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Professores da habilitação de magistério de 2º grau: dados pessoais e relações com o processo educativo

Resumos

O artigo relata parte de estudo desenvolvido junto ao Núcleo de Ensino de Araraquara para caracterizar o professorado que atua em cursos de Magistério (antigo Normal). Por meio de questionários foram obtidas e analisadas informações relativas a sexo, idade, estado civil, experiências anteriores e responsabilidade pelo sustento da família. A análise focaliza relações com o processo educativo, com outros estudos e com aspectos extra-escolares.

Professores; características pessoais; relações com o processo educativo


This article presents some results of a study developed at Núcleo de Ensino, in Araraquara, SP, Brazil with the aim of characterizing the teachers that are working at high school courses for teachers education. Information was obtained by means of questionnaires and the results about sex, age, civil status, previous experience and responsability for family's maintenance iowere analysed. The analysis focuses the relations of these characteristics with the educacional process, with ottsher similar studies and whith features external to school.

Teachers; personal characteristics; relations with educational process


Professores da habilitação de magistério de 2º grau: dados pessoais e relações com o processo educativo

Alda Junqueira Marin

Faculdade de Ciências e Letras/UNESP/Campus de Araraquara

RESUMO

O artigo relata parte de estudo desenvolvido junto ao Núcleo de Ensino de Araraquara para caracterizar o professorado que atua em cursos de Magistério (antigo Normal). Por meio de questionários foram obtidas e analisadas informações relativas a sexo, idade, estado civil, experiências anteriores e responsabilidade pelo sustento da família. A análise focaliza relações com o processo educativo, com outros estudos e com aspectos extra-escolares.

Palavras Chave: Professores; características pessoais; relações com o processo educativo.

ABSTRACT

This article presents some results of a study developed at Núcleo de Ensino, in Araraquara, SP, Brazil with the aim of characterizing the teachers that are working at high school courses for teachers education. Information was obtained by means of questionnaires and the results about sex, age, civil status, previous experience and responsability for family's maintenance iowere analysed. The analysis focuses the relations of these characteristics with the educacional process, with ottsher similar studies and whith features external to school.

Key Words: Teachers; personal characteristics; relations with educational process.

ORIGEM DESTE ESTUDO

Os estudos sobre os professores da escola pública de 1º e 2º graus decorreram de uma grande questão, colocada pelos Núcleos de Ensino1 1 Os Núcleos de Ensino da Universidade Estadual Paulista (UNESP) são instâncias criadas em diversos campi no estado de São Paulo, a partir de 1987, para realização de estudos e pesquisas sobre educação escolar em sistema de parceria entre professores e alunos da universidade e profissionais da rede pública de educação. ao iniciar as atividades por volta de 1987/1988. Não sabíamos responder, com segurança e objetividade, quem eram (e são) os professores que trabalham na rede pública.

Havia todo tipo de especulações e impressões. Buscadas informações junto a órgãos oficiais da Secretaria da Educação, não encontramos dados mínimos, como, por exemplo, quantos eram os professores que atuavam nas séries finais do 1º grau e/ou no 2º grau; como se distribuíam pelas escolas; qual sua situação funcional.

Buscando também informações em instituições de pesquisa e publicações, foram identificados alguns dados, mas esparsos, ou de décadas anteriores, considerados insuficientes para os nossos propósitos.

Diante do vácuo de dados, recentemente também apontado por NEUBAUER DA SILVA (1992) - dados considerados imprescindíveis para elaboração de projetos de investigação que envolvessem, seriamente e de forma sistemática, os professores da rede pública - decidiu-se pela sistematização de trabalho com base empírica, buscando as informações junto ao professorado.

