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Violência e tecnologias de gênero: tempo e espaço nos jornais

Violence and technologies of gender: time and space in the newspaper

Resumos

Este texto busca compreender uma tecnologia de gênero que constrói "homens" e "mulheres", o masculino e o feminino, nas páginas dos jornais, sublinhando, nos discursos jornalísticos sobre violência, a violência própria dos discursos - a violência dessa tecnologia.

violência; gênero; jornais; espaço; tempo


The present discussion aims at understanding a technology of gender that constructs "men" and "women", the masculine and the feminine, on the newspaper articles, underscoring, in the journalistic discourse on violence, the violence embedded in the discourses - the violence of the technology itself.

Violence; Gender; Newspaper; Space; Time


ARTIGOS TEMÁTICOS

Violência e tecnologias de gênero: tempo e espaço nos jornais

Violence and technologies of gender: time and space in the newspaper

Pedro Paulo Gomes Pereira

Universidade Federal de São Paulo

RESUMO

Este texto busca compreender uma tecnologia de gênero que constrói "homens" e "mulheres", o masculino e o feminino, nas páginas dos jornais, sublinhando, nos discursos jornalísticos sobre violência, a violência própria dos discursos - a violência dessa tecnologia.

Palavras-chave: violência; gênero; jornais; espaço; tempo.

ABSTRACT

The present discussion aims at understanding a technology of gender that constructs "men" and "women", the masculine and the feminine, on the newspaper articles, underscoring, in the journalistic discourse on violence, the violence embedded in the discourses - the violence of the technology itself.

Key Words: Violence; Gender; Newspaper; Space; Time.

A cada dia, notícias entram em nossas casas por diversas formas e, apesar do rádio, da televisão e da internet, o jornal impresso continua sendo um dos meios importantes pelos quais recebemos informações e elaboramos nossas perspectivas e visões de mundo. Os jornais nos apresentam eventos, e modelam e posicionam nossos olhares, tratando-se, portanto, de uma poderosa tecnologia. Neste texto, entendendo a mídia impressa como uma tecnologia de gênero - tecnologia que constrói determinadas imagens de "homens" e "mulheres", e que atua na produção do masculino e do feminino -, indagarei se os discursos jornalísticos que descrevem a violência não seriam eles próprios violentos.

O artigo está organizado da seguinte forma: abordo, inicialmente, os conceitos de "tecnologias de gênero" de Teresa de Lauretis, indicando o jornal como umas dessas tecnologias. Discorro, logo após, sobre as especificidades do discurso jornalístico, apresentando o conceito de "cronotopo" de Mickail Bakhtin, bem como as peculiaridades de sua análise de discurso. Argumento que conhecer as relações entre tempo e espaço é uma tentativa de aproximação aos modos de estruturar específicos do discurso jornalístico, procedimento que visa a contornar a assepsia estilística desses textos. Posteriormente, percorro os cronotopos dos jornais que representam a violência entre homens das classes populares e das classes altas para então analisar os motivos cronotópicos dos discursos que descrevem a "violência contra mulheres" nas páginas policiais. Em seguida, ainda na intenção de ressaltar as formas de funcionamento dessa tecnologia de gênero - a mídia impressa -, indago sobre a dimensão expressiva da violência como ato de comunicação. Finalizo, assinalando formas de construção da alteridade nos jornais.

Tecnologias de gênero

Num de seus textos mais conhecidos, Teresa de Lauretis1 1 DE LAURETIS, 1994. afirma que gênero é produto de diferentes tecnologias sociais, tais como internet, rádio, televisão, cinema ou jornais, e de diversas epistemologias e práticas críticas institucionalizadas, bem como práticas da vida cotidiana. Em diversas outras obras,2 2 DE LAURETIS, 1984, 1989 e 2007. a autora vem insistindo que gênero não é propriedade dos corpos nem algo que existe a priori nos seres humanos, mas conjunto de efeitos produzidos nos corpos, comportamentos e relações sociais.

Aproveitando essa definição, almejo alcançar a forma como se estrutura uma tecnologia de gênero - no caso, aquela que constrói homens e mulheres nas páginas policiais dos jornais - sublinhando a violência própria dessa tecnologia. Não se trata, então, de abordar a violência contra a Mulher - assim com maiúscula, representação de uma essência inerente a todas as mulheres -, nem de analisar as diferentes histórias de violência de mulheres. O foco analítico consiste na tecnologia de gênero (os jornais) que constrói mulheres e homens quando narra a violência. Para efetuar tal aproximação teórica, busco as configurações cronotópicas dos discursos jornalísticos (das páginas policiais) - tecnologia de gênero específica que, como pretendo demonstrar, emgendra.3 3 DE LAURETIS, 1994, p. 206. Ressalto que não são os tipos diferenciados de violência que me interessam mais diretamente neste texto (para tal, ver, entre outros, Lia Zanotta MACHADO, 1998), mas, insisto, uma tecnologia de gênero específica e a violência do próprio discurso jornalístico.

Focalizo a atenção na máquina que constrói o feminino e o masculino, em como as páginas policiais descrevem a violência em homens das classes populares e homens das classes altas, e como descrevem a violência contra a mulher. Trato o discurso jornalístico como um dispositivo que constrói o masculino e o feminino, e institui a razoabilidade de gêneros.4 4 DE LAURETIS, 1989; e Donna HARAWAY, 1995. A indagação é: em que medida essa construção - e esse dispositivo - não seria ela própria violenta, fazendo parte do exercício de violência. Gênero está no centro do exercício da violência - devemos, portanto, falar, para os objetivos aqui propostos, em violência de gênero. Evidentemente, dadas a inércia constitutiva da linguagem e a persuasão que os significantes exercem sobre nós, meu texto deslizar-se-á entre os significantes "homem" e "mulher".5 5 DE LAURETIS, 1994; e Rita Laura SEGATO, 2003. Para maior aproximação ao debate sobre as diferenças de abordagens que ensejam os termos " violência contra as mulheres" (Mariza CORRÊA, 1983; e Maria Amélia AZEVEDO, 1985; e Maria Filomena GREGORI, 1992) e " violência de gênero" (MACHADO, 1998; e SEGATO, 2003), ver Mireya SUÁREZ e Lourdes BANDEIRA, 1999. Para uma historicização das categorias "mulher", "mulheres", "gênero", ver Joana Maria PEDRO, 2005. Para um panorama dos debates do sujeito do feminismo, ver Claudia Lima COSTA, 2002.

As páginas policiais são complexas tecnologias de interpretação, representação e criação de mundos "reais".6 6 HARAWAY, 1995. De Lauretis já havia mostrado que o cinema era uma forma de modelar e posicionar homens e mulheres dentro da matriz heterossexual. As imagens cinematográficas se transformam em modelos, já que "formatam", "domesticam" o olhar sobre o mundo. Se Teresa de Lauretis pôde demonstrar como as tecnologias cinematográficas e os códigos cinemáticos constroem a mulher, existe a possibilidade de visualizarmos os jornais e seus códigos como tecnologias de gênero. Espero mesmo encontrar o caráter gendered das notícias sobre violência nas páginas policiais. Perscrutar os discursos jornalísticos, buscando detectar quais cronotopos escolhidos na narração da violência, pode nos possibilitar alcançar uma complexa tecnologia social - sustentada e operacionalizada por diversas instituições e agências sociais.

Tempo e espaço: o conceito de cronotopo

A imprensa grava e ressalta determinadas dimensões de forma mais ou menos consciente. Embora esses discursos se construam com base em representações coletivas, condensando emoções vivenciadas coletivamente nas imagens e nas letras reproduzidas pela mídia, existe certo grau de consciência nos jornais que indica a dimensão ideológica. Os jornais não são apenas portadores de eficácia mágica que consolidam a reciprocidade entre editores e leitores; são discursos posicionados e valorados.7 7 João Batista TORRES, 1990 e 1994. Como podem ser ideológicos os discursos que procuram se construir de forma "neutra" - que se autoproclamam imparciais, como linguagem que se busca "objetiva" -, tentando dizer tudo de forma clara e com frases simples, informando o leitor da totalidade do evento já no primeiro parágrafo?

