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Conflitos Conjugais e Parentais em Famílias com Crianças: Características e Estratégias de Resolução1 1 Artigo derivado da tese de doutorado da primeira autora, sob orientação da quarta autora, defendida no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). As autoras agradecem, sinceramente, aos autores do Projeto TIV e aos alunos de graduação e pós-graduação que recrutaram, coletaram e inseriram os dados da pesquisa, bem como às famílias participantes.

Conflictos Conyugales y Parentales en Familias con Niños: Características y Estrategias de Resolución

Resumo:

Conflitos são considerados inevitáveis nos relacionamentos e, portanto, mais do que a ocorrência, o que importa são as estratégias utilizadas para sua resolução. O objetivo do estudo foi compreender as características e as estratégias de resolução de conflitos conjugais e parentais em famílias com crianças. Trata-se de pesquisa empírica, de delineamento qualitativo, da qual participaram 12 casais, que responderam a uma entrevista semiestruturada. Análise categorial temática evidenciou que os conflitos conjugais envolveram motivos pessoais, relacionais e contextuais e a utilização de estratégias de resolução construtivas e destrutivas. As estratégias construtivas abrangeram comunicação aberta e solução de problemas; as destrutivas, evitação e hostilidade verbal. Os conflitos pais-criança abarcaram motivos relacionados à dificuldade parental para imposição de limites, com uso de estratégias construtivas, caracterizadas pela disciplina não violenta, bem como estratégias destrutivas, com agressão física e psicológica. Os achados desse estudo podem contribuir para intervenções de profissionais que atuam com famílias, em diferentes contextos.

Palavras-chave:
conflito; conflito conjugal; relações pais-criança; relações familiares; resolução de conflito

Resumen:

Los conflictos son inevitables en las relaciones y, por lo tanto, lo que importa mas allá de la ocurrencia son las estrategias utilizadas para su resolución. El objetivo fue comprender las características y las estrategias de resolución de conflictos conyugales y parentales en familias con niños. Se trata de un estudio empírico cualitativo, del cual participaron 12 parejas, que respondieron una entrevista semiestructurada. El análisis categorial temático evidenció que los conflictos conyugales abarcaron motivos personales, relacionales y contextuales y la utilización de estrategias de resolución constructivas y destructivas. Las estrategias constructivas implican comunicación abierta y solución de problemas, y las destructivas implican evitación y hostilidad verbal. Los conflictos padres-hijos abarcaron motivos relacionados a la dificultad parental para imposición de límites, con uso de estrategias constructivas, caracterizadas por la disciplina no violenta, y destructivas, con agresión física y psicológica. Los hallazgos de este estudio pueden contribuir para intervenciones de profesionales que actúan con familias en diferentes contextos.

Palabras clave:
conflicto; conflicto marital; relaciones padres-niños; relaciones familiares; resolución de conflicto

Abstract:

Conflicts are considered inevitable in relationships and, therefore, more than their occurrence, what matters are the strategies used for resolving them. The aim of the study was to investigate the characteristics of, and the strategies used for resolving, marital and parental conflicts in families with children. It is an empirical study, with qualitative design, in which 12 couples participated in a semi-structured interview. Thematic categorical analysis has shown that marital conflicts involved personal, relational and contextual reasons and the use of constructive and destructive resolution strategies. Constructive strategies included an emphasis on open communication and problem solving; destructive, emphasis on avoidance and verbal hostility. Parent-child conflicts involved reasons related to the parental difficulty in imposing limits, with the use of constructive strategies, characterized by non-violent discipline, and destructive, by physical and psychological aggression. The findings of this study may contribute to interventions of professionals who work with families, in different contexts.

Keywords:
conflict; marital conflict; parent-child relations; family relations; conflict resolution

Conflitos são considerados inevitáveis nos relacionamentos (Bolze, Crepaldi, Schmidt, & Vieira, 2013Bolze, S. D. A., Crepaldi, M. A., Schmidt, B., & Vieira, M. L. (2013). Relacionamento conjugal e estratégias de resolução de conflito entre casais. Actualidades en Psicología, 27(114), 71-85. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0258-64442013000100006
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) e, portanto, mais do que a sua ocorrência, o que importa são as estratégias utilizadas para a sua resolução. Os conflitos conjugais influenciam todo o sistema familiar, especialmente as relações entre o subsistema conjugal (casal) e o parental (pais-criança) (Rinaldi & Howe, 2003Rinaldi, C. M., & Howe, N. (2003). Perceptions of constructive and destructive conflict within and across family subsystems. Infant and Child Development, 12(5), 441-459. doi: 10.1002/icd.324
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). Do ponto de vista das repercussões que provocam aos membros da família, os conflitos conjugais podem ser classificados como construtivos ou destrutivos (Cummings & Davies, 2010Cummings, E. M., & Davies, P. T. (2010). Marital conflict and children: An emotional security perspective. New York, NY: Guilford Press.; Goeke-Morey, Cummings, Harold, & Shelton, 2003Goeke-Morey, M. C., Cummings, E. M., Harold, G. T., & Shelton, K. H. (2003). Categories and continua of destructive and constructive marital conflict tactics from the perspective of U.S. and Welsh children. Journal of Family Psychology, 17(3), 327-338. doi: 10.1037/0893-3200.17.3.327
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).

Conflitos conjugais construtivos envolvem comportamentos que incluem a resolução com estratégias bem-sucedidas, progressos para solucionar a situação (por exemplo, mudar de assunto ao invés de continuar a briga), respeito mútuo e percepções positivas de conflitos não resolvidos (Cummings & Davies, 2010Cummings, E. M., & Davies, P. T. (2010). Marital conflict and children: An emotional security perspective. New York, NY: Guilford Press.; Cummings, Goeke-Morey, & Papp, 2016Cummings, E. M., Goeke-Morey, M. C., & Papp, L. M. (2016). Couple conflict, children, and families: It’s not just you and me, babe. In A. Booth, A. C. Crouter, M. L. Clements, & T. Boone-Holladay (Eds.), Couples in conflict: Classic edition (pp. 117-148). New York, NY: Routledge.). Quando os conflitos ocorrem na presença da criança, explicações por parte dos pais de como os conflitos foram resolvidos e, até mesmo, elucidações deles de que os conflitos não são uma ameaça grave ou que podem ser manejados, são consideradas estratégias construtivas, pois ajudam a criança a desenvolver comportamentos positivos em situação de conflito nos seus relacionamentos (Bergman, Cummings, & Warmuth, 2016Bergman, K. N., Cummings, E. M., & Warmuth, K. A. (2016). The benefits of marital conflict: Constructiveness and resolution as predictors of positive child outcomes. In D. Narvaez, J. N. Braungart-Rieker, L. E. Miller-Graff, L. T. Gettler, & P. D. Hastings (Eds.), Contexts for young child flourishing: Evolution, family and society (pp. 233-245). New York, NY: Oxford University Press.).

Em contrapartida, conflitos identificados como destrutivos incluem estratégias de agressão verbal ou violência física entre os membros do casal, hostilidade não verbal ou “tratamento silencioso”. Ademais, conflitos destrutivos envolvem a retirada abrupta durante a interação conflitiva, causando a obstrução desta, ameaças à estabilidade da família (por exemplo, dizer que vai se separar ou sair de casa) e brigas sobre temas relacionados à criança (Coln, Jordan, & Mercer, 2013Coln, K. L., Jordan, S. S., & Mercer, S. H. (2013). A unified model exploring parenting practices as mediators of marital conflict and children’s adjustment. Child Psychiatry and Human Development, 44(3), 419-429. doi: 10.1007/s10578-012-0336-8
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; Cummings et al., 2016Cummings, E. M., Goeke-Morey, M. C., & Papp, L. M. (2016). Couple conflict, children, and families: It’s not just you and me, babe. In A. Booth, A. C. Crouter, M. L. Clements, & T. Boone-Holladay (Eds.), Couples in conflict: Classic edition (pp. 117-148). New York, NY: Routledge.).