Assim, delimitou-se com clareza um problema a ser focalizado, com dupla conotação. Por um lado, em sua conotação teórico-prática se evidenciou a necessidade da compreensão sobre quem são os professores, quais suas reais condições de vida pessoal, quais as condições em que realizam seu trabalho, e quais as condições de formação, pois são alguns dos elementos -isoladamente ou interrelacionados - fortemente determinantes da qualidade do trabalho educativo que realizam. E estamos sempre na condição de saber muito pouco sobre tais aspectos, tornando-se difícil saber onde estão os "reais nós" para implantar e implementar medidas para a melhoria da qualidade de ensino, por tratarmos sempre com profissionais abstratos ou, então, caracterizados a partir de opiniões, impressões e informações fragmentadas.

Por outro lado, o problema orientador dos estudos tem relevância científica por sua característica de acrescer alguns conhecimentos à área educacional, preenchendo lacunas de informação, já apontadas, impeditivas ao avanço do conhecimento.

O objetivo geral do estudo, portanto, foi o de buscar informações para conhecer e compreender os professores. Houve grupos de pesquisadores interessados em conhecer e compreender os professores de diferentes níveis de escolaridade nos Núcleos de Ensino já referidos. No campus de Araraquara houve um grupo de pesquisa interessado pela Habilitação Específica de 2º grau para o Magistério. Seus objetivos específicos foram: obter informações pessoais sobre os professores, sua formação inicial e continuada e condições de trabalho com vistas a auxiliar os processos de transformação da escola.

2. TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

Dado o objetivo geral do estudo e o interesse pelo curso de Magistério, nossos sujeitos ficaram definidos: professores que estivessem ministrando aulas nos seis cursos de Magistério vinculados à Delegacia de Ensino de Araraquara, nos anos de 1987 e 1988, ou seja: Araraquara, Américo Brasiliense, Matão, Boa Esperança do Sul, Tabatinga e Rincão, este último mantido pela Prefeitura Municipal, enquanto os anteriores eram mantidos pelo estado.

Definiu-se, previamente, que a coleta de informações abrangeria, se possível, toda a população, até porque, pelo levantamento inicial, verificamos que o número não era tão elevado: 120 professores. Entretanto, ao final tivemos um retorno de 69%, totalizando 83 questionários respondidos, parcela considerada representativa, quer pelo índice, quer pela presença de todas as escolas e, ainda, por conter participação de professores que ministravam os diferentes componentes curriculares da HEM.

O material para o estudo, portanto, foi composto com as respostas aos questionários.

A decisão por instrumento de coleta de informações do tipo questionário foi decorrência de considerarmos necessário ter informações em elevada quantidade para algumas generalizações nos âmbitos locais, regionais ou mesmo estaduais, pois vários outros Núcleos de Ensino2 2 Nesse período fizeram levantamentos similares os Núcleos de Ensino de Botucatu, São Paulo, Rio Claro e Franca. estariam participando de levantamentos similares. O levantamento genérico, ou do tipo "survey", serviria para mapear a situação, ter banco de dados e apontar algumas hipóteses preliminares ou aproximativas desse universo, fornecendo, ainda, novas pistas para estudos mais especializados por meio de outras técnicas.

A realização do estudo implicou a decisão por vários procedimentos.

Alguns indicadores de impressões e informações iniciais forneceram as pistas para a elaboração do instrumento. Contatos iniciais com a rede estadual tinham fornecido indícios sobre número excessivo de horas de trabalho numa jornada estafante; poucas horas de estudo e preparo de aulas; presença de outras fontes de renda além do magistério, entre tantos pontos. A partir de tais indícios fizemos uma listagem de itens que deveriam ser abordados num questionário posteriormente construído com questões abertas e fechadas, estas com número variável de alternativas. Para a atividade de elaboração do questionário auxiliaram docentes dos vários Núcleos que se organizavam na época (Araraquara, Botucatu, Jaboticabal, Rio Claro e São José do Rio Preto), e os assessores da Reitoria que apoiavam a implantação dos Núcleos.

