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Conflitos agrários e memória de mulheres camponesas

Agrarian Conflict and Peasant Memory

Resumos

Este artigo toma para objeto de reflexão questões suscitadas por pesquisa com mulheres camponesas, autodenominadas e conhecidas como quebradeiras de coco babaçu, acerca de conflitos em que estiveram e se encontram envolvidas, elas e suas famílias, no Maranhão. Procura-se refletir sobre aspectos metodológicos suscitados pela análise de depoimentos de lideranças camponesas femininas que reconstroem, hoje, um tempo vivido no passado.

conflito agrário; relações de gênero; memória camponesa


This article reflects upon questions brought about during research with rural women, who call themselves and are known by others as quebradeiras de coco babaçu (cacao bean breakers). It deals with previous and present conflicts in which they and their families have been involved in Maranhão. Methodological concerns about interviews done with peasant and rural women leaders are discussed, emphasizing how past experience is reconstructed at the present time.

Agrarian conflict; Gender Relations; Peasant Memory


DOSSIÊ

Conflitos agrários e memória de mulheres camponesas

Agrarian Conflict and Peasant Memory

Maristela de Paula Andrade

Universidade Federal do Maranhão

RESUMO

Este artigo toma para objeto de reflexão questões suscitadas por pesquisa com mulheres camponesas, autodenominadas e conhecidas como quebradeiras de coco babaçu, acerca de conflitos em que estiveram e se encontram envolvidas, elas e suas famílias, no Maranhão. Procura-se refletir sobre aspectos metodológicos suscitados pela análise de depoimentos de lideranças camponesas femininas que reconstroem, hoje, um tempo vivido no passado.

Palavras-chave: conflito agrário; relações de gênero; memória camponesa.

ABSTRACT

This article reflects upon questions brought about during research with rural women, who call themselves and are known by others as quebradeiras de coco babaçu (cacao bean breakers). It deals with previous and present conflicts in which they and their families have been involved in Maranhão. Methodological concerns about interviews done with peasant and rural women leaders are discussed, emphasizing how past experience is reconstructed at the present time.

Key words: Agrarian conflict; Gender Relations; Peasant Memory.

Apresentação

Nossa intenção é extrair algumas lições de método revisitando uma pesquisa realizada em 2003,1 1 Pesquisa realizada juntamente com Luciene Dias Figueiredo, então mestranda do NEAF/UFPA, tendo como assistente o estudante de geografia da UFMA Josoaldo Lima Rêgo, bolsista de iniciação científica do CNPq (PIBIC), no âmbito do Projeto Olhar Crítico (Dfid-Action Aid Brasil). A pesquisa envolveu trabalho de campo, com permanência das pesquisadoras nos povoados, observação direta, participação em reuniões da Associação em Áreas de Assentamento do Estado do Maranhão (Assema) e do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco (Miqcb), e entrevistas gravadas com mulheres, homens, jovens e casais. com mulheres e homens, mas principalmente junto às chamadas quebradeiras de coco babaçu, integrantes de famílias que estiveram envolvidas na luta pela terra e pela cobertura vegetal, na região do Mearim, no Maranhão, nos anos 80.2 2 Maristela de PAULA ANDRADE e Luciene FIGUEIREDO, 2004. As pessoas entrevistadas tinham conhecimento dos fins a que se destinavam as entrevistas e permitiram que seus depoimentos fossem utilizados em futuras publicações, conforme reuniões realizadas em cada local pesquisado para explicar os objetivos do estudo. Essas mulheres se destacam, hoje, como lideranças expressivas, em diferentes níveis da organização política e econômica das quebradeiras de coco no Maranhão, Pará, Tocantins e Piauí.