Cummings et al. (2016Cummings, E. M., Goeke-Morey, M. C., & Papp, L. M. (2016). Couple conflict, children, and families: It’s not just you and me, babe. In A. Booth, A. C. Crouter, M. L. Clements, & T. Boone-Holladay (Eds.), Couples in conflict: Classic edition (pp. 117-148). New York, NY: Routledge.) mapearam os efeitos do conflito conjugal dos pais para a criança, evidenciando que esta pode responder de múltiplas formas à exposição ao conflito conjugal, incluindo reatividade emocional e alterações comportamentais. Esses autores também constataram a intervenção ou a mediação infantil na interação conflitiva, além de retirada da cena de conflito com o intuito de evitá-lo. Destacaram-se expressões e posturas de angústia, tristeza, raiva, medo e preocupação, indicando que o conflito de casal dos pais se mostra como um estressor significativo para a criança.

Além disso, o conflito conjugal na presença da criança pode afetá-la de forma direta - pela própria exposição em si e por servir como um modelo de resolução de problemas -, bem como indireta - por comprometer o relacionamento pais-filhos e por gerar mudanças nas práticas parentais (na responsividade emocional e na imposição da disciplina) (Coln et al., 2013Coln, K. L., Jordan, S. S., & Mercer, S. H. (2013). A unified model exploring parenting practices as mediators of marital conflict and children’s adjustment. Child Psychiatry and Human Development, 44(3), 419-429. doi: 10.1007/s10578-012-0336-8
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). Desse modo, o conflito conjugal está relacionado a práticas parentais negativas, associando-se ao conceito de efeito spillover (Erel & Burman, 1995Erel, O., & Burman, B. (1995). Interrelatedness of marital relations and parent-child relations: A meta-analytic review. Psychological Bulletin, 118(1), 108-132. doi: 10.1037/0033-2909.118.1.108
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), o qual sustenta a hipótese de que há um transbordamento da qualidade da relação conjugal para o relacionamento pais-filhos (Hameister, Barbosa, & Wagner, 2015Hameister, B. R., Barbosa, P. V., & Wagner, A. (2015). Conjugalidade e parentalidade: Uma revisão sistemática do efeito spillover. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 67(2), 140-155. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672015000200011&lng=pt&tlng=pt
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). Assim, o estresse e a hostilidade que emergem do conflito conjugal são transpostos para a relação parental, levando a mudanças na disponibilidade emocional dos pais (rejeição, hostilidade, irresponsividade) ou no controle que esses exercem sobre a criança (baixo monitoramento, disciplina severa ou inconsistente) (Cummings et al., 2016Cummings, E. M., Goeke-Morey, M. C., & Papp, L. M. (2016). Couple conflict, children, and families: It’s not just you and me, babe. In A. Booth, A. C. Crouter, M. L. Clements, & T. Boone-Holladay (Eds.), Couples in conflict: Classic edition (pp. 117-148). New York, NY: Routledge.; McCoy, George, Cummings, & Davies, 2013McCoy, K. P., George, M. R. W., Cummings, E. M., & Davies, P. T. (2013). Constructive and destructive marital conflict, parenting, and children’s school and social adjustment. Social Development, 22(4), 641-662. doi: 10.1111/sode.12015
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).

Ademais, o uso de estratégias de hostilidade e de violência nas interações conflitivas conjugais está associado a estratégias de disciplina severa com a criança, podendo incluir agressão psicológica e punição corporal, cuja utilização pode desencadear distúrbios emocionais e comportamentais infantis (Liu & Wang, 2015bLiu, L., & Wang, M. (2015b). Parenting stress and harsh discipline in China: The moderating roles of marital satisfaction and parent gender. Child Abuse & Neglect, 43, 73-82. doi: 10.1016/j.chiabu.2015.01.014
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). O uso de estratégias destrutivas de resolução de conflitos, pelo casal, relaciona-se a práticas parentais negativas e ao comprometimento do desenvolvimento infantil típico (Coln et al., 2013Coln, K. L., Jordan, S. S., & Mercer, S. H. (2013). A unified model exploring parenting practices as mediators of marital conflict and children’s adjustment. Child Psychiatry and Human Development, 44(3), 419-429. doi: 10.1007/s10578-012-0336-8
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; Hameister et al., 2015Hameister, B. R., Barbosa, P. V., & Wagner, A. (2015). Conjugalidade e parentalidade: Uma revisão sistemática do efeito spillover. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 67(2), 140-155. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672015000200011&lng=pt&tlng=pt
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).

Diferentemente das interações conflitivas entre cônjuges, quando pais e filhos se envolvem em situações de conflitos, por diferenças substanciais de poder, o desejo dos pais tende a prevalecer (Recchia, Ross, & Vickar, 2010Recchia, H. E., Ross, H. S., & Vickar, M. (2010). Power and conflict resolution in sibling, parent-child, and spousal negotiations. Journal of Family Psychology, 24(5), 605-615. doi: 10.1037/a0020871
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). Para controlar o comportamento da criança e obter obediência, os pais lançam mão de estratégias construtivas de resolução de conflitos (com uso racional de discussão, argumento e raciocínio) e destrutivas (com uso de atos verbais ou não verbais ameaçadores ou de força física) (Rinaldi & Howe, 2003Rinaldi, C. M., & Howe, N. (2003). Perceptions of constructive and destructive conflict within and across family subsystems. Infant and Child Development, 12(5), 441-459. doi: 10.1002/icd.324
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). Estudos com amostras brasileiras evidenciaram o predomínio de estratégias construtivas, principalmente disciplina não violenta, que envolve o fornecimento de explicações à criança sobre o que é certo e errado, privações e retirada de regalias (Peruhype, Halboth, & Alves, 2011Peruhype, R. C., Halboth, N. V., & Alves, P. A. B. (2011). Uso da violência doméstica como prática educativa: Conhecendo a realidade em Diamantina-MG, Brasil. Textos & Contextos (Porto Alegre), 10(1), 170-178. Recuperado de http://revistaseletronicas.pucrs.br/fass/ojs/index.php/fass/article/view/7948/6432
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; Runyan et al., 2010Runyan, D. K., Shankar, V., Hassan, F., Hunter, W. M., Jain, D., Paula, C. S., Bordin, I. A. (2010). International variations in harsh child discipline. Pediatrics, 126(3), e701-e711. doi: 10.1542/peds.2008-2374
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). Contudo, estratégias destrutivas que compreendem agressão psicológica e castigos físicos também parecem comuns na criação de crianças, no Brasil e em outros países (Carmo & Alvarenga, 2012Carmo, P. H. B., & Alvarenga, P. (2012). Práticas educativas coercitivas de mães de diferentes níveis socioeconômicos. Estudos de Psicologia (Natal), 17(2), 191-198. doi: 10.1590/S1413-294X2012000200001
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; Gershoff & Grogan-Kaylor, 2016Gershoff, E. T., & Grogan-Kaylor, A. (2016). Spanking and child outcomes: Old controversies and new meta-analyses. Journal of Family Psychology, 30(4), 453-469. doi: 10.1037/fam0000191
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; Moura, Moraes, & Reichenheim, 2008Moura, A. T. M. S., Moraes, C. L., & Reichenheim, M. E. (2008). Detecção de maus-tratos contra a criança: Oportunidades perdidas em serviços de emergência na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, 24(12), 2926-2936. doi: 10.1590/S0102-311X2008001200022
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; Runyan et al., 2010Runyan, D. K., Shankar, V., Hassan, F., Hunter, W. M., Jain, D., Paula, C. S., Bordin, I. A. (2010). International variations in harsh child discipline. Pediatrics, 126(3), e701-e711. doi: 10.1542/peds.2008-2374
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). Essas estratégias são consideradas destrutivas porque ensinam a criança que os problemas devem ser resolvidos por meio de violência, comprometendo seu funcionamento social e relacionamento com irmãos e pares (Simons & Wurtele, 2010Simons, D. A., & Wurtele, S. K. (2010). Relationships between parents’ use of corporal punishment and their children’s endorsement of spanking and hitting other children. Child Abuse & Neglect, 34(9), 639-646. doi: 10.1016/j.chiabu.2010.01.012
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).

