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Nosotras: feminismo latino-americano em Paris

Nosotras: latin-american feminism in Paris

Resumos

A efervescência feminista europeia dos anos 1970 influenciou a formação de diversos coletivos feministas formados por mulheres latino-americanas na Europa. Neste artigo pretende-se analisar um dos primeiros grupos desse tipo constituído na França, o Grupo Latino-Americano de Mulheres em Paris. Formado por mulheres de diferentes países da América Latina, uma parte delas exiladas, o grupo realizou suas primeiras reuniões a partir de 1972. Promoveu grupos de reflexão (ou autoconsciência), debates, projeções de filmes e, entre janeiro de 1974 e o segundo trimestre de 1976, publicou o boletim bilíngue (português e espanhol) Nosotras. Pretende-se analisar como foram tematizadas noções como identidade, patriarcado, classe, dentre outras, nas páginas dessa publicação.

feminismo; exílio; América Latina; França


The European feminist ebullience in the 70s influenced the formation of several feminist movements composed of Latin-american women living in Europe. In this manuscript, we intend to analize one of the first such groups in France, the Latin-american women's group in Paris. Composed of women from different Latin-american countries, part of them on exile, this group had its first meeting in 1972. It promoted consciousness-raising groups, debates, film projections, and, from January 1974 to the second trimestre of 1976, published the bilingual (Portuguese and Spanish) bulletin Nosotras. We intend to analize how notions like identity, patriarchy, class, among others were approached on this publication.

Feminism; Exil; Latin America; France


ARTIGOS

Nosotras: feminismo latino-americano em Paris

Nosotras: Latin-American Feminism in Paris

Maira Abreu

Universidade Estadual de Campinas

RESUMO

A efervescência feminista europeia dos anos 1970 influenciou a formação de diversos coletivos feministas formados por mulheres latino-americanas na Europa. Neste artigo pretende-se analisar um dos primeiros grupos desse tipo constituído na França, o Grupo Latino-Americano de Mulheres em Paris. Formado por mulheres de diferentes países da América Latina, uma parte delas exiladas, o grupo realizou suas primeiras reuniões a partir de 1972. Promoveu grupos de reflexão (ou autoconsciência), debates, projeções de filmes e, entre janeiro de 1974 e o segundo trimestre de 1976, publicou o boletim bilíngue (português e espanhol) Nosotras. Pretende-se analisar como foram tematizadas noções como identidade, patriarcado, classe, dentre outras, nas páginas dessa publicação.

Palavras-chave: feminismo; exílio; América Latina; França.

ABSTRACT

The European feminist ebullience in the 70s influenced the formation of several feminist movements composed of Latin-american women living in Europe. In this manuscript, we intend to analize one of the first such groups in France, the Latin-american women's group in Paris. Composed of women from different Latin-american countries, part of them on exile, this group had its first meeting in 1972. It promoted consciousness-raising groups, debates, film projections, and, from January 1974 to the second trimestre of 1976, published the bilingual (Portuguese and Spanish) bulletin Nosotras. We intend to analize how notions like identity, patriarchy, class, among others were approached on this publication.

Key Words: Feminism; Exil; Latin America; France.

Os anos 1960-1970 são palco de uma intensa efervescência feminista que tem início nos EUA, a partir da segunda metade da década de 1960, mas que, pouco depois, adquire uma abrangência bem mais significativa, alcançando a maioria dos países europeus e chegando posteriormente a outros continentes.1 1 Este artigo é uma síntese do Capítulo 3 de minha dissertação, defendida na Unicamp em 2010, intitulada Feminismo no exílio: o Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris e o Grupo Latino-Americano de Mulheres em Paris, sob a orientação da Prof.a Dr.a Angela Maria Carneiro Araújo. Essa pesquisa foi realizada com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Agradeço a leitura atenciosa e sugestões de Helena Hirata. Agradeço também outras pessoas que leram diferentes versões deste texto, entre elas Marcilio Lucas, Danielle Tega e Rafael Afonso da Silva. Essa vaga feminista, que ficou conhecida como 'segunda onda', é extremamente diversa e engloba uma multiplicidade de grupos, propostas e teorias feministas. Malgrado sua diversidade, encontramos frequentemente descrições que nos dão uma ideia de homogeneidade, de pouca variedade. Segundo certa 'narrativa' bastante difundida, o feminismo dos anos 1970 é associado a um feminismo essencialista, cego às diferenças e defensor de uma ideia a-histórica de patriarcado. Críticas ao sujeito do feminismo, particularmente provenientes de mulheres negras e lésbicas, apareceriam somente nos anos 1980, e finalmente nos anos 1990 a crítica pós-moderna tornaria possível a superação do essencialismo.2 2 Clare HEMMINGS, 2009.

Esse tipo de leitura obscurece a diversidade de um movimento multifacetado e marcado por polêmicas, clivagens e cisões. Analisar as múltiplas discussões/tensões presentes nesse movimento exige um esforço analítico de complexificação dessa 'narrativa do progresso'3 3 HEMMINGS, 2009, p. 229. – o que vem sendo feito por diversas autoras4 4 Ver, por exemplo, HEMMINGS, 2009; e Barbara CROW, 2000. – que tenha como escopo não somente obras eleitas como 'canônicas' do feminismo, mas que englobe publicações de grupos, panfletos, materiais de congressos, além das narrativas de suas militantes. Além disso, não se pode apartar essas teorias do contexto no qual foram elaboradas, sob o risco de torná-las ilegíveis ou mesmo simplistas.