O questionário final resultou em três conjuntos de questões. O primeiro conjunto proporciona informações pessoais sobre o professor (sexo, idade, estado civil, ascendência étnica, principal responsabilidade pelo sustento da família). O segundo conjunto de informações se refere às várias facetas da formação do professor desde a escola básica até a educação continuada. O terceiro e último conjunto de informações fornece quadro referente às condições de trabalho na rede estadual (sua situação funcional, números, horas e períodos de trabalho, outras fontes de renda).

A coleta de informações teve duas etapas: uma ao final de 1988 e outra em 1989.

Ao final de 1988, primeira tentativa para essa coleta de informações, os questionários foram distribuídos a todos os professores que estavam trabalhando na região, por meio da Delegacia de Ensino, pois o Núcleo de Ensino contava com a participação de supervisores de ensino no projeto da HEM. Estes profissionais encaminharam os questionários aos diretores das escolas, os quais, por sua vez, deveriam distribuí-los aos professores. Como o índice de retorno foi muito baixo, e não houve participação de algumas escolas, o trabalho foi refeito em 1989 por outro procedimento. A forma de distribuição em 1989 foi direta nas escolas, com os questionários destinados nominalmente aos professores, acompanhados de esclarecimento verbal sobre o objetivo do estudo e a importância do retorno das informações para que pudéssemos saber quem eram os professores da HEM na região, assim como a importância desses dados no conjunto dos estudos que vinham sendo realizados sobre a escola pública. Para essa segunda etapa decidimos que os questionários daqueles professores participantes em 1988 deveriam ser aproveitados, quando continuassem lecionando na HEM.

Os procedimentos de análise foram de dois tipos. Um deles foi o tratamento quantitativo fornecendo tabelas, quadros e gráficos. Já as questões abertas propiciaram respostas diversas, originando a elaboração de categorias, que também foram passíveis de quantificação.

A análise mais qualitativa, segundo tipo de abordagem, se refere à exploração das respostas dadas às questões abertas e a certas interpretações com uso de referenciais teóricos selecionados na bibliografia, seja em artigos ou pesquisas sobre temática voltada a professores, seja em obras que tratam da atividade educativa, buscando estabelecer relações que enfatizem a perspectiva pedagógica.

3. RESULTADOS: QUEM SÃO OS PROFESSORES DO CURSO DE MAGISTÉRIO

Neste artigo estão apresentados apenas os resultados relativos aos dados pessoais dos professores. A opção por essa modalidade - ou seja, a de apresentar parte dos resultados - se deve ao fato de ser um estudo longo, e as revistas estarem restringindo os espaços. Outros artigos devem abordar as temáticas de formação dos professores e condições de trabalho.

O primeiro resultado verificado no estudo é o relativo ao sexo: 27% eram professores do sexo masculino e 73% eram do sexo feminino. O exame mais elementar desse resultado permite dizer que, ser professor no curso de Magistério, nessa região, ainda não se caracteriza como profissão feminina, embora se possa caminhar rapidamente, para tal situação (como nas séries iniciais do 1º grau, por exemplo) caso as atuais condições não sejam alteradas. Se tais alterações não ocorrerem, está, assim, caracterizada, na região, a feminização da ocupação de magistério conforme os conceitos usados por BRUSCHINI (1979) e BRUSCHINI e AMADO (1988), relativos à sexualização das profissões por força de fatores tais como desprestígio profissional, vieses salariais, insegurança da situação de trabalho.

Esse foco sobre trabalho feminino no magistério parece importante, e necessária a sua continuidade em estudos futuros, devido ao acompanhamento para verificar se ocorre o fechamento do ciclo de evolução apresentado por diversos estudos, como, por exemplo o de MADEIRA e SINGER (1975) que apontaram na direção da feminização durante o período de 1920 a 1970.

Outro aspecto a ser ressaltado nessa tendência é o de seu caráter irreversível, caso as condições permaneçam as mesmas, pois, dificilmente, haverá contingente masculino para assumir as tarefas educativas formais, aspecto não divisado para curto e médio prazo.