Assim, evidencia-se a necessidade de aprofundar a compreensão dos fenômenos que envolvem estratégias de resolução de conflitos conjugais e parentais. No que tange à relação de casal, uma recente revisão sistemática da literatura, com os descritores conflito conjugal, casamento e resolução de problemas, indicou a carência de estudos sobre essa temática no contexto brasileiro (Costa, Cenci, & Mosmann, 2016Costa, C. B., Cenci, C. M. B., & Mosmann, C. P. (2016). Conflito conjugal e estratégias de resolução: Uma revisão sistemática da literatura. Temas em Psicologia, 24(1), 325-338. doi: 10.9788/TP2016.1-22
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). Além disso, estudos que se referem às repercussões do conflito conjugal para o ajustamento dos filhos ainda são escassos no Brasil (Goulart, Wagner, Barbosa, & Mosmann, 2015Goulart, V. R., Wagner, A., Barbosa, P. V., & Mosmann, C. P. (2015). Repercussões do conflito conjugal para o ajustamento de crianças e adolescentes: Um estudo teórico. Interação em Psicologia, 19(1), 147-159. doi: 10.5380/psi.v19i1.35713
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). Salienta-se, ainda, a importância de pesquisas adotarem a família como unidade mínima de análise, ampliando o foco para além do indivíduo (Böing, Crepaldi, & Moré, 2008Böing, E., Crepaldi, M. A., & Moré, C. L. O. O. (2008). Pesquisa com famílias: Aspectos teórico-metodológicos. Paidéia (Ribeirão Preto), 18(40), 251-266. doi: 10.1590/S0103-863X2008000200004
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). Estudos dessa natureza contribuem para a compreensão da dinâmica complexa que perpassa as relações familiares.

De tal modo, o objetivo do presente estudo foi compreender as características e as estratégias de resolução de conflitos conjugais e parentais em famílias com crianças. Dada a complexidade da temática, realizou-se pesquisa empírica, com delineamento qualitativo, o qual é indicado em estudos com famílias, pois permite apreender de maneira multidimensional os fenômenos que circundam os participantes, aprofundar suas experiências, pontos de vista, opiniões e significados, ou seja, a forma como esses percebem subjetivamente a realidade (Böing et al., 2008Böing, E., Crepaldi, M. A., & Moré, C. L. O. O. (2008). Pesquisa com famílias: Aspectos teórico-metodológicos. Paidéia (Ribeirão Preto), 18(40), 251-266. doi: 10.1590/S0103-863X2008000200004
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).

Método

Participantes

Participaram 12 casais com filhos, cujo tempo de união conjugal foi de seis a 24 anos, sendo que oito díades tinham mais de 10 anos de casamento. A idade das mulheres variou entre 23 e 46 anos e dos homens, entre 26 e 48 anos. Cinco crianças eram do sexo feminino e sete, do masculino, cujas idades variaram entre 5 e 7 anos. A escolaridade das mulheres variou de 11 a 18 anos e dos homens, de oito a 18 anos. A renda familiar mensal variou de R$ 700,00 a R$ 4.000,00. A jornada de trabalho tanto das mulheres quanto dos homens variou de 20 a 44 horas semanais. Todos os participantes integraram uma pesquisa mais abrangente, desenvolvida por meio de parceria entre uma universidade brasileira e duas canadenses.

Instrumentos

Questionário sociodemográfico. Elaborado especificamente para o projeto de pesquisa do qual o estudo faz parte. Composto por 15 questões que investigam composição familiar, escolaridade, profissão, renda e carga horária de trabalho dos pais.

Entrevista semiestruturada. Investiga relações conjugais, parentais e intergeracionais, bem como conflitos e estratégias de resolução. Para o presente estudo, foram utilizadas apenas nove questões concernentes a conflitos conjugais e parentais (“Nós gostaríamos que cada um pudesse tentar lembrar e nos dizer uma situação de conflito que foi marcante, ao longo do relacionamento de vocês”); estratégias de resolução destes (“Como vocês resolveram essa situação?”); reações dos pais e da criança em situações de conflito entre o casal na presença dela (“Quando ocorreu esse conflito que vocês descreveram, onde a criança estava? O que vocês disseram para a criança na hora do conflito?”).

Procedimento

Coleta de Dados. A entrevista, agendada previamente via telefone, ocorreu no domicílio dos participantes e foi realizada em conjunto com os membros do casal por uma dupla de pesquisadoras, as quais são psicólogas. A entrevista envolvia um rapport, a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e a condução das perguntas via roteiro semiestruturado. Houve cuidado para que os membros da díade conjugal tivessem a oportunidade de responder individualmente a cada questão. O tempo da entrevista variou de 50 a 120 minutos. Ao final, fazia-se a síntese das principais temáticas abordadas, o acolhimento dos sentimentos e das percepções do casal sobre a experiência da entrevista.

Análise dos Dados. As entrevistas foram gravadas, transcritas e analisadas por meio de análise de conteúdo categorial temática (Bardin, 2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo (L. A. Reto & A. Pinheiro, Trads.). São Paulo, SP: Edições 70.), tendo sido organizadas com o recurso do software Atlas.ti 5.0, o qual se constitui como uma ferramenta adequada quando a categorização ocorre via processo de acervo (classificação analógica e progressiva dos elementos, na qual cada categoria somente é definida no final de cada operação). Após sucessivas leituras do corpus (12 entrevistas), definiram-se elementos de análise (temas), cuja classificação possibilitou a construção de subcategorias e suas respectivas categorias, as quais embasaram o fenômeno estudado. Essa categorização passou pela avaliação de dois juízes experts na temática e foi aprovada para uso, com pequenos ajustes. A porcentagem de concordância de cada um dos dois juízes com a primeira autora, baseada na fórmula de Fagundes (1999Fagundes, A. J. F. M. (1999). Descrição, definição e registro de comportamento (12a ed.). São Paulo, SP: Edicon.), foi, respectivamente, de 84.6% e 92.3%. Por fim, constituíram-se três categorias temáticas: Conflitos conjugais e estratégias de resolução; Conflitos parentais e estratégias de resolução; e Reações parentais e filiais frente ao conflito conjugal na presença da criança.

Considerações Éticas

O projeto no qual o presente estudo se insere foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina, sob o Certificado No. 520/2009. Com o intuito de preservar o sigilo dos informantes, os casais foram identificados pela letra C, a qual foi seguida pelo número que indica a ordem em que as entrevistas ocorreram (C1, C2, C3 e assim por diante até C12).

Resultados

Conflitos Conjugais e Estratégias de Resolução

Essa categoria, descrita por 11casais, abarcou situações de conflitos entre o casal relatados como significativos ou importantes, além de estratégias utilizadas de resolução de conflitos conjugais nessas ocasiões. É composta por três subcategorias, a saber: Conflitos conjugais; estratégias construtivas de resolução de conflitos conjugais; e estratégias destrutivas de resolução de conflitos conjugais.

