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No fio da navalha: anemia falciforme, raça e as implicações no cuidado à saúde

On the razor's edge: sickle cell anemia, race and the implications in health care

Resumos

As propostas de políticas de saúde para a população negra têm uma história recente no cenário político brasileiro, com um destaque especial para o Programa Nacional de Anemia Falciforme (PAF). Esse programa é o resultado das ações políticas do movimento negro em prol do reconhecimento da anemia falciforme como uma doença prevalente na população negra brasileira. No seio dessa ação política foram elaborados discursos sobre a anemia falciforme que ressaltam, a partir de pressupostos biológicos e epidemiológicos, o caráter racial dessa doença. O propósito deste artigo é criticar tais pressupostos, enfatizando as implicações éticas decorrentes da racialização das doenças.

anemia falciforme; racialização; ética; cuidados em saúde


The political propositions in health for the black population have a recent history in the Brazilian political setting, with a special highlight to the National Program on Sickle Cell Anemia. This program is an output of political actions launched by the black movement on behalf of the recognition of sickle cell anemia as prevalent disease among Brazilian black population. Discourses on the sickle cell anemia have been built in the core of that political action, stressing, based in biological and epidemiological assumptions, the racial character of this disease. The objective of this article is to criticize those assumptions, emphasizing the ethical implications of disease racialization.

sickle cell anemia; racialization; ethics; health care


ARTIGOS

No fio da navalha: anemia falciforme, raça e as implicações no cuidado à saúde

On the razor's edge: sickle cell anemia, race and the implications in health care

Josué Laguardia

Escola Nacional de Saúde Pública – FIOCRUZ

RESUMO

As propostas de políticas de saúde para a população negra têm uma história recente no cenário político brasileiro, com um destaque especial para o Programa Nacional de Anemia Falciforme (PAF). Esse programa é o resultado das ações políticas do movimento negro em prol do reconhecimento da anemia falciforme como uma doença prevalente na população negra brasileira. No seio dessa ação política foram elaborados discursos sobre a anemia falciforme que ressaltam, a partir de pressupostos biológicos e epidemiológicos, o caráter racial dessa doença. O propósito deste artigo é criticar tais pressupostos, enfatizando as implicações éticas decorrentes da racialização das doenças.

Palavras-chave: anemia falciforme, racialização, ética, cuidados em saúde.

ABSTRACT

The political propositions in health for the black population have a recent history in the Brazilian political setting, with a special highlight to the National Program on Sickle Cell Anemia. This program is an output of political actions launched by the black movement on behalf of the recognition of sickle cell anemia as prevalent disease among Brazilian black population. Discourses on the sickle cell anemia have been built in the core of that political action, stressing, based in biological and epidemiological assumptions, the racial character of this disease. The objective of this article is to criticize those assumptions, emphasizing the ethical implications of disease racialization.

Key Words: sickle cell anemia, racialization, ethics, health care.

As propostas de políticas de saúde para a população negra têm uma história recente no cenário político brasileiro. Em 1995 o Governo Federal instituiu o Grupo de Trabalho Interministerial para Valorização da População Negra (GTI) composto por oito membros da sociedade civil vinculados ao Movimento Negro e oito representantes de ministérios federais, dentre os quais o Ministério da Saúde, com a função de elaborar, propor e promover políticas governamentais relacionadas à cidadania da população negra. Juntamente com a criação do Programa Nacional de Direitos Humanos, nesse mesmo ano, o governo brasileiro reconhece e formaliza a raça como critério para definição e direcionamento das políticas públicas.1 1 Peter FRY, 2000. No ano seguinte, os representantes do grupo temático da saúde vinculado ao GTI realizaram uma reunião técnica intitulada "Mesa redonda sobre a saúde da população negra" que contou com a participação de pesquisadores, militantes, médicos e técnicos do Ministério da Saúde. O relatório final dessa reunião apresentava um quadro esquemático dos agravos relacionados à saúde da população negra, divididos em quatro grupos segundo um continuum de vulnerabilidade que se estendia do biológico ao ambiental. No primeiro grupo encontram-se as doenças classificadas como geneticamente determinadas, de berço hereditário, ancestral e étnico, em que se destaca a anemia falciforme. A etiologia monogênica da anemia falciforme e a sua maior prevalência entre negros e pardos são tidas como atributos que justificariam o destaque dado a essa patologia entre aquelas geneticamente determinadas. Nos outros três grupos estão um conjunto de ocorrências, condições, doenças e agravos adquiridos, derivados de condições socioeconômicas e educacionais desfavoráveis, além da intensa pressão social que caracterizaria, segundo Fry,2 2 FRY, 2004. uma elisão entre raça e classe atribuindo uma especificidade cultural à população negra que a tornaria mais suscetível a essas doenças.