O objetivo é refletir sobre representações femininas acerca da participação de homens e mulheres naquelas lutas, tendo em conta que o fazem dos lugares institucionais ocupados, atualmente, junto ao Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco (MIQCB); à Associação em Áreas de Assentamento do Estado do Maranhão (ASSEMA); à Câmara dos Vereadores (algumas são vereadoras); às famílias dos povoados onde residem, na condição de lideranças locais; à Escola Família Agrícola, instituição de ensino fundamental que fundaram para seus filhos; às fábricas de sabonetes, de papel reciclado e de doces, mantidas por elas e suas famílias em distintos povoados; às cooperativas e às chamadas cantinas organizadas após a conquista da terra, de modo a se livrarem dos atravessadores. Enfim, pretendemos perceber como reconstroem o passado, tendo em vista que o fazem a partir dos vários lugares que ocupam hoje, em sua bem-sucedida organização econômica e política, na qual emergiram como sujeito coletivo, assumindo papel preponderante.

Procuramos nos centrar nas especificidades da família camponesa e na plasticidade das estratégias econômicas, mormente daquelas que essa unidade de produção e consumo pode adotar em contextos de conflitos agrários.

Uma questão de fundo atravessa essa reflexão – certamente ainda sem resposta, e que somente a continuidade de pesquisas etnográficas permitirá perseguir – relativa ao fato de que, muitas vezes, extraem-se representações de depoimentos como se não fossem atravessadas pela posição ocupada pelos informantes hoje, como se a memória coletiva pudesse fluir de modo espontâneo e puro das consciências individuais, como se não fosse, conforme nos lembra Portelli,3 3 Alessandro PORTELLI, 1996. mediada por ideologias, linguagens, senso comum e instituições.

O tempo do coco preso

Toda vez que solicitamos a essas mulheres – e em geral o fazemos às ocupantes de posições de destaque, hoje, no movimento das quebradeiras – para discorrerem sobre as lutas que as levaram à conquista da terra e dos babaçuais, elas remontam ao tempo em que o acesso aos babaçuais e, portanto, a extração do babaçu deixou de ser livre. Toda vez que lhes pedimos para comentar sobre o processo que as levou a se livrar dos atravessadores, a controlar o beneficiamento das amêndoas, a comercialização e, até mesmo, a exportação do óleo para o mercado internacional, as narrativas remontam ao denominado tempo do coco preso. A memória das lutas travadas para garantir o livre acesso a esse recurso vegetal remete, nas narrativas, a um tempo em que os babaçuais deixaram de ser recursos abertos, usufruídos em sistema de uso comum.

O chamado tempo do coco preso não corresponde, necessariamente, ao tempo cronológico. Nós o datamos na década de 80, por ter sido esse o período em que as fontes escritas registraram o maior número de confrontos, de mortes, de incêndio de povoados, de destruição de casas, de escolas, de igrejas, de prisões, de ataques de pistoleiros. Quando as informantes se referem ao tempo do coco preso, porém, podem estar aludindo aos anos 70, aos 60, aos 50, ou seja, ao processo de fechamento dos babaçuais, que cada uma foi experimentando e do qual se lembra e rememora como um processo vivido.

Esse tempo é demarcado, portanto, por acontecimentos de profunda significação para a vida dessas famílias também no presente, como diz Maurice Halbwachs4 4 HALBWACHS, 2004, p. 126. – porque até hoje essas famílias lutam pelo acesso livre à cobertura vegetal, pela entrada livre nos babaçuais, estejam eles ou não dentro de propriedades privadas. Manter os babaçuais livres ao acesso das famílias, disponíveis ao usufruto comum, é o lema de sua luta, originando a logomarca do sabonete que produzem – Babaçu Livre – e também o nome pelo qual são conhecidas – as leis municipais que conseguiram as leis do babaçu livre. O tempo do coco preso marca a história do grupo, modelando, por oposição, sua identidade atual.

