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Questionário de percepção dos pais: evidências de uma medida de estilos parentais

Cuestionario de Percepción de los Padres: evidencias de una medida de estilos parentales

Resumos

Os estilos parentais são investigados há várias décadas, sendo considerados preditores de comportamentos dos jovens. O presente estudo teve como objetivo principal elaborar uma versão reduzida de uma medida brasileira que pode ser empregada para avaliar tais estilos, isto é, o Questionário de Percepção dos Pais - QPP. Participaram 386 estudantes do ensino fundamental, com idade média de 12,7 anos (DP = 1,60), que responderam duas versões do QPP, cada uma com 20 itens, que avaliavam a percepção dos jovens em relação ao seu pai (QPP-20-P) e sua mãe (QPP-20-M). Por meio de análise de componentes principais, identificou-se uma estrutura com dois componentes (responsividade e exigência) para ambas as versões, explicando cerca de 40% da variância total. Tais componentes apresentaram Alfas de Cronbach superiores a 0,70. Concluiu-se que existem evidências de validade fatorial e consistência interna desta medida.

estilos parentais; socialização; questionários; validade estatística; precisão do teste


Los estilos parentales han sido investigados por décadas, siendo considerados predictores de comportamientos de los jóvenes. El objetivo principal de este estudio fue producir una versión reducida de una medida brasileña que se puede utilizar para evaluar estos estilos, el Cuestionario de Percepción de los Padres (CPP-20), un instrumento útil para evaluar tales estilos parentales. Participaron 386 estudiantes de primaria (208 varones) con edad promedia de 12.7 años (dt = 1.60). Dos versiones del CPP, cada una con 20 ítems, fueron contestadas, evaluando la percepción de los jóvenes con respecto a sus padres (CPP-20-P) y madres (CPP-20-M). Un análisis de componentes principales (rotación varimax) reveló una estructura de dos factores (receptividad y exigencia) para las dos versiones, explicando alrededor de un 40% de la varianza total. Estos componentes presentaron alfas de Cronbach superiores a 0.70. Se concluyó que existen evidencias de validez factorial y fiabilidad de esta medida, que incluye dos dimensiones principales de los estilos parentales.

estilos parentales; socialización; cuestionario; validación estadística; precisión de test


Parenting styles have been investigated for several decades and are considered predictors of behavior among young individuals. This study's objective was to produce a reduced version of a Brazilian measure that can used to evaluate such styles, the Parental Perception Questionnaire (PPQ-20), an instrument that is useful in assessing parenting styles. The participants were 386 elementary-school students (208 men) with a mean age of 12.7 years (sd = 1.60). The participants answered two versions of the PPQ, each one composed of 20 items to assess the young individuals' perceptions concerning their fathers (PPQ-20-F) and mothers (PPQ-20-M). The analysis of principal components (varimax rotation) revealed a two-component structure (responsiveness and demandingness) for both versions, which accounted for about 40% of the total variance. These components presented Cronbach's alpha scores above 0.70. Finally, there is evidence this measure has factorial validity and internal consistency.

parental styles; socialization; questionnaires; statistical validity; teste reliability


ARTIGO

Questionário de Percepção dos Pais: evidências de uma medida de estilos parentais1 1 Apoio: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Cuestionario de Percepción de los Padres: evidencias de una medida de estilos parentales

Luiz PasqualiI; Valdiney Veloso GouveiaII; Walberto Silva dos SantosIII; Patrícia Nunes da FonsêcaIV; Josemberg Moura de AndradeIV; Tiago Jessé Souza de LimaIV

IUniversidade de Brasília, Brasília-DF, Brasil

IIUniversidade Federal da Paraíba, João Pessoa-PB, Brasil

IIIUniversidade Federal do Ceará, Fortaleza-CE, Brasil

IVUniversidade Federal da Paraíba, João Pessoa-PB, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Luiz Pasquali. Universidade de Brasília. Instituto de Psicologia. Departamento de Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações Campus Universitário Darcy Ribeiro. Instituto Central de Ciências Sul CEP 70.910-900. Brasília-DF, Brasil E-mail: luiz.pasquali@gmail.com

RESUMO

Os estilos parentais são investigados há várias décadas, sendo considerados preditores de comportamentos dos jovens. O presente estudo teve como objetivo principal elaborar uma versão reduzida de uma medida brasileira que pode ser empregada para avaliar tais estilos, isto é, o Questionário de Percepção dos Pais - QPP. Participaram 386 estudantes do ensino fundamental, com idade média de 12,7 anos (DP = 1,60), que responderam duas versões do QPP, cada uma com 20 itens, que avaliavam a percepção dos jovens em relação ao seu pai (QPP-20-P) e sua mãe (QPP-20-M). Por meio de análise de componentes principais, identificou-se uma estrutura com dois componentes (responsividade e exigência) para ambas as versões, explicando cerca de 40% da variância total. Tais componentes apresentaram Alfas de Cronbach superiores a 0,70. Concluiu-se que existem evidências de validade fatorial e consistência interna desta medida.

