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MATURIDADE DE COMPOSTO DE LIXO URBANO

URBAN SOLID WASTE MATURITY

Resumos

O processo de compostagem de lixo pré-digerido, produzido na Usina de Compostagem de Vila Leopoldina do município de São Paulo acondicionado em cestos telados, foi avaliado através das variáveis: pH, P total, temperatura, produção de CO2, matéria orgânica e N total durante um período de 52 dias. O lixo foi de 1 m de diâmetro por 1,5 m de altura, revolvido e umedecido semanalmente. Ao final do período estudado, as variáveis produção de CO2, temperatura, matéria orgânica total e relação C/N apresentaram seus valores reduzidos, enquanto o pH e os teores de N e de P total atingiram seus valores máximos. Os dados permitiram concluir que o período avaliado foi suficiente para a maturação do composto de lixo.

composto; compostagem; lixo; maturação


Solid urban waste was evaluated in a greenhouse experiment through the evaluation of pH, P, temperature, CO2 evolution, organic matter and N content for 52 days. The organic matter was placed in plastic baskets (1 m diameter per 1,5 m height), revolved and moistend weekly. At the end of the period, CO2 evolution, temperature, organic matter and C/N relation had decreased, while pH and total N and P attained the highest values. The data suggested that the evalution period was sufficient to achieve maturation of the organic compost.

compost; composting; urban solid waste; maturation


MATURIDADE DE COMPOSTO DE LIXO URBANO1 1 Trabalho apresentado no 25° Congresso Brasileiro de Ciência do Solo, Viçosa, 1995.

Marcelo Cabral Jahnel2,4; Rogerio Melloni2,4; Elke J. B. N. Cardoso3,4*

2 Pós-Graduando do Depto. de Solos e Nutrição de Plantas - ESALQ/USP.

3 Depto. de Solos e Nutrição de Plantas - ESALQ/USP, C.P. 09 - CEP: 13418-900 - Piracicaba,SP.

4 Bolsista CNPq.

*e-mail: ejbncard@carpa.ciagri.usp.br

RESUMO: O processo de compostagem de lixo pré-digerido, produzido na Usina de Compostagem de Vila Leopoldina do município de São Paulo, foi avaliado através das variáveis: pH, P total, temperatura, produção de CO2, matéria orgânica e N total durante um período de 52 dias. O lixo foi acondicionado em cestos telados de 1 m de diâmetro por 1,5 m de altura, revolvido e umedecido semanalmente. Ao final do período estudado, as variáveis produção de CO2, temperatura, matéria orgânica total e relação C/N apresentaram seus valores reduzidos, enquanto o pH e os teores de N e de P total atingiram seus valores máximos. Os dados permitiram concluir que o período avaliado foi suficiente para a maturação do composto de lixo.

Palavras-chave: composto, compostagem, lixo, maturação

URBAN SOLID WASTE MATURITY

ABSTRACT: Solid urban waste was evaluated in a greenhouse experiment through the evaluation of pH, P, temperature, CO2 evolution, organic matter and N content for 52 days. The organic matter was placed in plastic baskets (1 m diameter per 1,5 m height), revolved and moistend weekly. At the end of the period, CO2 evolution, temperature, organic matter and C/N relation had decreased, while pH and total N and P attained the highest values. The data suggested that the evalution period was sufficient to achieve maturation of the organic compost.

key words: compost, composting, urban solid waste, maturation

INTRODUÇÃO

A urbanização da população brasileira observada nas últimas décadas ocasionou um adensamento no volume de lixo gerado, trazendo problemas ambientais em função da má distribuição espacial desse resíduo.

A compostagem de resíduos orgânicos é um dos métodos mais antigos de reciclagem, durante o qual a matéria orgânica é transformada em fertilizante orgânico. Além de ser uma solução para os problemas dos resíduos sólidos, o processo de compostagem proporciona o retorno de matéria orgânica e nutrientes ao solo. Este processo é resultado da decomposição biológica aeróbica do substrato orgânico, sob condições que permitam o desenvolvimento natural de altas temperaturas, com formação de um produto suficientemente estável para armazenamento e aplicação ao solo, sem efeitos ambientais indesejáveis (Haug, 1980; Mesquita & Pereira Neto, 1992).

O município de São Paulo gera aproximadamente 12.000 t/dia de lixo doméstico, dos quais em torno de 50% são constituídos de matéria orgânica. O município possui duas usinas de compostagem que operam no sistema DANO, com capacidade de processamento de 1.600 toneladas diárias, o que corresponde a 7,6% do lixo coletado (CETESB, 1989).