Neste artigo pretendemos dar uma contribuição nesse sentido, analisando como um grupo feminista, o Grupo Latino-Americano de Mulheres em Paris (1972-1976), tematizou questões como identidade, patriarcado, classe, dentre outras, nas páginas de seu boletim Nosotras, publicado entre janeiro de 1974 e meados de 1976.

Grupo Latino-Americano de Mulheres em Paris

A efervescência feminista dos anos 1970 na Europa influenciou a formação de diversos coletivos feministas formados por mulheres de diferentes países latino-americanos em países europeus. Esses grupos – cuja duração e dimensão foram bastante diversas – compartilhavam, em maior ou menor medida, ideias feministas em voga naquele contexto, tais como politização da vida cotidiana, autonomia, novas formas de organização etc. Um dos primeiros grupos desse tipo constituídos na França foi o Grupo Latino-Americano de Mulheres, formado por mulheres de diferentes países da América Latina, uma parte delas exiladas,5 5 Neste trabalho refiro-me a exílio num sentido amplo, englobando a saída de pessoas do Brasil por banimento, isto é, militantes libertados em troca de reféns, e em consequência direta ou indireta de perseguição, pressão ou insatisfação política, incluindo autoexílios que, em alguns casos, se deram sob a forma "camuflada" de cursos de graduação, pós-graduação ou simplesmente viagem (Anette GOLDBERG, 1987). que realizou suas primeiras reuniões a partir do ano de 1972. Esse promoveu grupos de reflexão (ou autoconsciência), debates, projeções de filmes e, entre janeiro de 1974 e o segundo trimestre de 1976, publicou o boletim bilíngue (português e espanhol) Nosotras, totalizando 17 exemplares. Nesses foram publicados, além de textos escritos pelas próprias integrantes do grupo, traduções e/ou reprodução de textos já publicados e contribuições de leitoras e de grupos feministas de diferentes países. Participaram da confecção do Boletim mulheres de diferentes nacionalidades, entre elas podemos citar Danda Prado, Mariza Figueiredo, Lucia Tosí, Naty Guadilla, Clélia Pisa, Giovana Machado, Mireya Gutierrez, dentre outras.

É importante ressaltar que Nosotras surge no início de um período de multiplicação da imprensa feminista na França. Nesse mesmo ano (1974) surgiriam outros periódicos de diferentes tendências do movimento, tais como Femmes travailleuses en lutte, Les Pétroleuses e Le Quotidien des femmes.6 6 Para mais informações, ver Liliane KANDEL, 1980; e Martine LAROCHE e Michèle LARROUY, 2009. Mas, por outro lado, poucos eram os grupos feministas existentes na América Latina. O período de publicação do Boletim coincide com um momento no qual vários grupos surgem nessa região. Diante disso, o Boletim, inicialmente pensado sobretudo como órgão de socialização de discussões do grupo ou divulgação de opiniões – como sugerem no primeiro Boletim –, rapidamente passa a se propor como um "agente motivador de luchas reivindicatorias sugiriendo temas de debate y proponiendo formas de acción"7 7 EDITORIAL. Nosotras, Paris, n. 16/17/18, abr./maio/jun. 1975. Os textos publicados no Boletim não eram necessariamente assinados e, quando consta o nome das autoras, na maioria dos casos, não consta o sobrenome. Essa era uma prática corrente no Mouvement de libération des femmes (MLF). Para mais informações, consultar Françoise PICQ, 2011, p. 494 (item "Sur l'anony-mat"). Por essa razão, as citações serão feitas com as informações de que dispomos. Além disso, todas as citações são transcrições, mantive a língua do original, mesmo quando há mistura de línguas. e um elo que pudesse ligar os diferentes movimentos que começavam a surgir na região. Nosotras teve, em alguma medida, êxito na sua proposta. Diversos foram os grupos que se comunicaram com o Grupo Latino-Americano, muitos dos quais foram divulgados nas páginas do Boletim.

Deve-se ressaltar, como se verá, que não se tratava de uma publicação com uma linha editorial. Local de debates, Nosotras acolheu importantes polêmicas do período e publicou pontos de vista divergentes e até mesmo antagônicos.

Cabe ainda mencionar que os primeiros números foram produzidos de forma 'artesanal' – os textos eram datilografados, mimeografados e depois grampeados. Todo o processo de produção era realizado pelas próprias militantes, como a maioria das publicações militantes do período. O Boletim não era financiado por nenhuma organização e sua sobrevivência dependia de sua venda, que era realizada em algumas livrarias francesas, e de assinaturas, que permitiam sua divulgação em diferentes países da América Latina.


Feminismo latino-americano?