Palavras-chave: estilos parentais, socialização, questionários, validade estatística, precisão do teste

RESUMEN

Los estilos parentales han sido investigados por décadas, siendo considerados predictores de comportamientos de los jóvenes. El objetivo principal de este estudio fue producir una versión reducida de una medida brasileña que se puede utilizar para evaluar estos estilos, el Cuestionario de Percepción de los Padres (CPP-20), un instrumento útil para evaluar tales estilos parentales. Participaron 386 estudiantes de primaria (208 varones) con edad promedia de 12.7 años (dt = 1.60). Dos versiones del CPP, cada una con 20 ítems, fueron contestadas, evaluando la percepción de los jóvenes con respecto a sus padres (CPP-20-P) y madres (CPP-20-M). Un análisis de componentes principales (rotación varimax) reveló una estructura de dos factores (receptividad y exigencia) para las dos versiones, explicando alrededor de un 40% de la varianza total. Estos componentes presentaron alfas de Cronbach superiores a 0.70. Se concluyó que existen evidencias de validez factorial y fiabilidad de esta medida, que incluye dos dimensiones principales de los estilos parentales.

Palabras clave: estilos parentales, socialización, cuestionario, validación estadística, precisión de test

A família é um dos agentes mais importantes no processo de socialização. É no ambiente familiar que os indivíduos adquirem inicialmente seus valores, crenças, atitudes, normas e comportamentos considerados culturalmente adequados (Berns, 2009). Independente de cultura, grupo social ou estrutura familiar, os pais comumente reforçam os comportamentos de seus filhos, indicando se estes são ou não apropriados (Darling & Steinberg, 1993). Este aspecto faz da responsabilidade dos pais uma constante que transcende a diversidade de normas sociais, tornando possível a identificação de características comportamentais ou estilos que estes adotam na socialização diária de seus filhos (Musitu & García, 2001).

Os estilos parentais são investigados há várias décadas e podem ser considerados importantes preditores para o desenvolvimento infantil (Weber, Selig, Bernardi, & Salvador, 2006). Tais estilos podem ser entendidos como conjuntos de comportamentos de pais e mães no processo de socialização dos filhos (Kobarg, Vieira, & Vieira, 2010). A variabilidade de comportamentos dos pais no que se refere à socialização de seus filhos tem sido comumente explicada de forma satisfatória por duas dimensões básicas que, a despeito dos termos utilizados pelos pesquisadores, podem ser nomeadas como controle (exigência) e afeto (responsividade) parental (Musitu, Estévez, Martínez, & Jiménez, 2008). O controle implica cobrança, supervisão e exigências impostas pelas figuras materna e paterna, enquanto o afeto envolve a sensibilidade, a aceitação e o compromisso dos pais para com seus filhos (Baumrind, 2005; Weaver & Prelow, 2005).

Estas dimensões podem ser operacionalizadas por um continuum cuja interseção dá origem a quatro estilos de influência progressiva-regressiva, definindo quatro estilos de socialização parental que são consensuais na literatura (Costa, Teixeira, & Gomes, 2000; Maccoby & Martin, 1983; Steinberg, Lamborn, Darling, Mounts, & Dornbusch, 1994). Especificamente, as pontuações nas dimensões controle e afeto permitem definir os estilos autoritativo (controle e afeto altos), autoritário (controle alto e afeto baixo), negligente (controle e afeto baixos) e indulgente (controle baixo e afeto alto) (Rothrauff, Cooney, & An, 2009).

O estilo autoritativo descreve pais que mantêm o equilíbrio entre níveis altos de exigência e afeto, exercendo uma supervisão consistente dos comportamentos dos filhos com o fim de discipliná-los por meio de métodos indutivos ao invés de punitivos. Reforçam condutas socialmente responsáveis e maduras por meio de elogios e manifestações de afeto, oferecendo apoio, fomentando a comunicação e a valorização do ponto de vista dos filhos (Karavasilis, Doyle, & Markiewicz, 2003). Por outro lado, pais autoritários são altamente exigentes e insensíveis (pouca afetividade), enfatizam a obediência, o respeito pela autoridade e a manutenção da ordem por meio de disciplina baseada em poder e castigo severo (geralmente físico), esperando que as normas sejam cumpridas sem negociá-las com seus filhos (Baumrind, 1997).

Os pais denominados de indulgentes caracterizam-se pelo padrão escasso ou inexistente de controle, exercendo dificilmente qualquer tipo de autoridade com o fim de assegurar a conformidade de seus filhos. Contrariamente, tendem a conversar e consultar seus filhos acerca de decisões familiares, estimulando-os a serem independentes (Baumrind, 1997; Rothrauff et al., 2009). Diferentemente, os negligentes são caracterizados por ausência de envolvimento e tempo escasso dedicado à interação com seus filhos. Tais pais, geralmente, preocupam-se com seus próprios problemas, negligenciando suas responsabilidades parentais; não supervisionam seus filhos e não dão a eles qualquer tipo de apoio afetivo (Maccoby & Martin, 1983).

Contrariando a visão mais vertical e unidirecional que enfatiza unicamente a percepção dos pais acerca de seus filhos, os pesquisadores têm ressaltado cada vez mais a importância de considerar a percepção dos filhos acerca de seus pais, avaliando como tal percepção explica alguns construtos (Mora-Ríos, González-Forteza, Jiménez-Tapia, & Andrade-Palos, 1999). A propósito, estes quatro estilos têm sido associados com diversas questões que permeiam a infância e adolescência (Brand, Hatzinger, Beck, & Holsboer-Trachsler, 2009), como: desenvolvimento psicossocial, desempenho acadêmico, competência social, transtornos depressivos, ansiedade e comportamentos socialmente desviantes (Collins, Maccoby, Steinberg, Hetherington, & Bornstein, 2000; Milevsky, Schlechter, Netter, & Keehn, 2007; Steinberg, 2001).

