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Clínica psicológica do adolescente: do sistema à abordagem narrativista

Adolescent clinical approach: from systems to narratives

Resumos

O campo da Terapia Familiar Sistêmica tem demonstrado um interesse crescente pelos processos de construção de significado, sobretudo com o desenvolvimento das abordagens pós-modernas. O presente estudo resulta de um interesse por essa nova visão, tendo por objetivo discutir o processo de construção narrativa acerca do adolescente no contexto de terapia familiar. Para isso, descreve-se a evolução do pensamento cibernético chegando a duas vertentes teóricas contemporâneas: Construtivismo e Construcionismo Social. O estudo atenta para a importância das narrativas no contexto de terapia, não só como fonte de compreensão da realidade familiar, mas como uma desencadeadora do processo de mudança.

adolescência; narrativa; terapia familiar


The interest of Family Therapy in the process of meaning construction has been increasing, especially since the development of post-modern perspectives. The present study comes from an interest in those new views and aims at discussing the process of construction of narratives about the adolescent in the family therapy context. Thus, it describes the evolution of the cybernetic thought and makes reference to Constructivism and Social Constructionism. This study points to the importance of narratives in therapy context, not just as a source of information, but also as a starting-point of the process of change.

adolescence; narrative; family therapy


SECÇÃO TEÓRICO/METODOLÓGICA

Clínica psicológica do adolescente: do sistema à abordagem narrativista

Adolescent clinical approach: from systems to narratives

Flávio Lôbo GuimarãesI; Liana Fortunato CostaII

IInstituto de Medicina e Psicologia Integradas - Brasília

IIUniversidade Católica de Brasília

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Flávio Lobo Guimarães SHIS QI 15, conjunto 04, casa 05 Brasília, DF Cep 71635-240 E-mail flaviopsi@yahoo.com.br

RESUMO

O campo da Terapia Familiar Sistêmica tem demonstrado um interesse crescente pelos processos de construção de significado, sobretudo com o desenvolvimento das abordagens pós-modernas. O presente estudo resulta de um interesse por essa nova visão, tendo por objetivo discutir o processo de construção narrativa acerca do adolescente no contexto de terapia familiar. Para isso, descreve-se a evolução do pensamento cibernético chegando a duas vertentes teóricas contemporâneas: Construtivismo e Construcionismo Social. O estudo atenta para a importância das narrativas no contexto de terapia, não só como fonte de compreensão da realidade familiar, mas como uma desencadeadora do processo de mudança.

Palavras-chave: adolescência, narrativa, terapia familiar

ABSTRACT

The interest of Family Therapy in the process of meaning construction has been increasing, especially since the development of post-modern perspectives. The present study comes from an interest in those new views and aims at discussing the process of construction of narratives about the adolescent in the family therapy context. Thus, it describes the evolution of the cybernetic thought and makes reference to Constructivism and Social Constructionism. This study points to the importance of narratives in therapy context, not just as a source of information, but also as a starting-point of the process of change.

Key-words: adolescence, narrative, family therapy

Os autores, ao longo de sua experiência com atendimento familiar a adolescentes, vêm observando que as histórias contadas em família sobre eles, seja na sua apresentação ou nas narrativas acerca de seu comportamento, contêm uma importância significativa para a definição de quem são esses adolescentes. Sendo assim busca-se nesse texto apresentar a trajetória que os teóricos da Terapia Familiar vêm fazendo desde uma elaboração sobre a intervenção baseada nas mudanças operacionais das interações entre membros da família, até a presente preocupação com a escuta e interpretação hermenêutica das conversas que se passam no contexto terapêutico. Desse modo, procura-se apontar a importância que a abordagem narrativista pode ter na consideração da qualidade do diálogo estabelecido entre o adolescente e sua família, e de todos os membros dogrupo familiar entre si.

A Pós-Modernidade e a Nova Revolução Científica

O termo "Pós-Modernidade" tem sido utilizado para designar uma série de novas formulações no campo do conhecimento - algumas delas não tão novas, representando um ressurgimento de argumentos já utilizados por autores clássicos. O fato é que distintos autores e teorias têm se definido como pós-modernos, o que contribui para uma diversidade e heterogeneidade cada vez maiores sob a égide deste conceito.

Sem a pretensão de definir ou delimitar precisamente o que se situa dentro ou fora do campo circunscrito pelo referido conceito, pretende-se discutir a evolução de teorias centrais para a terapia familiar sistêmica, campo de atuação e produção de conhecimento profundamente imerso nessas novas questões. A discussão se inicia com a evolução da Cibernética, e dentro do cenário pós-moderno, serão vistos o Construtivismo e Construcionismo Social.

A Evolução da Cibernética

Dentro desse universo de revolução paradigmática, a Cibernética constitui uma disciplina que ocupou um lugar fundamental no que se refere ao campo da Psicologia. Ela impulsionou a Terapia Familiar nas décadas de 50 e 60, favorecendo o surgimento de conceitos que subverteram a forma de se pensar e fazer a clínica de famílias (Bloch & Rambo, 1998; Wittzaele & Garcia, 1998).