Em outros contextos, os camponeses de outras regiões aludem ao tempo da sujeição, ao tempo do cativeiro, para significar que estiveram sujeitos ao controle do proprietário das terras, pagando renda para cultivar. Desejavam a terra liberta. No caso das quebradeiras, procuravam libertar o coco. Era o recurso vegetal que estava preso, cativo, cercado pelo arame farpado, incendiado, derrubado, morto, extinto. Esta, ainda hoje, é a luta dessas mulheres – preservar os babaçuais, lutar pelo aproveitamento integral do coco, evitar que se transforme em carvão para alimentar siderurgias.5 5 Uma questão atual que se acrescenta às ameaças à integridade dos babaçuais e à expansão das atividades das quebradeiras de coco são as discussões e propostas em torno do biodiesel, aspecto que não desenvolveremos neste artigo.

O tempo do coco preso, repetidas vezes enunciado nas narrativas, aponta, por inversão, para um traço diacrítico da identidade desses grupos. Esses grupos lutaram contra o fechamento dos babaçuais, pela libertação de um recurso vegetal que, em seus sistemas de representação da natureza, era pensado e vivido como um recurso aberto, a ser apropriado pelo trabalho familiar e não para ser açambarcado individualmente pelos fazendeiros.

O tempo do coco preso é, portanto, de dor, de sofrimento, de fome, de perda de identidade. Isso porque não havia mais terras para cultivar. A expropriação já se completara. As terras já se haviam transformado em pastagens, via incentivos oficiais, e o extrativismo do babaçu se apresentava como única alternativa de sobrevivência às famílias camponesas. Dentre as atividades econômicas dantes praticadas – cultivo do solo, extrativismo, caça, artesanato, pesca – as famílias viam-se, subitamente, restritas à coleta e quebra do coco e venda das amêndoas aos fazendeiros. De atividade preponderantemente feminina, passara a constituir-se na única a garantir a alimentação do grupo familiar e a ser praticada por homens, mulheres, crianças, jovens e idosos. Completando o cerco à economia camponesa, os fazendeiros haviam passado a cercar os cocais, a prender o coco como dizem as informantes. Tratava-se, portanto, de lutar para libertá-lo, de modo a se libertarem a si mesmas e as suas famílias.

É sobre todo esse processo, que se estende aos dias de hoje, que nos falam os entrevistados, sobretudo as mulheres. Nesse momento, por volta dos 80, foram lançadas a uma posição de primeiro plano nos enfrentamentos com vaqueiros, pistoleiros e fazendeiros. Foram principalmente elas que, no tempo do coco preso, no exercício da atividade de extração, necessitaram adentrar as cercas de arame farpado, acompanhadas de suas crianças, apesar das proibições dos fazendeiros, das ameaças dos vaqueiros, das agressões físicas e das humilhações. Ou o faziam ou a família não se alimentava.

O protagonismo das mulheres na luta pelo acesso aos babaçuais

Os relatos sobre esse tempo são bastante chocantes, dolorosos, o que nos faz lembrar Portelli, mais uma vez, ao descrever a dor e o luto dos sobreviventes de Civitella: "as narrativas de Civitella nos deixam estarrecidos. No entanto, a tarefa do especialista, após recebido o impacto, é se afastar, respirar fundo, e voltar a pensar [...] interpretar criticamente todos os documentos e narrativas [...]".6 6 PORTELLI, 1996, p. 106.

Nesse sentido, para além dos relatos, devemos qualificar os enunciados, situando quem fala e de onde fala, atentando para o fato de que essas mulheres são lideranças que modelam o passado de um lugar muito especial no presente, da posição de proeminência hoje ocupada, lugar este reconhecido pelos homens, pois, como diz seu Zé Mundico, gerente da Cooperativa de Pequenos Produtores Agro Extrativistas de Lago do Junco (Coopalj), "a mulher hoje é a estrela da cooperativa".7 7 Excerto de depoimento extraído de PAULA ANDRADE e FIGUEIREDO, 2004.