Apesar do que anteriormente foi dito, ainda são poucos os estudos no Brasil a respeito, sendo mais escassos ainda os instrumentos disponíveis para avaliar a percepção dos filhos acerca dos pais, com algumas exceções (Costa et al., 2000; Teixeira, Oliveira, & Wottrich, 2006). O presente estudo teve como objetivo principal elaborar uma versão reduzida de uma medida brasileira que pode ser empregada para avaliar tais estilos, isto é, o Questionário de Percepção dos Pais - QPP (Pasquali & Araújo, 1986). Especificamente, pretende-se avaliar sua estrutura fatorial, enfocando as dimensões de afeto e controle, checando igualmente seus coeficientes respectivos de consistência interna. Justifica-se o uso desse instrumento em virtude das evidências de validade de construto que o mesmo já apresenta e dos adequados índices de confiabilidade dos seus fatores. O intuito é que essa nova versão reduzida seja de mais fácil e rápida aplicação e, dessa forma, possa ser utilizada convenientemente em estudos futuros. Mas antes de descrever o estudo correspondente, parece pertinente tratar brevemente de alguns instrumentos elaborados ou adaptados para avaliar estilos parentais neste país.

Instrumentos para Avaliar Estilos Parentais

As relações entre pais e filhos resultam em comportamentos ou práticas que são nomeados de formas diferentes na literatura, como: práticas de cuidados, cuidados parentais, práticas parentais, práticas educativas e estilos parentais. Além destes, aparecem também termos como cognições, crenças, idéias e valores parentais (Martins et al., 2010). Apesar de corresponderem a construtos algo diferentes, todos compartilham a ênfase nas relações entre pais e filhos, justificando considerá-los no conjunto. Neste tópico são listados alguns instrumentos empregados para avaliar tais relações, os quais foram elaborados e/ou avaliados em termos de evidências de sua validade no contexto brasileiro.

Costa et al. (2000) traduziram e adaptaram duas escalas que avaliam as dimensões de responsividade e exigência parentais, tendo participado do estudo 378 adolescentes. Os resultados da análise de componentes principais confirmaram uma dimensão relacionada com a responsividade, tendo sugerido dois fatores específicos para representar a exigência, a saber: controle explícito e controle implícito. Os coeficientes de consistência interna (Alfas de Cronbach) destas escalas variaram de 0,70 a 0,83. Análises de variância revelaram que a exigência materna percebida foi maior do que a paterna entre adolescentes de ambos os sexos, mas as garotas perceberam níveis de exigência (materna e paterna) mais altos do que os garotos. Já a responsividade materna foi superior à paterna para ambos os sexos, porém as garotas obtiveram pontuações em responsividade mais altas do que os garotos na percepção de suas mães.

Em estudo realizado por Teixeira, Bardagi e Gomes (2004), objetivou-se refinar o instrumento anteriormente citado para avaliar as dimensões de exigência e responsividade parentais percebidas entre adolescentes. Partiu-se da elaboração de novos itens levando em consideração as escalas de exigência e responsividade, previamente testadas no Brasil (Costa et al., 2000). Nesta etapa, pretendeu-se enriquecer o conteúdo dos itens e melhorar a fidedignidade das referidas escalas. Portanto, inicialmente 33 itens foram aplicados a 550 adolescentes com média de idade de 16,6 anos. Uma análise de componentes principais indicou que 24 itens poderiam ser representados pelos dois componentes teorizados. Estes apresentaram Alfas de Cronbach de 0,78 (exigência) e 0,92 (responsividade). Tais resultados indicaram evidências de validade fatorial e consistência interna do referido instrumento.

Benetti e Balbinotti (2003) elaboraram um inventário de práticas de socialização empregadas por pais e mães com filhos na idade escolar. Neste sentido, consideraram uma amostra de 106 pais, de ambos os sexos, de crianças com idades que variavam de seis a dez anos. A partir da revisão da literatura, dois instrumentos foram elaborados: Inventário de Práticas Parentais (IPP) e Escala de Pertinência e Clareza (EPC), esta construída com a finalidade de medir o acordo inter-juízes. Os 16 itens do primeiro instrumento avaliavam quatro dimensões: envolvimento afetivo, didática, disciplina e aspectos sociais do envolvimento parental. A partir da análise dos itens e dos coeficientes de consistência interna (Alfa de Cronbach), que variaram de 0,55 (disciplina) a 0,82 (educação), sugeriu-se que o IPP era um instrumento que permitia identificar as práticas de socialização em crianças em idade escolar em relação à qualidade do envolvimento dos pais.

