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SENSIBILIDADE DE OVOS DE Ceratitis capitata (WIED., 1824) IRRADIADOS EM DIETA ARTIFICIAL E EM FRUTOS DE MANGA (Mangifera indica L.)

Resumos

O objetivo deste trabalho foi determinar as doses de radiação gama que impedissem a emergência de adultos de Ceratitis capitata, a partir de ovos irradiados em dieta artificial e em frutos de manga. Quinhentos ovos de 6, 12, 24 e 48 horas de idade foram irradiados em cada dose. A infestação artificial de ovos ocorreu em mangas das cultivares Haden, Tommy Atkins ou Keitt. Um aumento da radioresistência de ovos foi observado durante o desenvolvimento embrionário, e para ovos de 48 horas em dieta artificial, foi estimado um Probit 9 de 24,67Gy. Não foi observada influência significativa dos frutos de manga na eficiência da irradiação dos ovos, quando comparada com os testes em dieta artificial.

Insecta; mosca-do-mediterrâneo; radiação gama; tratamento quarentenário


The objective of this study was to establish gamma radiation doses required to prevent emergence of Ceratitis capitata (Wied.) adults, from irradiated eggs in artificial diet and mango fruits. Six-, twelve-, twenty-four- and fourty-eight-hour-old eggs were used. Artificial infestation by C. capitata was carried out in mangoes of `Haden', `Tommy Atkins' and `Keitt' cultivars. An increase of radiation resistance of C. capitata eggs was observed as a function of the embryonic development and a Probit 9 of 24.67Gy was estimated for 48-hour-old eggs in artificial diet. No significant influence of mango fruits was found on the efficacy of irradiation.

Insecta; mediterranean fruit fly; gamma irradiation; quarantine treatment


SENSIBILIDADE DE OVOS DE Ceratitis capitata (WIED., 1824) IRRADIADOS EM DIETA ARTIFICIAL E EM FRUTOS DE MANGA (Mangifera indica L.)

A. RAGA1; S.T. YASUOKA1; E.O. AMORIM1; M.E. SATO1; N. SUPLICY FILHO1; J.T. de FARIA2

1Instituto Biológico, C.P. 70, CEP: 13001-970 - Campinas, SP.

2Delegacia Federal de Agricultura - São Paulo, SP.

RESUMO: O objetivo deste trabalho foi determinar as doses de radiação gama que impedissem a emergência de adultos de Ceratitis capitata, a partir de ovos irradiados em dieta artificial e em frutos de manga. Quinhentos ovos de 6, 12, 24 e 48 horas de idade foram irradiados em cada dose. A infestação artificial de ovos ocorreu em mangas das cultivares Haden, Tommy Atkins ou Keitt. Um aumento da radioresistência de ovos foi observado durante o desenvolvimento embrionário, e para ovos de 48 horas em dieta artificial, foi estimado um Probit 9 de 24,67Gy. Não foi observada influência significativa dos frutos de manga na eficiência da irradiação dos ovos, quando comparada com os testes em dieta artificial.

Descritores: Insecta, mosca-do-mediterrâneo, radiação gama, tratamento quarentenário

SENSITIVITY OF Ceratitis capitata (WIED., 1824) EGGS IRRADIATED IN ARTIFICIAL DIET AND IN MANGO FRUITS

ABSTRACT: The objective of this study was to establish gamma radiation doses required to prevent emergence of Ceratitis capitata (Wied.) adults, from irradiated eggs in artificial diet and mango fruits. Six-, twelve-, twenty-four- and fourty-eight-hour-old eggs were used. Artificial infestation by C. capitata was carried out in mangoes of `Haden', `Tommy Atkins' and `Keitt' cultivars. An increase of radiation resistance of C. capitata eggs was observed as a function of the embryonic development and a Probit 9 of 24.67Gy was estimated for 48-hour-old eggs in artificial diet. No significant influence of mango fruits was found on the efficacy of irradiation.

Key Words: Insecta, mediterranean fruit fly, gamma irradiation, quarantine treatment

INTRODUÇÃO

Ceratitis capitata (Wied.) é a única espécie do gênero ocorrendo no Brasil e sua presença foi constatada pela primeira vez em 1901, por Ihering, citado por Mariconi & Iba (1955). Também conhecida como mosca-do-mediterrâneo, por seu relato inicial, é originária da África Ocidental.

Em vista de sua facilidade adaptativa a climas bastante diversos, grande diversidade de hospedeiros, alta capacidade reprodutiva e facilidade de dispersão, a mosca-do-mediterrâneo é encontrada nos cinco continentes. Está amplamen-te distribuída na América do Sul e no Brasil, ocorrendo desde o Estado do Ceará até o Rio Grande do Sul. Por causa desses fatores, a mosca-do-mediterrâneo, tem grande importância quarente-nária no comércio internacional de frutas frescas.