Essa configuração feminina crescente do corpo docente parece importante, de nossa perspectiva, pois tem relações pedagógicas sérias. É bastante diferente pensar na formação de crianças e adolescentes pelo contato com professores de ambos os sexos quando comparado ao trabalho educativo dos professores de apenas um sexo. Quando o corpo docente é formado por homens e mulheres, estão presentes na escola formas de conduta e visões de mundo diferenciadas: o dos professores e o das professoras. Numa escola, ou mesmo em um curso, onde haja ação apenas de mulheres há tão somente a perspectiva feminina, tolhendo contatos, prejudicando relacionamentos humanos variados, empobrecendo, pela não diversidade, a percepção de formas de pensar e agir diferenciados, interferindo na identidade que vai se formando nessas faixas etárias em que nossas crianças e adolescentes estão na escola básica.

Na faixa de escolaridade cujos professores são focalizados aqui, a situação não atingiu tais limites e, portanto, não se fechou o ciclo. Entretanto, os indicadores apontam para tal fechamento com generalização da tendência da feminização do magistério abrangendo amplas camadas da população atendida pela escola pública: o Recenseamento Demográfico de 1980 dá notícia de que 86,6% do professorado brasileiro é formado pelo sexo feminino bem como MONTEIRO et al (1988), confirmam 100% de "professoras alfabetizadoras" na região de Araraquara.

Somadas, tais particularidades e projeções nos permitem apontar um quadro em que, dentro de pouco tempo, a tarefa educativa - formal e básica informal - em nosso meio, deverá passar a ser eminentemente conduzida pelas mulheres. Quais as conseqüências dessa tendência? Consideramos que essa deva ser uma questão para futuras reflexões com destaque para os estudos de gênero, analisando o foco apontado, ou seja, os estudos do impacto de um processo educativo feminizado em que estejam envolvidas gerações de crianças e adolescentes e também estejam envolvidas gerações de "professoras", mães", "irmãs", "tias", avós" e "empregadas".

O segundo tipo de resultado obtido diz respeito à idade dos professores.

No Quadro 1 os professores estão quantificados segundo as faixas etárias em que foram classificados.


É interessante notar que a distribuição obtida no Quadro 1, quando configurada num gráfico, se aproxima, quantitativamente, de uma distribuição normal, com ligeiros acréscimos para as faixas etárias mais elevadas. Verifica-se, também, que não era uma população tão jovem, pois a mais alta proporção se dava na faixa de 31 a 45 anos; mas também desvanece a imagem romântica dos "velhos professores da Escola Normal", saudosamente apontada às vezes.

Tais percentuais, que coincidem com os da região de São Carlos em outros graus de ensino (PUCCI, OLIVEIRA e SGUISSARDI, 1991), permitem apontá-los como reflexos de medidas implementadas pelos governos na área da educação nos últimos anos. Uma das facetas de tais medidas se refere ao expansionismo da escolarização básica em décadas anteriores decorrentes de inúmeros fatores, alguns deles analisados por BARROSO (1981) e AZANHA (1987), quais sejam, o crescimento vegetativo, a migração, a urbanização, entre outros. Esta faceta - do expansionismo da escola básica até 8ª série - tem reflexos diretos sobre a expansão da escola de 2º grau, principalmente nos cursos de Magistério e dos cursos superiores, pois exigiu crescente número de professores para atuar nas séries iniciais (1ª a 4ª) e pré-escola, além de professores com curso superior para atuar no 2º grau.

É exatamente a faixa objeto de tal situação de demanda, ou seja, 31 a 45 anos, professores que se formaram e estão trabalhando hoje no 2º grau.

Ainda que a faixa de 31 a 45 anos seja a mais freqüente, não é desprezível o percentual de professores muito jovens trabalhando na Habilitação: 23% estavam na faixa de 18 a 30 anos. Analisada a distribuição desse percentual na região, verificou-se que o curso de Matão é o que possuía maior incidência de professores jovens: 7 entre 9 na faixa de 18 a 25 anos e 10 entre 18 se as faixas etárias abrangidas forem 18 a 30 anos.