Em razão da imprecisão conceitual que envolve a Cibernética (Esteves de Vasconcellos, 1995), ressalta-se que no presente trabalho é adotada a terminologia utilizada por Sluzki (1987), entre outros (Grandesso, 2000; Seixas, 1992), que a dividem em dois grandes momentos: Cibernética de Primeira Ordem (subdividida em Primeira e Segunda Cibernética) e a Cibernética de Segunda Ordem.

2.1- Cibernética de Primeira Ordem

Wiener (1954) conta que derivou o termo cibernética da palavra grega "kybernetes", que significa 'piloto' e da qual é também derivada 'governador'. O autor define a Cibernética como a ciência da comunicação e do controle no ser humano e na máquina.

Ao se preocupar com os processos de comunicação e controle, a Cibernética realiza o primeiro grande salto conceitual, que consiste na mudança de um enfoque centrado em questões de matéria e energia1 1 A ênfase na matéria e na energia constitui uma herança da mecânica newtoniana, que influenciou a ciência como um todo. , para a ênfase nos processos de informação e organização (Grandesso, 2000), o que contribui para que terapeutas e pesquisadores voltem seus olhos para os fenômenos interpsíquicos, ampliando seu campo de análise: os indivíduos são vistos como parte de sistemas humanos, dotados de propriedades e funcionamento específicos; nesse contexto, a contribuição da Cibernética está na formulação do conceito de Circularidade, segundo a qual os "inúmeros elementos de um sistema são reciprocamente contingentes e influem nas condutas uns dos outros de uma maneira complexa" (Simon, Stierlin & Wynne, 1988, p.64).

Outro conceito utilizado para explicar o funcionamento dos sistemas é o de Entropia, que se refere ao grau de evolução de um sistema físico. De acordo com a 2ª Lei da Termodinâmica, a evolução está em estreita relação com o progresso da desordem. Assim, a entropia também pode ser interpretada como uma medida da desordem do sistema (Capra, 1982).

Na visão de Wiener (1954), Entropia e Circularidade se articulam de forma fundamental no funcionamento do organismo vivo e de algumas máquinas, que se dá por um esforço constante em dominar a entropia por meio da retroalimentação2 2 Ou realimentação (Wiener, 1954; Capra, 1982), ou retroação (Morin, 1999). . Pela captação de informação através de seus mecanismos perceptuais, os sistemas procuram corrigir o seu funcionamento em favor de uma meta específica, a homeostase.

A Primeira Cibernética, de início, centrou-se nos aspectos relacionados ao controle e à ordem. Para tanto, privilegiou o enfoque nos processos de correção dos desvios dos sistemas (redução da entropia). Seixas (1992) conta que "no primeiro ciclo, os investigadores se preocuparam por determinar como poderia manter-se a estabilidade de um sistema ou sua homeostase" (p.57).

Atentando para esta flexibilidade e adaptabilidade dos sistemas às mudanças em seu contexto, a ênfase da Segunda Cibernética recai sobre os processos de ampliação do desvio (incremento da entropia), centrando-se os pesquisadores nos mecanismos que poderiam favorecer a alteração nos sistemas. De acordo com Sluzki (1987), este período adota uma visão homeoDINÂMICA, em contraste com a homeoSTÁTICA anterior. O conceito de homeostase, central na epistemologia da Primeira Cibernética, foi definido como "o estado interno relativamente constante de um sistema que se mantém mediante a autorregulação" (Simon, Stierlin & Wynne, 1988, p. 188). Portanto, a mudança enfocada neste período não se limita ao aspecto quantitativo. Ao contrário, sob a atenção dos pesquisadores ela é justamente aquela que contribui para instalar uma nova estrutura no sistema em que opera, sendo denominadas de segunda ordem, em contraste com as de primeira ordem anteriores. Este conceito está estreitamente relacionado com o de auto-organização, que se refere à capacidade que alguns sistemas possuem de se auto-renovar e de evoluir para níveis mais complexos de funcionamento (Capra, 1982).

A Cibernética de Primeira Ordem e a Terapia Familiar

O antropólogo Gregory Bateson foi quem mais contribuiu para a transposição dos conceitos cibernéticos para o campo das ciências sociais. Seus estudos se deram no contexto do grupo de Palo Alto - formado também por Jay Haley, Don Jackson e Weckland -que após a sua saída viria a constituir o Mental Research Institute (MRI), que passou definitivamente a abordar o campo da saúde mental.

O grupo de Palo Alto se interessava pelo estudo dos sistemas familiares em função de seu aspecto comunicacional, centrando-se em sua dimensão pragmática, ou seja, nos seus efeitos sobre o comportamento. Sob a premissa de que todo comportamento é comunicação e de que a comunicação afeta o comportamento (Watzlawick, Beavin & Jackson, 1967) os terapeutas e pesquisadores se utilizam do estudo desses processos para desvendar as regras familiares subjacentes a eles. A intervenção, portanto, também se dá no plano da comunicação e do comportamento para promover mudanças na organização do sistema.