Conflitos conjugais. Envolveram situações de conflitos na relação conjugal que foram relatadas como significativas ou importantes pelos membros do casal. Os temas que remeteram a motivos de conflito entre os cônjuges englobaram conteúdos diversificados, concernentes a aspectos pessoais, relacionais e contextuais. No que tange a aspectos pessoais, os casais relataram a dificuldade de sair da “solteirice” e adaptar-se à vida de casado, bem como depressão de um dos cônjuges e abuso de bebida alcoólica: “Tu quer fazer coisas que tu fazia quando tu era solteiro . . . e voltar dois dias depois e, às vezes, não voltar . . . Daí tu chega em casa, já tá te esperando pro combate, já vem te atacando” (C11; 7 anos de união); “É, porque eu tive depressão. Daí, digamos assim, que ele [esposo] não teve paciência.” (C9; 24 anos de união). “Ele [esposo] gosta de tomar uma cervejinha . . . Isso aí, acho que foi mais no começo, pelo menos, da nossa união, foi mais conflitante” (C12; 13 anos de união). Os aspectos relacionais foram mencionados por situações de ciúme, suspeita de traição por parte do cônjuge, brigas e/ou separação temporária, conforme o seguinte relato: “Suspeitei que ele [esposo] tava me traindo . . . Falei pra ele sair de casa. Não discuti na frente do [filho]. Mas, naquele momento, pra mim, não queria mais. Eu achei que não fosse mais dar certo” (C3; 7 anos de união). Os aspectos contextuais se referiram a conflitos devido à organização da casa, pelo distanciamento em virtude do trabalho e pela situação financeira: “No ano passado . . . eu tava muito ausente ou muito no trabalho. Ele [esposo] acabou se distanciando . . . tendo vários amigos, indo pro bar, bebendo um pouco. Então a gente chegou num ponto de assim: ‘Assim não dá mais’” (C4; 17 anos de união); “Eu tive algumas atitudes . . . de querer estar maquiando um estado real de situação financeira, de emprego e tudo mais . . . Veio à tona e a gente [casal] teve um conflito bem grave, de separação, de sair uns dias” (C10; 20 anos de união).

Estratégias construtivas de resolução de conflitos conjugais. Essa subcategoria englobou a busca pela resolução construtiva do conflito entre o casal, cujos temas foram caracterizados por conversas entre os cônjuges, orientadas para a comunicação aberta, avaliação de alternativas e solução de problemas. Essas estratégias contemplaram comportamentos tais como: conversar sobre o problema ou a situação que gerou o conflito; avaliar com o cônjuge as alternativas possíveis e chegar a um acordo; ser flexível, isto é, cada um ceder um pouco; e superar: voltar atrás, pedir desculpas e resolver a questão para continuar em frente: “Sempre que tem, assim, algum conflito a gente procura colocar: ‘Tá, o quê que tu estás achando que tá errado’? ‘Tá. Então, vamos tentar melhorar isso’” (C1; 6 anos de união). Alguns casais enfatizaram a importância de entender que há situações conflitivas que levam tempo para serem superadas: “É uma questão de tempo também, não adianta... São coisas que não tem como, duma hora pra outra, você falar assim: ‘Esqueci. Apaguei a minha memória’. Que só o tempo cura, né?” (C3; 7 anos de união). Um casal também mencionou a necessidade de solicitar a mediação de outro familiar: “Chamamos o pai. Coisa que eu nunca fiz [risos]. ‘O que o pai disse?’ . . . ‘Sentem e conversem, porque vocês têm uma filha’” (C4; 17 anos de união).

Estratégias destrutivas de resolução de conflitos conjugais. Essa subcategoria abarcou temas que remeteram a estratégias em que o casal optou pela evitação do conflito ou pelo uso de hostilidade verbal para sua resolução. A evitação caracterizou-se por não falar sobre o problema que desencadeou o conflito, seja temporariamente ou permanentemente. Nesse sentido, alguns participantes mencionaram que preferiam silenciar, ou seja, não conversar, e deixar que o tempo ajude a esquecer a situação conflitiva: “Se tem a ferida, não pode tocar nela. Então, ela dói. Então, eu tento ao máximo evitar isso, tocar nela” (C9; 24 anos de união). Outros, entretanto, optaram pelo afastamento temporário e deixaram para resolver o problema depois: “A gente fecha a cara um pro outro, ninguém fala nada” (C3; 7 anos de união); “Se for preciso dormir no quarto separado, dorme em quarto separado. E deixa pra outro dia, na hora é complicado” (C12; 13 anos de união). A hostilidade verbal remeteu a discussões que evoluíram para brigas, nas quais os membros do casal mediram forças na interação conflitiva e não cederam sem brigar e/ou cada um tentou convencer o cônjuge para fazer prevalecer a sua opinião: “A gente é, como eu posso dizer, um pouco mais escandaloso, quando a gente começa a discutir, a gente se exalta, então, grita” (C11; 7 anos de união); “Eu sou mais briguenta, sou mais inflexível, eu vou ceder, mas primeiro eu vou fazer ele [esposo] sofrer, primeiro vou deixar ele sentir que tá errado, depois eu vou cedendo aos poucos” (C10; 20 anos de união). Um entrevistado também mencionou que sua esposa costuma remoer conflitos do passado nas situações conflitivas: “Aí, tu [se dirigindo à esposa] quer sempre voltar naquela situação e isso, às vezes, atrapalha o nosso relacionamento. Porque a gente continua preso a coisas que, pô, já passaram cinco anos, quatro anos, sei lá” (C11; 7 anos de união).

Conflitos Parentais e Estratégias de Resolução

Essa categoria contou com a participação de 11 casais e abrangeu a descrição de interações conflitivas entre pais-criança que foram relatadas como significativas ou importantes pelos membros do casal, além das estratégias de resolução utilizadas por eles com a criança. É composta por três subcategorias: Conflitos parentais; Estratégias construtivas de resolução de conflitos parentais; e Estratégias destrutivas de resolução de conflitos parentais.

Conflitos parentais. Essa subcategoria envolveu temas relacionados à descrição de conflitos em situações de comportamentos infantis considerados inadequados pelos pais. As narrativas abarcaram a criança fazer birra, manha ou algo para chamar a atenção dos pais: “Quando ela quer uma coisa, e sabendo que não pode, ela insiste, insiste . . . Ela bate o pé” (C8; 14 anos de união); “Por exemplo, a hora do banho, que eu quero que ele [filho] se comporte e, aí, ele começa a brincar, começa a correr . . . Ele se esconde, aí é aquela briga” (C12; 13 anos de união). Outro motivo de conflito foi a demanda da criança por dormir na cama dos pais: “Ele tem essa insistência em estar dormindo no nosso meio . . . Aí, consegui negociar com ele que ele comece a dormir na cama dele. Aí, de madrugada ele vem pra nossa cama. Isso me deixa muito triste com ele” (C10; 20 anos de união). As demais situações relatadas incluíram a criança fazer algo sem avisar aos pais e os deixar preocupados, além de não se comportar adequadamente ou quebrar alguma coisa, envolvendo, inclusive, situação de uso de violência como fato isolado: “Quando ele [filho] quebrou meu celular . . . Porque eu nunca tinha batido no [filho], e naquele dia, eu bati nele. Bati” (C7; 9 anos de união).