Esses dados relativos à faixa etária permitem estabelecer algumas relações com o processo educativo. As avaliações feitas pelo grupo de auxiliares de pesquisa, sobretudo pelos alunos bolsistas, egressos de 2º grau, apontam insegurança perceptível dos professores recém saídos dos cursos superiores que atuam no âmbito da escola de 2º grau. Na perspectiva de tais alunos, se os professores mais velhos inovam pouco, mantendo trabalho inalterado em sua forma ao longo ao ano, contrabalançam sua atuação com a segurança e o domínio de todos os elementos de sua função. Parece, portanto, haver aí alguns ingredientes para novos estudos, importantes pistas, dadas as repercussões dessas perfomances sobre a futura atuação dos alunos de Magistério que estão em formação para lecionar na escola fundamental.

Com relação às características de ascendência étnica, verificamos a imensa maioria branca de professores. Uma análise mais qualitativa dos dados permitiu identificar, pelos sobrenomes, que tais docentes descendem de europeus (italianos, portugueses, espanhóis) e de diversos povos do Oriente Médio. Verifica-se ausência de bibliografia relativa a tais dados. Parece uma questão interessante para outros estudos investigando fatores relacionados sobretudo na vertente da ascendência de novas camadas da população ao magistério.

Outro lado interessante da vida dos professores é o relativo ao sustento da família: 68% não se responsabilizavam pelo sustento da família!

Esses dados podem ser enriquecidos quando analisados à luz de outras informações obtidas. Havia uma parcela de professores jovens, na faixa de 18 a 25 anos (11%) e solteiros (23%). São, portanto, profissionais que moravam com os pais ou não possuíam "família" para sustentar. Os que possuíam família para sustentar são todos os demais 67% casados, 7% desquitados e 3% viúvos.

Além disso, outra interessante associação de informações ocorre quando analisados os dados em função do sexo dos professores: dentre os 56, "não responsáveis pelo sustento da família" encontravam-se 8 homens (que podem ser os solteiros) e dentre os 26 "responsáveis pelo sustento da família" encontravam-se 12 mulheres!

Há, então, indícios de tendência apontando que as mulheres estão deixando de ser meras auxiliares nos orçamentos domésticos para assumir papéis econômicos mais delineados e fundamentais. Cabem, sobre esse item, outros levantamentos e exploração de hipóteses de estudo vinculados à condição feminina no mercado de trabalho educacional em suas relações com âmbito social mais geral.

A caracterização dos professores vai se complementando com os dados referentes ao tema das experiências anteriores, investigadas em dois sentidos: experiências docentes e não docentes.

Tínhamos interesse em saber quais as experiências já vividas pelos docentes, identificando a(s) disciplina(s) por ele ministrada(s) e qual o tempo de magistério da mesma. Deixamos para a resposta cinco espaços prévios, sem prejuízo de diversificação maior de respostas.

As informações obtidas revelaram um quadro bastante diversificado. Verificamos que, à medida que cresce o número de experiências diferentes no magistério vividas até o momento da investigação, o percentual de respostas decresce rapidamente: apenas quatro professores, dentre os 83, possuíam, naquele momento, cinco experiências diferenciadas para relatar.

Uma análise mais qualitativa das respostas permite compreender um pouco melhor a perspectiva da diferenciação do quadro geral. Nessa categoria de dados existiam situações de bastante heterogeneidade, como, por exemplo um professor com 2 meses de experiência em História, 3 meses em Didática e outro que lecionou Português, Matemática, Estudos Sociais, OSPB e Inglês.

Por outro lado, encontramos professores com história profissional muito homogênea: 20 anos de experiência em Educação Física ou experiências diferentes mas na mesma área do conhecimento, ou seja, Cálculo Diferencial e Integral, Cálculo Numérico e Análise Matemática.