A partir de Palo Alto, surgiram duas importantes escolas da terapia familiar: a Estrutural e a Estratégica, que foram contemporâneas, influenciando-se mutuamente. Salvador Minuchin constitui o principal representante da Escola Estrutural. Em sua visão, o terapeuta familiar devia focalizar aspectos fundamentais que revelam a estrutura familiar: padrões relacionais, hierarquia, poder, fronteiras e subsistemas. A intervenção objetiva, assim, mudar a organização familiar atuando sobre estes componentes estruturais. Na Escola Estratégica os terapeutas estão mais interessados em gerar mudanças no sistema familiar que em compreender as causas que geravam ou mantinham seu funcionamento. Suas teorias são, desse modo, mais simples e pragmáticas. De acordo com Haley (1991), a terapia estratégica representou uma reação contra a passividade dos terapeutas das abordagens psicodinâmica e rogeriana. Apropriando-se primordialmente da noção de ampliação do desvio (Segunda Cibernética) eles baseavam suas intervenções em ações que perturbassem o funcionamento do sistema familiar. Em outras palavras, estes terapeutas induziam o sistema a uma crise com vistas a permitir a instalação de um novo tipo de funcionamento.

Cibernética de Segunda Ordem

A Cibernética de Segunda Ordem representa um salto qualitativo muito grande em relação ao período anterior. Conforme afirma Esteves de Vasconcellos (1995, p.97), "incorporação da cibernética simples pela cibernética da cibernética3 3 Ou Cibernética de Segunda Ordem. contextualiza a primeira e permite que seja vista com um olhar novo, que não mais simplifica, não mais reduz, não perde de vista a complexidade".

A inclusão do observador no processo de construção do conhecimento constitui a principal reformulação da Cibernética de Segunda Ordem, incorporando-a de forma definitiva no paradigma da pós-modernidade. O reconhecimento da importância da subjetividade do observador traz para o centro da cena questionamentos anteriores acerca da realidade, da experiência, do conhecer e da linguagem. Todos estes questionamentos, somados à questão da auto-referência (Simon et all, 1988)4 4 Este conceito se refere à possibilidade de se fazer enunciações por meio da linguagem e de outros sistemas de signos, que remetem à própria enunciação ou àquele que a enuncia. Os processos e as estruturas que se voltam sobre se mesmos são considerados, em geral, auto-referentes. , promovem uma revolução epistemológica, extrapolando o próprio objeto inicial da Cibernética: os processos comunicacionais das máquinas e dos sistemas vivos.

Esta questão coloca no cenário da produção científica outras dimensões anteriormente negligenciadas, como a ideológica, a política, a afetiva, a ética e até a espiritual. A inclusão do observador é a humanização do conhecimento, um conhecimento produzido e produtor da humanidade.

O foco no sujeito do conhecimento traz à tona uma nova visão acerca dos processos de mudança dos sistemas. Na Cibernética de Primeira Ordem, os cientistas buscavam modificar o funcionamento dos sistemas por meio da manipulação de seus processos de comunicação através dos mecanismos de regulação: retroalimentação positiva e retroalimentação negativa. Dentro de uma perspectiva que admite uma infinidade de concepções e descrições acerca do funcionamento dos sistemas, a Cibernética de Segunda Ordem procura atuar justamente nas descrições destes sistemas, acreditando que uma mudança de significado acerca de uma determinada realidade constitui uma modificação nesta própria realidade. Diante disso, a ênfase nos processos de conhecer e descrever a realidade promove o interesse da Cibernética de Segunda Ordem para o campo da linguagem, que se refletiu no desenvolvimento do Construtivismo e do Construcionismo Social.

A Cibernética de Segunda Ordem e a Terapia Familiar

A evolução das idéias do Grupo de Milão constitui um exemplo claro da penetração dos conceitos da Cibernética de Segunda Ordem no campo da terapia familiar. Nichols e Schwartz (1998) relatam que após a cisão sofrida pelo Grupo, "Luigi Boscolo e Gianfranco Cecchin moveram-se em uma direção diferente, distanciando-se da manipulação estratégica das famílias e rumando para formular hipóteses sistêmicas sobre seus problemas" (p.351). Desse modo, ressaltam os autores, o terapeuta liberava-se da responsabilidade pela mudança e assumia uma postura de curiosidade ao invés da intervencionista. Mesmo em seu período inicial, o Grupo de Milão adota uma abordagem menos centrada em questões comportamentais que seus colegas estratégicos; ele se interessa em expor os jogos subjacentes à dinâmica familiar, procurando reestruturar os motivos para os comportamentos indesejáveis. O Grupo começa a atuar na forma com que a família enxerga as coisas, acreditando que uma mudança neste plano pode gerar alterações de comportamento. Está-se falando aqui de mudanças de significado, o principal objeto da atenção dos modelos subseqüentes de terapia. De fato, Nichols e Schwartz (1998) colocam que "este dêslocamento do comportamento para o significado determinou o palco do movimento construtivista" (p. 352).

Na evolução de pensamento do Grupo de Milão, tomando-se por base as proposições mais recentes de Boscolo e Cecchin, pode-se perceber a transição para um modelo que se alinha com a Cibernética de Segunda Ordem; os autores passaram a dar mais ênfase ao processo de entrevista, adotando um estilo cooperativo e menos diretivo. Por meio da utilização de técnicas como o questionamento circular5 5 O questionamento circular constitui uma técnica de entrevista criada pelos associados de Milão com base no conceito de circularidade e se encontra melhor descrito em Boscolo e cols (1993). , os terapeutas procuram favorecer o surgimento de múltiplas perspectivas, tornando clara a natureza circular dos problemas.