Estratégias construtivas de resolução de conflitos parentais. Essa subcategoria abarcou estratégias de resolução de conflitos exercidas pelos pais com a criança, que envolveram temas relacionados à disciplina não violenta, ou seja, conversar e dar-lhe explicações, repreendê-la e chamar sua atenção: “Chamo mais atenção dela, converso” (C4; 17 anos de união). Os membros do casal também informaram adotar o isolamento temporário da criança e a privação de privilégios, ou seja, proibir a criança, por um determinado período, de brincar, usar o computador, assistir a algum programa de TV ou fazer outra coisa de que ela goste: “Sempre tentando explicar [por] qual motivo que ele [filho] está de castigo, [por] qual motivo que ele perdeu o brinquedo” (C5; 13 anos de união). Outra estratégias mencionada foi comunicar à criança como os pais se sentem quando ela faz algo errado ou fazê-la colocar-se no lugar da mãe ou do pai: “A mãe ficou muito triste, não deverias ter feito isso com o celular da mãe’, mas daí, abracei, dei um beijo e a gente foi dormir” (C7; 9 anos de união); “Falei assim ‘[filha], agora vamos supor que você seja o pai e eu sou você. Como é que você agiria se eu fizesse isso, isso e isso?’ Aí, ela começou a pensar que faria assim” (C8; 14 anos de união). Um dos pais referiu pedir desculpas à criança pela forma como agiu quando considerou não ter apresentado uma atitude adequada no momento da interação conflitiva: “Então, eu falo pra ele [filho]: ‘Olha, desculpa que eu te fiz tal coisa, mas foi por isso, e isso e isso. Que você também não faça mais’” (C1; 6 anos de união).

Estratégias destrutivas de resolução de conflitos parentais. Essa subcategoria abrangeu temas relacionados a ações de um ou de ambos os pais que envolveram agressão física e/ou psicológica com a criança. A punição corporal, com uso de palmadas ou chineladas, foi relatada em situações nas quais os pais visavam a castigar, obrigar a criança a fazer algo que era desejo dos pais ou cessar determinado comportamento que fosse considerado inadequado por eles: “Aí, eu juntei [bati com] uma sandália nele [filho]” (C12; 13 anos de união). A punição física também foi associada a estratégias de disciplina não violenta, tais como conversas e castigos: “É assim que tem que ser. Elas [filhas] também já crescem com isso, sabendo que tá errado. Elas são assim: às vezes fazem coisas e apanham, ou ficam de castigo, ou ficam sem alguma coisa” (C11; 7 anos de união). A agressão psicológica envolveu situações em que, na interação conflitiva com a criança, os pais usaram ameaçar, enganar, incitar culpa ou medo: “Às vezes, a gente tem que impor assim um, sei lá, um limite, um medo, pra que eles [filhos] se auto . . . Eles próprios cuidem das atitudes deles, né?” (C2; 15 anos de união). Quatro casais referiram arrependimento, após bater na criança: “Me doeu muito o coração, dei umas palmadas nele [filho] . . . Me senti covarde” (C12; 13 anos de união). Entretanto, um casal afirmou não se arrepender e considerar o castigo corporal necessário, em algumas situações: “Naquele momento ali, o que ele [filho] fez, não deveria ter feito. Foram duas chineladas na bunda, sabe? Então, pra mim, foi nada que eu tenha me arrependido de ter feito” (C7; 9 anos de união).

Reações Parentais e Filiais frente ao Conflito Conjugal na Presença da Criança

Essa categoria, evidenciada nas respostas de 10 casais, envolveu a identificação, pelos membros da díade conjugal, de interação conflitiva na presença da criança e as reações dos envolvidos nessas situações. É composta por duas subcategorias: Reações parentais frente ao conflito conjugal na presença da criança e Reações da criança frente ao conflito conjugal em sua presença.

Reações parentais frente ao conflito conjugal na presença da criança. Essa subcategoria abrangeu temas que remeteram a comportamentos dos membros do casal, com relação à criança, durante e após ela presenciar interação conflitiva entre eles. Os casais mencionaram que, durante a situação de conflito, pediram para a criança sair do recinto, explicaram a ela que não estavam brigando, mas sim conversando, ou cessaram a interação conflitiva frente à intervenção da criança: “A gente pede pra ele [filho] sair”, complementado pelo cônjuge: “Ir pro quarto. Fechar a porta” (C1; 6 anos de união); “Aí, ele [filho] já fala, assim: ‘Brigando com a mamãe?’ ‘Não! A gente tá conversando [filho]. A gente tá conversando, a gente não tá brigando’” (C3; 7 anos de união). Após o conflito, os participantes referiram conversar com a criança sobre o que ocorreu, tentando tranquilizá-la, ou explicar a ela que a situação de conflito não lhe diz respeito: “‘Isso é uma coisa que a mãe estava resolvendo com o pai e a mãe ficou nervosa’, eu falo assim pra ele” (C7; 9 anos de união); “Eu explico: ‘[filho], papai tá nervoso, deixa ele se acalmar’ ou ‘fica tranquilo, que não é nada contigo’” (C12; 13 anos de união). Houve uma parcela de participantes que afirmou não fornecer explicações para a criança após o conflito: “Na verdade, não falei assim muita coisa. Não falei quase nada assim pra ela [filha], porque ela viu a gente brigando” (C11; 7 anos de união).

Reações da criança frente ao conflito conjugal em sua presença. Essa subcategoria englobou temas que abarcaram a descrição de situações nas quais os membros do casal identificaram que a criança foi testemunha de interação conflitiva entre eles e as reações desta frente a isso. De acordo com os participantes, nessas ocasiões, a criança interveio no intuito de interromper o conflito conjugal ou ela tampou os ouvidos, roeu as unhas, chorou, ficou triste ou brava: “Inicialmente, ele [filho] fala: ‘Para de brigar’ . . . Aí, ele vê que não adianta . . . Aí, a gente fica brabo com ele. Porque, aí, ele tampa o ouvido, assim. E ele fica triste. E ele fica brabo também” (C1; 6 anos de união). Um casal identificou que a criança mencionou os conflitos em situações posteriores: “Eu lembro que ela [filha] chorou um monte, que ela ficou bem assustada, e ela lembra assim de bastante coisa. Mas até quando ela tinha uns 4 anos, ela falava: ‘tu lembras aquela vez, daquela briga lá do Carnaval?’” (C11; 7 anos de união). Três casais mencionaram que procuram não discutir na frente da criança.

Discussão

O objetivo do presente estudo foi compreender as características e as estratégias de resolução de conflitos conjugais e parentais em famílias com crianças. Os resultados revelaram o uso de estratégias construtivas e destrutivas de resolução de conflitos nos dois subsistemas investigados, corroborando achados de outras pesquisas (Goeke-Morey et al., 2003Goeke-Morey, M. C., Cummings, E. M., Harold, G. T., & Shelton, K. H. (2003). Categories and continua of destructive and constructive marital conflict tactics from the perspective of U.S. and Welsh children. Journal of Family Psychology, 17(3), 327-338. doi: 10.1037/0893-3200.17.3.327
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; Rinaldi & Howe, 2003Rinaldi, C. M., & Howe, N. (2003). Perceptions of constructive and destructive conflict within and across family subsystems. Infant and Child Development, 12(5), 441-459. doi: 10.1002/icd.324
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).

Os conflitos conjugais abarcaram motivos diversificados, sendo a maioria descrita na literatura científica, a qual aponta que dentre as principais razões de desentendimentos entre casais, incluem-se conteúdos referentes ao tempo que os cônjuges desfrutam juntos, questões relacionadas a dinheiro e divisão das tarefas domésticas (Dillon et al., 2015Dillon, L. M., Nowak, N., Weisfeld, G. E., Weisfeld, C. C., Shattuck, K. S., Imamoğlu, O. E., Shen, J. (2015). Sources of marital conflict in five cultures. Evolutionary Psychology, 13(1), 1-15. doi: 10.1177/147470491501300101
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; Mosmann & Falcke, 2011Mosmann, C., & Falcke, D. (2011). Conflitos conjugais: Motivos e frequência. Revista da SPAGESP, 12(2), 5-16. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702011000200002&lng=pt&tlng=pt
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). Outros motivos mencionados pelos participantes, tais como ciúmes, relações extraconjugais e uso de álcool, também se configuram como preditores significativos de conflito conjugal (Fincham, 2003Fincham, F. D. (2003). Marital conflict: Correlates, structure and context. Current Directions in Psychological Sciences, 12(1), 23-27. doi: 10.1111/1467-8721.01215
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).