A resposta poderia ser dada de diversas maneiras. Uma delas consiste em apontar na própria forma de escrever, no como se diz o que se diz, o conteúdo ideológico dos discursos sobre violência. O contato com a violência por meio da mídia impressa pode nos levar a concluir que, por detrás do objetivo de neutralidade e objetividade, existem discursos altamente valorados. No que se refere aos jornais, principalmente às páginas policiais, devemos nos questionar: como alcançar a dimensão formal - e, por meio dela, o caráter ideológico do discurso - numa linguagem, como a jornalística, que busca uma verdadeira assepsia estilística? Uma resposta a essa indagação pode indicar a própria tentativa de eliminação da linguagem figurativa como índice significativo de seu caráter ideológico; a convencionalidade da linguagem assinalaria o posicionamento.8 8 Existe certa padronização dos textos jornalísticos, como se pode observar nos manuais de redação dos grandes jornais, nos cursos para os profissionais que ingressam nas redações, no diário controle da escrita efetuado pela própria maneira de organizar os jornais - demonstrado, por exemplo, por TORRES, 1994, em sua etnografia na redação do jornal Folha de S. Paulo. Evidentemente, os tipos de jornalismos são variados, e incluem mesmo aqueles mais críticos, que buscam subverter as próprias formas específicas desse tipo de discurso. A literatura sobre o assunto é extensa, o que parece indicar certa resistência a abordagens unidirecionais. Ciente da complexidade e da especificidade desse discurso, proponho-me, neste texto, apenas uma aproximação parcial às páginas policiais dos jornais de um conjunto de notícias selecionadas e catalogadas no Dossiê 1985 do Banco de Dados do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH). Todas as vezes que mencionar os termos "jornais", "discurso jornalístico", "textos de jornal", estarei me referindo às páginas policiais. Os possíveis achados deste texto, portanto, devem ser circunscritos ao universo das páginas policiais - gênero bem particular no quadro mais geral do jornalismo. Para outras abordagens do tema, ver Maria Vitória BENEVIDES, 1983; James CAREY, 1988; Sílvia RAMOS, 1994; Sérgio ADORNO, 1995; Adriana LOPES, 1999; Tânia MONTORO, 1999; Danilo ANGRIMANI SOBRINHO, 1995; e Theóphillos RIFIOTIS, 1999.

Este artigo busca, portanto, empreender uma análise de discurso. O texto jornalístico é abordado como um "gênero de discurso"9 9 Mikhail BAHKTIN, 1997. que possui forma própria de descrição. As notícias são construções discursivas, como forma própria de narrar/criar eventos, que podem ser analisadas com o objetivo de perceber, no evento narrado, o que passa a ser naturalizado ou percebido como autêntico - ou seja, como o "aparelho jornalístico", adaptando aqui a expressão de De Lauretis,10 10 DE LAURETIS, 1989. constrói e naturaliza os gêneros.

A procura de estreita ligação da análise formal com seu caráter histórico e social e a necessidade de conceito que pudesse penetrar na assepsia dos textos jornalísticos conduziram à análise de discurso de Mikhail Bakhtin.11 11 Para a elaboração deste artigo me apoio especialmente na abordagem de Bakhtin sobre cronotopo (BAKHTIN, 1988). Para análises da obra de Bakhtin, ver Michael HOLQUIST, 1991, Elsa DRUCAROFF, 1991, Cristóvão Tezza, 2003. Diferentemente de Edward SAID, 1996, que relaciona a obra de Bakhtin a modismo intelectual (ele se refere basicamente ao universo norte-americano), ligado diretamente a "discursos domesticados", acredito que este texto acaba por sugerir como Bakhtin pode ser útil num projeto de crítica cultural ou numa hermenêutica da suspeita (Paul RICOEUR, 1978). Por dois motivos básicos. Em primeiro lugar, para ele forma e conteúdo são indissociáveis e representativos; as palavras não são desabitadas e só existem em sua qualidade dialógica. Em segundo, por mais que um texto prime pela assepsia, pela busca da neutralidade, pela eliminação da linguagem figurativa, ele, necessariamente, se constitui nalguma relação espaço-temporal. Essa característica nos conduz ao conceito bakhtiniano de cronotopo, que é um entrecruzar das coordenadas de tempo e espaço, uma intervinculação espaço-temporal de uma narrativa ou discurso. Qualquer discurso, mesmo o jornalístico, se expressa espaço-temporalmente.

Ao se representarem no espaço e no tempo, as narrativas se colocam de determinada maneira como ser histórico. Assim, cada cronotopo, determinando uma imagem espaço-temporal, supõe concepções ideológicas. Como argumenta Michael Holquist,12 12 HOLQUIST, 1991. numa primeira instância, cronotopo é para Bakhtin uma combinação particular de tempo e espaço resultantes de determinadas manifestações históricas de formas narrativas, vinculadas principalmente à literatura. Mas, como o ser "histórico real" se revela nos cronotopos, podemos acreditar que esse conceito proporciona um meio de explorar a complexa, indireta e frequentemente mediada relação entre vida e discurso. Mais do que um instrumental técnico para análises literárias, o conceito de cronotopo nos possibilita captar a forma como homens e mulheres se representam. Esse conceito bakhtiniano demonstra que texto e vida estão em permanente diálogo, e o caráter dialógico assinala como um enunciado está sempre interconectado a outros.

O caráter dialógico evita, assim, a absoluta separação entre a existência livre de convenções fora dos textos e um mundo de convenções dentro do texto. Dessa maneira, apesar de o estudo de cronotopo de Bakhtin ser explicitamente dedicado à descrição de vários modelos que têm dominado a história da novela, suas análises nos fornecem elementos para estabelecer a vinculação entre práticas sociais, história e literatura - como argumentou Tzvetan Todorov.13 13 TODOROV, 1984. O conceito de cronotopo poderá ajudar a penetrar o véu que encobre o caráter ideológico dos assépticos textos jornalísticos que noticiam a violência de gênero.

Se o cronotopo é uma forma de percepção ideológica, um modo de compreender a vida humana simultaneamente dentro de um espaço e num ponto específico do tempo histórico, a própria violência não pode ser distanciada de seu caráter ideológico, nem de sua dimensão espaço-temporal. A violência se configura, assim, numa ideia-valor que marca os discursos, constituindo-se em forma de a própria sociedade se pensar e de atribuir divisões, hierarquias e escalas de poder; consistindo em maneiras de tratar o "outro", de solucionar conflitos, de sustentar identidades, de obter reconhecimento social, entre outros.14 14 Luis Eduardo SOARES, 1995b, advertiu sobre a utilização de violência como "palavra-valise", com certa tendência a homogeneizar as observações relativas a fenômenos associadas à violência. Neste texto, seguindo Luis Eduardo SOARES e Leandro Piquet CARNEIRO, 1997, e na tentativa de escapar das ciladas apontadas acima, violência é percebida como ideia-valor, modos de construir e tratar a alteridade. Assim, o direcionamento adotado não foi arbitrário: pretendo sugerir que os discursos jornalísticos que relatam a violência utilizam cronotopos diferenciados, o que implica um posicionar específico.

Os jornais e as classes populares

Faz parte de certa imagem - como já tive oportunidade de frisar - achar que o jornalismo tem uma forma peculiar de contar que é única em todos os casos e que se materializaria numa assepsia estilística. Todavia, se pudermos assinalar cronotopos diferentes para os textos jornalísticos, essa ideia seria, no mínimo, relativizada. As pesquisas que realizei no Banco de Dados do Movimento Nacional de Direitos Humanos15 15 Utilizei as notícias do ano 1995, perfazendo um total de 50, todas selecionadas e catalogadas no Banco de Dados do MNDH, e petencentes ao que se denomina no jargão jornalístico de "páginas policiais". O Banco de Dados consiste num arquivo de notícias, elaborado por profissionais do MNDH, todas envolvendo casos de diversos tipos de violência e noticiadas em jornais de grande circulação - as notícias são retiradas de dois jornais de grande circulação estadual em cada unidade da Federação. No Banco de Dados, em seu Dossiê 1995, obtive textos que descreviam a violência envolvendo homens de classes populares e altas, e violência contra mulheres, todas dos jornais Correio Braziliense e Jornal de Brasília (doravante CB e JB, respectivamente). Além dos textos, o Banco de Dados agrupa o perfil dos envolvidos a partir das variáveis idade; cor; sexo; ocupação; menção ao uso de drogas; envolvimento em atividades ilícitas e relação entre os envolvidos. Para uma análise detalhada desse Banco de Dados, de sua importância e limitações, ver Valéria G. de BRITO E SILVA, 1998. Como já salientei, utilizando análise de discurso, basicamente a teoria de discurso de Mickail Bakhtin, busquei analisar nessas notícias as relações entre espaço e tempo (cronotopo). levaram justamente a esta conclusão: quando os periódicos descrevem, por exemplo, um crime qualquer ocorrido com homens das classes populares,16 16 Apesar das discussões sobre os limites do termo, principalmente no que tange a uma visão que homogeneíza e essencializa as "classes populares" e as "classes altas", apresentando-as de forma monolítica, alguns autores/as vêm empregando o termo de forma a evitar tais conotações, como em Cláudia FONSECA e Jurema BRITES, 2006. Ver também Gilberto VELHO e Marcos ALVITO, 1996. utilizam um cronotopo; mas quando apresentam um crime semelhante com homens das classes altas, o cronotopo se transforma. Um movimento análogo ocorre com a posição cronotópica da mulher quando ela é personagem participante de um crime ou ação violenta.