"Todo se pasó como si fuéramos una pelota de nieve: dos o tres latinoamericanas escribiendo sus tesis de doctorado sobre la mujer. Deparamonos por la primera vez con las preguntas porque piensan esto las femenistas francesas? que lo que quiere decir el femenismo? El femenismo es un movimiento que tendria sentido solamente en un pais industrializado? Que hay de común o de distinto entre la mujer mexicana, venezolana, argentina, brasileña, francesa?". 8 8 EDITORIAL. Nosotras, Paris, n. 1, jan. 1974.

Nesse trecho, publicado no primeiro Boletim, as militantes rememoram seus questionamentos iniciais. Dúvidas sobre o que seria o feminismo, sobre a validade de suas propostas, particularmente em países subdesenvolvidos, além de questionamentos sobre a possibilidade de se articular uma luta a partir de 'algo comum', foram questões recorrentes para muitas mulheres que tomaram contato com o feminismo nesse contexto.

O Grupo Latino-Americano de Mulheres surge profundamente influenciado pelas mobilizações feministas francesas. Mas, apesar do reconhecimento do papel do Mouvement de libération des femmes (MLF), a relação do grupo com esse não se configurou como uma assimilação acrítica e descontextualizada. Ao contrário, o tema da 'especificidade' latino-americana se impôs desde o princípio. Assim, o 'nosotras' do qual falava o grupo era um 'nós mulheres', mas tratava-se principalmente de um 'nós mulheres latino-americanas':

a realidade de cada país, marca profundamente as táticas de uma luta política. E o feminismo é político. Algumas tradições profundas de nossos povos, como a religião católica e o "machismo", dão um caráter específico às reivindicações que só poderão ser formuladas, teórica e concretamente pelas feministas de cada país latino-americano.9 9 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.

A própria existência do grupo era justificada por essa especificidade, como lembra Naty Guadilla:

Atraídas por estos movimientos nuevos, las mujeres latinoamericanas se implicaban y participaban en los grupos de conciencia o en las grandes asambleas del movimiento de mujeres francés. Después nació la necesidad de analizar la especificidad de la situación de las mujeres latinoamericanas y se constituyó el Grupo LatinoAmericano de Mujeres con el objetivo de comparar y buscar las diferencias entre las mujeres de diferentes países del mundo.10 10 Naty GUADILLA, 1980, p. 11. O texto publicado no boletim Herejias é assinado por "Naty", mas, através da entrevista realizada com Naty Garcia Guadilla, sabemos que a autoria é dela.

Ao longo dos seus dois anos de existência, diversos foram os textos publicados que buscavam analisar diferentes aspectos da realidade da mulher latino-americana11 11 Eis alguns exemplos: "Algumas estadísticas sobre La mujer venezolana" (n. 1), "Venezuela: la madre marginada" (n. 2), "Mujer e escuela en Venezuela" (n. 3), "Del matrimonio: critica dela código civil equatroriano" (n. 7), "As verdadeiras razões do incentivo à mão-de-obra feminina no Brasil" (n. 7), "La mujer en Bolívia" (n. 8/9/10), "La condición de la mujer en las sociedades indigenas latinoamericanas" (n. 11), "El comportamiento sexual des venezolanos" (n. 12), "La participación de la mujer latinoamericana en la actividad economica" (n. 16/17/18), "La femme de couleur en Amérique Latine" (n. 16/17/18), "Análise geral e conclusões finais do seminário pesquisa sobre o papel e o comportamento da mulher brasileira" (n. 19/20) e "Bolívia: analisis de la situacion actual y general de la mujer" (n. 23/24). e sua particularidade. No Boletim n. 5, por exemplo, elas criticam as ideias de Herbert Marcuse desse ponto de vista. As ideias do autor sobre o movimento feminista, afirmavam, poderiam ter validade para a sociedade norte-americana, mas não teriam "aplicação no marco da sociedade latino-americana".12 12 Diana e Maria Elena. "Herbert Marcuse en Paris...". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974. A situação da mulher latino-americana seria "específica" e exigiria métodos de lutas também "específicos".

A elaboração de uma teoria feminista latino-americana, enfatizavam, deveria ser "uma tarefa dos grupos feministas no nosso continente",13 13 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974. pois, "assim como cabe à mulher, e não ao homem, a determinação de seu próprio combate, cabe às mulheres de cada país a determinação do caráter específico/geral de sua luta".14 14 Vera. "Novos lançamentos: Feminisme et revolution...". Nosotras, Paris, n. 2, fev. 1974. Dadas as "condiciones historicas y culturales en America Latina", a "estrategia y las tácticas de acción" para superar o machismo seriam muito diferentes da mulher europeia e norte-americana.15 15 "Algunos aspectos sobre o machismo em America Latina". Nosotras, Paris, n. 7, jul. 1974. Dessa forma, o grupo posicionava-se contra a importação acrítica de ideias, pelo fato de essa desconsiderar as particularidades regionais; e acrescentava que "No podemos separar a la mujer de la realidad nacional en donde se encuentra".16 16 "Dos experiencias del grupo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.