Cecchin (1987) atenta para a necessidade da "criação de um estado de curiosidade na mente do terapeuta" (p.406). Segundo o autor, é importante que ele mantenha uma postura sistêmica e esteja aberto para diferentes explicações que possam ser úteis no processo terapêutico. Não se trata de determinar se explicações são verdadeiras ou falsas, mas de se utilizar aquelas que favorecem o avanço. O que se procura é ter um espaço para a emergência de diferentes perspectivas para que se possa fazer conexões entre elas, numa visão mais complexa; assim, para o autor, o terapeuta toma uma posição de respeito com relação à integridade do sistema.

O Construtivismo e o Construcionismo Social

O Construtivismo

O Construtivismo retoma uma discussão antiga na filosofia acerca da realidade, da experiência e da linguagem. Assim, determinar a sua origem constitui uma tarefa ardilosa. De modo geral, suas formulações são associadas a uma tradição que inclui Berkeley, Vico, Kant, Wittgenstein e Piaget (Glasersfeld, 1996b; Hoffman, 1990). Glasersfeld (1996a) identifica quatro fontes que influenciaram o pensamento construtivista: a linguagem, o ceticismo, o conceito darwiniano de adaptação (encaixe, fit) e a Cibernética.

Pode-se resumir os princípios básicos do Construtivismo6 5 O questionamento circular constitui uma técnica de entrevista criada pelos associados de Milão com base no conceito de circularidade e se encontra melhor descrito em Boscolo e cols (1993). em dois (Glasersfeld, 1992; 1996b, p.25):

  • "O conhecimento não é recebido passivamente por meio dos sentidos, nem da comunicação, mas é construído ativamente pelo sujeito cognoscente";

  • "A função da cognição é adaptativa e serve para organizar o mundo experiencial do sujeito, não para descobrir uma realidade ontológica objetiva".

Ao contrário das vertentes que o precederam, os argumentos que sustentam as formulações do Construtivismo não são de natureza filosófica, mas têm lugar dentro da própria ciência. Cientistas como Humberto Maturana, Francisco Varela, Heinz von Foerster e outros, em seus diferentes campos, promovem avanços que possuem sérias implicações epistemológicas, o que tem provocado muitos outros cientistas a se aventurarem em direção a uma epistemologia científica.

Von Foerster (1973, apud Glasersfeld, 1996a), pela constatação do fenômeno da "codificação indiferenciada" no córtex cerebral, questiona a visão tradicional da ciência, que atribui ao mundo as distinções que se faz por meio dos sentidos. Os estudos de Foerster abrem caminho para a discussão do papel do sistema nervoso na construção destas distinções.

Através de seus experimentos acerca da neurofisiologia da visão e das cores, Maturana atesta a participação do observador na construção da realidade, chamando a atenção para a importância de sua estrutura biológica neste processo. O autor formula um conceito central no pensamento construtivista, o de autopoiésis (Maturana & Varela 1987, citados por Goolishian & Winderman, 1989), que significa "que cria a si mesmo". Esse conceito está intimamente ligado ao de "determinismo estrutural", que postula que o comportamento dos sistemas vivos ocorre em função do modo que estes estão constituídos. Isto significa que o comportamento de um organismo não está submetido a um determinismo ambiental. Ao contrário, sua reação a uma estimulação ambiental ocorre de uma maneira singular e estreitamente ligada a sua estrutura.

O Construcionismo Social

Da mesma forma que o Construtivismo, o Construcionismo Social deve a outras vertentes o desenvolvimento de suas principais bases teóricas. Apesar disso, não se submete a nenhum dessas, promovendo desfigurações e rearranjos nos conceitos trazidos por diferentes autores (Grandesso, 2000).

Gergen (1996) relaciona três linhas críticas com o surgimento do Construcionismo Social: a ideológica, a literário-retórica e a social. Estas estão relacionadas com uma reação ao pressuposto científico tradicional de que a linguagem constitui o reflexo do mundo real e "convidam a reconsiderar completamente a natureza da linguagem e seu lugar na vida social" (Gergen, 1996, pp.143).

A estas linhas estão associadas contribuições de pragmatistas norte-americanos, a tradição desconstrucionista de Derrida e as formulações mais tardias de Wittgenstein (Fried Schnitman & Fuks, 1994; Gergen, 1996; Pearce, 1996).

Baseada em Gergen e outros autores construcionistas, Grandesso (2000) apresenta de forma clara e sintética as principais contribuições do Construcionismo Social. Em sua essência, esta abordagem defende a noção de que o conhecimento é construído no processo de intercâmbio social, ou seja, "os termos e formas pelos quais obtemos a compreensão do mundo e de nós mesmos são artefatos sociais, produtos de intercâmbios histórica e culturalmente situados entre as pessoas" (Gergen, 1996, p.162). Nesse sentido, não se identificam os eventos do mundo com base em critérios objetivos, mas em função de processos circunscritos por uma cultura, história ou contexto social. A construção do conhecimento resulta de uma ação cooperativa entre as pessoas, que desenvolvem consensos acerca da realidade por meio da negociação contínua que compõe os processos sociais. Uma característica importante dos consensos, dos conhecimentos produzidos socialmente acerca da natureza das coisas, é de que estes constituem formas de ação social, possuindo relevância fundamental na vida das pessoas na medida que integram padrões sociais.