Nas páginas policiais que descrevem eventos ocorridos com homens das classes populares, as ações se desenrolam tendo como marco um ponto fundamental: a violência. Esse ponto se torna o acontecimento essencial da vida dos personagens, transfigurando-se no índice significativo das biografias. Apesar da existência de fatos e de acontecimentos anteriores a esse ponto, nos discursos desses jornais tudo se passa como se, nesse período, nada de essencial se passasse. Os personagens só existem por causa da violência; a construção cronotópica indica que até aquele momento nada significativo ocorreu em suas vidas.

Exemplos variados poderiam ser alocados para confirmar a afirmação acima. Notícias como "Empregada é assassinada"; "Grávida morre, mas bebê escapa"; "Menina é estuprada e morta pelos pais"; entre numerosas outras, apontam os nomes dos envolvidos na cena da violência, apresentam descrição do episódio e, quando muito, indicam pequenos antecedentes que já antecipavam o próprio ato de violência, e os prováveis desdobramentos originados - sempre referentes à ação.17 17 O objetivo não é analisar ou acompanhar os eventos noticiados na íntegra, mas somente captar nos discursos dos jornais as relações entre tempo e espaço, ou seja, os motivos cronotópicos, tal como proposto por Backtin. Trata-se de um tipo específico de análise de discurso, que, se por um lado se distancia das abordagens mais focadas em eventos específicos (como em Lourdes BANDEIRA e Tânia Mara ALMEIDA, 1999), por outro lado permite uma visão geral dos motivos que perpassam esses textos. Noutras palavras, interessa-se menos pelos eventos (ou pelos diferentes tipos de notícias) do que pelas configurações cronotópicas - objetivando-se, como salientado, compreender um pouco mais esse "aparelho jornalístico" ou a maneira como se estrutura essa tecnologia de gênero. Para uma discussão sobre as possibilidades e limites da análise cronotópica de Backtin, ver TODOROV, 1984; sobre tecnologia de gênero, ver DE LAURETIS, 1984, 1989, 1994 e 2007. Descontextualizam-se o agressor e a vítima, suprimindo suas histórias de vida. A exceção a esse procedimento formal é mínima e se circunscreve a casos em que pequenos fatos já demonstravam a "propensão ao crime", como atestam, geralmente, depoimentos de vizinhos e amigos: "Eu sempre achei João muito esquisito, caladão, cheio de marcas de facadas e tiro espalhadas pelo corpo". A vida dos envolvidos só existe em função imediata ao ato de violência.

Antes do ato de violência - como ponto fundamental - há um hiato, pois tudo o que acontece não deixa marcas, não indicando qualquer possibilidade de mudança. Desfechos como "O casal deverá ficar preso até a conclusão das investigações"; "Os médicos ainda tentaram salvar a vítima. Em vão" sugerem a inexistência de crises e de transformações, seja no agressor, seja na vítima.

Quando os jornais narram violência de homens das classes populares, o tempo abstrato encerra um ser passivo e imutável. Os fatos acontecem ao personagem que se encontra privado de iniciativa. Sendo passivo, sofrendo o jogo do destino, ele se resguarda, conservando profunda identidade consigo mesmo. Os acontecimentos não alteram nem forjam nada; só provam a solidez de um produto já fabricado. O mundo e os homens estão prontos e imóveis, suprimindo-se possibilidades de transformação. Os fatos aparecem por acaso, e desaparecem sem deixar vestígios no comportamento dos envolvidos. Durante o tempo anterior à ação violenta, os personagens permanecem inalterados. Quando os eventos surgem, são organizados numa série temporal exterior à vida, de forma simplesmente técnica. Os fatos ocorrem de repente e a vida só é interrompida pelo acaso.

Essa organização temporal conduz a uma dimensão anistórica e natural, asseverando que os personagens não se modificam. O acaso, ao colocar o de repente, que amiúde leva à violência - que na construção jornalística se torna o fato mais relevante na vida dos personagens -, assinala que o tempo não pertence às pessoas, implicando, assim, a naturalização das ações dos personagens.

De um lado, temos a naturalização do homem que, diante das situações proporcionadas pelo acaso, comete naturalmente atos de violência. Ou seja: é natural que homens das classes populares sejam violentos. Daí que não se necessita narrar os eventos e fatos anteriores a um crime, nem mostrar as mudanças ocorridas ou as marcas que deixou nos homens e mulheres. Mas, de outro lado, temos a forma descontextualizada de se colocar os fatos: isolados e excepcionais, não se admitindo um tempo-espaço concreto. Nesse caso, temos distância admitida no discurso que parece propor, para além da naturalização da violência nas classes populares, a necessidade de colocá-las num mundo estranho, à margem do mundo normal e familiar de quem está narrando. Assim, podemos localizar nos discursos jornalísticos cronotopos com as seguintes características: a) ligação técnica e abstrata do espaço e do tempo; b) reversibilidade dos momentos da série temporal; c) possibilidade de transferência no espaço.

Os jornais e as classes altas

O mundo imutável, de um tempo-espaço abstrato e tecnicamente arranjado, naturalizado e estrangeiro, construído nos discursos jornalísticos que descrevem a violência de homens das classes populares, contrasta-se com os discursos dos mesmos jornais ao relatarem a violência de homens nas classes altas. Nesses discursos, um motivo fundamental é o da metamorfose, entendida como modo de interpretação e de representação do destino particular do homem. A metamorfose é a base da representação da vida humana em seus momentos essenciais de crise e de ruptura, nos períodos em que um personagem se transforma em outro. O motivo da metamorfose coloca a crise e a transformação como partes do discurso, apresentando-se duas ou três imagens do mesmo personagem, desunidas por suas crises.

As imagens são alocadas uma ao lado da outra, como no caso em que o jornal Correio Braziliense aponta o suicídio de um jovem "da classe média alta". O início é esclarecedor: "J.R.G.T.C, 17 anos, era um rapaz inteligente, saudável e tranqüilo. Tinha carro próprio, computador, carinho da família. Estudava em escola particular, freqüentava festinhas com amigos e pretendia formar uma banda de rock". Logo a seguir, outra imagem: "Deu um tiro na cabeça com um revólver calibre 38 no quintal de sua casa no Lago Sul" (CB, 20 de maio). Como esse episódio, são numerosos os casos de homens "normais", que eram vizinhos, amigos e parentes, mas que, de repente, se transformam e cometem atos violentos.

Os textos de jornal que relatam a violência - principalmente crimes - em classes altas também não sugerem um tempo histórico, proporcionando tão somente momentos excepcionais que, por sua vez, determinam as imagens do personagem que caracterizam sua vida posterior. Diferentemente dos elementos contidos no cronotopo anterior, o tempo deixa marcas no personagem, apesar de ainda se caracterizar pelos acontecimentos excepcionais e pelo acaso.