A proposição nessa reunião de um Programa Nacional de Anemia Falciforme (PAF) pelo Ministério da Saúde teve importante contribuição feminina e feminista do Movimento Negro, que vê sua ligação com as iniciativas governamentais como uma conquista própria.3 3 FRY, 2005. Em acréscimo, diversos trabalhos de intelectuais negras buscaram destacar a relevância do enfoque racial na epidemiologia da anemia falciforme entre as mulheres negras e suas repercussões na saúde reprodutiva dessa população.4 4 Marcos C. MAIO e Simone MONTEIRO, 2005. Vale ressaltar que no tocante às questões relativas à procriação e anemia falciforme, embora os documentos elaborados pelo Ministério da Saúde5 5 MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001a; 2001b. enfatizem o papel do aconselhamento genético como um componente assistencial importante,6 6 Débora DINIZ, Cristiano GUEDES e Alexandra TRIVELINO, 2005. os aspectos mais controversos de alguns dos seus desdobramentos, como o diagnóstico pré-natal e a interrupção da gestação, carecem de uma abordagem crítica que oriente os profissionais de saúde quanto aos procedimentos a serem adotados na entrevista com o paciente.

Decorridos quatro anos da elaboração do PAF, alguns militantes do Movimento Negro cobravam uma maior sensibilização das autoridades para a gravidade do problema de saúde pública (a anemia falciforme) e uma ação política do Ministério da Saúde na divulgação, promoção e acompanhamento da implantação do programa no nível nacional. As mudanças ocorridas nos últimos anos no Programa Nacional de Sangue e Hemoderivados, responsável pela coordenação do PAF, são apontadas como fatores adicionais que restringiram as ações do Governo Federal, na maioria das vezes, às atividades de informação e educação genética para a anemia falciforme.7 7 MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001a; 2001b; e DINIZ e GUEDES, 2003. A publicação pelo Ministério da Saúde, no ano de 2001, da Portaria nº 822 que incluiu as hemoglobinopatias, dentre elas a anemia falciforme, no Programa Nacional de Triagem Neonatal criou uma situação de impasse entre os especialistas e militantes do Movimento Negro. Para alguns especialistas, os benefícios dessa portaria resultariam da garantia de igualdade de acesso aos testes de triagem a todos os recém-nascidos brasileiros, independentemente da origem geográfica, raça e classe sócio-econômica, adequando essa triagem às características étnicas da população brasileira.8 8 Antônio RAMALHO, Luis MAGNA e Roberto PAIVA-E-SILVA, 2003. O desenvolvimento de ações de confirmação diagnóstica, acompanhamento e tratamento das doenças falciformes, de outras hemoglobinopatias de interesse à saúde pública e de algumas doenças genéticas (fenilcetonúria, hipotireodismo congênito, fibrose cística) contrapunha o caráter mais abrangente do Programa Nacional de Triagem Neonatal ao particularismo do PAF. Para alguns militantes do Movimento Negro, a Portaria nº 822 foi interpretada como desconhecimento, omissão e desrespeito do Ministério da Saúde a uma conquista do movimento e às próprias definições políticas do governo.9 9 Fátima OLIVEIRA, 2002.

A distinção nas tomadas de posição dos militantes do movimento negro e dos especialistas acerca dos rumos políticos do PAF revela as tensões decorrentes de um espaço de interlocução com interesses distintos, sendo que a dinâmica do processo, descrita por José Carlos dos Anjos,10 10 Anjos, 2004. é caracterizada pela simultaneidade da consolidação da problemática de saúde dos negros nas arenas públicas e da gênese do próprio grupo étnico como portador dessa problemática. Assim, de acordo com Anjos, "a luta pela definição do caráter da relação entre o problema social e o grupo social é uma típica luta que reinventa o grupo ao inventar o princípio de legitimidade de sua demanda".11 11 ANJOS, 2004, p. 111. Na opinião desse autor, as intervenções dos especialistas municiariam os grupos excluídos para a reivindicação de políticas especiais e favoreceriam a emergência de processos de mediação que se contrapõem ao processo de racialização de populações pelo registro biológico de pureza racial. Entretanto, se tomamos um conjunto de proposições e recomendações12 12 Pré-Conferência Cultura & Saúde da População Negra, Brasília, de 13 a 15 de setembro de 2000; Substitutivo ao Projeto de Lei 3.198/2000 do deputado Paulo Paim (PT/RS); Moção dos Pesquisadores no VII Congresso de Saúde Coletiva da ABRASCO, em 2003; OLIVEIRA, Fátima. Saúde da população negra: Brasil ano 2001. Brasília: OPAS, 2002; Secre-taria de Estado de Direitos Humanos. Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Intole-rância. Carta do Rio; Relatório do Seminário Nacional de Saúde da População Negra, Brasília, 18 a 20 de agosto de 2004. para uma política de saúde direcionada à população negra, o que se destaca nesses documentos é a associação de uma experiência específica de adoecimento pautada pela afirmação de uma singularidade biológica que atribui um caráter étnico-racial a um grupo de doenças, dentre as quais se encontra a anemia falciforme. No tocante à saúde, o Movimento Negro critica o mito da brasilidade inclusiva por meio da desconstrução étnico-cultural e a afirmação do caráter multicultural.13 13 Sérgio COSTA, 2002. Nesse movimento que reivindica a legitimidade da medicina popular de matriz africana e as contribuições das manifestações afro-brasileiras na promoção à saúde, tal crítica convive de maneira pacífica com o essencialismo racial e a racialização das doenças. Como nota Fry, o Programa da Anemia Falciforme não apenas associa essa doença genética a um corpo negro. No Brasil ela tem "um efeito pragmático: o de contribuir para a constituição da 'raça negra' como algo real e natural".14 14 FRY, 2004, p. 127.