Focalizando as experiências anteriores mencionadas pelos professores quanto aos graus de ensino, foram obtidas respostas que, também, permitem ao pesquisador dizer que existiam desde professores que trabalharam só no âmbito do curso de Magistério até professores que já haviam exercido a docência em pré-escola, 8ª série e HEM, ou, ainda, ensino superior, seguido de SENAC e HEM.

A variação de respostas obtidas sugere algumas reflexões e hipóteses. A primeira das interpretações diz respeito à relação com o mercado de trabalho flutuante. O campo profissional não é estável e os processos migratórios são constantes e muitas vezes interrelacionados. Esses dois fatores concorrem para essa situação de precariedade pois os professores não têm garantia em qual componente curricular trabalharão no ano seguinte e qual a sua situação social, nem mesmo sabendo se permanecem na mesma cidade. Se houvesse estabilidade maior desses dois elementos (oferta de aulas e possibilidade de fixação) talvez o número de alternativas arroladas fosse menor, e a disparidade também, com certos componentes diversificados ausentes nas experiências desses professores.

Tais circunstâncias criam as necessidades cotidianas de oferta e procura de profissionais. É em função desses aspectos, e também da difícil situação social e econômica vivida nos últimos anos, que é possível interpretar o fato de haver grande contingente dos professores vivendo a sua primeira experiência docente, ou com apenas uma experiência reduzida no magistério no momento da investigação. Parte dessa proporção pode ser atribuída ao contingente ingressante na profissão recentemente egresso de cursos superiores. Outra parte pode significar população economicamente ativa em reserva, ou em outros setores profissionais mobilizada para o magistério nesse momento de pauperização da população.

Tais dados têm significados importantes para a qualidade do curso de Magistério, seja pela parca "prática" dos novos profissionais, seja pela sua total ausência. Acresça-se, ainda, a possível defasagem dos que estão formados há algum tempo e só agora se dedicam à profissão, ou, ainda, a dificuldade de poder se aprofundar numa área específica, sem ficar alternando a responsabilidade por inúmeras disciplinas.

Sobre essa questão das experiências, que os professores trazem como bagagem ao exercício da sua função, há várias concepções norteando as discussões. Uma delas considera a prevalência da experiência, ou seja, a experiência é o elemento qualificador mais importante. Nesse sentido a idade aliada ao tempo de exercício no magistério comporiam condições ótimas para o desempenho da função. Outra faceta dessa concepção diz respeito às relações entre experiências docentes anteriores em classes de pré-escola e quatro séries da escola básica e o fato de atuarem em cursos que preparam o profissional para as faixas iniciais. De acordo com essa concepção, a experiência anterior em classes de ensino fundamental é fator de enriquecimento para o ensino no Magistério pelo fato de haver referência a situações vividas concretamente, estabelecendo conexões entre a teoria e a prática numa antecipação, aos alunos, desse modo de atuar. Se formos analisar os dados, de acordo com tal concepção, grande parte dos professores teriam dificuldade em estar estabelecendo tal conexão em suas aulas, pois, conforme os dados colhidos em alguns casos, tal experiência inexiste, ou então é reduzida.

Outra concepção é a de que a formação teórica básica obtida pelos professores nos cursos de formação inicial deve prevalecer no exercício do magistério. Nessa perspectiva a grande maioria dos professores estaria -pelo menos teoricamente - adequadamente preparada para as funções que vêm exercendo, pois as experiências anteriores não devem prevalecer e a exigência de formação em cursos específicos tem sido crescente. Esta formação garantiria as condições para o exercício da função docente.

Essa polêmica está a merecer mais aprofundados estudos e parece ser uma pista para identificação de importantes relações com o ensino e a sala de aula, incluindo dados empíricos de outra natureza, diferentes dos usados neste estudo.

Por outro lado, foi importante obtermos informações sobre as experiências não docentes desses professores pesquisados, conforme dados do Quadro 2.


É bastante expressivo o índice de professores sem experiências anteriores e em outros setores de atuação que não sejam os da educação: 84.4%. Por outro lado, dentre as poucas atividades ligadas à educação, as experiências citadas referem-se a atuações especializadas, tais como, orientação educacional, direção da escola ou auxiliar de direção.