Nas descrições de violência de homens das classes altas, o acaso atua somente nos limites, pois a iniciativa primeira pertence ao homem. Essa iniciativa não é "positivamente criada" e sim uma iniciativa da falta, do erro e do engano. Nessas condições, os fatos vividos pelo personagem conduzem à construção de uma nova imagem, em que o homem é responsabilizado pelos seus atos. Já não é mais um tempo abstrato e técnico, o tempo é "um todo essencial e irreversível" que exige concretude e que se aproxima do tempo da vida cotidiana.18 18 BAKHTIN, 1988, p. 239.

Depois do ato violento, as páginas policiais salpicam declarações dos familiares, dos envolvidos, mostrando como há lições e ensinamentos no episódio, e sugerindo como os personagens mudaram suas vidas e seus modos de agir. Não é a identidade anterior que é afirmada, mas sua modificação com a crise e a ruptura advinda dos acontecimentos.

Há nesses textos uma fusão da vida do homem com seu caminho real e espacial, com suas peregrinações. Surge, então, o motivo do caminho da vida, que passa pela terra natal, familiar. O espaço é preenchido pelo sentido da vida do personagem. O cronotopo da estrada permite, além de maior familiaridade, a existência da vida cotidiana; já não se fala em lugares distantes, mas do "quintal", do lugar onde os fatos aconteceram e modificaram os rumos de vida. O espaço se concretiza: não é qualquer espaço; trata-se do sítio da metamorfose, da mudança.

Essa vida cotidiana, não obstante, só existe em determinados momentos, nos caminhos laterais da estrada, pois os personagens principais e os acontecimentos estão fora do cotidiano. O personagem tem um caminho fora do cotidiano e somente atravessa por ele numa das fases de sua vida. Ao se retirar o personagem de seu dia a dia, empurrando-o para as margens, fragmentando-o em pedaços independentes e desunidos, privando-o de laços substanciais, elimina-se também sua historicidade.

Particular e privada, a vida cotidiana não contém nada de público e só se depreende da esfera privada quando a ação violenta acontece. Nas páginas policiais, o crime, nas classes altas, é o momento da vida privada em que ela se demuda pública a contragosto.

Motivos cronotópicos da construção da Mulher

A diferenciação cronotópica entre os relatos jornalísticos que tratam a violência com homens das classes populares e com homens das classes altas deve ser comparada com os motivos cronotópicos dos relatos de violência contra a mulher. Tal movimento possibilita verificar as formas escolhidas para construir os personagens, captando as maneiras escolhidas para representar mulheres e homens - o que indica o caráter gendered do discurso jornalístico.

Ao relatarem a "violência contra as mulheres", os jornais concebem tempo-espaço como abstratos, não existindo vestígio de construção cronotópica que remeta a algum tipo de historicidade. O tempo e o espaço abstratos conferem ao feminino um caráter totalmente passivo, pois, já que a dimensão espaço-temporal é exterior à constituição dos personagens, as mulheres acabam sendo conformadas como sem iniciativa; ao se movimentarem no tempo e no espaço sem qualquer inserção, as mulheres simplesmente sofrem o jogo do destino. "L.M.N. foi esfaqueada por seu amante", "M.P.D. morta a tiros por seu marido", "E.L.S. assassinada pelo irmão". Nada da vida dos personagens, das condições que ensejaram o ato violento.

Daí se conclui que os discursos jornalísticos, quando descrevem a violência contra mulheres desconhecem qualquer localização histórica do tempo dos acontecimentos. A história é excluída dos textos jornalísticos. Assim, as datas fornecidas são referenciais, exteriores ao curso do acontecimento, em geral se limitando à própria data do jornal diário, tratando-se, simplesmente, de instrumental técnico de informação, mas que, no essencial, não guardam nenhuma vinculação com o fato ocorrido. "Ceilândia, terça-feira à tarde"; "Um homem não identificado invadiu ontem de madrugada"; são as referências temporais amiúde fornecidas nessas circunstâncias. O tempo nos discursos jornalísticos, portanto, é abstrato e anistórico.19 19 História e mudança não devem ser confundidas, pois a persistência da estrutura através do tempo é ela própria histórica. Todavia, o texto jornalístico constrói a realidade como se fosse anistórica. Ao criar um personagem que não revê o significado de seus projetos pessoais, o esquema cultural não enfrenta qualquer perigo, não podendo colocar, para utilizar os termos de Marshal SAHLINS, 1987, p. 186, a humbris simbólica do homem como "uma grande aposta feita com as realidades empíricas".

O espaço, à semelhança do tempo, também é abstrato. Para descrever o ato violento se faz necessária a delimitação do espaço. Contudo, os jornais apresentam os acontecimentos num espaço determinado unicamente pelo acaso, "pela coincidência ou pela não coincidência fortuitas em dado lugar no espaço".20 20 BAKHTIN, 1988, p. 224. Os fatos podem se passar em qualquer lugar: Ceilândia, Samambaia, Taguatinga, Sobradinho ou Plano Piloto. Existe, evidentemente, a suposição de que algumas localidades na cidade são mais violentas do que outras, mas, mesmo nesses sítios, não se propõe descrição espacial ou vinculação entre espaço-personagem. O ato de violência ocorreu aqui, como poderia ter acontecido em qualquer lugar.21 21 Concordo com Luiz Eduardo SOARES, 1995a, p. 26, quando aponta o equívoco da ideia de que a violência é um fenômeno democrático e com distribuição homogênea. Contudo, o que estou sublinhando aqui é que existe uma forma de narrar que vincula abstratamente a violência ao espaço de sua localização. As localidades consideradas de maior índice de violência recebem, entretanto, motivo cronotópico diferente, o de lugar distante e desconhecido, o que serve para consolidar a visão de que a violência ocorre nos espaços marginais da sociedade.22 22 Ver HALL et al., 1973, p. 226.

Esse mundo naturalizado e de um tempo e espaço abstratos e tecnicamente arranjados se distancia de tempo-espaço concreto, inevitável na representação de um mundo familiar. Seja pela distância denunciada pela objetividade e assepsia dos textos de jornal, seja pela forma de interligar tempo e espaço, ao relatar a violência de alguma forma relacionada ao feminino, as páginas policiais a colocam num mundo estranho e estrangeiro. E nele não se verifica familiaridade com o autor - familiaridade com o de onde veio e o de onde observa o autor. Esse caráter de "estranho" é dado também pela forma descontextualizada de se colocar os fatos.

A construção espaço-temporal conduz à indistinção tanto dos personagens como de suas ações. Esse procedimento pode ser observado quando se obnubila a biografia dos sujeitos ou quando as páginas policiais resumem a vida ao ato violento. Mas, também, quando no mesmo jornal diário o assassinato de uma mulher pelo seu marido e o estupro perpetrado pelo vizinho a uma jovem de 16 anos são alocados numa disposição que subsumem essas notícias num amplo universo, não as diferenciando, por exemplo, do furto de uma bicicleta, seguido de prisão, por um jovem da periferia de Brasília. Disposição formal, aliás, deveras comum em jornais. O processo de indistinção naturaliza a violência, subsumindo, por exemplo, os crimes de gênero numa miríade de outros crimes e de outras formas de violência. Indistinção que esconde o rastro de gênero dos discursos, reforçando a ideia de um narrador neutro e equânime, escondendo sua participação na comunicação - que também gera violência, como argumentarei adiante.

Mesmo em notícias nas quais as mulheres efetuam crimes, os jornais as colocam como sujeitos não constituintes. Quando a mulher comete o crime, passa a existir somente por causa dele; o discurso, então, olvida toda história de vida e se cria um imenso vazio sobre o passado. Mas, além disso, o texto jornalístico procura retirar a mulher do centro da descrição. O Jornal de Brasília (5 de julho de 1995) descreve, por exemplo, a história de uma mulher que matou seu marido e escondeu o corpo. Na matéria, o jornalista começa dizendo ser O.P.G. acusada de matar seu companheiro a golpes de facão. Depois, ele localiza o bairro e o nome da vítima. Em seguida, informa que os bombeiros encontraram o corpo, que policiais descobriram o crime por meio de um telefonema anônimo denunciando brigas entre o casal, denúncia confirmada pelo vizinho. No final, o leitor fica sabendo que OPG teve ajuda de certo D, personagem, evidentemente, masculino. A presença de um número infindável de sujeitos constituintes sugere o papel sempre secundário da mulher, mesmo quando é ela quem efetuou o crime.