Tomando como ponto de partida os pressupostos biológicos e epidemiológicos que sustentam as afirmações sobre o caráter racial da anemia falciforme, busquei criticar nesse artigo tais fundamentos, ressaltando as implicações éticas da racialização da anemia falciforme e possíveis conseqüências aos cuidados em saúde.

Crítica da racialização da anemia falciforme

Do ponto de vista do conhecimento biomédico contemporâneo, a anemia falciforme é uma doença hereditária monogênica causada pela mutação do gene da globina beta da hemoglobina, originando uma hemoglobina anormal, a hemoglobina S (HbS), que substitui a hemoglobina A (HbA) nos indivíduos afetados e modifica a estrutura físico-química da molécula da hemoglobina no estado desoxigenado. À medida que a porcentagem de saturação de oxigênio da hemoglobina diminui, essas moléculas podem sofrer polimerização, com falcização das hemácias, ocasionando encurtamento da vida média dos glóbulos vermelhos, fenômenos de oclusão vascular, episódios de dor e lesão de órgãos. Em geral, os pais são portadores assintomáticos de um único gene afetado (heterozigotos), produzindo HbA e HbS (AS) e transmitem o gene alterado para a criança, que assim recebe o gene anormal em dose dupla (homozigoto SS), situação que caracteriza a anemia falciforme. A heterozigose para hemoglobina S define uma situação relativamente comum, mas clinicamente benigna. Além disso, o gene da HbS pode combinar-se com outras anormalidades hereditárias das hemoglobinas, como hemoglobina C (HbC), hemoglobina D (HbD) e beta-talassemia, entre outras, gerando combinações que também são sintomáticas, denominadas, respectivamente, hemoglobinopatia SC, hemoblobinopatia SD e S/beta-talassemia. No conjunto, todas essas formas sintomáticas do gene da HbS, em homozigose ou em combinação, são conhecidas como doenças falciformes.15 15 MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001a; 2001b.

No campo da saúde pública, a ênfase na anemia falciforme como doença étnico-racial apóia-se em três aspectos relacionados a essa patologia que caracterizariam uma maior suscetibilidade da população negra e parda: origem geográfica, etiologia genética e as estatísticas de prevalência.

A hipótese mais comum entre os geneticistas para o desenvolvimento do traço da anemia falciforme seria a de que se trata de um evento de seleção natural em seres humanos cuja forma heterozigótica oferece proteção parcial à malária.16 16 Alan FIX, 2003. Disso decorre que a anemia falciforme pode ser encontrada primariamente naquelas populações cujos ancestrais são provenientes de regiões onde a malária apresenta ou apresentou um padrão endêmico – África Central e Ocidental, região mediterrânea (sul da Itália, Grécia, Turquia), Península Arábica e Índia. A pigmentação da pele, a textura do cabelo e a forma dos lábios e do nariz são determinadas por traços oligogênicos que emergiram como adaptações a forças seletivas, tais como a radiação solar e o calor. Entretanto, a associação entre pigmentação da pele e alta transmissão de malária não é significativa para a ocorrência da anemia falciforme, como demonstram os dados da Papua Nova Guiné, onde seus habitantes apresentam a cor da pele e as taxas de incidência de malária semelhantes às da África. Naquela região, a seleção de um gene deletério pela vantagem de sobrevivência para a malária resultou na maior incidência de um traço genético para ovalocitose melanésia, agravo distinto da anemia falciforme.17 17 Louis MILLER, 1994. A relevância dada à pele negra e à origem africana, em detrimento das demais cores de pele e áreas geográficas, é significativa porque, ao associar a anemia falciforme a um corpo negro específico, ela tanto reforça vínculos de identidade com uma África ancestral, origem dos escravos que introduziram a doença no continente americano, quanto marca esse corpo com os estereótipos de debilidade e defeito atribuídos a essa doença. Como assinala Paul Brodwin,18 18 BRODWIN, 2002. a associação entre genética e ancestralidade anuncia uma conexão geracional de longo prazo que ratifica ou mesmo cria conexões sociais no presente, dando um cunho científico às questões relacionadas ao campo cultural e político.

A racialização da anemia falciforme foi possível, de acordo com Melbourne Tapper,19 19 TAPPER, 1999. quando a ciência médica abraçou a noção antropológica de diferença e de especificidade racial, tendo a hereditariedade e a raça desempenhado papéis importantes na classificação das anemias. Essas anemias, por sua vez, serviram de parâmetros para a classificação de populações e raças, em que as diferentes taxas de uma dada anemia eram tidas como expressões inequívocas de especificidades raciais. O que estava em questão não era a entidade clínica, mas a identidade racial do indivíduo diagnosticado com uma dada anemia, sua pureza racial, inseridas em um projeto colonialista justificado pelo discurso dominante de raça que identificava a anemia falciforme como uma doença dos negros e contribuía para associar a branquidade à noção de invulnerabilidade e saúde.