A ênfase no intercâmbio social no processo de construção de significado contradiz a concepção tradicional de que o significado tem origem na mente individual, argumentando que são as relações que o criam (Gergen & Warhuus, 2001).

Esta noção se baseia fundamentalmente nas formulações de Wittgenstein (1953/1996). O autor se ocupa largamente da linguagem e de sua relação com o mundo, sendo uma de suas questões centrais a de sua função. Para Wittgenstein, é o mundo que dá significação às palavras, que não deve ser interpretado como um elemento ideal, invariável, nem o mundo compreendido com os objetos materiais. Pelo contrário, se o mundo é tido como acontecimento, as significações serão tantas quantos forem os usos dados à linguagem no interjogo social. O mais primário na sua compreensão não é saber sua significação, mas antes, o uso que se faz dela. Wittgenstein coloca que quando se encontra o uso, encontra-se o significado. Assim, os jogos de linguagem adquirem importância fundamental na construção de significados.

Esta formulação tem implicação na maneira com que o construcionista social concebe as teorias acerca do comportamento humano, para ele muito mais relacionadas a um contexto sociocultural que às formas de comportamento em si. É por isso que, a visão de Gergen e Warhuus (2001) constitui um convite ao abandono de uma busca de pontos de vista singulares acerca do funcionamento humano, de diagnósticos fixos, de práticas terapêuticas "melhores" que outras e da comparação de resultados. O Construcionismo é um convite à multiplicidade, como se verá no tópico "Famílias enquanto Sistemas Lingüísticos".

Construtivismo e Construcionismo Social: aproximações e distinções

O binômio individual-social é freqüentemente utilizado para diferenciar o Construtivismo e o Construcionismo Social. No entanto, esta distinção pode muitas vezes se revelar muito simplista quando não abordada com a devida atenção. Grandesso (2000) se dá conta do reducionismo que é colocar estas duas perspectivas em pólos opostos para resolver uma dificuldade de diferenciação; ela diz que não se trata de uma questão de polarização, mas de ênfase.

Maturana (1996) afirma que "acontecemos na linguagem, e acontecemos na linguagem como sistemas vivos que somos"(p. 78). Como se pode notar, Maturana não aborda as dimensões psicológica e biológica dissociadas de um contexto mais amplo. Pelo contrário, trata os sistemas em sua práxis do viver, na linguagem. Neste contexto, a dimensão social expressa-se pelo que o autor denomina "linguagear". Na sua concepção, os seres humanos são 'nós conversacionais' no sentido de constituírem pontos de convergência entre diversas redes conversacionais que fluem através da corporalidade. Esta concepção explicita a dimensão social na visão construtivista, nos colocando mais cautelosos quanto à tentativa de distingui-lo do Construcionismo Social.

Da mesma forma, a ênfase do Construcionismo nos processos sociais não exclui o indivíduo do contexto de análise. Gergen e Warhuus (2001) se colocam contra uma posição totalitária do Construcionismo. Para eles, não se pode cometer o erro de reificar o relacional. Apesar de todas as possibilidades que este enfoque proporciona, "não por isso devemos abandonar a exploração do self, de nossas emoções, memórias e desejos" (Gergen & Warhuus, 2001, p.20).

As posições construtivista e construcionista social não constituem, portanto, pólos opostos que se contradizem. Apesar de possuírem distinções fundamentais, estas não tornam as duas perspectivas incompatíveis, o que se reflete de forma clara na prática terapêutica, em que contribuições acerca de ambas as vertentes são utilizadas em conjunto, às vezes sendo impossível identificar sua origem específica.

Acreditando que uma demarcação entre Construtivismo e Construcionismo Social não possa ser feita de forma clara e que, embora possível, não constituiria algo de relevância em relação ao presente trabalho, apresenta-se a seguir suas implicações para a prática terapêutica de forma conjunta.

Famílias enquanto Sistemas Lingüísticos

Influenciados pelas epistemologias construtivista e construcionista social, muitos terapeutas familiares passam a dar mais atenção ao universo dos significados que permeiam todo o contexto terapêutico, adotando uma perspectiva mais voltada para a linguagem e para a construção de significado, vendo na conversação um importante instrumento para o surgimento de mudanças na terapia.