Falo de crime cometido por mulheres, neste momento, só para nuançar os motivos cronotópicos das páginas policiais que constroem mulheres como sujeitos não constituintes. Se ao cometer o crime a mulher não se apresenta como sujeito, quando vítima, simplesmente desaparece. No primeiro caso, aparece tecnicamente, como um nome que reage diante de um fato; no segundo, é um nome apenas - condição decorrente, como já fiz notar, da descontextualização das ações e da localização espaço-temporal.

Essa configuração cronotópica produz efeitos. A sucessão de histórias, descontextualizadas de localização concreta espaço-temporal, insinua uma repetição que entedia os leitores e adjudica a naturalização da violência - seja ela em forma de crime, seja simbólica.23 23 Violência simbólica é, segundo Pierre BOURDIEU, 2002, p. 50, " a forma de poder que se exerce sobre os corpos, diretamente, e como que por magia, sem qualquer coação física; mas esta magia só atua com o apoio de predisposições colocadas como molas propulsoras, nas zonas mais profundas dos corpos". Na análise de Roger CHARTIER, 1995, violência simbólica, no caso de gênero, seria a interiorização, pelas mulheres, de normas enunciadas pelos discursos masculinos. O historiador adverte, entretanto, que tal interiorização da dominação não exclui afastamentos e manipulações - que vão permitir o deslocamento ou a subversão da relação de dominação. A reapropriação pelo dominado de uma representação imposta se volta, então, contra a ordem dominante que a produziu. Ver também BOURDIEU, 1989; Rita Laura SEGATO, 2003; e Rachel SOIHET, 1989 e 1997. A naturalização parece mesmo formar a base moral sob a qual a violência não noticiada, mas comum no dia a dia vivenciado por homens e mulheres, pode surgir com a mesma naturalidade.

A violência cotidiana, quando aparece nos jornais, figura num tempo e espaço abstratos e intangíveis, perfazendo configuração que indica sua distância de qualquer realidade observável. Uma das maneiras de edificar textualmente esse distanciamento se dá quando o jornalista confere certo ar de jocosidade às situações: "Depois de beber a tarde inteira, J.P.P. vai a Delegacia das Mulheres se queixar dos desmandos de seu marido"; "Questionada na Delegacia, O.M. diz que as brigas ocorrem por que o marido quer controlar a televisão", e assim por diante. A violência moral e simbólica termina por se tornar trivialidade, e sua denúncia se configura em "coisa de mulher mal amada" (CB, 12 de setembro de 1995) - como ressaltou o jovem L.P.G., casado e pai de duas filhas e que proferiu a frase acima depois de uma briga do casal na qual sua esposa - com hematomas pelo corpo - prestou queixa na polícia. O pretenso gracejo confere naturalidade à violência. Justamente por esse tipo de violência ser inerente e indispensável à ordem de gênero, exercendo papel ubíquo de atualização naquilo que se denomina gênero,24 24 SEGATO, 2003. é que a construção textual torna jocosas situações de angústia, medo, insegurança e dominação.

O programa de televisão "Sem meias palavras" apresentou um incidente que envolveu Jeremias - rapaz de uns vinte e poucos anos detido por conduzir uma motocicleta embriagado. A fala desconexa desse personagem parece conferir graça a esse episódio por demais banal para alcançar tão amplamente a mídia. O site youtube divulgou a matéria e logo uma quantidade enorme de espectadores, no país e no mundo, puderam acompanhar o acontecimento, chegando à mídia impressa e à rede televisiva de outros países. O que passou despercebido para muitos foi que por detrás do gracejo surge uma fala que impressiona pela violência: "Eu sou cabra homem, se eu pudesse, eu matava mil... eu mato até o delegado", vociferou Jeremias. A fala desconexa, o estado de embriaguez, o caráter, por assim dizer, inconsciente da narrativa acabaram por conformar uma estranha e desconcertante facúndia que denuncia a vinculação imediata entre violência e gênero. Tão marcante fora essa conexão que esse mesmo personagem, encontrado dias após nas mesmas condições da primeira detenção, sofreu a incitação exatamente nesse campo: "Ainda continua sendo cabra homem?", como indagou várias vezes o repórter. Essa história demonstra a vinculação entre aquilo que se noticia, a forma de se contar a história e as relações entre meios de comunicação, violência e gênero.25 25 Podemos também pensar em outras dimensões, como a força da mídia e sua interconexão com diversas modalidades de comunicação, sejam jornais impressos, rádio, internet ou televisão - aspecto esse que não poderei desenvolver aqui. Utilizo esse evento somente para destacar a zombaria como elemento do discurso jornalístico, tratando-se, entretanto, do único caso que não consta no Banco de Dados do MNDH. Sobre a zombaria como arma antifeminista, ver SOIHET, 2005.

Quando o texto de jornal descreve práticas violentas nas classes populares utiliza um tempo-espaço que coloca os sujeitos como imutáveis e anistóricos, um tempo e espaço abstrato que priva os sujeitos de toda iniciativa. Os homens surgem como personagens que cometem ações violentas, existindo somente por causa delas. No caso das mulheres, como vítimas ou agressoras, os textos de jornais apagam suas atitudes e ações, tornando-as, além de passivas e socialmente marginais, seres à margem no próprio discurso. Geralmente, as notícias de violência reservam às mulheres o espaço que o ato violento abarca, e pequenas informações são adicionadas à margem, como que para atestar que aquele personagem se limita ao ato de violência sofrido. A parca quantidade de detalhes ou de dados sobre o ocorrido, bem como das condições que propiciaram a violência, completa e perfaz a própria economia simbólica da violência. Nos discursos jornalísticos nada há de novo, nenhuma alteração ou criação; tudo ocorre para confirmar uma identidade que já existia desde o início. Os traços biográficos são tão genéricos que terminam por assegurar a construção de uma mulher também genérica, criada para consubstanciar o feminino como eternamente passivo.26 26 O discurso jornalístico estabelece - e se pauta por - contratos na interação entre o enunciador e o destinatário. Há uma complexa rede de relações entre jornalista e leitor, o que significa que não podemos imaginar um isolado criador (o jornalista) de sentidos, sem perceber o público também como aquele que marca a formação de significados. Dessa forma, o processo de construção da mulher, ou de "engendramento", não é unidirecional nem homogêneo (DE LAURETIS, 1994, p. 206). As tecnologias de gênero são reapropriadas e desviadas, como demonstram, por exemplo, Marie-Hélène BOURCIER, 2002 e 2005; e Beatriz PRECIADO, 2000, 2002 e 2007. Uma limitação deste trabalho, evidentemente, é que ele se centra em verificar como o gênero é construído por uma tecnologia específica (as páginas policiais dos jornais), mas não como ele é absorvido pelas pessoas, o que implica a não observância das fraturas, das disjunções e da resistência. Ou seja, afirmar que os jornais constroem a Mulher não significa, em hipótese alguma, dizer que não haja resistências e dissonâncias no processo, e reapropriações e desvios dos instrumentos simbólicos e das tecnologias que instituem e efetuam a própria construção da mulher e do feminino (ver SOIHET, 1997).

O mais interessante é que, mesmo quando se trata de discursos jornalísticos que procuram relatar a violência contra mulheres das classes altas, os motivos cronotópicos não se alteram, como demonstra a inexistência do motivo da metamorfose envolvendo mulheres das classes altas nas notícias por mim analisadas. A imagem da mulher, portanto, não sofre alteração no processo de descrição e de narração do ato violento.

O resultado dessa construção cronotópica é que a notícia acaba por distanciar o leitor dos personagens, fazendo desaparecer qualquer personagem palpável, localizado historicamente, vinculado a um tempo-espaço concreto. Dois outros efeitos poderiam, ainda, ser apontados. Em primeiro lugar, a foraclusão do feminino, tratando-se de uma negação insistente e repetitiva da mulher como sujeito. O sujeito feminino inexiste, encontrando-se em seu lugar uma mulher genérica, um simulacro. Esse processo ocorre não apenas como recalque - rasura de algo dito - mas como ausência de inscrição; já que a mulher só surge nos discursos jornalísticos como simulacro. Em segundo, mas diretamente relacionada à foraclusão do feminino nos textos que noticiam a violência contra a mulher, a construção cronotópica, ao naturalizar a violência, acaba por tornar indistintos os mais variados crimes e atos violentos; uma indistinção interna dos tipos de crimes, que coaduna com a construção simulacral de uma "mulher genérica".27 27 Penso aqui na utilização e ampliação de Judith BUTLER, 1997, do conceito lacaniano de foraclusão, e, sobretudo, no texto de SEGATO, 2006b, sobre o Édipo brasileiro. Utilizo o conceito de simulacro valendo-me de Jean BAUDRILLARD, 1996.