Interpretar criticamente as narrativas não quer dizer desqualificar os depoimentos das entrevistadas, mesmo porque não estamos buscando a verdade, mas lidando com representações, com verdades, no plural. Encontramo-nos diante de várias verdades, ditas sob muitas vozes. A memória coletiva é polifônica, cada qual afirmando, na sua voz, a partir da sua posição, a história do grupo. Sendo assim, erramos quando, a partir de uma leitura ingênua das narrativas, tentamos descrever a história dos conflitos e das lutas, linearmente, por etapas, como muitas vezes o fazemos: inicialmente as mulheres lutaram pelo coco; num segundo momento os homens decidiram apoiá-las e, a partir daí, desencadeou-se a luta pela terra, a luta pela reforma agrária propriamente dita.

Evidentemente, há um protagonismo das mulheres nesse chamado tempo do coco preso. Quando narram que passavam por baixo das cercas de arame farpado, enfrentando a humilhação no confronto com os vaqueiros – que lhes tomavam os cestos com os cocos coletados, quebravam seus instrumentos de trabalho, lhes batiam com chicote8 8 Vide depoimentos a esse respeito em PAULA ANDRADE e FIGUEIREDO, 2004. –, é como se os homens não existissem, como se elas e seus filhos existissem sozinhos no mundo. Sabemos, no entanto, que a família camponesa é, ao mesmo tempo, uma unidade de produção e uma unidade de consumo. Todos os seus membros produzem em conjunto, obedecendo a uma divisão sexual e etária do trabalho, e todos consomem o que foi produzido. Daí a dificuldade dos economistas em calcular, com base nas categorias da economia capitalista, a renda da família camponesa, já que o que é produzido serve, ao mesmo tempo, para o auto-consumo e para comercializar e, assim, adquirir o que não produzem. Sabemos que o fruto do trabalho é compartilhado por todos, conforme suas necessidades.

Inadvertidamente, no entanto, muitas vezes, trabalhamos com as categorias de análise da família urbana, cujos membros vivem de forma atomizada, embora vivam sob o mesmo teto. Tomamos literalmente as narrativas e entendemos que, de fato, as mulheres lideraram as lutas e os homens só se engajaram nelas a posteriori. É assim que vários comentaristas e mediadores têm se referido à construção desse movimento, apenas como de mulheres e não como movimento de famílias.

De fato, como pesquisadoras mulheres, embora pertencentes à outra classe, à outra cultura, podemos nos sentir bastante tocadas pelos depoimentos dessas entrevistadas, pela dor e sofrimento que representam, e resvalar para um ponto de vista militante ingênuo. Para evitá-lo, poderíamos nos perguntar onde estavam os homens no momento dos conflitos ou como se dão as relações entre homens e mulheres nessa sociedade – como são pensados o ser mulher e o ser homem nessas culturas, o que entendem por trabalho feminino e masculino, por trabalho leve e trabalho pesado. Poderíamos nos questionar sobre como se davam as relações entre homens e mulheres naquele momento, como se desenhavam as estratégias de sobrevivência dos grupos familiares, de modo que cada membro se dividia na tarefa de conseguir alimentos, já que o acesso à terra estava cada vez mais interditado.

Em vez de tomar literal e ingenuamente o que está sendo dito, além de situar quem fala, devemos contextualizar esse discurso no âmbito da cultura e da economia desses grupos.

Julie Cruikshank,9 9 CRUIKSHANK, 1996, p. 163. ao analisar exemplos de estudos realizados nas Filipinas, na Nova Zelândia, em Uganda e na Colúmbia Britânica, nos diz que uma das contribuições mais diretas que a tradição oral pode prestar ao discurso acadêmico é complicar nossas perguntas. Historiadores e antropólogos, diz ela, em sua tarefa de examinar o passado, indagam o que realmente aconteceu, mas em geral fazem isso utilizando categorias e conceitos ocidentais.

Perguntamos se não corremos o risco de proceder assim quando imaginamos essas mulheres como agentes sociais à parte, avulsas, e não como integrantes de unidades familiares, fazendo parte de estratégias de sobrevivência e de luta que incluíam homens, mulheres, jovens, idosos e crianças; quando pensamos a família camponesa nos termos da família urbana; quando entendemos a dominação masculina de modo trans-histórico e trans-cultural.