A classificação étnico-racial é construída com base em diferenças reais ou atribuídas e reflete a interseção de condições históricas, fatores econômicos, políticos, legais e socioculturais específicos. A adequação do uso científico das categorias raciais pode ser avaliada pela capacidade de replicabilidade dos resultados obtidos quando são utilizadas as categorias raciais, consolidando informações consistentes em diferentes contextos por meio de métodos comparáveis. Para os propósitos da vigilância em saúde pública, a classificação étnico-racial deveria ser idêntica quando medida com diferentes instrumentos em períodos similares de tempo.20 20 Robert HAHN e Donna STROUP, 1994. Todavia, o que se observa é que as classificações étnico-raciais variam ao longo do tempo dentro de um mesmo país, entre países ou de acordo com o modo de atribuição, as características particulares da população e do contexto urbano.21 21 Raj BHOPAL e Liam DONALDSON, 1998; Edward TELLES, 2001; e Melissa NOBLES, 2000. A forma como são formuladas as perguntas sobre raça ou etnicidade (grupo étnico, origem étnica, ancestralidade) e as categorias raciais utilizadas nos formulários também contribuem para entendimentos distintos quanto à herança que são independentes da cor da pele e da hemoglobinopatia. Essa variabilidade na classificação racial pode repercutir nas estatísticas de uma doença segundo o grupo étnico-racial. Vejamos, por exemplo, os critérios utilizados para classificação racial dos progenitores de crianças rastreadas em triagem neonatal para hemoglobinopatias no Brasil.22 22 Liane DAUDT, Débora ZECHMAISTER, Liliana PORTAL, Eurico NETO, Lúcia SILLA e Roberto GIUGLIANI, 2002; e Maria ARAÚJO, Édvis SERAFIM, Wivel CASTRO JUNIOR e Tereza MEDEIROS, 2004. Nesses estudos, os grupo étnicos foram definidos levando em consideração a cor da pele e olhos, a textura do cabelo e o formato do nariz e lábios (espessura). Desse modo, um indivíduo que fosse considerado branco no Brasil poderia ser classificado como negro nos EUA, o que resultaria na variação tanto do numerador quanto do denominador do indicador e conseqüentemente das taxas estimadas para a prevalência da doença nos negros. Podemos também supor que a inclusão da categoria "mestiço" na classificação racial norte-americana provocaria mudanças nas estatísticas da anemia falciforme daquele país.

Do ponto de vista da saúde pública e da epidemiologia, o uso da classificação étnico-racial é recomendado como uma medida substituta para a ancestralidade e, por conseguinte, para o risco da herança de traços genéticos mais prevalentes em determinadas áreas geográficas. Nos estudos genéticos, o uso da ancestralidade auto-relatada reduz a proporção de falso-positivos quando há uma forte correlação entre o risco da doença e a ancestralidade genética. Porém, dado que esses estudos buscam identificar loci de suscetibilidade com pequenos efeitos utilizando um grande número de participantes e testes de significância para análise dos dados, pequenas diferenças na ancestralidade entre casos e controles podem produzir associações estatisticamente significativas incorretas.23 23 Noah ROSENBERG, Jonathan PRITCHARD, James WEBER, Howard CANN, Kenneth KIDD e Lev Zhivotovsky, 2002. No Brasil, dado o alto grau de mistura genética, Flávio Parra et al.24 24 Flávio PARRA, Roberto AMADO, José LAMBERTUCCI, Jorge ROCHA, Carlos ANTUNES e Sérgio PENA, 2003. ressaltam que a classificação por cor da pele não é uma boa preditora para a ancestralidade africana, pois pessoas classificadas em categorias distintas de cor compartilham a mesma proporção de ancestralidade africana. No caso de populações com miscigenação mais recente, por exemplo a Grã-Bretanha, Peter Aspinall et al.25 25 Peter ASPINALL, Simon DYSON e Elizabeth ANIONWU, 2003. assinalam que a adequação da classificação para identificação das populações sob risco de hemoglobinopatias depende da inclusão nas categorias raciais de todos os grupos étnicos passíveis de serem portadores dos traços genéticos. Porém, esses autores destacam a dificuldade na identificação étnica, ressaltando que as perguntas dos questionários têm utilizado uma gama variada de termos e levam os respondentes a interpretá-las de maneiras distintas. As revisões sistemáticas referentes ao uso das variáveis de identificação étnico-racial nas pesquisas em saúde têm apontado a ausência tanto de definições conceituais e operacionais de raça e etnicidade quanto de justificativas para o seu uso que podem repercutir no modo como são interpretadas as associações e correlações entre doença e grupo étnico.26 26 Camara JONES, Thomas LaVEIST e Marsha LILLIE-BLANTON, 1991; David WILLIANS, 1994; Rafael HERNÁNDES-ARIAS e Carles Muntaner, 2002; e Richard COMSTOCK, Edward CASTILLO e Suzanne LINDSAY, 2004.