No que tange à resolução de conflitos conjugais, os participantes referiram estratégias orientadas à comunicação aberta, com avaliação de alternativas e busca de solução de problemas, as quais podem ser compreendidas como construtivas (Cummings et al., 2016Cummings, E. M., Goeke-Morey, M. C., & Papp, L. M. (2016). Couple conflict, children, and families: It’s not just you and me, babe. In A. Booth, A. C. Crouter, M. L. Clements, & T. Boone-Holladay (Eds.), Couples in conflict: Classic edition (pp. 117-148). New York, NY: Routledge.). As estratégias destrutivas envolveram evitação e hostilidade verbal. Sobre a evitação, constatou-se, pelas falas dos participantes, uma distinção entre a evitação e o afastamento temporário. A evitação pode ser compreendida como uma estratégias destrutiva, no sentido de os cônjuges optarem pelo tratamento silencioso das questões conflitivas e por deixarem que o tempo resolva suas desavenças (Bolze et al., 2013Bolze, S. D. A., Crepaldi, M. A., Schmidt, B., & Vieira, M. L. (2013). Relacionamento conjugal e estratégias de resolução de conflito entre casais. Actualidades en Psicología, 27(114), 71-85. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0258-64442013000100006
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). Entretanto, cabe esclarecer que nem sempre a evitação é concebida como uma estratégias destrutiva (Costa & Mosmann, 2015Costa, C. B., & Mosmann, C. P. (2015). Estratégias de resolução dos conflitos conjugais: Percepções de um grupo. Psico, 46(4), 472-482. doi: 10.15448/1980-8623.2015.4.20606
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). Há casais que se consideram satisfeitos com seus casamentos e se caracterizam pelo tipo esquivo, isto é, têm como estilo minimizar seus problemas e evitar conflitos, enfatizando os aspectos positivos da relação (Driver, Tabares, Shapiro, & Gottman, 2016Driver, J., Tabares, A., Shapiro, A. F., & Gottman, J. M. (2016). Interação do casal em casamento com altos e baixos níveis de satisfação. In F. Walsh (Ed.), Processos normativos da família: Diversidade e complexidade (S. M. M. Rosa, Trad., 4a ed., pp. 57-77). Porto Alegre, RS: Artmed.). O afastamento temporário, por sua vez, é descrito como a opção de dar um tempo para refletir sobre a questão conflitiva e discuti-la posteriormente, a qual se configura como uma estratégia construtiva, sendo, inclusive, uma intervenção recomendada na clínica com casais (Stith, McCollum, & Rosen, 2011Stith, S. M., McCollum, E. E., & Rosen, K. H. (2011). Couples therapy for domestic violence: Finding safe solutions. Washington, DC: American Psychological Association.). Desse modo, concebe-se a evitação como uma estratégia destrutiva quando os cônjuges percebem não conseguir resolver suas questões conflitivas, fato que pode acarretar no acúmulo de mágoas e ressentimentos que se cristalizam ao longo do tempo, tornando-os insatisfeitos com a relação.

A estratégia de hostilidade verbal entre os membros do casal pode ser compreendida como agressão psicológica (Pendry, Carr, Papp, & Antles, 2013Pendry, P., Carr, A. M., Papp, L. M., & Antles, J. (2013). Child presence during psychologically aggressive interparental conflict: Implications for internalizing and externalizing behavior. Family Relations: An Interdisciplinary Journal of Applied Family Studies, 62(5), 755-767. doi: 10.1111/fare.12033
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), pois envolveu, principalmente, discussões que evoluíram para brigas, permeadas pelo jogo de forças entre os parceiros, dificuldades de ceder e tentativas de convencimento do outro, com o intuito de fazer prevalecer a sua opinião. A agressão psicológica, descrita na literatura como a estratégia mais comum entre cônjuges, pode ser considerada destrutiva, pois mina a autoestima de cada parceiro e acarreta danos emocionais (Bolze et al., 2013Bolze, S. D. A., Crepaldi, M. A., Schmidt, B., & Vieira, M. L. (2013). Relacionamento conjugal e estratégias de resolução de conflito entre casais. Actualidades en Psicología, 27(114), 71-85. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0258-64442013000100006
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; Razera, Mosmann, & Falcke, 2016Razera, J., Mosmann, C. P., & Falcke, D. (2016). The interface between quality and violence in marital relationships. Paidéia (Ribeirão Preto), 26(63), 71-79. doi: 10.1590/1982-43272663201609
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).

Cabe salientar que não houve relato de violência física entre os cônjuges como uma estratégia de resolução de conflitos. Uma possível explicação é que isso tenha ocorrido pelo número de participantes, bem como pelo fato de que as pessoas que aceitaram participar e colaborar com o estudo foram aquelas que se caracterizam por relacionamentos mais harmônicos. Ademais, apesar de todos os casais comporem famílias com filhos pequenos, a maior parte deles tinha mais de 10 anos de união. Assim, é esperado que na medida em que os cônjuges tenham mais tempo de convivência e intimidade, eles também estarão mais maduros e hábeis para lidar com seus problemas. Contudo, esses aspectos não se mostram lineares mesmo em díades com casamentos de longa duração, indicando necessidade de diálogo constante e adequações ao longo dos anos (Campos, Scorsolini-Comin, & Santos, 2017Campos, S. O., Scorsolini-Comin, F., & Santos, M. A. (2017). Transformações da conjugalidade em casamentos de longa duração. Psicologia Clínica, 29(1), 69-89. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-56652017000100006
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).

No que se refere aos conflitos entre pais-crianças, esses abrangeram, principalmente, a dificuldade parental de impor limites e de lidar com situações de birras e desobediências. Com relação às estratégias exercidas pelos pais com a criança, destacaram-se as construtivas, de disciplina não violenta, caracterizadas pelo gesto dos pais de dar explicações, castigos (isolamento temporário) e retirada de privilégios, conforme já apontado por outros estudos (Peruhype et al., 2011Peruhype, R. C., Halboth, N. V., & Alves, P. A. B. (2011). Uso da violência doméstica como prática educativa: Conhecendo a realidade em Diamantina-MG, Brasil. Textos & Contextos (Porto Alegre), 10(1), 170-178. Recuperado de http://revistaseletronicas.pucrs.br/fass/ojs/index.php/fass/article/view/7948/6432
http://revistaseletronicas.pucrs.br/fass...
; Runyan et al., 2010Runyan, D. K., Shankar, V., Hassan, F., Hunter, W. M., Jain, D., Paula, C. S., Bordin, I. A. (2010). International variations in harsh child discipline. Pediatrics, 126(3), e701-e711. doi: 10.1542/peds.2008-2374
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). Entretanto, os resultados também evidenciaram a utilização de outras estratégias, tais como pedir para a criança se colocar no lugar dos pais e perguntar a ela o que faria em determinada situação, instigando nela um sentimento de empatia e compromisso. Outra estratégia reportada foi o pedido de desculpas parental, o qual serve como um modelo que ensina à criança a necessidade de reconhecer seus erros e buscar repará-los. Assim como nas relações conjugais, essas estratégias podem ser consideradas construtivas por envolverem a resolução de conflitos com manifestação de afeto, apoio parental, pedido de desculpas, possibilitando reações emocionais positivas na criança (Bergman et al., 2016Bergman, K. N., Cummings, E. M., & Warmuth, K. A. (2016). The benefits of marital conflict: Constructiveness and resolution as predictors of positive child outcomes. In D. Narvaez, J. N. Braungart-Rieker, L. E. Miller-Graff, L. T. Gettler, & P. D. Hastings (Eds.), Contexts for young child flourishing: Evolution, family and society (pp. 233-245). New York, NY: Oxford University Press.; Goeke-Morey et al., 2003Goeke-Morey, M. C., Cummings, E. M., Harold, G. T., & Shelton, K. H. (2003). Categories and continua of destructive and constructive marital conflict tactics from the perspective of U.S. and Welsh children. Journal of Family Psychology, 17(3), 327-338. doi: 10.1037/0893-3200.17.3.327
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; McCoy et al., 2013McCoy, K. P., George, M. R. W., Cummings, E. M., & Davies, P. T. (2013). Constructive and destructive marital conflict, parenting, and children’s school and social adjustment. Social Development, 22(4), 641-662. doi: 10.1111/sode.12015
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).