Evidentemente, quem fala o faz do lugar de vencedora. Hoje é uma liderança, olha para o passado após a conquista da terra, depois de terem se organizado economicamente, terem fundado uma escola para seus filhos, terem montado cooperativas. O passado é reconstituído desse ponto de vista. É desse lugar que o reconstroem, que interpretam seu papel na luta, falando de sua participação e daquela dos seus maridos, assim como dos outros homens na conquista dos babaçuais e da terra. Algumas dessas lideranças subsumem ou omitem completamente a participação dos homens. Falam no feminino. É assim também que as entidades de mediação elaboram seu discurso e, igualmente, os apoiadores internacionais, reforçando um discurso ancorado no que chamam de relações de gênero (ao menos nas relações de gênero tal como conceituadas do ponto de vista da mulher branca, ocidental, e impostas às mulheres do chamado Terceiro Mundo via instituições financeiras e ONGs internacionais).10 10 Vandana SHIVA, 1995, p. 90-97.

O discurso dessas mulheres passa, portanto, a sofrer a interferência de ideologias, da ação de instituições. Algumas autoras não ocidentais, como Chandra Mohanty,11 11 Apud Andreu VIOLA, 2000, p. 38. chamam a atenção para certo colonialismo discursivo de parte das feministas ocidentais, que acabam produzindo uma leitura etnocêntrica e reducionista das condições de vida das mulheres do chamado Terceiro Mundo.12 12 Cf. Arturo ESCOBAR, 1996. Criticam a aplicação da categoria mulher, como categoria essencialista, predefinida de fora, sem levar em conta as relações sociais em que essa mulher do chamado Terceiro Mundo está inserida.

A memória dessas quebradeiras de coco também é dividida, para nos apropriar, ainda, de uma expressão de Portelli,13 13 PORTELLI, 1996, p. 129. embora utilizando-a em outro sentido. Mesmo valorizando seu papel como protagonistas da luta, ainda que ressaltando sua posição de lideranças, elas nos explicam, em suas narrativas, por que os homens não estavam presentes em muitos momentos, as razões de estarem escondidos e por que estavam elas enfrentando a polícia e os jagunços quando estes chegavam aos povoados. O enfrentamento entre seus homens e os antagonistas, naquele momento, seria mais grave, mais violento, principalmente porque os homens em idade adulta, do povoado, estavam sendo caçados pelos pistoleiros. Registrava-se, portanto, uma divisão do trabalho de guerra, estrategicamente pensada.14 14 Dado o tamanho exigido para este artigo, não pudemos inserir depoimentos, que podem ser consultados em nosso outro trabalho, já citado.

Em outros momentos, as mulheres partiam para o confronto com os que estavam derrubando as palmeiras, enquanto os homens ficavam por perto, vigilantes, e apareceriam caso elas sofressem ameaças mais graves. Havia, desse modo, o que denominamos de uma divisão sexual e etária do trabalho de guerra. As crianças, que transitam melhor pelos caminhos, pelo chamado mato, sem chamar muito a atenção, levavam comida, entregavam recados. Mulheres, crianças e idosos cuidavam de guardar os povoados, encarregando-se também de empatar as derrubadas de palmeiras. Em outras situações, era necessária a presença dos homens em idade adulta para enfrentar os que pretendiam destruir os babaçuais.

Considerações finais

Gostaríamos de concluir com algumas indagações que, embora se refiram ao caso específico, talvez possam ser úteis aos que trabalham com dados de memória social, com representações do passado, com reconstituições de histórias de lutas, com memória camponesa.

Como reconstituir as histórias das lutas incorporando os vários pontos de vista, as diferentes verdades, ditas de vários lugares, por mulheres, homens, crianças e idosos?