Além disso, a etiologia e a variabilidade do quadro clínico, a interação entre fatores genéticos e ambientais na gravidade da doença e a correspondência entre marcadores genéticos e características fenotípicas colocam dúvidas quanto à relevância da raça na etiologia das hemoglobinopatias. A transmissão dos alelos susceptíveis nas hemoglobinopatias apresenta um padrão de segregação por parentesco conformando linhagens de risco e não genótipos raciais. No caso da anemia falciforme, os pacientes apresentam uma variabilidade clínica que pode cursar com quadros de maior gravidade, outros mais benignos e alguns quase assintomáticos.27 27 MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001a. A variabilidade clínica depende tanto de fatores ambientais, por exemplo o nível sócio-econômico, o acesso à assistência médica e a prevenção de infecções, quanto de fatores adquiridos, como os níveis de hemoglobina fetal (HbF), a concomitância de alfa-talassemia e os haplótipos associados ao gene da HbS. As anemias falciformes com níveis mais elevados de HbF associadas a talassemia ou com os haplótipos Senegal, Árabe-Indiano e Benin apresentam um curso mais benigno da doença.28 28 Allison ASHLEY-KOCH, Qu YANG e Richard OLNEY, 2000. A combinação desses fatores genéticos no indivíduo está relacionada à ancestralidade e não guarda uma vinculação com a ocorrência de traços fenotípicos associados à raça negra. Os estudos de genética populacional mostram que a variação humana não é concordante, ou seja, alguns traços genéticos tendem a variar independentemente de outros traços.29 29 Allan GOODMAN, 2000. A ocorrência da mutação no gene da hemoglobina, que dá origem à hemoglobina S da anemia falciforme, não está associada à presença do gene (ou grupo de genes) que define uma determinada cor da pele ou textura dos cabelos. Desse modo, grandes diferenças no genótipo para hemoglobinopatias (genes da anemia falciforme, beta-talassemia e hemoglobinas C, D e E) correspondem a diferenças variadas, algumas vezes imperceptíveis, nos traços fenotípicos, ou seja, pessoas classificadas como brancas, pardas e negras compartilham de um mesmo diagnóstico para a anemia falciforme. Além disso, as mudanças na freqüência de alelos nas populações que produzem a diferenciação genética entre grupamentos humanos devem-se à seleção natural, resultante da variação populacional entre genótipos individuais nas suas probabilidades de sobrevivência e/ou reprodução, assim como à mutação, à deriva genética, à migração e a condicionantes socioculturais.30 30 Luigi CAVALLI-SFORZA e Marcus FELDMAN, 2003. Esses fatores interferem no fluxo gênico das populações e contribuem para a persistência de um traço ou doença genética em determinados grupos, sem que por isso se constituam em um atributo biológico de grupos étnico-raciais. Simon Dyson31 31 DYSON, 1998. assinala que os profissionais de saúde, ao apoiarem suas condutas práticas em noções de raça como entidade biológica fundamentada no senso comum (ingenuidade biológica) ou mesmo na formalização de categorias étnicas construídas socialmente, tais como as classificações do censo (ingenuidade sociológica), terão dificuldades em compreender as diversas dimensões do plano onde se desenrola a doença, comprometendo, dessa maneira, a provisão de um serviço apropriado.

Implicações da racialização no cuidado à saúde

Robert Proctor32 32 PROCTOR, 1992. assinala que as discussões sobre raça, genética e doença têm lugar em um espaço político onde as questões de poder, ética, cidadania e identidade se entrelaçam conformando práticas discursivas contraditórias e onde indivíduos e profissionais de saúde, a partir dos conhecimentos disponíveis, estão envolvidos na construção e negociação de sentidos e significados. Esse autor reitera que o uso de argumentos biológicos para explicar problemas sociais intratáveis tem sido uma estratégia comum e conveniente no campo científico e, na sua opinião, o estudo das diferenças humanas não constitui um empreendimento inerentemente maléfico. Todavia, o fator de preocupação estaria nas explicações genéticas que apontam para uma certa continuidade entre genômica e eugenia33 33 Eugenia: expressão cunhada pelo cientista inglês Francis Galton para abarcar os usos sociais que o conhecimento da hereditariedade poderia prover para alcançar uma melhor procriação, melhoria da raça humana ou preservação da pureza de determinados grupos. Nancy STEPAN (2005) assinala que a eugenia buscou o gerencia-mento científico e racional da constituição hereditária da espécie humana sustentada em idéias e políticas inovadoras acerca do controle social dos indivíduos considerados biologi-camente inaptos, incluindo a esterilização cirúrgica involuntá-ria e o racismo genético. Ver também Daniel J. KEVLES (1995) e STEPAN (2004). no que diz respeito a uma forte tendência ao determinismo biológico correlacionado a uma visão reducionista da genética, segundo a qual o destino dos indivíduos é definido pelos seus genes. Isso leva a uma ênfase maior nos 'defeitos' individuais do que nas alterações produzidas no/pelo meio ambiente e, por sua vez, ao fortalecimento de uma concepção errônea de que a natureza (nature) é mais importante que o ambiente (nurture) no desencadeamento de certas doenças. Algumas das metáforas utilizadas na genética como mapas e códigos, através de catacreses, reforçam a idéia de que basta conhecer a localização dos genes para interpretá-los e compreender o seu significado, sem se levar em conta o contexto e a influência dos fatores ambientais.34 34 Maria DAVO e Carlos ALVAREZ-DARDET, 2003.