Os jornais têm estrutura formal e procedimentos estilísticos, já que utilizam motivos cronotópicos valendo-se de formas da tradição para construir verdades. O jornalista escreve se posicionando - cronotopicamente -; ao se distanciar do leitor e enquadrá-lo, a construção textual exerce sempre seu olhar sob o manto da neutralidade. Essa neutralidade e essa distância se desfazem, entretanto, quando percebemos o caráter de classe e de gênero dos discursos - como espero ter ficado demonstrado pela análise da composição cronotópica dos textos de jornal que abordam a violência.28 28 Inspiro-me, aqui, no livro de Mary Louise PRATT, 1999, e em suas considerações sobre o "observador" ( seeing-man), e igualmente nas abordagens de Teresa DE LAURETIS, 1989, sobre as tecnologias de gênero. Assim, talvez seja melhor compreender as páginas policiais dos jornais como dispositivos discursivos que constroem o outro, que agem sob o outro e que classificam, enquadram, definem e inventam a violência e o violento.

Podemos observar, ainda, que as relações espaço-tempo nos textos de jornal que noticiam a violência ocorrem de forma a criar locais civilizados e pacificados e espaços marginais, distantes e estrangeiros, que se configuram num outro da sociedade hegemônica. Esses textos espargem, fragmentariamente, também uma pedagogia da nação limpa da violência, composta por homens brancos razoáveis e mulheres passivas que devem ser controladas pelo discurso normatizador que as enquadra - o que nos lembra a frequente vinculação entre a preservação do território nacional e o corpo feminino.29 29 Ver SEGATO, 2004 e 2006a.

Páginas policiais, gênero e violência

Ao analisar as dinâmicas psíquicas, sociais e culturais que se relacionam com a violação, Rita Laura Segato30 30 SEGATO, 2003. conclui ser ela, antes de tudo, um enunciado. Desse modo, as análises que circunscrevem os atos de violação a patologias individuais ou à ação imediata e automática da dominação masculina acabam por olvidar uma dimensão fundamental: a violação é, fundamentalmente, um mandato que, sempre segundo Segato, seria condição necessária para a reprodução do gênero como estrutura de relações entre posições marcadas pelo diferencial hierárquico, e instância paradigmática de todas as outras ordens de status. A violação surge como cobrança rigorosa, forçada e naturalizada de um tributo sexual, na reprodução da economia simbólica de poder cuja marca é o gênero. A violação, portanto, atua nos ciclos regulares de restauração desse poder.

Na busca de formulação de modelo capaz de dar conta da etiologia da violência - sempre pensada em sua associação direta com as relações de gênero -, a autora assevera que a violência, no caso da violação, decorre da relação entre dois eixos interconectados. Um eixo horizontal, formado por termos acoplados por relações de aliança e competição; outro, vertical, caracterizado por vínculos de entrega ou expropriação. O eixo vertical associa as posições assimétricas de poder à sujeição, ou seja, o perpetrador à sua vítima; o eixo horizontal associa o perpetrador aos seus pares, em relações que atuam objetivando a simetria. Esses dois eixos possuem ciclos que se articulam, formando sistema único cujo equilíbrio é instável e de consistência deficiente. O ciclo cuja dinâmica violenta se desenvolve sobre o eixo horizontal se organiza ideologicamente em torno de uma concepção de contrato entre iguais; o ciclo que se revolve em torno do eixo vertical corresponde ao mundo pré-moderno, e se refere ao universo do status. As esferas do contrato e do status, apesar de pertencerem a universos distintos, são coetâneas e se interceptam sistematicamente.

A manutenção do eixo horizontal, que prima pela relação simétrica entre pares, depende, para sua sustentação em simetria, da relação vertical com a posição subordinada. Esse processo origina uma relação de exação de tributo no eixo vertical, condição mesma da conservação da estabilidade do eixo horizontal. Essa exação de tributo resulta num fluxo afetivo, sexual e de outros tipos de subordinação que expressa a sujeição constante da posição do que se designa de mulher ou feminina. Como se pode deduzir, esse tributo é voluntário em condições de "normalidade", mas em períodos e conjunturas especiais pode ser coagido.

A violação é um enunciado que se dirige basicamente a colocutores presentes no cenário ou no panorama intelectual e afetivo do sujeito de enunciação. O estupro, seguindo esse raciocínio, decorre de um mandato que dimana da própria estrutura de gênero, e garante, em determinados casos, o preito que se acredita ter acesso. Este esquema forma o desenho do patriarcado e das estruturas de gênero, perfilando suas arquiteturas.31 31 A análise sobre violação aqui esboçada objetiva apenas destacar a dimensão expressiva da violência, problematizando as relações entre os meios de comunicação, gênero e violência, e indagando sobre as possibilidades de formas de atuação violentas específicas dessa tecnologia de gênero. Sobre o assunto, ver SEGATO, 2003.

A exação do tributo de gênero é condição indispensável para a habilitação dos que aspiram ao status masculino e esperam poder competir ou se aliar, regidos por um esquema contratual. A violência tem papel fundamental na reprodução da ordem do gênero, sendo-lhe mesmo consubstancial. A articulação violenta é paradigmática da economia simbólica dos regimes de status, exercendo papel central na reprodução da ordem de gênero. Dessa forma, fica evidente que a moral e o costume são indissociáveis da dimensão violenta do regime hierárquico.

Essas ideias conduzem a questionamentos interessantes sobre as relações entre meios de comunicação, gênero e violência. A dimensão expressiva e não apenas instrumental de violências contra as mulheres e a presença da interlocução entre os agentes - relações tanto ou mais importantes que conexão imediata entre agressor e vítima - sugerem as seguintes indagações: qual o papel da mídia naquilo que Segato denominou de "eixo horizontal"? Como esses textos participam do eixo horizontal e, assim, do próprio ato violento? Se a violência é um ato de comunicação, como os meios de comunicação atuam sobre esse ato?

Se a violência é coetânea ao gênero, a foraclusão feminina que se manifesta na construção cronotópica das notícias das páginas policiais por mim analisadas corresponde a uma naturalidade que enseja - noutras palavras, sustenta as condições comunicativas - a própria violência moral e simbólica, mesmo naquele tipo de violência não noticiada pelos jornais; violência que se manifesta, inclusive, na própria foraclusão do feminino. Diante dessas dimensões devemos, ainda, indagar sobre outro aspecto da construção desse "outro feminino".

Um crime perfeito

Os artigos de jornal apresentam diferenciação cronotópica substancial na forma de narrar a violência nas classes populares e nas classes altas, e na forma de abordar a violência quando se refere ao universo feminino. Nas páginas policiais que retratam a violência nas classes populares, os personagens: a) só existem por causa do crime, b) não se modificam, c) são anistóricos, d) são colocados dentro de um espaço-tempo abstrato. Na representação das classes altas, os discursos são construídos de modo a mostrar: a) a "metamorfose" do personagem - indicando a existência de uma vida "normal" anterior à ação violenta, b) diversas imagens do mesmo personagem, c) um tempo-espaço mais concreto. A imagem da mulher não sofre alteração no processo de descrição e de narração do ato violento. No caso dos motivos cronotópicos que constroem a mulher e o feminino nas páginas policiais, existe um duplo olhar: em primeiro lugar, a naturalização da mulher dá-se exatamente no processo de retirá-la de um tempo-espaço concreto e de seu caráter histórico. Em segundo, nota-se que, independentemente de classe social - e das condições histórico-sociais daí advindas - a mulher é construída como alteridade total. Nos discursos jornalísticos que descrevem a violência contra mulheres temos também a naturalização da alteridade. Já que a diferença é naturalizada e se atribui um valor menor ao universo feminino, as mulheres podem ser sujeitos de agressão preferencial.