Diversos países já executaram ou estão executando programas de erradicação de C. capitata, em parte ou no total de seu território. Naqueles países que convivem com a praga, a exportação de vegetais hospedeiros de C. capitata para os Estados Unidos e Japão, só tem ocorrido por meio da formação de zonas livres ou com a aplicação de um tratamento quarentenário.

Largamente empregados até 1984, os tratamentos quarentenários à base de fumigantes (dibrometo de etileno, brometo de metila e fosfina) estão sendo proscritos mundialmente, em virtude de suas características indesejáveis, como a fitotoxicidade e toxicidade ao homem. Com isto,o controle por meio de tratamentos físicos está sendo o mais pesquisado, através da aplicação de calor, frio ou radiação ionizante. Para mangas brasileiras, nos últimos anos, tem sido usado o processo de tratamento com água quente.

Pesquisas com radiação gama como tratamento quarentenário foram iniciadas há quarenta anos no Havaí, por técnicos do "Agricultural Research Service (ARS)" dos Estados Unidos. Balock et al. (1956) concluíram que a dose de 40Gy foi letal para ovos de Dacus dorsalis (Hendel), com até 6 horas e que de 360Gy não afetou o desenvolvimento embrionário de ovos de 24 horas. Segundo Balock et al. (1963), a dose de 130Gy (DL 95) foi capaz de prevenir pupamento, ao irradiarem ovos de D. dorsalis com 1 dia de idade. Ainda para este estágio, encontraram 35Gy, 28Gy e 14,5Gy como as DL 95 requeridas para prevenir as emergências dos adultos de Dacus cucurbitae (Coquillett), D. dorsalis e C. capitata, respectivamente.

Macfarlane (1966) não observou eclosão de larvas de Dacus tryoni Tychsen, a partir de ovos de2-5 horas de idade, irradiados com 20Gy. Também, Bughio et al. (1969) concluiram que 20Gy foi suficiente para prevenir eclosão de larvas de Dacus zonatus (Saunders), testando ovos de 4-5 horas de idade. Thomas & Rahalkar (1975) verificaram que a dose de 400Gy preveniu a eclosão larval ao irradiarem ovos de D. dorsalis e D. cucurbitae, sem idade definida.

Suplicy Filho et al. (1987) demonstraram que 400Gy impediu o desenvolvimento de larvas da mosca-do-mediterrâneo em frutos de mamão e caqui, ao irradiarem ovos de 3 dias de idade. Walder et al. (1989) obtiveram em C. capitata, as doses letais de 50Gy para ovos de até 18 horas e 150Gy para os de 24 horas.

Faria (1989) determinou a dose de 20Gy como necessária para impedir o surgimento de adultos de C. capitata em mamões infestados em laboratório, com ovos de até 72 horas e calculou a dose de 30,14Gy como a de Probit 9 (DL 99,9968).

O objetivo deste trabalho foi determinar as doses de radiação gama que impedissem a emergência de adultos da mosca-do-mediterrâneo, a partir de ovos irradiados em dieta artificial e em frutos de manga.

MATERIAL E MÉTODOS

A pesquisa foi desenvolvida no período de abril de 1989 a março de 1990, nos laboratórios da Seção de Pragas das Plantas Frutíferas do Instituto Biológico, sendo as irradiações conduzidas no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), ambas instalações localizadas em São Paulo, SP.

Empregou-se um irradiador de Cobalto-60, marca Yoshizawa Kiko Company Ltda., modelo panorâmico, destinado à pesquisa, que apresentou durante as irradiações uma atividade mínima de 1078 Ci. As irradiações foram feitas a 30cm da fonte, apresentando uma taxa de dose entre 105,09 e 93,05Gy/h. As maiores doses foram fracionadas.

A população de C. capitata foi oriunda da criação iniciada no Instituto Biológico em 1973 e desde então conduzida em dieta artificial (Tabela 1).

Foram utilizados ovos de até 6, 12, 24 e 48 horas de idade. Os ovos colocados pelas fêmeas na tela de oviposição das gaiolas eram receptados em cubas d'agua e transferidos para um béquer de 500ml. Por meio de uma pipeta os ovos eram coletados e repassados para uma placa de Petri contendo no fundo, papel de filtro saturado com água destilada. Os ovos, em número de 50, eram contados sob microscópio estereoscópico, com aumento de 20 vezes, sendo acondicionados sobre um disco de papel sulfite de 0,6cm de diâmetro. Nos testes em dieta artificial, cada disco, correspondendo a uma repetição, era colocado na parte central de um recipiente plástico com 90ml de volume, ocupado com a dieta artificial (Tabela 1). O recipiente era tampado com tecido de jersei preso com elástico.

Para os testes em frutos, empregou-se a mesma quantidade de ovos dos testes em dieta artificial. O disco neste caso, era introduzido na parte mediana de um canudo de polietileno de 0,7cm de diâmetro e 13cm de comprimento (tipo refrigerante). Para evitar ressecamento dos ovos, o canudo era completado com a própria dieta artificial, fechando-se as extremidades com tampas preparadas com Perfex® .