Se quisermos discutir experiências profissionais não docentes, anteriores à do momento estudado, existem interessantes reflexões apresentadas por KAYE (1977). Esse autor considera grave limitação do processo educativo o fato de os professores e alunos participarem de um círculo fechado no circuito "escola - escola normal - escola" fator que contribui para o isolamento profissional e visão muito restrita do mundo do trabalho. Segundo tal estudioso a ausência de tais experiências não docentes reduz muito as possibilidades de estabelecer relações de ensino e aprendizagem mais estreitas e significativas no desempenho das funções docente-discente. Nessa perspectiva podem ficar bastante prejudicadas as adaptações curriculares ao universo de vida dos alunos, os quais contam exatamente com tais experiências, ou seja, do setor comercial, industrial e outras ocupações, pois o professor não possui ciados experienciais da mesma natureza a que possa recorrer, evidenciadas pelos dados do Quadro 2.

De todo modo parece que tais relações entre formação, experiências docentes e não docentes precisariam ser melhor estabelecidas por meio de estudos mais aprofundados para análise do impacto da atuação desses profissionais em sala de aula sobre a formação dos jovens e sua destinação profissional.

4. CONCLUINDO

Para todos os que se interessam por educação, acreditamos que os dados aqui apresentados já significam um acréscimo ao acervo das informações e perspectivas de desdobramentos gerando novos estudos.

Saber a proporção de professores do sexo masculino e feminino na região - aparentemente, um dado de pouca importância - já é fundamental em si mesmo, constituindo informação valiosa para o estudo das tendências reveladas. É evidente que não chegamos, ainda, ao extremo da feminização da educação apontada na análise. Penso, entretanto, que, ao estabelecer relações entre tais tendências e o processo educativo, este estudo contém reflexões que apontam para sérias questões a serem pesquisadas futuramente.

Da mesma forma foi possível saber, de maneira muito aproximada, a realidade do corpo docente nos cursos de Magistério, no que se refere às faixas etárias e indicadores relativos ao desempenho em sala de aula, antevendo necessidades de novos dados descritivos sobre a qualidade da formação proporcionada por eles nos cursos em que atuam, cursos terminais de 2º grau e profissionalizantes para a atuação de futuros professores na educação básica.

A terceira categoria de respostas obtidas, a da representação feita pelos professores sobre seu papel como membro não responsável pelo sustento das famílias, nos intriga. Do ponto de vista das relações com o processo educativo algumas questões podem ser levantadas, como por exemplo, a questão do auto desprestígio transmitido no cotidiano aos futuros professores e, ligada a essa, a questão da necessidade da educação continuada para elevar o grau de profissionalização pela percepção de seu papel financeiro na constelação familiar e na categoria docente.

Por outro lado, o quadro de referências apresentado pelos professores em relação às experiências anteriores demonstra situações extremas que requerem atenção tanto no que diz respeito a aspectos políticos e administrativos, por parte das autoridades do sistema escolar, como no que diz respeito a aspectos de sua educação continuada, pois a qualificação da escola básica passa pela qualificação de seu corpo docente e de seus formadores nos diversos âmbitos.

Para nós, e todos aqueles envolvidos diariamente com as questões da formação de professores, os elementos divulgados dessa parte do estudo permitem um patamar de crescente profissionalização ao possuirmos dados de pesquisa em que basear nossas ações educativas. As características, as dinâmicas e as tendências na composição da "clientela", principalmente para as ações de educação continuada, já são dados, de forma a não trabalharmos mais com os "achismos", e sim com respostas a reais necessidades, de forma a auxiliar o contínuo reequacionamento dos cursos, das escolas e seus sujeitos, que constróem dia-a-dia o processo educativo.

É a partir do uso dos dados sobre os professores, suas características concretas, que a perspectiva político social toma corpo para tratarmos de propostas pedagógicas e alterações substanciais do processo educativo de nossas escolas.