Anderson e Goolishian (1988; 1998)7 7 Estas referências aplicam-se às sentenças de a) até g). explicitam de forma clara as premissas fundamentais de seu modelo, que caminha na direção de uma posição mais hermenêutica e interpretativa, o que será desenvolvido a seguir no diálogo com diversos autores.

a) Os sistemas humanos são geradores de linguagem e, simultaneamente, geradores de sentido. Nesta concepção, a organização deles é estudada em função de seus significados produzidos pela comunicação, e não de estruturas sociais. b) O sentido e o entendimento são construídos socialmente. Gergen e Kaye (1998) se apoiam no pensamento de Wittgenstein para dizer que as palavras obtêm sentido pelo seu uso na troca social, não refletindo, assim uma realidade estabelecida, mas jogos relacionais em que a linguagem assume uma função.c) Qualquer sistema em terapia é formado dialogicamente em torno de um problema. Numa visão funcionalista, os problemas humanos são estudados em termos da organização dos sistemas em que estão situados; e são eles que organizam sistemas ao seu redor. Assim, o sistema terapêutico é formado por aqueles que falam sobre o problema.d) A terapia é um evento lingüístico que ocorre no que se chama de conversação terapêutica. Esta conversação tem por objetivo facilitar o surgimento de novas narrativas (Lax, 1998). Para isso, clientes e terapeutas devem se envolver em uma "sutil e multicolorida troca e negociação de significados (inter)pessoais" (Neimeyer, 1997, p.6). e) O papel do terapeuta é, portanto, o de um artista da conversação - um arquiteto do processo dialógico - cuja especialidade está em facilitar e criar o espaço para uma conversação dialógica". O terapeuta, pela introdução da diferença na conversação, estimula o surgimento de novas perspectivas (Lax, 1998). Assim, o seu papel não é mais o de desvendar uma realidade, mas o de construir novas realidades em conjunto com a família (Fruggeri, 1998). No entanto, para isto ele deve ser capaz de transformar sua própria visão acerca da família, abandonando velhos significados (Anderson & Goolishian, 1988, 1998; Ausloos, 1996). No cenário da terapia familiar, Lynn Hoffman (1998) conta que os terapeutas, antes centrados na leitura da estrutura familiar e dos padrões comunicacionais disfuncionais, passaram a voltar sua atenção sobre os significados subjacentes ao discurso familiar, e a seu próprio discurso. Isto se dá pela concepção de que f) Os problemas existem na linguagem e são próprios do contexto narrativo do qual extraem seu significado. Imbuída de uma preocupação crescente com os processos lingüísticos que envolvem os problemas familiares, a terapia, antes centrada na obtenção da mudança na estrutura familiar, nas seqüências comunicacionais entre seus membros, passou a empenhar-se na obtenção da mudança de significado: g) mudança é a evolução de novos significados por meio do diálogo.

Terapia Familiar: do sistema à abordagem narrativista

No estudo da adolescência, a perspectiva sistêmica tem uma repercussão fundamental, pois inclui a compreensão do contexto social e familiar que envolve o sujeito. A partir daí a clínica psicológica de adolescentes se preocupa em compreender os diversos sistemas que compõem o seu contexto social, dando especial atenção aos grupos de pares, à escola, e ao sistema familiar (Fishman, 1998).

Estudos acerca do grupo familiar tiveram a surpresa de constatar que não só o adolescente passa por transformações nesse período, mas toda a família. Sob a influência da perspectiva do ciclo de vida (Carter & McGoldrick, 1995), começa-se a enfocar a família com adolescentes, e a se perceber esse período não em função de uma crise do desenvolvimento de um indivíduo, mas como uma confluência de crises envolvendo vários elementos do sistema familiar (Falceto, 1996).

A partir daí, pesquisadores e terapeutas voltaram-se para a dinâmica relacional e estrutura da família, concebendo a adolescência como um período que "exige mudanças estruturais e renegociação de papéis nas famílias, envolvendo pelo menos três gerações de parentes" (Preto, 1995, p.223).

As alterações na organização do sistema familiar têm implicação fundamental no processo de individuação do adolescente (Fishman, 1996; Stanton & cols, 1988), e a perspectiva sistêmica ressalta que este processo não é vivido de forma unilateral - do adolescente em relação aos pais, mas também dos pais em relação ao filho. Dessa forma, enquanto o adolescente se depara com o desafio de começar a tomar suas próprias decisões e a assumir maior responsabilidade sobre seus atos, os pais são desafiados a gradativamente delegarem responsabilidade (Minuchin, 1990) sem que isso signifique um distanciamento emocional. Este equilíbrio consiste numa das maiores dificuldades vividas pelo sistema familiar e está relacionado ao surgimento de muitos percalços a serem enfrentados por toda a família.

Numa perspectiva de Cibernética de Primeira Ordem, terapeutas familiares estruturais e estratégicos começam a compreender os problemas no processo de individuação do adolescente como um sintoma de disfunção familiar (Fishman, 1996; Haley, 1985). Segundo Neuburger (1992), a função do comportamento delinqüente "é sinalizar à família o pedido do adolescente de que haja uma redefinição das relações existentes entre eles"(p. 462). Segond (1992) compreende a violência, a transgressão enquanto acting-out, e "tentativa de abolição e de transformação de uma regra que se tornou insuportável em sua expressão implícita" (p. 443). Dentro desta visão, o comportamento do adolescente não é fruto de delinqüência ou doença, mas uma mensagem, um sintoma que cumpre uma função dentro de um sistema (Haley, 1985; Minuchin, 1990; Stanton & cols, 1988), que diz respeito a uma transformação, tanto dele como da própria família.