No contexto da saúde ambiental, no que se refere às questões da exposição, toxicidade e suscetibilidade dos grupos populacionais, os desdobramentos das pesquisas genéticas podem produzir mudanças na avaliação e regulamentação do risco com sérias conseqüências para as populações minoritárias.35 35 Julie SZE e Swati PRAKASH, 2004. A mais citada é o uso da informação genética por empresas ou seguradoras para negar emprego ou cobertura de saúde sob a alegação da presença de causas preexistentes ou maior suscetibilidade à doença (por exemplo leucopenia em trabalhadores negros), tomando por base os resultados de testes genéticos positivos ou achados de estudos que apontam que um determinado grupo étnico possui maior freqüência de um determinado alelo. A presença de exposições ambientais específicas poderia levar os empregadores a utilizar a raça como medida substituta para uma suscetibilidade aumentada e a exclusão de membros de grupos étnicos para determinados postos de trabalho sob alegação de que estariam protegendo-os de uma dada exposição.

Na anemia falciforme, os efeitos de uma discriminação genética podem se manifestar na indistinção entre o status de portador e o status de homozigoto; na compreensão errônea da variabilidade clínica da doença, da severidade ou de sua relevância para o desempenho de determinadas atividades laborais; no duplo padrão de discriminação com relação ao teste (discriminado se testado, discriminado se não é testado) e na sobreposição de discriminações pela associação entre doença e grupos étnicos. Medidas discriminatórias, tais como a suspensão na concessão de benefícios pelas empresas ou na contratação de mão-de-obra, e um desinteresse pelos legisladores na aprovação de medidas mais fortes de prevenção da exposição ambiental ou de proteção do consumidor são o resultado da genetização da saúde.

Por seu turno, a racialização das doenças nas pesquisas sobre as diferenças raciais em saúde gera uma percepção, por alguns segmentos da população, de que a saúde dos grupos étnico-raciais é 'ruim', reforçando a crença de que eles são uma carga aos serviços de saúde, ignorando a qualidade dos serviços e alimentando preconceito racial por meio de pesquisas que retratam esses grupos como inferiores.36 36 BHOPAL, 1998. Nessas pesquisas, a limitação dos fatores de risco às características individuais ou de um dado grupo fortalece o pressuposto de que as condições de saúde dos grupos étnico-raciais são de inteira responsabilidade dos seus membros, culpando suas vítimas, minimizando o papel do Estado na perpetuação das condições sócio-econômicas e ambientais desfavoráveis a que estão submetidos esses grupos e estigmatizando seus membros por sua suposta predisposição a determinados agravos. A estigmatização enfrentada pelas pessoas com doenças genéticas, uma conseqüência da dificuldade da sociedade em acomodar aqueles que são de algum modo diferentes, torna-se ainda mais grave quando acrescida da discriminação racial. A associação entre condição genética e raça pode reforçar idéias de que determinados grupos étnicos são desviantes e vulneráveis, portanto sujeitos a um controle mais estrito pelas autoridades sanitárias. Sob a justificativa da prevenção e da melhoria das condições humanas, essas ações governamentais podem se assemelhar a projetos eugênicos.

Um aspecto ético relevante da associação entre raça e genética é a adoção de perfis ou estereótipos raciais (racial profiling/estereotyping) na prática de saúde, que podem influenciar as decisões tomadas pelos profissionais acerca do diagnóstico e tratamento dos pacientes e, conseqüentemente, com efeitos negativos na qualidade da atenção e na evolução clínica desses pacientes. O viés racial (racial bias) faz com que o profissional de saúde julgue o paciente com base na percepção de que esse indivíduo pertence a uma única categoria humana (raça ou etnicidade), ignorando outros atributos ou categorias de pertença. O viés racial pode levar a duas formas de discriminação estatística que influenciam na probabilidade diagnóstica subjacente – a assunção de que o paciente apresenta uma dada doença (hipótese da prevalência) ou maior ocorrência de erros na leitura dos sinais diagnósticos de membros de minorias étnico-raciais. Michelle Ryn e Jane Burke37 37 RYN e BURKE, 2000. mostraram como a percepção dos médicos acerca dos seus pacientes com doença arteriocoronariana era influenciada pelas características sociodemográficas desses pacientes, sendo os pacientes negros e de mais baixa renda vistos de maneira mais negativa do que os pacientes brancos e de estratos sociais mais elevados. Nesse estudo, os médicos relataram os mais baixos sentimentos de afiliação com os pacientes negros, associando-os a uma maior probabilidade de serem não aderentes à reabilitação cardíaca, ao abuso de substâncias e à precariedade quanto ao apoio social, além de serem percebidos como menos inteligentes que os pacientes brancos, mesmo quando o sexo, a idade, a renda e a educação eram controlados na análise. Essas crenças implicavam uma avaliação diferenciada segundo a raça para revascularização, independentemente da adequação clínica desse procedimento e das características demográficas do paciente. Na saúde mental, Lonnie Snowden38 38 Lonnie SNOWDEN, 2003. destaca duas conseqüências do viés racial – a sobrepatologização, na qual o compor-tamento pouco familiar aos médicos de indivíduos pertencentes a minorias é interpretado como uma manifestação de doença, e a minimização, quando os profissionais ignoram manifestações genuínas de doença mental, compreendendo-as como especificidades culturais.