A 'condição' de mulheres latino-americanas descentrava, em certa medida, a ideia de um 'nós' homogêneo. Não era possível separar os 'múltiplos' pertencimentos por parte daquelas que os viviam. Assim, a estratégia de luta deveria levar em consideração essa situação. Pensar essas múltiplas formas de opressão procurando articulá-las foi certamente um debate no seio de diversos grupos feministas nesse contexto e as respostas a essas questões não eram fáceis.17 17 O conceito de intersecionalidade, dentre outros, é tributário, em larga medida, de questões postas no seio do movimento feminista. Ver, entre outros, Sirma BILGE, 2010.

No Editorial do Boletim n. 13/14 elas defendem que o feminismo teria um importante papel na superação das desigualdades e do 'subdesenvolvimento' na América Latina e que a batalha por uma sociedade baseada na 'verdadeira igualdade' seria indissociável de uma luta pela libertação da mulher:

Estamos convencidas de que la lucha que emprendamos conjuntamente para nuestra liberación es la que permitirá a la imensa mayoría de nuestras poblaciones de acceder a otra forma de relacionamiento humano que estará basado en la verdadera igualdad y en la confraternidad humana.18 18 EDITORIAL . Nosotras, Paris, n. 13/14, jan./fev. 1975.

No texto de título evocador, "Diferencia de lucha entre latinoamericanas y europeas", as militantes pontuam diferenças em relação a essas duas realidades e fazem uma aproximação entre a realidade da mulher latino-americana e vietnamita:

La mujer latinoamericana, al igual que la mujer Vietnamita, tiene la imperiosa necesidad de emprender dos luchas: una, contra la opresión extranjera representada a nivel nacional por un sistema de injusticia que la domina al igual que el hombre como individuo social; otra, contra la mentalidad machista tradicional – que la mantiene sujeta al poder de decision del hombre.19 19 EDITORIAL . Nosotras, Paris, n. 13/14, jan./fev. 1975.

Deve-se ressaltar que a especificidade latino-americana ressaltada é menos uma questão étnica/'racial' que uma diferença socioeconômica. Fala-se de realidade nacional, de imperialismo, de diferentes realidades socioeconômicas, de subdesenvolvimento etc.

Mas, para além dessas diferenças, elas afirmam que "os dilemas e contradições atuais a respeito da emancipação das mulheres são idênticos, em muitos aspectos".20 20 NOSOTRAS. Paris, n. 1, jan. 1974. Essa identidade de "dilemas e contradições" é que justificaria a perspectiva de que o "movimento feminista debe abarcar a las mujeres en su conjunto, porque no se poderá liberar a una parte de ellas sin liberarlas a todas".21 21 NOSOTRAS. Paris, n. 13/14, jan./fev. 1974.

A existência de outras formas de opressão não colocava, portanto, em xeque a ideia de um "nós mulheres". Voltaremos a essa questão no último item. Antes disso, é importante analisar como se construía essa identidade. Um dos instrumentos utilizados para a construção dessa foram os grupos de autoconsciência ou reflexão, sobre os quais cabem alguns comentários.

Os grupos de autoconsciência ou reflexão, conhecidos como consciousnessraising groups nos EUA, eram pequenos grupos que partiam das experiências pessoais e cotidianas das mulheres com o objetivo de forjar uma identidade comum. Tratava-se de um elemento fundamental no processo de politização do privado e na criação de uma identidade que superasse as experiências individuais. Assim, as vivências individuais poderiam ser percebidas como parte de uma condição social e histórica comum. Tratava-se, portanto, também de um momento de formulação teórica. Num texto considerado como um dos fundadores da ideia de grupos de autoconsciência, Kathie Sarachild afirmava: "Nossos sentimentos nos conduzirão a nossa teoria, nossa teoria à nossa ação, nossos sentimentos nesta ação a uma nova teoria e em seguida a uma nova ação".22 22 Kathie SARACHILD, 1970, p. 66.

As reuniões de grupos de autoconsciência ou reflexão constituíram-se numa importante atividade do Grupo Latino-Americano. Mariza Figueiredo e Danda Prado rememoram essas atividades:

As reuniões eram fáceis, porque trabalhávamos com grupos de consciência, com a visão de que política não é só o que você discute, mas também a vida pessoal. Então começamos a conversa [...] com a seguinte pergunta: qual foi o momento da sua vida que você percebeu que existiam homens e mulheres? E aí cada uma contou. Essas reuniões aconteciam com mais ou menos 15 mulheres.23 23 Entrevista com Danda Prado citada por Elisabeth CARDOSO, 2004, p. 77.

Você escolhia um tema para aquele dia. Tinha mulheres de quinze até mulheres de setenta anos. Um exemplo, no nosso grupo às vezes você tinham moças de 18-20 anos como você tinha senhoras já de cinqüenta e poucos que era o caso da Lucia Tosí, que acho que era acho a mais velha do grupo, ou Norma Benguell, que era uma pessoa bem liberal e tal existencialmente falando. [...] Tinha diferentes idades, tinha diferentes classes culturais, com formação universitária ou não, tinha diferentes faixas etárias [...]. Então você via que no fundo no fundo tudo era sempre uma mesma e única coisa. Isso no movimento feminista francês então era gritante. Porque a diversidade era muito maior, a quantidade de gente era muito maior.24 24 Entrevista com Mariza Figueiredo.