A construção textual ocorre sempre, podemos afirmar agora, de uma perspectiva e de um lugar - denunciados pela composição cronotópica -: os do homem branco, pertencente às elites, que direciona seu olhar masculino sobre o outro, perfazendo uma pedagogia da dominação masculina e da assepsia que se quer civilizatória. O discurso jornalístico nas páginas policiais constrói uma distância entre o narrador e a violência. Essa distância é elaborada de maneira diferenciada. Ao tratar das classes populares, o narrador admite uma distância absoluta em relação aos personagens da ação violenta, pois eles já são os "outros", advindos de um tempo-espaço abstrato, de um mundo estrangeiro, seres imutáveis cuja incômoda existência se deve ao ato violento, não existindo nenhuma familiaridade entre o narrador-personagem. Mas, ao tratar das classes altas, o narrador observa momentos de familiaridade com os personagens, apresentado imagens de vida que indicam condutas e procedimentos "normais", e a metamorfose assinala quando e como os personagens se afastam do narrador e da sociedade, para se configurar em "outros".

Os textos de jornal buscam, portanto, naturalizar a violência no "outro", construindo, no discurso, a alteridade. O narrador fabrica a alteridade, colocando a violência como anômala, buscando situá-la nas margens, para retirá-la de si mesmo. Talvez esse modo de criar a alteridade, de construí-la, objetive a afastar as motivações consideradas socialmente inadequadas, e a distanciar os atos moralmente censuráveis que, não obstante, continuam constituindo o imaginário e a sensibilidade daquele que relata a violência nos jornais. Os discursos jornalísticos concebem os personagens envolvidos como alteridades totais, sujeitos situados à margem, dividindo assim a sociedade em duas partes: uma região interna e central, composta por pessoas consideradas puras; e uma margem formada por pessoas impuras, perigosas, violentas.32 32 Mireya SUÁREZ, 1995.

Se o texto jornalístico, pelo menos no que se refere às páginas policiais, busca alocar e naturalizar a violência no "outro", e se o "truque" da violência e do terror, na análise de Michael Taussig,33 33 TAUSSIG, 1993. por exemplo, é o de produzir imagens que alocam a violência, a desordem, o perigo no outro, o jornal seria, de certa forma, um amplificador da violência. As matérias de jornais que noticiam a violência - mesmo quando existe um tom de denúncia ou condenação -, em sua própria forma, na sua maneira de estruturar o texto (ou seja, nos pilares dessa tecnologia de gênero), envereda-se na própria violência descrita. Não se trata somente de relatos sobre violência, pois, ao fragmentar os personagens, retirar sua historicidade, construir imagens que refletem mulheres como "sujeitos não constituintes", aderem violência aos fatos violentos que descrevem, tornando-se textos violentos. Disse anteriormente que a violência é "uma forma de tratar o 'outro'"; posso ampliar minha argumentação afirmando que é também uma forma de retratar o "outro", de construí-lo textualmente.34 34 BAUDRILLARD, 1996, p. 156.

A construção do "outro", nesse caso, é uma forma de buscar sua própria liquidação. Quando disse que as páginas policiais criam a "alteridade", estava me referindo a uma visão artificial de alteridade, pois o texto homogeneíza o "outro". De um lado, as páginas policiais apresentam cronotopos variados em situações diversas, conforme sugeri acima; mas, por outro lado, toda distinção cronotópica é para afirmar que a violência está no "outro". Aquele que escreve não se identifica com os personagens e, independentemente de sua situação, o personagem é sempre o "outro", retirando assim seu caráter irredutível. O que temos é o desmoronamento da experiência de alteridade. Segundo Soares,35 35 SOARES e CARNEIRO, 1997, p. 17. a tendência de "homogeneizar as observações relativas a fenômenos associados à violência" seria a característica definidora da "cultura do medo". A tendência dos textos das páginas policiais de homogeneizar os personagens e situações de violência também poderia ser vinculada à busca de se construir uma "cultura do medo".

Jean Baudrilhard36 36 BAUDRILHARD, 1996. nos conta qual seria o crime perfeito. Segundo ele, estamos vivendo um tempo em que a função primeira do signo é fazer desaparecer a realidade e, simultaneamente, dissimular essa desaparição. Um outro crime perfeito seria o de ocultar a violência dos textos nos textos sobre violência.

[Recebido em abril de 2007 e aceito para publicação em junho de 2008]