Valentini (2009) buscou validar para o contexto brasileiro o Inventário de Estilos Parentais de Young (Young, 1999). Tal instrumento é composto por 72 itens que buscam avaliar dezoito estilos parentais, materno e paterno, propostos pelo autor. O estudo contou com uma amostra de 920 estudantes, sendo 543 do sexo feminino, do ensino médio e superior das cidades de Natal, Petrolina, Brasília e da região metropolitana de Porto Alegre. Foram realizadas análises fatoriais exploratórias e confirmatórias, que corroboraram, em parte, os fatores de segunda ordem proposto por Young. Foram extraídos cinco fatores tanto para a escala materna quanto para a paterna. Na escala materna os fatores explicaram 45,1% da variância, sendo os seguintes: desconexão (α = 0,89) afetividade (α = 0,85), hipervigilância (α = 0,83), superproteção (α = 0,78) e limites prejudicados (α = 0,66). Para a escala paterna, os fatores explicaram 47,6% da variância, sendo descritos a seguir: rejeição (α = 0,90), estabilidade emocional (α = 0,88), orientação para o outro (α = 0,85), autonomia prejudicada (α = 0,79) e limites prejudicados (α = 0,71).

Procurando elaborar um instrumento para avaliar dimensões de práticas educativas parentais em adolescentes, Teixeira et al. (2006) contaram com uma amostra de 409 adolescentes, dos quais 298 responderam a todos os itens. Inicialmente, elaboraram-se 62 itens para avaliar diversas dimensões de práticas parentais, identificando-se seis delas por meio de análises de componentes principais, resultando em uma versão com 27 itens. Os componentes e seus Alfas de Cronbach entre parênteses foram como seguem: controle punitivo (0,73), supervisão do comportamento (0,77), cobrança de responsabilidade (0,70), intrusividade (0,67), apoio emocional (0,89) e incentivo à autonomia (0,76). Neste sentido, tais autores concluíram que era possível distinguir dimensões de práticas educativas parentais mais específicas além daquelas de exigência e responsividade. Foram observadas correlações entre as práticas educativas parentais e variáveis de desenvolvimento psicossocial, indicando que as primeiras são importantes para o desenvolvimento psicossocial dos adolescentes, sugerindo evidências de validade concorrente de sua medida.

Estudos realizados por Gomide (2006) resultaram na elaboração do Inventário de Estilos Parentais (IEP). Composto por 42 questões, este avalia estilos parentais por meio de sete práticas educativas, sendo cinco relacionadas com o desenvolvimento de comportamentos antissociais (negligência, punição inconsistente, disciplina relaxada, monitoria negativa e abuso físico) e duas relativas ao desenvolvimento de comportamentos pró-sociais (comportamento moral e monitoria positiva). Este instrumento foi inicialmente aplicado em uma amostra de 769 adolescentes do sexo masculino pertencentes a dois grupos: um em situação de risco e outro de não-risco. Os coeficientes de consistência interna destes fatores de estilos parentais variaram entre 0,46 e 0,87.

Martins et al. (2010) reuniram evidências de validade fatorial de uma escala de crenças parentais e práticas de cuidado na primeira infância, considerando o contexto brasileiro (E-CPPC). Eles consideraram o modelo de entendimento da parentalidade, proposto por Keller (2007), que engloba práticas de cuidado utilizadas por pais de crianças de até três anos de idade, bem como crenças que os mesmos possuem e orientam seus comportamentos. A escala foi aplicada em duas amostras com 250 e 600 mães, identificando-se dois fatores: cuidados primários e estimulação, que apresentaram Alfas de Cronbach variando de 0,68 a 0,83. Portanto, estes autores sugeriram que tal medida reuniu evidências de validade fatorial e confiabilidade.

Em um estudo realizado por Kobarg, Vieira e Vieira (2010), objetivou-se validar a escala que avalia lembranças de práticas de criação na infância, a EMBU. O estudo contou com uma amostra de 454 universitários, de ambos os sexos. O instrumento inicialmente era composto por 23 itens para cada um dos pais e os itens eram respondidos em uma escala de quatro pontos. As dimensões avaliadas no instrumento eram: suporte emocional, rejeição e superproteção. A partir de uma análise fatorial com extração varimax, verificou-se que os três fatores explicaram 44,14% da variância das respostas dos sujeitos. Na versão final, a EMBU ficou com 21 itens, dois a menos que na versão inicial. Os autores assinalam para a importância da validação do instrumento que necessita ser contextualizado à cultura em que é aplicado.

Em resumo, existem diversos instrumentos no contexto brasileiro que permitem conhecer estilos e práticas parentais. Contudo, nem todos se centram em avaliar as dimensões de exigência e responsividade (Teixeira et al., 2004). Verifica-se que alguns foram dirigidos a mapear estruturas fatoriais complexas, com múltiplos fatores (Costa et al., 2000; Teixeira et al., 2006) e outros apresentaram coeficientes baixos de consistência interna (Benetti & Balbinotti, 2003; Gomide, 2006). Neste sentido, considerou-se a possibilidade de, partindo de uma medida elaborada no contexto brasileiro para avaliar múltiplos fatores de percepção dos pais, identificar as dimensões supracitadas de estilos parentais. Pretende-se, pois, obter uma estrutura fatorial mais parcimoniosa, reunindo evidências de sua adequação em termos de consistência interna. Portanto, antes de apresentar resultados referentes ao estudo, demanda-se conhecer o referido instrumento.