Na descrição de Mariza Figueiredo, destaca-se a ideia de que os grupos de autoconsciência promoveriam a percepção de uma experiência comum compartilhada pelas mulheres. Independentemente das particularidades, para além das divisões de classe, diferenças culturais, etárias etc., "no fundo no fundo tudo era sempre uma mesma e única coisa".

O pressuposto dos grupos de autoconsciência era "algo comum" que permitia gerar uma identidade. Essa ideia é bastante presente nas páginas do Boletim. Mas como essa unidade formada por nosotras era visada no Boletim?

A descoberta do conjunto nosotras aparecia, frequentemente, sob a forma de uma referência negativa. Nós, esse 'algo comum', aparecia traduzido no reconhecimento de uma similaridade que se expressava na dor, no mal-estar. Maricota da Silva faz o seguinte comentário a respeito:

O que interessava fundamentalmente era ver como nós éramos parecidas; era a gente ver como a nossa dor, enfim [...] como o nosso inconsciente tinha sido forjado da mesma maneira.25 25 Maricota da SILVA citada por Albertina COSTA et al., 1980, p. 39.

Essa dor que há em mim, só em mim, finalmente é uma dor absolutamente de todas nós.26 26 SILVA citada por COSTA et al., 1980, p. 40.

O modelo de feminilidade imposto seria também parte desse 'algo comum' compartilhado. Para Lucia Tosí, a especificidade seria uma consequência de uma identificação com o estereótipo sexual, que seria, por sua vez, resultado de um condicionamento.27 27 Lucia Tosí. "Algunas reflexiones a proposito del articulo de Françoise Collin...". Nosotras, Paris , n. 23/24, nov./dez. 1975. Esse tipo de posição aparece também em outros textos:

No começo: um mal-estar. Perguntas sem respostas. O isolamento: cada uma no seu canto, carregando sua própria insatisfação. Essa feminilidade que tanto apregoam: um olhar carinhoso, a frivolidade, o sensualismo... ESSA NÃO SOU EU. Será que passarei toda a vida em busca de uma resposta? E se não houver resposta?

No entanto, um dia a gente percebe que à volta, ao lado da gente mesmo há outras com o mesmo mal-estar, as mesmas questões, a mesma busca. Ah! Então não sou a única? Ela também.28 28 "Três Mulheres, três atrizes semi-profissionais e a condição feminina", texto escrito por Wadad Alamedine, Catherine Lemaire e Evelyne Perard, autoras e atrizes da peça "Histoires de bonnes femmes", e distribuído na entrada do teatro. NOSOTRAS. Paris, n. 8/9/10, ago./set./out. 1974.

Mas a percepção dessa opressão compartilhada era, no entanto, apenas um momento do processo. Essa opressão, afirmavam, precisava ser qualificada em termos teóricos para fundamentar uma prática adequada. Num dos Boletins, faz-se referência à importância desse processo que, da identidade experiencial, conduz à generalização teórica, possibilitando a formação de uma 'consciência política'. Não se trata aqui da ideia de uma consciência que deveria ser trazida de fora, mas que emergiria a partir da própria experiência:

Ser capaz de identificar no outro seus próprios problemas, sair do isolamento, fazer a generalização e poder teorizar, significam passos decisivos na aquisição de uma consciência política capaz de definir as transformações necessárias e de assumir o momento histórico para realizá-las.29 29 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris , n. 5, maio 1974.

A consciência deveria ir até a apreensão da existência de um sistema a ser combatido e do reconhecimento da necessidade de oposição a essa opressão que estaria "na base de toda nossa estrutura social".30 30 EDITORIAL . Nosotras, Paris, n. 13/14, jan./fev. 1975.

Havia o sentimento de que, a partir dessa percepção, as mulheres poderiam sair do isolamento e se reconhecerem nesse 'nós'. O vocativo "hermanas", utilizado em diversos momentos no Boletim, é bastante significativo desse sentimento. Embora o termo "irmandade" seja pouco utilizado, há menções a "sororidade", que faz referência a "soeur", isto é, "irmã", em francês. Os pedidos de ajuda financeira para o jornal eram, por exemplo, chamados de "bonos de sororidade". Essa metáfora foi largamente utilizada pelo movimento feminista do período e denota a percepção não só do sentimento de se compartilhar uma experiência comum, mas também da possiblidade de se convertê-la em solidariedade, numa irmandade, numa sororidade: "ÀS IRMÃS DE PORTUGAL, DO MUNDO MUSULMANO, DA AUSTRÁLIA, DA INDOCHINA E DE ISRAEL, ÀS IRMÃS EUROPÉIAS E NORTE-AMERICANAS, nossa solidariedade internacional".31 31 "Solidariedade às portuguesas". Nosotras, Paris, n. 13/14, jan./fev. 1975.

As mulheres não precisavam mais vivenciar sozinhas suas angústias de viver numa sociedade machista. Coletivamente poderiam criar "uma nova perspectiva", tal como descreve Mariza Figueiredo comentando o filme Wanda:

Barbara Loden é feminista? Não sei. Não creio.