Obs.

Este texto foi escrito pela autora que o subscreve, mas ao longo de sua realização o estudo contou com diversos profissionais da universidade e da rede estadual de ensino, a saber: UNESP - Professoras Luciana Maria Giovanni (FCL), Marilda da Silva (FCL), Vera Tereza V. Gonçalves (FCL), Maria Lúcia Ribeiro (IQ); rede estadual - Marília Cimini Vannuchi e Neusa Carmona D'Andréa (supervisoras da Delegacia de Ensino) e os professores: Thereza Anália Cochar Magalhães, Ana Cristina Octaviano, Maria Ap. Boschi Ribeiro, Maria da Graça de Sá Loschiavo, Maria Elisabete T. Ranzani, Nilza Ap. Vicente de Mello, Terezinha Chediek, Valkíria M.C. da Silva Abruzio, Ana Maria Brandão, Luiz Gonzaga Manzine, Claire Ap. Sodré Cosma, Maria Cristina Senzi Zancul, José Luiz Pinto, Vânia C. de Araújo Pereira, Suzana Petlik, José Geraldo Fábio, Ruth CR. Drouet, Maria Ursulina R. Basaglia, Miriam A. Gomiero, Maria Luiza Benassi, Regina Célia F. Arena, Sebastião Luiz Sant'anna, Maria de Fátima Mapelli, Antônio Carlos Soares, Alfredo Giorbi, Célia Teixeira Marcoso, Maria Suely R. Moreira, Suely de F. Barbosa, Heloísa Helena Krespski, Eva Ap. Couto Lima, Eva Ap. Marchiorato, Maria José da S. Rocha. Contou, ainda, com as alunas bolsistas Mara Célia de Almeida e Karina Aparecida Doimo do curso de Pedagogia/UNESP/Campus de Araraquara.

  • APLLE, M. (1987) Relações de classe e de gênero e modificações no processo de trabalho docente. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, nş 60, p. 3-14.
  • AZANHA, J.M.P. (1987) Educação: alguns escritos. São Paulo, Editora Nacional.
  • BARROSO, C. (1981) Recentes mudanças demográficas: implicações educacionais. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n° 39, p. 32-34.
  • BRUSCHINI, M.C. (1979) Sexualização das ocupações: o caso brasileiro. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, nş 28, p. 5-20.
  • BRUSCHINI, MC. e AMADO, T. (1988) Estudo sobre mulher e educação: algumas sugestões sobre o magistério. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, nş 64, p. 4-13.
  • KAYE, B. (1977) Formação de professores: participação na aprendizagem (um relatório de experiências). Lisboa. Livros Horizonte.
  • MADEIRA, F.R. e SINGER, P. (1975) Estrutura do emprego e trabalho feminino no Brasil: 1920-1970. Cadernos Cebrap. São Paulo, (13).
  • MONTEIRO, D.C. (1988-1989) O ensino e o momento atual em Araraquara - Ciclo Básico à 4Ş série. Araraquara, FCL, Núcleo de Ensino, (mimeo).
  • NEUBAUER DA SILVA, T.R. (1992) e outros. Formação de Professores no Brasil: Um estudo analítico e bibliográfico. Brasilia. Seminário sobre Formação de Professores para Educação Básica, (mimeo).
  • PUCCI, B.; OLIVEIRA, N.R. e SGUISSARDI, V. (1991) "O processo de proletarização dos trabalhadores em educação". Teoria e Educação. Porto Alegre, nş 4, p. 91-108.
  • 1
    Os Núcleos de Ensino da Universidade Estadual Paulista (UNESP) são instâncias criadas em diversos campi no estado de São Paulo, a partir de 1987, para realização de estudos e pesquisas sobre educação escolar em sistema de parceria entre professores e alunos da universidade e profissionais da rede pública de educação.
  • 2
    Nesse período fizeram levantamentos similares os Núcleos de Ensino de Botucatu, São Paulo, Rio Claro e Franca.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Ago 1996
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