Questionário de Percepção dos Pais (QPP)

Segundo Pasquali e Araújo (1986), o QPP teve como meta proporcionar um levantamento da percepção dos filhos acerca de comportamentos e atitudes de seus pais. Sua elaboração partiu dos trabalhos de Schaefer (1965), em que se apresentavam 189 itens distribuídos em três fatores principais: aceitação / rejeição, autonomia psicológica / controle psicológico e controle firme / controle lasso. Com base neste referencial, foram adaptados ou elaborados mais de 200 itens para os quais se checaram evidências de sua validade semântica. Neste caso, contou-se com a participação de 25 adolescentes, estudantes de ensino médio com idades de 15 a 18 anos. Com base nesta análise preliminar, reformularam-se alguns itens e outros foram eliminados, resultando na versão inicial do instrumento composta por 185 itens.

Com o propósito de reduzir estes itens, chegando a uma versão do QPP que fosse mais prática e funcional, realizou-se uma análise fatorial exploratória dos componentes principais (CP). Na ocasião, o questionário foi respondido por 171 adolescentes, de ambos os sexos, estudantes de ensino fundamental e médio, dos quais 85 responderam uma versão do questionário destinada à percepção do pai e 86 à da mãe. Em função de critérios fixados a priori pelos autores (cargas fatoriais mínimas de 0,30, saturação em um único fator e número mínino de três itens por fator), retiveram-se 65 itens distribuídos em 12 fatores relacionados com a percepção do pai, explicando 52,5% da variância total, e 19 fatores que representavam a percepção da mãe, responsáveis por explicar 68,2% da variância total.

Esta nova versão do QPP foi aplicada a 574 estudantes dos ensinos fundamental (9%), médio (50%) e universitário (41%), com média de idade de 17,5 anos, a maioria proveniente de famílias em que os pais viviam juntos (75%). Todos responderam as versões para pai e mãe, realizando-se análises de componentes principais para cada conjunto de itens, segundo se referissem à figura de um dos genitores. Para a retenção do item em cada fator foram considerados os mesmos critérios anteriormente apresentados, acrescentando-se valores próprios iguais ou superiores a 1,5 e cargas fatoriais a partir de 0,40. A matriz de dados da versão para o pai permitiu extrair até sete componentes, mas em função dos critérios estabelecidos, os itens foram agrupados em quatro que explicaram conjuntamente 33,6% da variância. No caso da versão para a mãe, extraíram-se cinco componentes, eliminando-se um deles por não atender aos critérios estabelecidos, restando os quatro que explicaram 35,1% da variância total.

Com base nas correlações entre os fatores em ambas as versões, conjeturaram-se dois fatores de segunda ordem (Pasquali & Araújo, 1986). Portanto, na etapa subsequente, que tinha como propósito verificar a precisão (consistência interna) do QPP, calcularam-se coeficientes para cada componente específico e para os dois admitidos como de segunda ordem. Na versão para o pai, estes componentes de segunda ordem foram nomeados como amizade, composto pelos componentes de primeira ordem companheiro amigo e centralização no filho, e disciplina, que abarcou os componentes disciplina punitiva e disciplina lassa. Na versão para mãe, o componente de segunda ordem disciplina reuniu os componentes de primeira ordem superproteção, controle lasso e punição, enquanto que aquele nomeado como amizade foi constituído pelos itens do componente de primeira ordem, denominado intimidade amiga. Nas versões do QPP para pai e mãe, excetuando o terceiro componente de primeira ordem (disciplina/controle lasso), cujos coeficientes Kuder-Richardson (KR21) foram 0,62 e 0,61, respectivamente, os demais apresentaram valores acima de 0,70.

Em resumo, este instrumento reuniu evidências de validade fatorial, permitindo de certo modo contemplar as dimensões de afeto (responsividade) e controle (exigência) identificadas na literatura, apresentando indicadores de consistência interna (KR21) que podem ser admitidos como satisfatórios ao menos para propósitos de pesquisa (Pasquali, 2003). Contudo, indaga-se acerca da viabilidade de contar com uma medida mais reduzida, focada especificamente nas dimensões de segunda ordem, cujas pontuações alta e baixa podem ser combinadas para formar os quatro estilos parentais citados na literatura: autoritativo, autoritário, negligente e indulgente (permissivo) (Pereira, Canavarro, Cardoso, & Mendonça, 2009; Weber, Prado, Viezzer, & Brandenburg, 2004). Precisamente este foi o norte do presente estudo, descrito a seguir.

Método

Participantes

O presente estudo contou com a participação de 386 estudantes (208 do sexo masculino e 178 do feminino) com idades entre 10 e 16 anos (m = 12,7, DP = 1,60), cursando do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental, distribuídos equitativamente entre instituições de ensino públicas e privadas da cidade de João Pessoa (PB). Tratou-se de uma amostra de conveniência (não-probabilística), tendo participado os jovens que, autorizados pela direção de cada escola, concordaram em responder voluntariamente o questionário. Foi informado aos responsáveis, bem como aos próprios respondentes, que a pesquisa tinha um caráter confidencial e que, em qualquer momento da pesquisa, os mesmos poderiam desistir de responder o questionário sem nenhum tipo de prejuízo.

Instrumentos

Os participantes receberam um livreto contendo quatro partes principais: Escala de Condutas Antissociais e Delitivas, Questionário dos Valores Básicos, Questionário de Percepção dos Pais e Questionário Demográfico. Considerando os propósitos deste estudo, unicamente estes dois últimos são descritos a seguir.