Em contrapartida, os achados também revelaram o uso de estratégias destrutivas com a criança, envolvendo agressão física e/ou psicológica. As interações conflitivas com a criança, permeadas pela agressão psicológica, foram evidenciadas pela incitação de medo e culpa ou por comportamentos que envolvem ameaçá-la e/ou enganá-la. Salienta-se que a agressão psicológica é descrita como a estratégia destrutiva mais usada por pais em situações de conflito com a criança (Carmo & Alvarenga, 2012Carmo, P. H. B., & Alvarenga, P. (2012). Práticas educativas coercitivas de mães de diferentes níveis socioeconômicos. Estudos de Psicologia (Natal), 17(2), 191-198. doi: 10.1590/S1413-294X2012000200001
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; Moura et al., 2008Moura, A. T. M. S., Moraes, C. L., & Reichenheim, M. E. (2008). Detecção de maus-tratos contra a criança: Oportunidades perdidas em serviços de emergência na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, 24(12), 2926-2936. doi: 10.1590/S0102-311X2008001200022
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) e associada a problemas de comportamento internalizado e externalizado (Liu & Wang, 2015aLiu, L., & Wang, M. (2015a). Parenting stress and children’s problem behavior in China: The mediating role of parental psychological aggression. Journal of Family Psychology, 29(1), 20-28. doi: 10.1037/fam0000047
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).

Dentre as estratégias destrutivas que envolvem violência física, constatou-se, principalmente, o uso de palmadas e chineladas, tanto para castigar a criança quanto para obrigá-la a fazer algo, ou interromper algum comportamento considerado inadequado pelos pais. Argumentos contraditórios surgiram com relação ao uso de castigos físicos, os quais abarcaram arrependimento parental por um lado, e, por outro, o entendimento de que esses são necessários em determinadas situações. Tal resultado mostra-se preocupante, pois crianças cujos pais aprovam e se valem de punição corporal são mais propensas a endossar o bater, como estratégia para a resolução de conflitos interpessoais, com irmãos e pares (Simons & Wurtele, 2010Simons, D. A., & Wurtele, S. K. (2010). Relationships between parents’ use of corporal punishment and their children’s endorsement of spanking and hitting other children. Child Abuse & Neglect, 34(9), 639-646. doi: 10.1016/j.chiabu.2010.01.012
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). Além disso, o uso de palmadas, em particular, está associado ao incremento do risco para vários desfechos considerados prejudiciais ao desenvolvimento infantil, tais como aumento da agressividade, do transtorno antissocial, de comportamentos externalizantes e internalizantes, de problemas de saúde mental, de relacionamento negativo com os pais, além de menor habilidade cognitiva e baixa autoestima (Gershoff & Grogan-Kaylor, 2016Gershoff, E. T., & Grogan-Kaylor, A. (2016). Spanking and child outcomes: Old controversies and new meta-analyses. Journal of Family Psychology, 30(4), 453-469. doi: 10.1037/fam0000191
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).

Foram acessadas, também, as reações parentais frente ao conflito conjugal na presença da criança e, novamente, puderam ser vislumbradas estratégias construtivas e destrutivas. Pedir para a criança deixar o recinto pode funcionar tanto como uma atitude de proteção para ela quanto algo que incita reações emocionais, tais como medo e angústia, em virtude das fantasias que podem surgir por saber que os pais estão brigando. Conceder explicações sobre a interação conflitiva para acalmar a criança, seja durante ou após o conflito, e interromper a interação conflitiva também foram comportamentos reportados pelos pais, os quais são estratégias descritas como construtivas (Bergman et al., 2016Bergman, K. N., Cummings, E. M., & Warmuth, K. A. (2016). The benefits of marital conflict: Constructiveness and resolution as predictors of positive child outcomes. In D. Narvaez, J. N. Braungart-Rieker, L. E. Miller-Graff, L. T. Gettler, & P. D. Hastings (Eds.), Contexts for young child flourishing: Evolution, family and society (pp. 233-245). New York, NY: Oxford University Press.; Cummings & Davies, 2010Cummings, E. M., & Davies, P. T. (2010). Marital conflict and children: An emotional security perspective. New York, NY: Guilford Press.). Alguns participantes, contudo, admitiram não ter fornecido explicações sobre o conflito, fato que não se configura necessariamente como de caráter destrutivo, pois a criança nem sempre precisa assistir à resolução do conflito, mas é importante ela perceber que o clima emocional tenso entre os pais se extinguiu (Bergman et al., 2016Bergman, K. N., Cummings, E. M., & Warmuth, K. A. (2016). The benefits of marital conflict: Constructiveness and resolution as predictors of positive child outcomes. In D. Narvaez, J. N. Braungart-Rieker, L. E. Miller-Graff, L. T. Gettler, & P. D. Hastings (Eds.), Contexts for young child flourishing: Evolution, family and society (pp. 233-245). New York, NY: Oxford University Press.; Cummings & Davies, 2010Cummings, E. M., & Davies, P. T. (2010). Marital conflict and children: An emotional security perspective. New York, NY: Guilford Press.).

No que diz respeito à ocorrência de conflitos conjugais na presença da criança, os casais referiram, nessas ocasiões, reatividade emocional na criança (demonstrar tristeza ou raiva) ou manifestações comportamentais (intervenção no sentido de fazer parar o conflito, tampar os ouvidos, roer as unhas, chorar), tal como evidenciado também por outros autores (Cummings et al., 2016Cummings, E. M., Goeke-Morey, M. C., & Papp, L. M. (2016). Couple conflict, children, and families: It’s not just you and me, babe. In A. Booth, A. C. Crouter, M. L. Clements, & T. Boone-Holladay (Eds.), Couples in conflict: Classic edition (pp. 117-148). New York, NY: Routledge.). Esses achados estão em consonância com a literatura que aponta que a criança, ao testemunhar conflitos conjugais entre seus pais, pode empreender esforços cognitivos, comportamentais e emocionais para significar e lidar com essas interações conflitivas (Goulart et al., 2015Goulart, V. R., Wagner, A., Barbosa, P. V., & Mosmann, C. P. (2015). Repercussões do conflito conjugal para o ajustamento de crianças e adolescentes: Um estudo teórico. Interação em Psicologia, 19(1), 147-159. doi: 10.5380/psi.v19i1.35713
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). As respostas infantis ligadas à reatividade emocional são associadas ao uso de estratégias destrutivas de resolução de conflitos conjugais, visto que demonstram comprometer a segurança emocional da criança (Cummings & Davies, 2010Cummings, E. M., & Davies, P. T. (2010). Marital conflict and children: An emotional security perspective. New York, NY: Guilford Press.).