O equipamento principal do sistema DANO é um biodigestor com um cilindro de 28 m de comprimento por 3,5 m de diâmetro que gira a uma velocidade de 1 rpm. O lixo permanece de 2 a 5 dias no interior do cilindro, onde ocorre trituração parcial, homogeneização e drenagem. Após este processo, a matéria orgânica segue para o pátio onde é peneirada e submetida ao processo de compostagem.

A avaliação da maturidade de composto de lixo urbano tem sido reconhecida como um dos mais importantes problemas relacionados ao processo de compostagem e utilização agrícola segura do produto final. Sabe-se que a aplicação de composto imaturo ao solo, além de poder causar imobilização microbiológica de nitrogênio, pode ainda provocar decréscimo na concentração de oxigênio no solo, criando um ambiente redutor capaz de aumentar a solubilidade de metais pesados. Composto imaturo gera mau cheiro, inibe a germinação de sementes e interfere negativamente no desenvolvimento de plantas (Johnson & Crawford, 1993).

Utilizando-se de variáveis como pH, temperatura, produção de CO2, matéria orgânica total, N e P totais e relação C/N do material produzido em usina de compostagem do município de São Paulo, buscou-se identificar o período ideal de maturação do composto de lixo urbano para uso agrícola.

MATERIAL E MÉTODOS

Conduziu-se um experimento em casa-de-vegetação, no qual foi acondicionado lixo doméstico pré-digerido, produzido na usina de compostagem de Vila Leopoldina (São Paulo), em cinco cestos plásticos de 1 m de diâmetro por 1,5 m de altura e malha hexagonal de 2,8 cm, por um período de 52 dias. Semanalmente o material foi revolvido com auxílio de forcados e umedecido com água de torneira, de modo a manter a umidade em torno de 55% (Pereira Neto & Mesquita, 1992). Uma amostra composta de três sub-amostras foi retirada semanalmente de cada cesto telado para análise das variáveis em laboratório, com exceção da temperatura, que foi medida diariamente na própria pilha de composto com termômetro de haste longa, para avaliação da necessidade de um revolvimento adicional.

A determinação do CO2 produzido foi realizada por respirometria, segundo metodologia proposta por Öhlinger (1993), utilizando-se amostras de 10 gramas de composto e resultados expressos em mg CO2 10 g-1 em 24h.

A determinação de P total foi feita pelo método colorimétrico, após digestão nitro-perclórica, conforme indicação de Kiehl & Porta (1980), enquanto o N total foi obtido através do método de Kjeldahl, após digestão sulfúrica, seguindo metodologia descrita em Bremner & Keeney (1965).

Para determinação do teor de matéria orgânica total foi utilizado o método da combustão em mufla (Kiehl & Porta, 1980), e o índice pH do composto foi determinado com potenciômetro, utilizando a relação em massa de 1 parte de material para 2,5 partes de água destilada.

As relações C/N foram calculadas conforme indicado em Kiehl (1985), e todos os dados foram submetidos às análises de variância e regressão, a 1% (**) e a 5 % (*) de significância.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A produção de CO2 foi intensa nas primeiras duas semanas de compostagem, iniciando com valores ao redor de 250 mg CO2 10 g-1 em 24he atingindo o equilíbrio em valores próximos a 25 mg CO2 10 g-1 em 24h(Figura 1). No início da compostagem, predominam produtos de fácil decomposição microbiológica e, por isso, a atividade (respiração aeróbia de microrganismos quimiorganotróficos) é mais intensa, com maior liberação de CO2 e energia na forma de calor (Figura 2). Ao longo do tempo, observou-se uma redução da variável temperatura, indicando que a maior parte das substâncias biodegradáveis já tinha sido esgotada e a atividade microbiana não era mais suficiente para gerar energia e aquecer a pilha de composto. Após o consumo do carbono prontamente disponível (final da fase mesofílica), inicia-se a degradação de substâncias mais complexas, como celulose e hemicelulose, tarefa esta realizada principalmente por fungos (início da fase termofílica), resultando em queda dos valores de CO2 produzidos, matéria orgânica e relação C/N.

Figura 1
- Respirometria de composto de lixo urbano durante 52 dias de compostagem.
Figura 2
- Temperatura de composto de lixo urbano durante 52 dias de compostagem.

A degradação da matéria orgânica pode ser claramente observada na Figura 3, com decréscimo dessa variável ao longo do processo de compostagem. A oxidação da matéria orgânica para CO2, realizada microbiologicamente pelo processo de compostagem, faz com que ocorra um aumento relativo nos teores de nutrientes, como pode ser visto nas Figuras 4 e 5.