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  • _____ As Folhas do Mal. 1994. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) - Departamento de Antropologia, Universidade de Brasília.
  • VELHO, Gilberto; ALVITO, Marcos (Orgs.). Cidadania e violência Rio de Janeiro: Editora UFRJ-FGV, 1996.
  • 1
    DE LAURETIS, 1994.
  • 2
    DE LAURETIS, 1984, 1989 e 2007.
  • 3
    DE LAURETIS, 1994, p. 206. Ressalto que não são
    os tipos diferenciados de violência que me interessam mais diretamente neste texto (para tal, ver, entre outros, Lia Zanotta MACHADO, 1998), mas, insisto,
    uma tecnologia de gênero específica e a violência do próprio discurso jornalístico.
  • 4
    DE LAURETIS, 1989; e Donna HARAWAY, 1995.
  • 5
    DE LAURETIS, 1994; e Rita Laura SEGATO, 2003. Para maior aproximação ao debate sobre as diferenças de abordagens que ensejam os termos "
    violência contra as mulheres" (Mariza CORRÊA, 1983; e Maria Amélia AZEVEDO, 1985; e Maria Filomena GREGORI, 1992) e "
    violência de gênero" (MACHADO, 1998; e SEGATO, 2003), ver Mireya SUÁREZ e Lourdes BANDEIRA, 1999. Para uma historicização das categorias "mulher", "mulheres", "gênero", ver Joana Maria PEDRO, 2005. Para um panorama dos debates do sujeito do feminismo, ver Claudia Lima COSTA, 2002.
  • 6
    HARAWAY, 1995.
  • 7
    João Batista TORRES, 1990 e 1994.
  • 8
    Existe certa padronização dos textos jornalísticos, como se pode observar nos manuais de redação dos grandes jornais, nos cursos para os profissionais que ingressam nas redações, no diário controle da escrita efetuado pela própria maneira de organizar os jornais - demonstrado, por exemplo, por TORRES, 1994, em sua etnografia na redação do jornal
    Folha de S. Paulo. Evidentemente, os tipos de jornalismos são variados, e incluem mesmo aqueles mais críticos, que buscam subverter as próprias formas específicas desse tipo de discurso. A literatura sobre o assunto é extensa, o que parece indicar certa resistência a abordagens unidirecionais. Ciente da complexidade e da especificidade desse discurso, proponho-me, neste texto, apenas uma aproximação parcial às
    páginas policiais dos jornais de um conjunto de notícias selecionadas e catalogadas no Dossiê 1985 do Banco de Dados do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH). Todas as vezes que mencionar os termos "jornais", "discurso jornalístico", "textos de jornal", estarei me referindo às páginas policiais. Os possíveis achados deste texto, portanto, devem ser circunscritos ao universo das páginas policiais - gênero bem particular no quadro mais geral do jornalismo. Para outras abordagens do tema, ver Maria Vitória BENEVIDES, 1983; James CAREY, 1988; Sílvia RAMOS, 1994; Sérgio ADORNO, 1995; Adriana LOPES, 1999; Tânia MONTORO, 1999; Danilo ANGRIMANI SOBRINHO, 1995; e Theóphillos RIFIOTIS, 1999.
  • 9
    Mikhail BAHKTIN, 1997.
  • 10
    DE LAURETIS, 1989.
  • 11
    Para a elaboração deste artigo me apoio especialmente na abordagem de Bakhtin sobre cronotopo (BAKHTIN, 1988). Para análises da obra de Bakhtin, ver Michael HOLQUIST, 1991, Elsa DRUCAROFF, 1991, Cristóvão Tezza, 2003. Diferentemente de Edward SAID, 1996, que relaciona a obra de Bakhtin a modismo intelectual (ele se refere basicamente ao universo norte-americano), ligado diretamente a "discursos domesticados", acredito que este texto acaba por sugerir como Bakhtin pode ser útil num projeto de crítica cultural ou numa
    hermenêutica da suspeita (Paul RICOEUR, 1978).
  • 12
    HOLQUIST, 1991.
  • 13
    TODOROV, 1984.
  • 14
    Luis Eduardo SOARES, 1995b, advertiu sobre a utilização de violência como "palavra-valise", com certa tendência a homogeneizar as observações relativas a fenômenos associadas à violência. Neste texto, seguindo Luis Eduardo SOARES e Leandro Piquet CARNEIRO, 1997, e na tentativa de escapar das ciladas apontadas acima, violência é percebida como ideia-valor, modos de construir e tratar a alteridade.
  • 15
    Utilizei as notícias do ano 1995, perfazendo um total de 50, todas selecionadas e catalogadas no Banco de Dados do MNDH, e petencentes ao que se denomina no jargão jornalístico de "páginas policiais". O Banco de Dados consiste num arquivo de notícias, elaborado por profissionais do MNDH, todas envolvendo casos de diversos tipos de violência e noticiadas em jornais de grande circulação - as notícias são retiradas de dois jornais de grande circulação estadual em cada unidade da Federação. No Banco de Dados, em seu Dossiê 1995, obtive textos que descreviam a violência envolvendo homens de classes populares e altas, e violência contra mulheres, todas dos jornais Correio Braziliense e Jornal de Brasília (doravante CB e JB, respectivamente). Além dos textos, o Banco de Dados agrupa o perfil dos envolvidos a partir das variáveis idade; cor; sexo; ocupação; menção ao uso de drogas; envolvimento em atividades ilícitas e relação entre os envolvidos. Para uma análise detalhada desse Banco de Dados, de sua importância e limitações, ver Valéria G. de BRITO E SILVA, 1998. Como já salientei, utilizando análise de discurso, basicamente a teoria de discurso de Mickail Bakhtin, busquei analisar nessas notícias as relações entre espaço e tempo (cronotopo).
  • 16
    Apesar das discussões sobre os limites do termo, principalmente no que tange a uma visão que homogeneíza e essencializa as "classes populares" e as "classes altas", apresentando-as de forma monolítica, alguns autores/as vêm empregando o termo de forma a evitar tais conotações, como em Cláudia FONSECA e Jurema BRITES, 2006. Ver também Gilberto VELHO e Marcos ALVITO, 1996.
  • 17
    O objetivo não é analisar ou acompanhar os eventos noticiados na íntegra, mas somente captar nos discursos dos jornais as relações entre tempo e espaço, ou seja, os
    motivos cronotópicos, tal como proposto por Backtin. Trata-se de um tipo específico de análise de discurso, que, se por um lado se distancia das abordagens mais focadas em eventos específicos (como em Lourdes BANDEIRA e Tânia Mara ALMEIDA, 1999), por outro lado permite uma visão geral dos
    motivos que perpassam esses textos. Noutras palavras, interessa-se menos pelos eventos (ou pelos diferentes tipos de notícias) do que pelas
    configurações cronotópicas - objetivando-se, como salientado, compreender um pouco mais esse "aparelho jornalístico" ou a
    maneira como se estrutura essa tecnologia de gênero. Para uma discussão sobre as possibilidades e limites da análise cronotópica de Backtin, ver TODOROV, 1984; sobre tecnologia de gênero, ver DE LAURETIS, 1984, 1989, 1994 e 2007.
  • 18
    BAKHTIN, 1988, p. 239.
  • 19
    História e mudança não devem ser confundidas, pois a persistência da estrutura através do tempo é ela própria histórica. Todavia, o texto jornalístico constrói a realidade como se fosse anistórica. Ao criar um personagem que não revê o significado de seus projetos pessoais, o esquema cultural não enfrenta qualquer perigo, não podendo colocar, para utilizar os termos de Marshal SAHLINS, 1987, p. 186, a
    humbris simbólica do homem como "uma grande aposta feita com as realidades empíricas".
  • 20
    BAKHTIN, 1988, p. 224.
  • 21
    Concordo com Luiz Eduardo SOARES, 1995a, p. 26, quando aponta o equívoco da ideia de que a violência é um fenômeno democrático e com distribuição homogênea. Contudo, o que estou sublinhando aqui é que existe uma forma de narrar que vincula abstratamente a violência ao espaço de sua localização.
  • 22
    Ver HALL et al., 1973, p. 226.
  • 23
    Violência simbólica é, segundo Pierre BOURDIEU, 2002, p. 50, "
    a forma de poder que se exerce sobre os corpos, diretamente, e como que por magia, sem qualquer coação física; mas esta magia só atua com o apoio de predisposições colocadas como molas propulsoras, nas zonas mais profundas dos corpos". Na análise de Roger CHARTIER, 1995, violência simbólica, no caso de gênero, seria a interiorização, pelas mulheres, de normas enunciadas pelos discursos masculinos. O historiador adverte, entretanto, que tal interiorização da dominação não exclui afastamentos e manipulações - que vão permitir o deslocamento ou a subversão da relação de dominação. A reapropriação pelo dominado de uma representação imposta se volta, então, contra a ordem dominante que a produziu. Ver também BOURDIEU, 1989; Rita Laura SEGATO, 2003; e Rachel SOIHET, 1989 e 1997.
  • 24
    SEGATO, 2003.
  • 25
    Podemos também pensar em outras dimensões, como a força da mídia e sua interconexão com diversas modalidades de comunicação, sejam jornais impressos, rádio, internet ou televisão - aspecto esse que não poderei desenvolver aqui. Utilizo esse evento somente para destacar a zombaria como elemento do discurso jornalístico, tratando-se, entretanto, do único caso que não consta no Banco de Dados do MNDH. Sobre a zombaria como arma antifeminista, ver SOIHET, 2005.
  • 26
    O discurso jornalístico estabelece - e se pauta por - contratos na interação entre o enunciador e o destinatário. Há uma complexa rede de relações entre jornalista e leitor, o que significa que não podemos imaginar um isolado criador (o jornalista) de sentidos, sem perceber o público também como aquele que marca a formação de significados. Dessa forma, o processo de construção da mulher, ou de "engendramento", não é unidirecional nem homogêneo (DE LAURETIS, 1994, p. 206). As tecnologias de gênero são reapropriadas e desviadas, como demonstram, por exemplo, Marie-Hélène BOURCIER, 2002 e 2005; e Beatriz PRECIADO, 2000, 2002 e 2007. Uma limitação deste trabalho, evidentemente, é que ele se centra em verificar como o gênero é construído por uma tecnologia específica (as páginas policiais dos jornais), mas não como ele é absorvido pelas pessoas, o que implica a não observância das fraturas, das disjunções e da resistência. Ou seja, afirmar que os jornais constroem a Mulher não significa, em hipótese alguma, dizer que não haja resistências e dissonâncias no processo, e reapropriações e desvios dos instrumentos simbólicos e das tecnologias que instituem e efetuam a própria construção da mulher e do feminino (ver SOIHET, 1997).
  • 27
    Penso aqui na utilização e ampliação de Judith BUTLER, 1997, do conceito lacaniano de foraclusão, e, sobretudo, no texto de SEGATO, 2006b, sobre o Édipo brasileiro. Utilizo o conceito de simulacro valendo-me de Jean BAUDRILLARD, 1996.
  • 28
    Inspiro-me, aqui, no livro de Mary Louise PRATT, 1999, e em suas considerações sobre o "observador" (
    seeing-man), e igualmente nas abordagens de Teresa DE LAURETIS, 1989, sobre as tecnologias de gênero.
  • 29
    Ver SEGATO, 2004 e 2006a.
  • 30
    SEGATO, 2003.
  • 31
    A análise sobre violação aqui esboçada objetiva apenas destacar a dimensão expressiva da violência, problematizando as relações entre os meios de comunicação, gênero e violência, e indagando sobre as possibilidades de formas de atuação violentas específicas dessa tecnologia de gênero. Sobre o assunto, ver SEGATO, 2003.
  • 32
    Mireya SUÁREZ, 1995.
  • 33
    TAUSSIG, 1993.
  • 34
    BAUDRILLARD, 1996, p. 156.
  • 35
    SOARES e CARNEIRO, 1997, p. 17.
  • 36
    BAUDRILHARD, 1996.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Dez 2009
    • Data do Fascículo
      Ago 2009

    Histórico

    • Recebido
      Abr 2007
    • Aceito
      Jun 2008
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