Questionário de Percepção dos Pais: A versão original apresentada pelos autores continha mais de 50 itens (Pasquali & Araújo, 1986); porém, o propósito foi contar com uma medida mais reduzida. Neste sentido, com base no conteúdo semântico dos itens e de suas cargas fatoriais descritas no estudo de sua elaboração, selecionaram-se, para cada versão, isto é, pai e mãe, 20 itens igualmente distribuídos para representar as dimensões responsividade (por exemplo, Fica feliz de me ver quando volto da escola ou de um passeio; Consola-me quando estou com medo) e exigência (por exemplo, Acha que deve me castigar para me corrigir e melhorar; Fica sempre me lembrando das coisas que não posso fazer). Para cada item, o participante deve indicar em que medida o comportamento ou a atitude descrita é aplicável ou descreve cada um de seus pais, utilizando para isto uma escala de resposta de cinco pontos, variando de 0 = Nada aplicável a 4 = Totalmente aplicável.

Questionário Demográfico: Este instrumento foi elaborado com o fim de descrever os participantes do estudo, constando como última parte do livreto. Foram incluídas perguntas sobre o sexo, a idade e a religião dos jovens, mas também perguntas sobre sua religiosidade autopercebida (Em que medida você se considera religioso?) e identificação com diferentes grupos sociais (Em que medida você se identifica com os seguintes grupos: pais, irmãos, companheiros de estudo, vizinhos, familiares em geral e amigos). Em ambos os casos foi adotada a mesma escala de resposta, formada por cinco pontos, variando de 0 = Nada aplicável a 4 = Totalmente aplicável.

Procedimento

Coleta de dados. Atendendo recomendações éticas e em conformidade com a Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, tomou-se o cuidado de obter a autorização de diretores das escolas e o consentimento dos pais ou responsáveis pelos participantes. Posteriormente, agendaram-se datas para a aplicação dos instrumentos. Todos os estudantes responderam os questionários individualmente, porém em ambiente coletivo de sala de aula. Dois bolsistas treinados para esta finalidade foram responsáveis por coletar os dados. Na ocasião foi solicitado aos professores que se ausentassem, ficando na sala somente tais aplicadores, que foram instruídos a dirimir dúvidas unicamente na forma de responder, mas nunca no conteúdo de cada item dos instrumentos. O tempo médio para concluir a aplicação foi de, aproximadamente, 30 minutos.

Análise dos dados. Os dados foram tabulados e analisados por meio do PASW (versão 18). Inicialmente, buscou-se avaliar a adequação da matriz de correlações inter-itens do QPP para realizar análise fatorial, observando os indicadores KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) e Teste de Esfericidade de Bartlett. Em seguida, com o fim de conhecer o número de componentes a extrair, checaram-se diferentes critérios (Kaiser, Cattell e Horn), efetuando análises de componentes principais (CP). Para reunir evidências de precisão, foi calculada a consistência interna (Alfa de Cronbach) dos componentes resultantes.

Considerações Éticas

O presente estudo contou com aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Hospital Universitário Lauro Wanderley, da Universidade Federal da Paraíba (protocolo CEP/HULW nº 140/11).

Resultados

Inicialmente, averiguou-se a adequação da matriz de correlações entre os itens do QPP para realizar uma análise fatorial. Neste caso, foram observados indicadores satisfatórios tanto para versão destinada a avaliar a percepção da mãe [KMO = 0,85; Teste de Esfericidade de Bartlett (190) = 1.992,64, p < 0,001] como a do pai [KMO = 0,86; Teste de Esfericidade de Bartlett (190) = 2.340,29, p < 0,001]. Passo seguinte, procurou-se identificar o número de componentes a extrair, adotando-se o critério de Horn (análise paralela), procedimento alternativo aos critérios comumente empregados (Kaiser e Cattell), que têm apresentado resultados ambíguos (Hayton, Allen, & Scarpello, 2004). Na análise paralela são comparados os valores próprios (eigenvalues) simulados com os valores próprios observados. No presente caso, admitiu-se uma estrutura de banco de dados formado por 386 participantes e 20 itens, efetuando-se 1.000 simulações; os resultados correspondentes foram comparados com aqueles da análise de CP. O componente é identificado quando o valor próprio observado é superior ao simulado. Os resultados desta análise são mostrados na Tabela 1.

De acordo com a Tabela 1, unicamente os dois primeiros valores próprios observados para os questionários de percepção da mãe (4,69 e 2,88, respectivamente) e do pai (5,38 e 2,90, respectivamente) foram superiores àqueles simulados, sugerindo a pertinência de extrair unicamente dois componentes para ambas as versões do QPP. Portanto, decidiu-se realizar uma análise CP para cada versão deste instrumento, segundo o foco (pai ou mãe), adotando rotação varimax e critério de saturação superior a 0,30. Descrevem-se a seguir os resultados específicos para cada progenitor.

Questionário de Percepção da Mãe. Os resultados desta versão são resumidos na Tabela 2. Como é possível observar, os dois componentes extraídos apresentaram valores próprios superiores a 2, explicando conjuntamente 37,9% da variância total. Estes podem ser descritos nos seguintes termos:

Componente I. Compôs-se de onze itens com saturações variando de 0,33 (Item 5. Gostaria que eu ficasse mais em casa onde ela pode cuidar de mim) a 0,76 (Item 7. Consola-me quando estou com medo). Seu valor próprio foi 4,69, explicando 23,5% da variância total, apresentando consistência interna (Alfa de Cronbach) de 0,84. A análise semântica dos itens não deixa dúvida acerca do construto representado: responsividade, evidenciando comportamentos relacionados à comunicação e promoção de apoio, expressando a afetividade e a harmonia na relação mãe-filho.

