizamento, as estacas iniciam a absorção de água e algum nutriente do substrato pelas raízes, subsidiando o desenvolvimento de brotações aliado ao crescimento das raízes, visto que, quanto maior a quantidade de raízes, maior foi a quantidade de brotações.

Unindo-se os dados das duas épocas e eliminando-se o efeito de concentração e de bloco, obteve-se elevada correlação residual entre VR e MSR (r=0,90 e P<0,0001), como já era esperado, proporcionando a conclusão de que é ambíguo determinar volume e matéria seca de raízes (elevada associação linear), permitindo, para experimentos futuros, medir ou somente volume, ou somente MSR, optando entre o menos oneroso.

Para as estacas coletadas no Verão, não ocorreu diferença significativa entre as concentrações de AIB para o percentual de folhas restantes e enraizamento, bem como para o volume de raízes, matéria seca de raízes e matéria seca de brotações (Tabela 1). O percentual de retenção de folhas, característica desejável conforme explicitado por TAIZ & ZEIGER (2004TAIZ, L.; ZEIGER, E. Fisiologia vegetal. 3.ed. Porto Alegre: Artmed, 2004. 719p.), manteve-se em 47%. O desenvolvimento radicial foi de 1,5mL de raízes por estaca com massa da matéria seca de 0,079 g.

Para as estacas coletadas na Primavera, o número de raízes (NR) e a massa da matéria seca média por raiz (MSMR) foram significativos e lineares, apresentando um incremento de 0,84 raízes EE-1 e um decréscimo de 0,002g raiz-1 (Figura 1) para cada aumento de 1000mg L-1 na concentração de AIB utilizada, ou seja, o AIB fez as raízes aumentarem em número e diminuírem em espessura, o que é muito importante, visto que aumenta a área superficial radicial e, concomitantemente, a capacidade de absorção de água e nutrientes pela muda. O volume de raízes (VR) foi superior quando foi utilizada a concentração de 6000mg L-1(Tabela 1), entretanto não houve diferença significativa entre os tratamentos no percentual de folhas restantes (FR), percentual de estacas enraizadas (%EE), matéria seca de raízes (MSR) e de brotações (MSB).

Figura 1:
Número médio de raízes por estaca enraizada (NR) e matéria seca média por raiz (MSMR) em estacas de Thunbergia mysorensis, coletadas na Primavera e tratadas com 0, 1,5, 3 e 6mg L-1 de ácido indolbutírico (AIB). Faculdade de Agronomia/UFRGS, Porto Alegre, 2010/11.

Não ocorreu efeito tóxico pelo AIB nas concentrações utilizadas. A toxicidade é facilmente observada pela redução acentuada no enraizamento ou morte das estacas com o aumento da concentração do enraizador, a exemplo do encontrado por PIVETTA et al. (2012PIVETTA, K.F.L. et al. Época de coleta e ácido indolbutírico no enraizamento de estacas de espirradeira (Nerium oleander L.). Revista Árvore, v.36, n.1, p.17-23, 2012. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/rarv/v36n1/a03v36n1.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2015. doi: 10.1590/S0100-67622012000100003.
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) em espirradeira, em que as maiores doses testadas inibiram o número e comprimento das raízes. Estacas possuem naturalmente uma certa quantidade endógena de hormônios, que podem promover ou inibir o enraizamento. O fornecimento exógeno atua neste balanço, favorecendo ou não o enraizamento (RAMOS et al., 2003RAMOS, J.D. et al. Enraizamento de estacas herbáceas de 'Mirabolano' (Prunus cerasifera Ehrn) em diferentes substratos e concentrações de ácido indolbutírico. Revista Brasileira de Fruticultura, v.25, p.189-191, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbf/v25n1/a53v25n1.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2015.
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), porém, essa associação não é possível neste estudo por não ter sido realizada avaliação quantitativa de hormônios endógenos nas estacas. Casa de vegetação com sistema para manter elevada a umidade do ar é um fator ambiental positivo ao enraizamento, proporcionando a produção de mudas mesmo em períodos desfavoráveis e com baixa umidade do ar externo à sala. Não ocorreram problemas relacionados ao excesso de umidade, possivelmente pela adequação de um substrato, com elevado espaço de aeração, ao ambiente, possibilitando uma boa drenagem do excesso de água e apropriado suprimento de oxigênio às raízes, fundamental às mudas (KÄMPF, 2005KÄMPF, A.N. Produção comercial de plantas ornamentais. 2.ed. Guaíba: Agropecuária, 2005. 256p.).

AGRADECIMENTOS

Ao Hotel Vila Ventura Ltda., pela permissão de coleta do material propagativo para o desenvolvimento da pesquisa. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

  • AMARAL, G.C. et al. Produção de mudas de Duranta repens L. pelo processo de estaquia. Revista de Ciências Agrárias, v.35, n.1, p.134-142, 2012. Disponível em <http://www.scielo.mec.pt/pdf/rca/v35n1/v35n1a13.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2015.
    » http://www.scielo.mec.pt/pdf/rca/v35n1/v35n1a13.pdf
  • HUSSEIN, M.M.M. Studies on the rooting and the consequent plant growth on the stem cuttings of Thunbergia grandiflora, (Roxb ex Rottl.) Roxb: 1- Effect of different planting dates. World Journal Of Agricultural Sciences, v.4, n.2, p.125-132, 2008. Disponível em: <http://www.idosi.org/wjas/wjas4%282%29/1.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2015.
    » http://www.idosi.org/wjas/wjas4%282%29/1.pdf
  • KÄMPF, A.N. Produção comercial de plantas ornamentais. 2.ed. Guaíba: Agropecuária, 2005. 256p.
  • LORENZI, H.; SOUZA, H.M. de. Plantas ornamentais no brasil; arbustivas, herbáceas e trepadeiras. 4.ed. Nova Odessa-SP: Instituto Plantarum, 2008. 1120p.
  • PIVETTA, K.F.L. et al. Época de coleta e ácido indolbutírico no enraizamento de estacas de espirradeira (Nerium oleander L.). Revista Árvore, v.36, n.1, p.17-23, 2012. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/rarv/v36n1/a03v36n1.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2015. doi: 10.1590/S0100-67622012000100003.
    » https://doi.org/10.1590/S0100-67622012000100003.» http://www.scielo.br/pdf/rarv/v36n1/a03v36n1.pdf
  • RAMOS, J.D. et al. Enraizamento de estacas herbáceas de 'Mirabolano' (Prunus cerasifera Ehrn) em diferentes substratos e concentrações de ácido indolbutírico. Revista Brasileira de Fruticultura, v.25, p.189-191, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbf/v25n1/a53v25n1.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2015.
    » http://www.scielo.br/pdf/rbf/v25n1/a53v25n1.pdf
  • TAIZ, L.; ZEIGER, E. Fisiologia vegetal. 3.ed. Porto Alegre: Artmed, 2004. 719p.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jun 2015
  • Data do Fascículo
    Ago 2015

Histórico

  • Recebido
    16 Maio 2014
  • Aceito
    13 Jan 2015
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