Ela propõe soluções porque a realidade que ela descreve não tem solução, é o inevitável, o óbvio, o de sempre.

Uma mulher só: sem emprego, sem dinheiro, sem estudos, sem homem, sendo usada por todos os homens que a consideram à disposição deles. O que é de um é de todos.

No entanto hoje, como feminista eu sei que na situação dela, uma mulher poderia procurar um grupo de mulheres e aí perguntar: Mas, o que fazer? Aonde ir? E, juntas, tentarão criar uma nova perspectiva.32 32 Mariza Figueiredo. "Wanda: crítica de um filme". Nosotras, Paris , n. 15, mar. 1975.

Mas, no Boletim, há ressalvas de que a percepção de uma opressão comum não geraria automaticamente uma solidariedade entre as mulheres. Essa solidariedade, segundo Ana Tegui, é fruto de um processo que avança a contrapelo dos próprios condicionamentos sociais a que as mulheres estão submetidas ("somos condicionadas pela sociedade para sermos inimigas", diz o texto abaixo) e exige uma complexa articulação de consensos e uma superação de rivalidades:

Es que mucho más difícil que luchar contra el sistema (tarea de verdaderas combatientes), es unirnos las mujeres y ponernos de acuerdo sin atacarnos unas a otras. Me parece a mi que no podremos llegar muy lejos mientras no superemos esta etapa que tendría que ser La primera a recorrer, aunque también hay que tener en cuenta que estamos condicionadas por La Sociedad para que seamos enemigas.33 33 Ana Tegui. "Testimonio: soy una mujer más". Nosotras, Paris, n. 7, jul. 1974.

A construção de uma identidade "mulheres" foi um elemento fundamental para o feminismo da 'segunda onda'. As diversas publicações com os nomes 'Nós Mulheres', 'Nosotras', 'Noidonne', como lembra Joana Pedro, são emblemáticas desse momento. Sobre essa questão, cabe aqui uma pequena digressão.

Para algumas feministas, as mulheres seriam uma 'classe' oprimida cuja condição seria comparável à do proletariado. Outras, inspiradas nos movimentos anticoloniais e antirracistas, preferiam a ideia de 'casta'. Outras ainda evocavam a ideia de diferença sexual para explicar os traços comuns da feminilidade.34 34 Yasmine ERGAS, 1990, p. 595. Enfatizaram-se, muitas vezes, nesse contexto, mais as semelhanças que as diferenças. Mas, por outro lado, a explicação para a natureza das características comuns às mulheres não foi unânime e deu origem a diferentes teorizações.

Deve-se ressaltar que a emergência e a importância da categoria "mulheres" devem ser compreendidas no contexto no qual foi elaborada. Consideramos que foi fundamentalmente numa conjuntura na qual se negava a especificidade da "opressão feminina" que essa categoria ganhou preeminência. Um dos fatores fundamentais foi o embate com largos setores da "esquerda" que insistiam em tudo subordinar a um sistema de classe. Nos EUA, como afirma Echols,35 35 Alice ECHOLS, 1993. a tendência do feminismo radical em subordinar classe e raça ao gênero e de falar hiperbolicamente sobre um sisterhood universal foi, em larga medida, uma reação às análises da esquerda que privilegiavam classe e raça. Na França, para Eléonore Lépinard, a necessidade para o movimento feminista de se emancipar de uma extrema esquerda desejosa de colocá-lo sob sua tutela pode bem explicar por que a categoria "mulheres" tenha permanecido um sujeito não questionado tanto na teoria como na ação feminista.36 36 Eléonore LÉPINARD, 2005, p. 114. As editoras da revista Questions féministes faziam também, em 1977, uma autocrítica a essa postura: "ocupadas em resistir ao chapeamento das análises de classe [...] nós privilegiamos os pontos comuns entre as mulheres".37 37 QUESTIONS FEMINISTES, 1977, p. 11. Mas não se pode esquecer que a ideia de uma categoria "mulheres" produzida por um sistema de dominação autônomo foi fundamental para a autonomização do movimento feminista.

Como veremos no próximo item, esses "pontos comuns" não remetiam necessariamente a uma condição biológica. Essa questão foi objeto de controvérsias no seio do MLF e também em Nosotras.

Diferencialismo x universalismo

A discussão sobre a 'diferença sexual' foi uma importante polêmica dentro do MLF. Grosso modo, podemos dizer que havia, dentro do movimento, duas formas de se conceber essa diferença. Por um lado, um feminismo 'diferencialista' para o qual existiria uma diferença essencial e ontológica entre homens e mulheres e que buscava uma valorização do 'feminino'; por outro lado, um feminismo chamado 'universalista' que considerava a existência de homens e mulheres como um fenômeno social e que buscava denunciar o caráter opressivo dessa construção.38 38 PICQ, 1997, p. 222. Sobre essa discussão, ver também KANDEL, 2000. Nos textos de Nosotras há diversos elementos dessa polêmica.