Ademais, o relato de um participante que mencionou ficar bravo com o filho por ele tentar interromper o conflito, entre ele próprio e sua esposa, remete ao conceito de efeito spillover (Erel & Burman, 1995Erel, O., & Burman, B. (1995). Interrelatedness of marital relations and parent-child relations: A meta-analytic review. Psychological Bulletin, 118(1), 108-132. doi: 10.1037/0033-2909.118.1.108
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), ou seja, da reverberação do conflito conjugal para a relação parental, indicando que o clima emocional tenso que emerge da situação conflitiva transborda para o relacionamento pais-criança (Goulart et al., 2015Goulart, V. R., Wagner, A., Barbosa, P. V., & Mosmann, C. P. (2015). Repercussões do conflito conjugal para o ajustamento de crianças e adolescentes: Um estudo teórico. Interação em Psicologia, 19(1), 147-159. doi: 10.5380/psi.v19i1.35713
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; Hameister et al., 2015Hameister, B. R., Barbosa, P. V., & Wagner, A. (2015). Conjugalidade e parentalidade: Uma revisão sistemática do efeito spillover. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 67(2), 140-155. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672015000200011&lng=pt&tlng=pt
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; Liu & Wang, 2015bLiu, L., & Wang, M. (2015b). Parenting stress and harsh discipline in China: The moderating roles of marital satisfaction and parent gender. Child Abuse & Neglect, 43, 73-82. doi: 10.1016/j.chiabu.2015.01.014
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; Rinaldi & Howe, 2003Rinaldi, C. M., & Howe, N. (2003). Perceptions of constructive and destructive conflict within and across family subsystems. Infant and Child Development, 12(5), 441-459. doi: 10.1002/icd.324
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). Ainda, o fato de a criança se lembrar do conflito em situações posteriores sinaliza o quanto o evento pode ser traumático, quando não manejado adequadamente (Cummings et al., 2016Cummings, E. M., Goeke-Morey, M. C., & Papp, L. M. (2016). Couple conflict, children, and families: It’s not just you and me, babe. In A. Booth, A. C. Crouter, M. L. Clements, & T. Boone-Holladay (Eds.), Couples in conflict: Classic edition (pp. 117-148). New York, NY: Routledge.). Salienta-se que alguns casais reportaram procurar não discutir na frente da criança, comportamento que, à primeira vista, pode ser considerado como construtivo, desde que esses casais não optem por um tratamento silencioso, ou seja, de hostilidade não verbal, mas carregado de emoção negativa (Cummings & Davies, 2010Cummings, E. M., & Davies, P. T. (2010). Marital conflict and children: An emotional security perspective. New York, NY: Guilford Press.).

Goulart et al. (2015Goulart, V. R., Wagner, A., Barbosa, P. V., & Mosmann, C. P. (2015). Repercussões do conflito conjugal para o ajustamento de crianças e adolescentes: Um estudo teórico. Interação em Psicologia, 19(1), 147-159. doi: 10.5380/psi.v19i1.35713
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) chamam atenção para o caráter multidimensional do conflito e para a existência da multiplicidade de fatores que influenciam na vulnerabilidade dos filhos ao conflito conjugal. O presente estudo não discute todas as implicações do conflito conjugal e parental e de suas estratégias de resolução para o funcionamento familiar. Contudo, contribui no sentido de caracterizar as estratégias de resolução de conflitos conjugais e parentais, bem como algumas das reações dos pais e das crianças, frente às interações conflitivas do subsistema conjugal, evidenciando que nem sempre as famílias conseguem manejar seus conflitos de forma construtiva, fato que se configura como importante campo de atuação para o psicólogo.

As pesquisas internacionais sobre conflitos e estratégias de resolução no âmbito familiar são frequentes. Entretanto, no contexto brasileiro, ainda há escassez de publicações sobre essa temática, a qual se mostra de relevância social, visto que o uso de estratégias construtivas de resolução de conflitos pode contribuir para o funcionamento familiar saudável. Desse modo, conhecer as estratégias de resolução de conflitos mais utilizadas nas relações conjugais e parentais, bem como as reações parentais e filiais quando o conflito ocorre na presença da criança, pode contribuir na elaboração de estratégias de intervenção junto a famílias.

Assim, dentre os possíveis desdobramentos desse estudo para a prática profissional, destaca-se a importância de proporcionar espaços que permitam reflexões sobre interações familiares e, em particular, sobre estratégias construtivas de resolução de conflitos conjugais e parentais. Isso porque os conflitos são inerentes às relações humanas e, portanto, em maior ou menor grau, farão parte do cotidiano de todas as famílias. Logo, além de eventualmente oferecer subsídios à prática clínica dos terapeutas de família e casal, entende-se que este estudo pode contribuir para a elaboração de projetos de educação conjugal e parental que visem à promoção da qualidade das interações familiares.

No que diz respeito às limitações do presente estudo, salienta-se o fato de a coleta de dados ter ocorrido exclusivamente por meio da aplicação de entrevista semiestruturada ao casal. Nesse sentido, a desejabilidade social pode ter permeado os relatos dos participantes, de forma que tanto as situações de conflito conjugal e parental quanto as estratégias de resolução, talvez, tenham sido descritas com base em uma tendência positivamente irreal. Ademais, os dados referentes aos conflitos parentais, às estratégias adotadas para resolvê-los, bem como às reações parentais e filiais, quando o conflito ocorre na presença da criança, foram coletados exclusivamente junto à mãe e ao pai, mas não junto ao filho. Contudo, entende-se que essas limitações não inviabilizaram os resultados do presente estudo, os quais corroboram a literatura sobre a temática. Igualmente, pelo fato de os participantes se configurarem como díades conjugais, isso permitiu lançar luz às particularidades das dinâmicas das famílias investigadas, sem a intenção de generalização.

Sugere-se que futuras pesquisas incluam, além de entrevista ao casal, a entrevista individual e a observação da interação dos membros dos sistemas parental e conjugal, por exemplo, em tarefa que envolva a resolução de alguma situação conflitiva. Recomenda-se, também, a coleta de dados junto às crianças, considerando instrumentos adaptados às peculiaridades de seu estágio do desenvolvimento, para investigar como elas experienciam as situações de conflito conjugal e parental. Por fim, sugere-se, ainda, pesquisas adicionais com amostras maiores de delineamento misto que possam evidenciar, por exemplo, diferenças entre grupos de mães e pais, por tempo de união, faixa etária ou número de filhos.

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  • 1
    Artigo derivado da tese de doutorado da primeira autora, sob orientação da quarta autora, defendida no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). As autoras agradecem, sinceramente, aos autores do Projeto TIV e aos alunos de graduação e pós-graduação que recrutaram, coletaram e inseriram os dados da pesquisa, bem como às famílias participantes.
  • 6
    Como citar este artigo: Bolze, S. D. A., Schmidt, B., Böing, E., & Crepaldi, M. A. (2017). Marital and parental conflicts in families with children: Characteristics and resolution strategies. Paidéia (Ribeirão Preto), 27(Suppl. 1), 457-465. doi:10.1590/1982-432727s1201711

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2017

Histórico

  • Recebido
    03 Fev 2017
  • Revisado
    30 Jul 2017
  • Aceito
    18 Out 2017
Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Programa de Pós-Graduação em Psicologia Av.Bandeirantes 3900 - Monte Alegre, 14040-901 Ribeirão Preto - São Paulo - Brasil, Tel.: (55 16) 3315-3829 - Ribeirão Preto - SP - Brazil
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