Desse modo, a terapia familiar sistêmica se firma em uma posição funcionalista, em que a conduta serve aos fins do sistema, contrapondo-se à perspectiva estruturalista, em que ela reflete a estrutura do espírito (White, 1997). Este já constitui um avanço significativo para a superação da dificuldade que é o processo de rotulação. Boscolo, Cecchin, Hoffman e Penn (1993, p. 49) salientam que "uma vez que um rótulo é aceito, todos os comportamentos subseqüentes passam a ser vinculados a este rótulo". Segond (1986, apud Sudbrack, 1992) chama atenção para o processo de "designação familiar precoce", em que o filho é reconhecido como diferente pelos pais que dão a ele um tratamento que acaba por ampliar as diferenças, incorrendo em "uma espiral invisível de designação repetitiva e patológica" (Sudbrack, 1992, p.449).

Muitos autores, desde o início da terapia familiar sistêmica manifestaram preocupação com esta questão e buscaram formas de contorná-la. A técnica do reenquadramento (Minuchin & Fishman, 1984), a conotação positiva (Boscolo e cols, 1993) e a redefinição (Watzlawick, Weakland & Fisch, 1973), constituem recursos utilizados pelos terapeutas para obterem a mudança no sistema familiar.

É interessante notar que, mesmo numa perspectiva de Cibernética de Primeira Ordem, terapeutas estruturais e estratégicos estão atentos para as descrições que a família faz de seus membros, voltando-se para sua visão da realidade8 8 Minuchin e Fishman (1984), por exemplo, declaram desafiar o sintoma, a estrutura e também a realidade das famílias. . No entanto, as construções de seus problemas são consideradas relevantes na medida em que informam algo a respeito do funcionamento. A intervenção, portanto, se dá de forma pragmática, privilegiando o nível comportamental para a obtenção de mudança na organização do sistema.

Pode-se perceber que na evolução do pensamento do Grupo de Milão a transição de um modelo que se alinha com a Cibernética de Segunda Ordem. O que se verifica é a transição de um modelo calcado na separação entre observador e observado, terapeuta e família, com uma diferença hierárquica marcante entre eles, para um que privilegia as construções em conjunto. Assim, mais atenção passa a ser dada para as hipóteses familiares, que integram a conversação terapêutica no sentido de se produzir novos significados.

Abandonando a metáfora cibernética dos circuitos de retroalimentação, terapeutas concebem a terapia enquanto um processo conversacional. A abordagem hermenêutica e interpretativa ao entendimento da terapia (Anderson & Goolishian, 1998) promoveu a ênfase no processo de construção de significados e na sua influência na dinâmica relacional dos sistemas que os produzem.

Os sistemas humanos são enfocados não mais de um ponto de vista funcionalista, mas por uma perspectiva que propõe que "a vida das pessoas é modelada pela significação que elas atribuem a sua experiência, pela situação que ocupam nas estruturas sociais e pelas práticas culturais e de linguagem do que e de suas relações" (White, 1997, p.30)9 9 White denomina esta perspectiva de "constitucionalista", e a associa ao Construtivismo crítico. .

O caráter social da linguagem promove uma mudança na concepção do self. A pós-modernidade questiona o conceito tradicional, que adota uma perspectiva essencialista, em que o self é reificado, tido como uma entidade abstrata, que se diferencia das demais construções psicológicas. É o que Goolishian e Anderson (1996) denominam "self encapsulado", uma espécie de núcleo da experiência, claramente delimitado e integrado. Adotando uma visão diferente, os autores defendem a abordagem de um "self narrador" em que "a pessoa constitui-se como sujeito na e pela linguagem" (p.195). Dessa forma, o self revela-se o produto do universo intersubjetivo; por meio de histórias que se narra aos outros e a nós mesmos a nosso respeito, e das que se ouve dos outros sobre nós, nossa identidade é construída. Somos, portanto, co-autores de nós mesmos.

Dessa forma, as construções de significado em torno da adolescência tornam-se elementos fundamentais no contexto da terapia de famílias com adolescentes, e são objeto da atenção de terapeutas e pesquisadores, sendo estudadas na forma de narrativas.

As narrativas surgem no intercâmbio social e constituem a principal moeda de negociação dos significados atribuídos à experiência. Para White (1997), ela é a principal base de onde as pessoas partem para formular julgamentos e concepções acerca de suas vidas. Nesse sentido, as histórias modelam a vida das pessoas, conferindo-lhes uma estrutura coerente e constante.

Efran e Fauber (1997, p.237) afirmam que "quase nenhuma das ações de uma pessoa, se atentamente observada, pareceriam lógicas ou consistentes". São as narrativas que organizam a experiência, atribuindo a ela um sentido (Epston, White & Murray, 1998) e um caráter de homogeneidade. Elas situam a experiência numa dimensão temporal, dando uma idéia de constância e continuidade às ações (Neimeyer, 1997).

Pode-se constatar o quão significativas são as narrativas para as conclusões acerca de quem somos ou quem são as pessoas que estão ao nosso redor. Este entendimento é construído na interação com as percepções e concepções de outras pessoas (Lax, 1998) resultando em certo grau de consenso.

