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Editorial

EDITORIAL

Na publicação do segundo número do volume de 2009 da REF, comemoramos o retorno de Susana Funck às atividades da coordenação editorial da revista, trazendo sua experiência em edições acadêmicas e seus talentos específicos na área de literatura e análise do discurso, além do bom humor que a caracteriza e torna mais leves nossas reuniões de trabalho.

Continuamos (pre)ocupadas em buscar alternativas de financiamento para a manutenção da publicação gráfica da revista, em meio aos dilemas que se vão impondo sobre a disponibilização on line dos periódicos acadêmicos. A REF implantou uma proposta inovadora de publicação de um Portal Feminista cuja tecnologia se tornou obsoleta e está sendo renovada para voltar aos meios eletrônicos de comunicação ainda em 2009, possibilitando o acesso a várias publicações nacionais do campo de estudos feministas e de gênero. Além disso, a REF se encontra disponível on line no Scielo e no Portal de Publicações da UFSC.

Insistimos, no entanto, mesmo nos curvando à conveniência econômica de reduzir a tiragem da revista para 500 volumes, em manter sua publicação em papel, fiéis ao projeto gráfico proposto pelo grupo de editoras que idealizou e implantou a Revista Estudos Feministas, acreditando que essa é uma forma importante de divulgação de seus conteúdos. O aumento do número de assinantes em eventos acadêmicos, militantes e de formação de professoras/es em 2009 atesta que a revista em papel tem um nicho próprio de procura e valorização que não podemos negligenciar.

Contamos com o subsídio do CNPq, que tem diminuído ou permanecido invariável, mesmo com as exigências de aumento anual dos números publicados, o que nos levou a tornar a REF quadrimestral a partir de 2004.

Assim, estamos novamente apresentando proposta de financiamento à Secretaria Especial de Políticas para Mulheres, que, no 2º Encontro de Núcleos e Grupos de Pesquisa Pensando Gênero e Ciências (Brasília, 24-26.6.2009), definiu como uma de suas recomendações o apoio a publicações das áreas de gênero e feminismo.

Este número da REF trata principalmente de mulheres: mulheres da Bolívia, do Rio de Janeiro, de Santiago de Cuba, mulheres migrantes, mulheres que enfrentam violência doméstica, que lutam por cidadania, mulheres representadas em textos, em jornais, mães, escritoras, cientistas, bruxas, pesquisadoras, sempre em relações marcadas pelo gênero.

Naara Luna analisa notícias de jornais (especialmente O Globo, Rio de Janeiro, 2000-2005) acerca da constituição em sujeitos sociais de embriões produzidos por fertilização in vitro e fetos anencefálicos, seres que antes não eram dissociados do corpo materno. Tais sujeitos, circunscritos pela biomedicina, estiveram no centro dos debates quando da aprovação da lei de biossegurança, que autorizou o uso de embriões fertilizados in vitro para pesquisas, e também tiveram como protagonistas os fetos anencefálicos nas controvérsias para a ampliação dos permissivos de aborto legal. A autora procurou demonstrar como os argumentos contra e a favor do uso de embriões para pesquisa e da inclusão da gravidez anencefálica como permissivo do aborto no Brasil coincidiram em muitos pontos, pois são tributários da configuração dos valores individualistas estudados por Louis Dumont.

Víctor Silva Echeto e Rodrigo Browne Sartori contrapõem, em seu artigo, às cidades homogêneas que se vão desenhando no capitalismo tardio como não lugares, sem identidade, sem relações ou histórias, cidades outras, invisíveis, abrigadoras de singularidades e diferenças, reivindicadas pelos estudos de gênero, cidades sexuais e nômades, excêntricas, ambivalentes, desejantes.

No artigo "Migración, género y desigualdad social...", María José Magliano reflete sobre os modos como as dimensões de gênero, etnia e classe social condicionam as formas de inserção social e laboral de mulheres bolivianas que migram para a Argentina, reproduzindo e reforçando práticas e discursos de exclusão que enfrentam tradicionalmente, também, no país de origem.

Considerando o crescimento da participação das mulheres no mercado de trabalho e o aumento de seus níveis de escolaridade, Maria das Dores Campos Machado e Myriam Lins de Barros apresentam os resultados de pesquisas que estudaram as continuidades e descontinuidades nas representações de gênero de três gerações de mulheres de famílias de camadas médias e populares no Rio de Janeiro, privilegiando suas percepções sobre o lugar social das mulheres no contexto das transformações da sociedade brasileira.

Ivette Sóñora Soto reflete sobre o sufragismo e o feminismo em Santiago de Cuba, buscando nova interpretação para a inserção parcial das mulheres santiagueras em partidos políticos e seu direito ao voto. Afirma ter sido o voto feminino uma concessão de partidos políticos que consideravam vantajoso promover o sufrágio feminino para obter vitória em eleições, mas que as mulheres o utilizaram para seus próprios fins, buscando consolidar direitos civis e políticos, e participando de forma efetiva na constituição de uma sociedade com consciência de cidadania.

O artigo de Isabel González Díaz analisa o processo de elaboração e produção das duas primeiras antologias editadas por mulheres na área de estudos culturais, detendo-se nas informações referentes ao papel das mulheres na evolução da disciplina, à qual trouxeram novos temas e conceitos em debates acadêmicos, bem como novas ferramentas de análise, apesar das dificuldades que tiveram de enfrentar nos primeiros momentos da constituição dessas publicações.

Eriza de Oliveira Parente, Rosana do Nascimento e Luiza Jane Eyre Vieira apresentam pesquisa realizada com mulheres que denunciaram seus agressores de violências domésticas, em Fortaleza, Ceará. Acompanhando várias mulheres que romperam com o silêncio e utilizando abordagem qualitativa, com observações e grupos focais, durante e após a denúncia, as pesquisadoras buscaram analisar os relatos das barreiras identificadas pelas denunciantes como dificultadoras no processo de exporem as violências sofridas, bem como os fatores que se configuraram como formas de enfrentamento dos agressores. Ressaltando o fato de as ações violentas terem ultrapassado os limites de natureza física, envolvendo sofrimentos de ordem psíquica, social e econômica, as mulheres pesquisadas relataram terem sido, assim, levadas a romper o silêncio que as mantinha nas situações de sofrimento.

No ensaio publicado neste número, Ester Massó Guijarro analisa, por meio do paradigma do holismo epistemológico, a sexualidade feminina em tempos de globalização. Considerando as questões globais atuais sob uma perspectiva multidisciplinar, a autora utiliza a perspectiva análoga da complexidade para sugerir a defesa do holismo erótico como forma de problematização da sexualidade e do erotismo feminino.

Os artigos temáticos, selecionados a partir de textos submetidos espontaneamente, ilustram a crescente preocupação com os estudos do discurso e a instrumentação que as várias abordagens discursivas proporcionam às ciências humanas e sociais em geral e aos estudos de gênero em particular.

Este número da REF se encerra, como de costume, com resenhas de livros recentes para conhecimento de suas leitoras e leitores.

Mara Coelho de Souza Lago

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Dez 2009
  • Data do Fascículo
    Ago 2009
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