Os frutos eram perfurados com um vazador de 0,8cm de diâmetro, em sentido longitudinal, ao lado das duas faces do caroço. Em cada furo foi introduzido o canudo descrito acima, de modo a aproveitar melhor o espaço da mesa do irradiador.

Foram empregadas mangas das variedades `Haden', `Tommy Atkins' ou `Keitt'. Durante as irradiações, as mangas foram dispostas com a face mais larga voltada para a fonte, sustentadas em co-pos plásticos de 90ml de volume e 5,4cm de altura.

Em todas as irradiações foram utilizadas 10 repetições. Foram anotados para cada dose empregada, o número de larvas, pupas e adultos emergidos. As idades, datas, tipos de infestação e doses empregadas constam da Tabela 2. Os dados obtidos das irradiações que induziram 3 valores de mortalidade menores de 100% e maiores do que a testemunha, foram submetidas à analise de Probit, ao nível de 5% de probabilidade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

1. Efeitos da irradiação sobre ovos em dieta artificial (Tabela 3): Houve um aumento da resistência de ovos de C. capitata à radiação gama no decorrer do desenvolvimento embrionário. Não foram observadas larvas no tratamento de ovos de 6 horas, a partir da dose de 17,5Gy, enquanto que em ovos de 48 horas, 30Gy permitiu o desenvolvimento de larvas e formação de pupas. Por conseguinte, a emergência de adultos da mosca-do-mediterrâneo foi afetada de acordo com a idade em que o ovo foi irradiado.

Em dieta artificial com ovos de 6 horas, 17,5 Gy evitou completamente a emergência de adultos, sendo estimadas em 8,28Gy e 19,62 Gy as doses letais DL 95 e DL 99,9968 (Probit 9), respectivamente.

Apesar de apenas 12,5Gy ter impedido a emergência de adultos em ovos de 12 horas, esta idade mostrou maior resistência às doses intermediárias. Benschoter & Telich (1964) obtiveram 99,9% de mortalidade para ovos de Anastrepha ludens (Loew) irradiados com 1 dia de idade, na dose de 17,4Gy.

Quando ovos de 24 horas foram irradiados com 15,0Gy, evitou-se o surgimento de adultos, com estimativas de 9,83Gy e 30,49Gy para as DL 95 e DL 99,99968, respectivamente. A dose para não emergência e as estimativas de DL para ovos de 48 horas foram de 25Gy 13,54Gy e 24,67Gy, respectivamente.

Os resultados indicam que em vista da sua maior resistência, os ovos de C. capitata de 48 horas devem ser os mais visados, em estudos que empreguem a irradiação para fins de desinfestação quarentenária de vegetais hospedeiros da mosca-do-mediterrâneo.

2. Efeito da irradiação sobre ovos em frutos de manga (Tabela 3): A irradiação de ovos de 6 horas com 15Gy impediu a geração de adultos da mosca-do-mediterrâneo, dose inferior àquela com a qual se obteve o mesmo efeito em dieta artificial (17,5Gy). Mas houve similaridade no índice de mortalidade entre os testes, visto que, 15Gy causou 99,8% de mortalidade, em dieta artificial.

Os ovos de 12 horas necessitaram de 12,5Gy para inibir o aparecimento de adultos, à semelhança da irradiação em dieta artificial, apresentando as doses letais estimadas de 6,22Gy (DL 95) e 14,51Gy (Probit 9). Também para ovos de 24 horas não foi observada influência dos frutos de manga na eficácia das doses de radiação, pois 15Gy induziu uma mortalidade de 100%. Rigney & Wills (1985) mostraram que 25Gy causaram em laranjas (Citrus sinensis L. Osbeck) 100% de mortalidade dos ovos de Dacus tryoni Tychsen.

A dose requerida para a não emergência de adultos de C. capitata, oriundos de ovos irradia-dos com 48 horas, foi conseguida com 30Gy, o que reitera a condição de idade mais radioresistente.

CONCLUSÕES

Considerando as condições em que foi desenvolvido este trabalho, pode-se concluir que:

- Há um aumento da radioresistência de ovos de C. capitata, no decorrer do desenvolvimento embrionário, sendo estimado para ovos de 48 horas, um Probit 9 de 24,67Gy, em dieta artificial.

- De modo geral, os resultados da irradiação de ovos de C. capitata em frutos de manga, não mostraram valores diferentes daqueles obtidos nos testes em dieta artificial.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Engº Agrº Marcos Roberto Potenza, pela colaboração recebida durante a execução deste trabalho.

Recebido para publicação em 28.09.95

Aceito para publicação em 24.01.96

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Fev 1999
  • Data do Fascículo
    Jan 1996

Histórico

  • Recebido
    28 Set 1995
  • Aceito
    24 Jan 1996
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