Embora descrito mais freqüentemente no âmbito individual, o viés racial pode ocorrer também no nível coletivo quando pressupostos infundados tornam-se crenças normativas compartilhadas por membros de redes de profissionais e organizações ou quando as autoridades e membros da comunidade preconizam normas de comportamento aceitável segundo os padrões de grupos étnico-raciais majoritários. Dentre as causas apontadas para a ocorrência de vieses e estereotipias raciais está o erro de aplicação,39 39 Jack GEIGER, 2001. ou seja, a incorporação e atribuição, pelos provedores e profissionais de saúde, a cada indivíduo do grupo das probabilidades estimadas para o grupo nos estudos epidemiológicos, levando a uma associação etiológica e estigmatização genética de grupos étnico-raciais específicos – por exemplo judeus asquenazis e câncer de mama; negros e anemia falciforme. As estatísticas populacionais, consistentes com os vieses dominantes de especificidades biológicas das raças, acabam por fortalecer e manter intocadas essas associações mesmo diante das críticas que ressaltam que a única essência irredutível da natureza é a variação e que as medidas estatísticas são meras abstrações da realidade.

A designação racial no contexto do manejo clínico, de acordo com Robert Schwartz,40 40 SCHWARTZ, 2001. não apenas contradiz o que aprendemos da biologia, da genética e da história, mas também abre as portas para iniqüidades no cuidado à saúde. O autor questiona a concepção biológica de raça na criação de drogas direcionadas a grupos étnico-raciais específicos, levantando dúvidas sobre a capacidade de como um médico saber se dado paciente, que pode se identificar como pertencente a mais de um grupo étnico-racial, tem ou não a combinação de alelos que garantirá a eficácia de uma determinada droga. Michael Root41 41 ROOT, 2002. sublinha que, se um médico deseja ser justo com seu paciente, ele não deve tratá-lo como representante de um grupo racial, uma vez que a raça pode mascarar outras variáveis de nível populacional que estão relacionadas a exposições relevantes à saúde. Além disso, é improvável que os genes responsáveis pela determinação de certas características físicas possam ser logicamente vinculados à complexidade de doenças de etiologia multifatorial ou a efeitos terapêuticos de drogas.

Estereótipos étnicos ou raciais pejorativos, incapacidade em responder à diversidade, julgamentos negativos e atitudes racistas são fatores que afetam a autonomia e a escolha individual dos pacientes oriundos de grupos étnicos minoritários que buscam os serviços de saúde, em especial os serviços de aconselhamento genético. Esses fatores comprometem a comunicação efetiva entre paciente e profissional de saúde e, conseqüentemente, a satisfação, adesão, confiança, utilização dos serviços e o resultado final da ação em saúde. A baixa qualidade do cuidado, a informação inadequada, a insensibilidade às preocupações, interesses e perspectivas individuais contribuem, desse modo, para a manutenção e ampliação das iniqüidades étnico-raciais no cuidado em saúde. Vários autores42 42 Patricia KING, 1992; Karl ATKIN, 2003; e Michelle RYN e Steven FU, 2003. ressaltam que falhas na comunicação durante a troca de informações entre profissionais e pacientes são mais prováveis de ocorrer quando há diferenças de poder entre esses dois grupos, agravando-se quando elas refletem relações históricas de exploração e subordinação.

As implicações no cuidado à saúde dos grupos étnico-raciais pela atribuição de estereótipos negativos a determinados segmentos da população, sua correlação com categorias de risco e a construção de vulnerabilidades têm na AIDS um campo prolífico e exemplar para que se reflita sobre as inflexões morais e políticas que permeiam o discurso científico sobre as relações entre raça e saúde. Tanto no discurso moral quanto no discurso médico, a 'culpa' pela AIDS foi atribuída a estilos de vida caracterizados pela hiperatividade sexual e à sua noção moral correlata – a promiscuidade. As categorias adotadas pela ciência para identificar os grupos de risco relacionavam prostitutas, homossexuais e africanos, refletindo no discurso epidemiológico expressões sociais de sexofobia, homofobia e xenofobia que correspondiam a diferentes facetas da mesma repugnância – a repugnância pelos pobres, pelos diferentes.43 43 Geneviéve PAICHELER, 1992. A proibição da doação de sangue por homossexuais, regulamentada pela Portaria nº 1.376/93 do Ministério da Saúde brasileiro, é um reflexo dessa estratégia de identificação dos perigosos sociais e ilustra a prática da discriminação e da estereotipia negativa nas instituições de saúde. Ao assumir que todos os homossexuais tinham práticas sexuais que resultariam em maior risco para a transmissão do HIV/AIDS, desconhecendo que as práticas de risco não estão vinculadas à orientação sexual como demonstram as estatísticas oficiais, o Ministério da Saúde perpetuava o estereótipo do homossexual promíscuo e irresponsável, uma ameaça à saúde pública e objeto de medidas restritivas tradicionais e conservadoras da Saúde Pública que ferem os princípios contemporâneos dos Direitos Humanos.