Componente II. Reuniu oito itens cujas saturações variaram de 0,31 (Item 6. Quando estou fora de casa quer saber realmente onde estou e o que estou fazendo) a 0,76 (Item 19. Acredita que todos os meus comportamentos maus devem ser castigados de alguma forma). Com um valor próprio de 2,88, este componente contribuiu com 14,4% da variância total; seu Alfa de Cronbach foi 0,73. Seus itens com maiores saturações são claros em relação ao conteúdo abordado: exigência. Retratam, portanto, a percepção do/a jovem em relação à autoridade da mãe, descritas em ações como a monitoração, a exigência e o controle dos comportamentos do/a filho/a.

Questionário de Percepção do Pai. Na Tabela 3 é possível observar um resumo da análise de CP referentes às percepções dos respondentes em relação ao seu pai. Dois componentes foram extraídos, explicando conjuntamente 41,4% da variância total. Tais componentes podem ser descritos como seguem:

Componente I. Os itens que o compuseram apresentaram saturações entre 0,54 (Item 16. Permite que eu receba meus amigos em casa) e 0,77 (Item 10. Procura me animar quando estou triste). Este apresentou valor próprio de 5,38, explicando 26,9% da variância total. Sua consistência interna (Alfa de Cronbach) se situou em 0,86. O conteúdo destes itens revelou tratar-se de responsividade paterna, caracterizada com estratégias como conversar com o filho, compartilhar ideias e problemas, ouvi-lo e demonstrar afeto.

Componente II. Este concentrou itens com saturações variando entre 0,33 (Item 18. Não parece notar muito se me comporto bem em casa ou me saio bem na escola) e 0,75 (Item 5. Acredita que todos os meus comportamentos maus devem ser castigados de alguma forma). Seu valor próprio foi 2,89, contribuindo com a explicação de 14,5% da variância total; seu Alfa de Cronbach foi 0,85. A leitura de seus itens sugere a obediência imposta e o castigo como forma de assegurar o cumprimento de normas e regras sociais, primando-se pela manutenção de condutas consideradas como socialmente corretas. Deste modo, fica evidente sua denominação de exigência.

Em resumo, parece evidente nas versões para pais e mães uma estrutura bidimensional da Escala de Percepção dos Pais, retratando duas dimensões principais de estilos parentais: responsividade e exigência. Seus coeficientes de consistência interna dão conta da adequação de cada um desses componentes.

Discussão

O objetivo deste estudo foi conhecer evidências de validade fatorial e consistência interna de uma versão reduzida do Questionário de Percepção dos Pais - QPP (Pasquali & Araújo, 1986). Confia-se que este tenha sido alcançado. De fato, as análises estatísticas efetuadas permitiram identificar as duas dimensões principais dos estilos parentais que têm sido referidos na literatura, isto é, responsividade e exigência (Baumrind, 2005; Teixeira et al., 2004; Weaver & Prelow, 2005), cujos coeficientes de consistência interna (Alfas de Cronbach) se situaram acima do ponto de corte comumente recomendado (0,70) (Pasquali, 2003). Apesar disso, é prudente alertar acerca da restrição da amostra de participantes, que não pode ser considerada representativa. Porém, foi suficiente para realizar as análises empreendidas (Osborne & Costello, 2004). Neste sentido, discutem-se a seguir os principais achados.

Apesar de se tratar de uma versão reduzida do instrumento original (Pasquali & Araújo), a estrutura fatorial de segunda ordem subjacente foi claramente resguardada. Neste caso, teórica e empiricamente foram evidentes os componentes responsividade e exigência. Apesar de quatro ou cinco componentes serem plausíveis quando empregados critérios de extração como Kaiser (valor próprio maior que 1) e Cattell (representação gráfica dos valores próprios), optou-se por critério mais robusto, efetuando simulações (análise paralela) para contrastar os valores próprios gerados aleatoriamente com aqueles efetivamente observados (Laros, 2004).

Seguindo a indicação de extração de dois componentes, nitidamente foram identificadas as dimensões preditas para as versões de percepção de pais e mães. Especificamente, uma dimensão cobriu elementos que traduzem comportamentos relacionados com comunicação aberta, promoção de apoio e demonstração de afetividade e harmonia na relação entre os pais e o/a filho/a (responsividade), enquanto a outra enfocou aspectos que destacavam monitoração de comportamento, exigências e controle comportamental, refletindo a percepção dos pais como figuras de autoridade (exigência). Estes resultados reforçam aqueles descritos por Pasquali e Araújo (1986) que, embora tenham extraído quatro componentes para cada versão do QPP, descreveram dois de segunda ordem denominados como amizade e disciplina, que são muito similares aos aqui identificados. De fato, independente dos termos utilizados pelos pesquisadores, estas dimensões têm sido comumente identificadas, expressando o controle e o afeto parentais (Musitu et al., 2008).