Como escapar à tentação da estatística ingênua, procurando o ponto de vista médio, ou os pontos de vista recorrentes?

Como escapar das armadilhas colocadas pelo ponto de vista da mulher ocidental que nos conduz a perceber a mulher camponesa, necessariamente, como vítima, subjugada, dominada, nos termos do que se passa em nossa sociedade?

  • CRUIKSHANK, Julie. "Tradição oral e história oral: revendo algumas questões". In: FERREIRA, Marieta de M.; AMADO, Janaína (Orgs.). Usos e abusos da história oral Rio de Janeiro: FGV Ed., 1996. p. 149-164.
  • ESCOBAR, Arturo. La invención del Tercer Mundo: construcción y desconstrucción del desarollo Barcelona: Grupo Editorial Norma, 1996.
  • HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva São Paulo: Centauro Editora, 2004.
  • PAULA ANDRADE, Maristela de; FIGUEIREDO, Luciene Dias. "Na lei e na marra: a luta pelo livre acesso aos babaçuais". In: ACTION AID BRASIL. Olhar crítico sobre participação e cidadania na construção de políticas públicas Rio de Janeiro: Action Aid Brasil, 2004. p. 1- 41. CD-ROM.
  • PORTELLI, Alessandro. "O massacre de Civitella Val di Chiana: mito, política, luto e senso comum". In: FERREIRA, Marieta de M.; AMADO, Janaína (Orgs.). Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: FGV Ed.,1996. p. 103-130.
  • SHIVA, Vandana. Abrazar la vida: mujer, ecología y supervivencia Madrid: Horas y Horas, 1995.
  • VIOLA, Andreu. Antropología del desarrollo: teorías y estudios etnográficos en América Latina. Barcelona: Paidós, 2000.
  • 1
    Pesquisa realizada juntamente com Luciene Dias Figueiredo, então mestranda do NEAF/UFPA, tendo como assistente o estudante de geografia da UFMA Josoaldo Lima Rêgo, bolsista de iniciação científica do CNPq (PIBIC), no âmbito do Projeto Olhar Crítico (Dfid-Action Aid Brasil). A pesquisa envolveu trabalho de campo, com permanência das pesquisadoras nos povoados, observação direta, participação em reuniões da Associação em Áreas de Assentamento do Estado do Maranhão (Assema) e do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco (Miqcb), e entrevistas gravadas com mulheres, homens, jovens e casais.
  • 2
    Maristela de PAULA ANDRADE e Luciene FIGUEIREDO, 2004. As pessoas entrevistadas tinham conhecimento dos fins a que se destinavam as entrevistas e permitiram que seus depoimentos fossem utilizados em futuras publicações, conforme reuniões realizadas em cada local pesquisado para explicar os objetivos do estudo.
  • 3
    Alessandro PORTELLI, 1996.
  • 4
    HALBWACHS, 2004, p. 126.
  • 5
    Uma questão atual que se acrescenta às ameaças à integridade dos babaçuais e à expansão das atividades das quebradeiras de coco são as discussões e propostas em torno do biodiesel, aspecto que não desenvolveremos neste artigo.
  • 6
    PORTELLI, 1996, p. 106.
  • 7
    Excerto de depoimento extraído de PAULA ANDRADE e FIGUEIREDO, 2004.
  • 8
    Vide depoimentos a esse respeito em PAULA ANDRADE e FIGUEIREDO, 2004.
  • 9
    CRUIKSHANK, 1996, p. 163.
  • 10
    Vandana SHIVA, 1995, p. 90-97.
  • 11
    Apud Andreu VIOLA, 2000, p. 38.
  • 12
    Cf. Arturo ESCOBAR, 1996.
  • 13
    PORTELLI, 1996, p. 129.
  • 14
    Dado o tamanho exigido para este artigo, não pudemos inserir depoimentos, que podem ser consultados em nosso outro trabalho, já citado.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Nov 2007
    • Data do Fascículo
      Ago 2007
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