A atribuição de um caráter étnico-racial a determinadas doenças genéticas retoma uma tradição médica que enfatiza a qualidade hereditária da suscetibilidade a esses agravos pelo reconhecimento de que certas doenças são seletivas quanto aos seus alvos. A epidemiologia dos fatores de risco, em conjunto com modernas técnicas da bioestatística e de desenhos de estudo, ao tornar-se o locus de um saber hegemônico relativo à causalidade das doenças, oferece um potencial significativo para a categorização moral de um amplo espectro de comportamentos e fenômenos sociais. Ao associá-los às questões ligadas à sexualidade e à reprodução de grupos étnico-raciais, essa epidemiologia dá-lhes maior valência moral vinculando-os a associações históricas de vulnerabilidade, ócio e devassidão moral. As marcas da sua suscetibilidade não estão limitadas apenas à superfície dos seus corpos e a cor da pele, formato dos lábios ou textura do cabelo, mas também impressas nos padrões de alterações genéticas do DNA.

Conclusão

Embora já se tenha um conhecimento razoável sobre a magnitude das diferenças étnico-raciais na saúde, ainda estamos pouco cientes das dinâmicas causais que determinam a distribuição diferencial dos problemas de saúde, pré-requisito para o desenvolvimento e direcionamento de programas e serviços efetivos para redução das iniqüidades. A correlação pouco crítica entre doença e raça tomada como ente natural nas explicações sobre as iniqüidades em saúde pode limitar a prevenção primária e perpetuar idéias que de modo simplista e inadequado atribuem à raça o que é devido, na realidade, a fatores sócio-econômicos e ambientais. O benefício das ações em saúde para os grupos étnico-raciais e para os pobres depende de um entendimento, pelos programas de saúde, do conceito e do significado das diferenças humanas e como essas diferenças interagem criticamente na apropriação das informações sobre saúde e doença diante de normas e valores que se distanciam dos estereótipos tradicionais.

O predomínio de uma visão reducionista acerca do papel dos fenômenos sociais na origem e manutenção de condições desiguais de saúde decorre, em grande medida, de uma abordagem metodológica hegemônica nas ciências da saúde que trata os fatores sociais como exposições, que considera o indivíduo como um agente que cria o seu próprio status de saúde e que vê o racismo como uma propriedade psicológica dos indivíduos e não uma correlação de saberes e poderes que estruturam os sistemas sociais e promovem benefícios econômicos e políticos para os grupos dominantes. Esses aspectos influenciam a maneira como os pesquisadores pensam suas hipóteses, a coleta e o manejo dos dados e a elaboração de argumentos científicos para corroborar os seus achados. Por essa razão, faz-se necessária uma crítica dos marcos teóricos subjacentes aos modelos explicativos da associação entre raça e doenças, de modo a construir uma concepção de processo saúde-doença que reconheça os caminhos nos quais as ideologias de raça, de classe e de gênero estão, inevitavelmente, incorporadas às teorias científicas.

Essa crítica deve levar em conta as transformações na moderna economia representacional que reproduzem a raça e que são afetadas, segundo Gabriel Gudding44 44 Gudding, 1996. e Paul Gilroy,45 45 Gilroy, 1998. por um lado, pelas mudanças tecnológicas e científicas que se seguiram à revolução na biologia molecular e, por outro lado, pelas mudanças nas formas de escrutínio dos corpos, nos modos como são feitas as suas assinaturas visuais. Essas mudanças provocaram uma profunda inflexão perceptual do corpo, em que a compreensão dos cromossomos e da genética ganha uma precedência sobre o corpo e o gen é dotado de identidade (testes para o cromossomo XX, impressão do DNA), de moralidade (egoísta, altruísta, frugal) e de intenção (perpetuação da herança gênica). Para Gilroy,46 46 GILROY, 1998. essas mudanças demandariam dos pesquisadores a identificação e exploração de tecnologias políticas que atuam nas relações que mantemos com a nossa humanidade e nossa espécie e o confronto constante com o modo como sensorialmente percebemos as raças, possibilitando desenvolver um imaginário racial mais distante da autoridade da razão e mais sintonizado com a fenomenologia do visual.

No caso brasileiro, isso implica a avaliação dos pressupostos subjacentes às propostas de políticas de saúde para a população negra e como eles se relacionam às especificidades históricas e sociais da construção da raça no nosso país, às características particulares da classificação racial e da percepção da discriminação racial, às resultantes éticas das propostas políticas e aos princípios de universalidade, integralidade e eqüidade que orientam as ações do Sistema Único de Saúde. No que tange ao PAF, o controle da reprodução por meio da racionalidade médica e das metas epidemiológicas de redução da prevalência da anemia falciforme choca-se com os ditames da autonomia reprodutiva e demanda uma ação crítica com respeito às implicações éticas e políticas subjacentes às ações desse programa.

A maneira como operacionalizamos as respostas à questão racial na saúde pode nos levar a dois caminhos distintos – desnaturalizar a raça, tratá-la como uma adscrição social que molda as oportunidades de indivíduos e grupos, direcionando os nossos esforços para a eliminação do racismo e das iniqüidades raciais na saúde, ou naturalizar a raça, tomando a realidade da doença como reflexo unilateral da estrutura biológica/genética, perpetuando, nas palavras de Gilroy,47 47 GILROY, 1998. a assinatura mais perniciosa da modernidade.

Recebido em agosto de 2005 e aceito para publicação em março de 2006

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Ago 2006
    • Data do Fascículo
      Abr 2006

    Histórico

    • Aceito
      Mar 2006
    • Recebido
      Ago 2005
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