No presente estudo, entretanto, optou-se por denominar os componentes identificados como responsividade e exigência, renunciando à denominação prévia de Pasquali e Araújo, por serem estas mais adequadas à literatura corrente acerca de estilos e práticas de socialização parentais. Todavia, a ideia expressa pelos componentes é a mesma; a exigência indica a noção de controle, implicando a percepção dos filhos acerca da cobrança, supervisão e exigências impostas pelas figuras materna e paterna; já a responsividade abarca o afeto, traduzido na percepção que o jovem tem em termos de sensibilidade, aceitação e compromisso de seus pais (Baumrind, 2005; Gomide, 2006; Weaver & Prelow, 2005). Neste ponto, cabe questionar a maior contribuição da dimensão responsividade, quando comparada com exigência, para explicar a variância total da percepção que os jovens têm de seus pais. Embora esta diferença possa ser atribuída a maior complexidade desta última dimensão, conjetura-se aqui uma explicação mais simples: talvez a percepção dos jovens acerca de seus pais varie mais em termos dos afetos (responsividade) do que da autoridade (exigência) (Weber et al., 2004), o que parece plausível em razão da fase em que se encontram os participantes do estudo (média de 12,7 anos de idade), com preocupações e cobranças mais nítidas por parte dos pais. Demandam-se estudos futuros que considerem esta conjetura.

Parece evidente, pois, que é possível descrever a percepção dos adolescentes em relação aos seus pais por meio de duas dimensões principais de estilos parentais: responsividade e exigência. Mas, como então identificar os quatro tipos de estilos parentais (autoritário, autoritativo, negligente e indulgente) a partir destas dimensões? Neste caso, recomenda-se que, a partir da mediana empírica observada para cada uma delas, definam-se grupos inferiores e superiores, estratégia que vem já sendo empregada (Costa et al., 2000; Musitu & García, 2001). No caso, o estilo autoritário é representado como pontuação alta em exigência e baixa em responsividade, enquanto o autoritativo implicaria pontuação alta nas duas dimensões; o estilo negligente implica pontuação baixa em responsividade e exigência, e o indulgente se configura quando há pontuação alta em responsividade, porém baixa em exigência.

Macarini, Martins, Minetto e Vieira (2010), em revisão da literatura no Brasil sobre práticas parentais, identificaram 64 artigos que consideraram ao menos uma das seguintes palavras-chave: "práticas educativas", "estilos parentais", "práticas parentais", "práticas de cuidado" e "cuidados parentais". Deste total, mais de um terço (24) empregou algum questionário ou escala; o presente estudo não oferece um instrumento que substitua os existentes, mas traduz um esforço para contribuir com esta temática, que tem cada dia mais atraído o interesse de pesquisadores nacionais. Resgatar um instrumento dos anos 1980 pareceria sem sentido, não fosse a adequação de seus parâmetros psicométricos, sua brevidade e facilidade de responder. Além disso, trata-se de um instrumento de uso público, isto é, não é comercializado, estimulando estudos na área e contribuindo com as práticas profissionais dos psicólogos interessados em compreender a relação entre pais e filhos.

Finalmente, as versões propostas da medida de estilos parentais (QPP-20-P e QPP-20-M) reúnem parâmetros que são iguais ou inclusive superiores àqueles descritos na literatura. Os itens mais destoantes, com menores saturações, poderiam ser eliminados, considerando sete ou oito itens por dimensão. Porém, precisará ser avaliado o impacto desta redução nos parâmetros desta medida. Faltam também estudos sobre outros parâmetros, como estabilidade temporal, validade convergente-discriminante e validade preditiva, por exemplo. Além disso, reconhece-se que as análises realizadas foram exploratórias; caberá futuramente confirmar a adequação do modelo bifatorial, contrastando-o com um alternativo, unidimensional, e checar sua invariância fatorial.

Conclusões

O objetivo deste estudo foi conhecer evidências de validade fatorial e consistência interna de uma versão reduzida do Questionário de Percepção dos Pais - QPP (Pasquali & Araújo, 1986). Os resultados mostraram a existência dos dois fatores de estilo parental com parâmetro psicométricos robustos. Contudo, deve-se alertar que a amostra utilizada não pode ser considerada representativa da população brasileira, o que sugere a necessidade de futuras pesquisas com amostras mais abrangentes e diversificadas.

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Recebido: 05/01/2011

1ª revisão: 20/04/2011

2ª revisão: 05/07/2011

Aceite final: 10/07/2011

Luiz Pasquali é Professor Emérito do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília.

Valdiney Veloso Gouveia é Professor Titular do Departamento de Psicologia da Universidade Federal da Paraíba.

Walberto Silva dos Santos é Professor Adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará.

Patrícia Nunes da Fonsêca é Professora Adjunta do Departamento de Psicopedagogia da Universidade Federal da Paraíba.

Josemberg Moura de Andrade é Professor Adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade Federal da Paraíba.

Tiago Jessé Souza de Lima é doutorando em Psicologia Social pelo Programa de Pós-graduação da Universidade Federal da Paraíba.

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  • Endereço para correspondência:
    Luiz Pasquali.
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    Apoio: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      Ago 2012

    Histórico

    • Recebido
      05 Jan 2011
    • Aceito
      10 Jul 2011
    • Revisado
      05 Jul 2011
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