Encontramos em Nosotras analogias da opressão feminina seja com a questão da 'raça', seja com a questão de classe. Essas analogias foram muito utilizadas pelo movimento feminista e constituíam uma tentativa de desnaturalizar a opressão feminina. Na definição de 'sexismo', veiculada no Boletim n. 5, há uma clara analogia entre 'sexismo' e racismo:

SEXISTA é a palavra equivalente à racista, que atribui a um indivíduo (por causa de suas características específicas, raciais ou sexuais) um comportamento pré-estabelecido e irreversível. Assim, o negro "é violento", o judeu é "avaro", o homem é "racional", a mulher é "intuitiva e emocional".39 39 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.

Constata-se que as militantes recusam a atribuição aos indivíduos, a partir de características físicas, sexuais ou raciais, de um comportamento inato. O essencialismo biológico é considerado um apanágio do sexismo e do racismo e, por isso, rejeitado.

Embora seja essa a posição que pareça predominar no Boletim, no número 21/22 de Nosotras encontramos uma perspectiva distinta. No Editorial desse número, elas abordam a dificuldade de conceituar feminismo e afirmam que o objetivo do feminismo seria descobrir a 'essencia mesma do feminino'. A tarefa do movimento feminista não poderia se limitar à reivindicação de direitos iguais, mas deveria incluir a reivindicação de uma "nueva estructuración de la sociedad que permita la afirmación de la especificidad femenina y la realización de una verdadera comunidad 'humana'".40 40 EDITORIAL . Nosotras, Paris, n. 21/22, set./out. 1975.

Dentro dessa perspectiva encontra-se o texto de Françoise Collin, "Nuevo feminismo, nueva sociedad o, el advenimiento de outra", publicado nesse mesmo número e o texto de Julia Kristeva, "Ese sexo que es porlo menos dos", publicado originalmente em Les cahiers du GRIF (1974) e traduzido para o espanhol por Lucia Tosí no número 21/22.

No número 23/24 divergências quanto a esse ponto são exemplificadas pelo texto de Lucia Tosí, que se posiciona contra a busca de uma "especificidade feminina" proposta por Collin e defende que o papel do movimento feminista é justamente lutar pelo contrário:

En que consiste entonces la tan mentada especificidad femenina? Quiza únicamente en la capacidad potencial de anidar un óvulo fecundado y llevarlo a término. El resto pasa a ser creación social y en última instancia creación masculina. El movimiento feminista no debe buscar la especificidad feminina sino negarla y negar también toda otra especificidad. Nuestra especificidad presente, que no es sin una identificación con el estereotipo sexual es un resultado de un condicionamiento. Debemos recharzala y solo así nos sera posible encontrar nuestra verdadera especificidad en tanto que personas.41 41 Lucia Tosí. "Algunas reflexiones a proposito del articulo de Françoise Collin...". Nosotras, Paris , n. 23/24, nov./dez. 1975, grifos nossos.

Esse trecho é bastante significativo de determinada concepção de feminismo. Aqui Lucia Tosí se posiciona claramente dentro de uma perspectiva 'universalista' que, em contraposição à ideia de valorização da especificidade feminina, denunciava essa como uma construção social a ser combatida.42 42 PICQ, 1997. A 'especificidade feminina' seria uma 'construção social', 'criação masculina' que deveria ser superada.

Ainda em diálogo com essa perspectiva antiessencialista, cabe mencionar também a definição de mulheres como 'classe' e uma definição 'política' de lesbianismo (sic) que aparece num dos textos publicados no Boletim. Trata-se de um texto de Mariza Figueiredo comentando a publicação do livro de Ti Grace Atkinson, Odyssée d'une amazone, em 1975 pela editora Des femmes. Mariza Figueiredo centra-se na discussão sobre a definição de 'lésbica'. O lesbianismo (sic) seria o engajamento voluntário de uma mulher com outros membros da sua classe. Seria uma parcela dos oprimidos que não quer responder à sua função política na sociedade, a saber, a reprodução.

Chama-se lesbianismo o engajamento voluntário e total de uma mulher junto aos outros membros de sua "classe" (a 'classe" das mulheres, conseqüência da existência de uma 'classe' de homens). É este engajamento absoluto e, indiferente à toda consideração de ordem pessoal, que confere um significado político ao conceito de lesbianismo.43 43 NOSOTRAS. Paris, n. 25/26, 1. e 2. trim. 1976.

Cabe ressaltar que o texto de Mariza Figueiredo não foi o primeiro a abordar questões relacionadas à lesbianidade em Nosotras. A questão é abordada pela primeira vez no Boletim n. 5, que publica "De verdad, hay que curar al 85% de la mitad del cielo?", versão em espanhol de um artigo veiculado no jornal Libération. Naumi Vasconcelos faz também breves menções ao tema em "Feminismo x machismo".44 Sabemos que havia lésbicas no grupo e que não escondiam completamente essa orientação. Sabemos também que a questão não era bem vista pela comunidade de brasileiros na França e que foi usada, em alguns casos, como forma de deslegitimar o grupo. Cabe sublinhar o pioneirismo de Nosotras em abordar a questão, mesmo que timidamente.45 45 A publicação, em 1979, em Paris do texto de Herbert Daniel, "Homossexual: defesa dos interesses?", é apontada como o primeiro documento a discutir a questão da homossexualidade entre as esquerdas brasileiras. Antes dessa publicação, ocorreu um debate promovido pelo grupo de Cultura do CBA (Comitê Brasil Anistia), que gerou controvérsias e, segundo Denise Rollemberg, transformou-se num dos grandes marcos do exílio brasileiro na França. Mas tudo isso ocorreria cinco anos depois de o boletim Nosotras começar a tematizar a questão (Denise ROLLEMBERG, 1999).