Figura 3
- Matéria orgânica total de composto de lixo urbano durante 52 dias de compostagem.
Figura 4
- Nitrogênio total de composto de lixo urbano durante 52 dias de compostagem.
Figura 5
- Fósforo total de composto de lixo urbano durante 52 dias de compostagem.

A Figura 6 mostra a queda gradual da relação C/N durante o processo de compostagem quando o carbono vai sendo consumido pela respiração e eliminado na forma de CO2.

Figura 6
- Relação carbono/nitrogênio de composto de lixo urbano durante 52 dias de compostagem.

Estes dados confirmam as observações de Chanyasak & Kubota (1981); Tauk et al. (1982) e Pereira Neto & Mesquita (1992). Estes últimos estabeleceram que a relação C/N inicial ótima do lixo a ser compostado está entre 30 a 40, propiciando intensa atividade biológica e menor período de compostagem. A relação C/N média encontrada no resíduo estudado no início do experimento foi 35 e, portanto, dentro dos limites propostos, atingindo o valor de 13 ao final do período avaliado.

Os valores de pH apresentaram um aumento considerável até a terceira semana, quando então se estabilizaram (Figura 7). Verificou-se que o composto no início do processo de maturação apresentava-se ácido (pH em torno de 5) atingindo valores próximos a 8,5 após 52 dias de incubação, concordando com Kiehl (1985). O baixo valor do pH do material no início da compostagem pode ter sido causado pelo acúmulo de ácidos orgânicos existentes. Ao longo do processo de compostagem estes ácidos são metabolizados, provocando aumento no valor de pH. O uso agronômico de composto de lixo no estado inicial do processo de compostagem pode provocar, além do aquecimento pela respiração microbiana (alta atividade microbiológica), acidificação localizada e temporária do solo, prejudicando o desenvolvimento radicular e a produção vegetal.

Figura 7
- pH de composto de lixo urbano durante 52 dias de compostagem.

Evidencia-se, então, a importância do trabalho proposto na obtenção de compostos estabilizados e aptos à utilização racional, sem comprometimento do ecossistema agrícola.

Ambiente aeróbico e umidade adequada se destacam como condições básicas à atividade microbiana (desenvolvimento celular e dissolução de nutrientes) e ao processo de compostagem propriamente dito (Pereira Neto & Mesquita, 1992). Uma compostagem sem controle da umidade poderia indicar erroneamente o fim do processo (exaustão do carbono disponível), produzindo um composto fisicamente estabilizado mas biologicamente instável e passível de provocar problemas ambientais.

O umedecimento, praticado sema-nalmente com o revolvimento das pilhas de composto, garantiu condições ideais de umidade para o bom desenvolvimento do processo, visto que não ocorreu liberação de maus odores e chorume e, principalmente, pela rapidez com que se atingiu a estabilidade e maturação do material empregado.

CONCLUSÕES

• Os parâmetros utilizados foram suficientes para avaliar a maturação do composto de lixo urbano.

• A temperatura e relação C/N podem ser utilizados isoladamente como indicadores do grau de maturidade do composto, desde que sejam mantidas as condições adequadas de umidade e aeração.

• O material proveniente da usina de compostagem não deve ser aplicado diretamente ao solo, sem sofrer prévia compostagem, porque ainda apresenta intensa atividade microbiológica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CETESB. Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental. Destinação final de resíduos sólidos domiciliares e hospitalares. São Paulo, 1989. 22p. (Informação Técnica, 10/89/CABR).

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KIEHL, E.J. Fertilizantes orgânicos. São Paulo: Ed. Agronômica Ceres, 1985. 492p.

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TAUK, S.M.; LUCATO, V.O.; DERIGI, J.M. Factors affecting composting of instant coffee residue with and without the utilization of inocula. Environmental Technology Letters, v.3, p.173-178, 1982.

Recebido para publicação em 13.01.98

Aceito para publicação em 20.08.98

  • CETESB. Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental. Destinação final de resíduos sólidos domiciliares e hospitalares São Paulo, 1989. 22p. (Informação Técnica, 10/89/CABR).
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  • 1
    Trabalho apresentado no 25° Congresso Brasileiro de Ciência do Solo, Viçosa, 1995.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Jul 1999
    • Data do Fascículo
      1999

    Histórico

    • Aceito
      20 Ago 1998
    • Recebido
      13 Jan 1998
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