O problema surge quando este consenso ocorre justamente na forma de narrativas rígidas, cristalizadas, que não abrem espaço para o novo e o diferente no que tange ao universo experiencial de uma determinada pessoa ou grupo. Goolishian (1991, apud Selekman, 1996) chama a atenção para a linguagem do déficit, que constitui um mundo de descrições que se constróem em função do que falta, do negativo, do ruim. Muito comum no contexto de famílias de adolescentes com problemas, este tipo de narrativa limita a visão não oferecendo a eles possibilidade de mudança. Nestes contextos, qualquer ato que possa conotar competência e responsabilidade não é reconhecido enquanto tal. Ao contrário, pode até ser interpretado de modo negativo, perpetuando a narrativa já estabelecida e mantendo a organização do sistema familiar.

Segundo McNamee (1998) isto não ocorre somente no contexto familiar, mas também no terapêutico que de maneira irônica constrói o marginal como central, contribuindo para a estigmatização dentro da própria terapia, uma preocupação que é demonstrada por diversos autores em discussões acerca da rotulação, linguagem do déficit etc. (Boscolo & cols, 1993; Grandesso, 2000; Selekman, 1996).

No contexto de terapia, freqüentemente se defronta com esse tipo de construção, sendo-se desafiado a favorecer o surgimento de outras possibilidades, que possam se apresentar enquanto alternativas a essa via interpretativa dominante. É nesse sentido que um dos objetivos da terapia de base narrativa é o de criar um espaço conversacional que favoreça a multiplicidade. Epston, White e Murray (1998), por meio de uma abordagem narrativista, visam separar vidas de histórias empobrecedoras, desafiar práticas de self e relacionamento subjugantes e recontar vidas de modo alternativo, visando resultados mais desejáveis.

Considerações Finais

Os autores vêm trabalhando no atendimento a adolescentes numa perspectiva familiar, e buscam nesse texto apresentar uma trajetória teórica que enfoca a importância e a qualificação do diálogo que ocorre no contexto terapêutico entre familiares, e especialmente entre o adolescente e os familiares.

A conversação ocorrida no ambiente de terapia, muitas vezes, tende a se centralizar em processos de julgamento e culpabilização que dificultam a circularização da comunicação, e oferecem obstáculos às redefinições propiciadoras de avanço na compreensão e resolução dos conflitos.

Tem-se observado com grande preocupação uma inadequação na construção do espaço conversacional entre adolescentes e familiares, e pensa-se que o enfoque na narrativa funciona como uma possibilidade concreta de criação de troca colaborativa para esse contexto.

A conversa em família é um momento privilegiado de possibilidades, mas o terapeuta deve ter consciência de sua participação na direção da condução da qualidade do diálogo construído.

Acredita-se que a prática terapêutica centrada na resolução de questões interacionais pode e deve se beneficiar de maior atenção na direção das práticas discursivas, explicitando uma dimensão complementar de enfoques.

Artigo recebido para publicação em.06/2002; aceito em 11/2002

Obs: Este trabalho é referente a uma dissertação de mestrado intitulada "O problema é que esse garoto, desde pequeno..." - Construções Narrativas Acerca do Adolescente no Contexto de Terapia Familiar, realizada pelo primeiro autor, sob a orientação do segundo autor, defendida em dezembro/2001 na Universidade de Brasília e financiada pela CAPES.

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  • Endereço para correspondência:

    Flávio Lobo Guimarães
    SHIS QI 15, conjunto 04, casa 05
    Brasília, DF
    Cep 71635-240
    E-mail
  • 1
    A ênfase na matéria e na energia constitui uma herança da mecânica newtoniana, que influenciou a ciência como um todo.
  • 2
    Ou realimentação (Wiener, 1954; Capra, 1982), ou retroação (Morin, 1999).
  • 3
    Ou Cibernética de Segunda Ordem.
  • 4
    Este conceito se refere à possibilidade de se fazer enunciações por meio da linguagem e de outros sistemas de signos, que remetem à própria enunciação ou àquele que a enuncia. Os processos e as estruturas que se voltam sobre se mesmos são considerados, em geral, auto-referentes.
  • 5
    O questionamento circular constitui uma técnica de entrevista criada pelos associados de Milão com base no conceito de circularidade e se encontra melhor descrito em Boscolo e cols (1993).
  • 6
    Existem distinções de Construtivismo, e refletem pequenas, mas importantes diferenças no modo de pensar de diversos autores. No entanto, esta diferenciação foge ao propósito do presente texto. Assim, o Construtivismo aqui descrito se refirirá preferencialmente ao Construtivismo radical.
  • 7
    Estas referências aplicam-se às sentenças de a) até g).
  • 8
    Minuchin e Fishman (1984), por exemplo, declaram desafiar o sintoma, a estrutura e também a realidade das famílias.
  • 9
    White denomina esta perspectiva de "constitucionalista", e a associa ao Construtivismo crítico.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Ago 2009
    • Data do Fascículo
      2002

    Histórico

    • Aceito
      Nov 2002
    • Recebido
      Jun 2002
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