Patriarcado e capitalismo

"Muchacha estudiante

que lo cuestionas todo,

las relaciones del obrero con el patrón,

las relaciones del alumno con el maestro,

has pensado también en cuestiona las relaciones del hombre y la mujer ?

Muchacha estudiante

Que participas en la revolución,

no te engañes una vez más,

no te limites a seguir a los otros:

1i define tus proprias reivindicaciones."46 46 Anne e Jaqueline. "De un grupo a outro". Nosotras, Paris, n. 4, abr. 1974. Esse texto constitui uma versão de uma pichação feita em 1968 em Paris. Ver PICQ, 2011, p. 14.

A discussão sobre patriarcado e capitalismo foi recorrente no movimento feminista francês. Uma das principais questões postas nesse debate era se haveria ou não autonomia (e em que medida) entre esses dois 'sistemas'. Essa questão foi alvo de intensos debates e foi um ponto a partir do qual se estruturaram clivagens no movimento. É a partir de divergências em relação a essa questão que se estabelece uma categorização do movimento feminista, largamente utilizada, em duas correntes: feminismo socialista e feminismo radical. Mas deve-se ressaltar, há menos uma oposição e mais um continuum entre aquelas análises que consideram a subordinação feminina uma consequência do capitalismo e aquelas que a veem como uma consequência do patriarcado ou de uma forma de dominação masculina sistemática.47 47 Stevi JACKSON , 2001. E os grupos não necessariamente se posicionavam em uma ou outra corrente de forma estanque.

Segundo Naty Guadilla, os problemas políticos da articulação entre luta das mulheres e luta de classes foram analisados em diversas oportunidades no Grupo Latino-Americano: "las luchas de mujeres dividen la lucha de clases? Es ésta segunda lucha prioritaria en nuestros países? Quién determina las prioridades?".48 48 GUADILLA, 1980, p. 12. Podemos identificar diversas referências ao tema no Boletim. Alguns trechos de atas de reuniões citados no primeiro número mostram que desde o início elas se colocavam questões como: podemos falar de problemas das mulheres independentemente das classes sociais? Podemos separar o problema da "discriminação sexual da exploração de classe?".49 49 EDITORIAL . Nosotras, Paris, n. 1, jan. 1974.

No Boletim n. 5, num texto intitulado "Feminismo" e assinado por Danda e Mariza, encontramos uma das primeiras tentativas concretas de definir feminismo no Boletim. Uma primeira versão desse texto, assinado por "um grupo de feministas latino-americanas em Paris" (datado de março de 1974), foi publicada em La Libération de la Mujer, uma coletânea de textos feministas organizada por Mariza Figueiredo.50 50 FIGUEIREDO, 1974. Nesse texto, a questão "luta das mulheres e luta de classes" é o pano de fundo:

Qual é a luta principal? Apesar desta pergunta já ter sido respondida exaustivamente por várias autoras feministas, ela continua a ser a "eterna" questão levantada por todos aqueles que têm alguma preocupação política.

A realidade é que, todos os argumentos, objetivos ou não, têm sempre a mesma finalidade: provar que o feminismo não passa de "um desabafo das mal-amadas" ou de "uma luta divisionista e sectária".51

A acusação de que o feminismo seria 'divisionista' estava presente no discurso de largos setores da esquerda. E as feministas tiveram que reagir frequentemente a esse ponto de vista. Predominava entre partidos de esquerda a tradicional visão de que todos os esforços deveriam ser canalizados para a revolução socialista e que a 'questão feminina' revolver-se-ia num contexto pós-revolucionário.

Nas páginas do Boletim encontramos, em diversos momentos, críticas à diluição da opressão feminina nas relações de classe. O marxismo é criticado por não haver compreendido a especificidade da opressão da mulher e até mesmo por ter ofuscado o deslinde dessa especificidade:

Sem dúvida alguma o marxismo deu uma grande contribuição na compreensão da origem das injustiças sociais decorrentes da divisão da sociedade na classe detentora dos meios de produção e na classe que vende sua força de trabalho. Mas embora imprescindível, tal análise impediu durante muito tempo a clareza necessária à compreensão da discriminação específica das mulheres.52 52 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.

A razão de existir do movimento feminista residiria na especificidade da luta que travava. Do contrário, ele não teria motivo para existir e toda luta deveria ser canalizada para a transformação da estrutura econômica. Os partidos de esquerda eram criticados por ignorarem esse aspecto da luta e por não compreenderem a radicalidade da proposta feminista:

Los partidos de izquierda, por lo general, ignoran toda y cualquier reivindicación específicamente femenina, sólo interesándose por aquellas que pueden integrase en el contexto mas amplio de la lucha de clases. Temen que toda movilización de las mujeres por separado signifique crear un conflicto entre ambos sexos en el seno de la clase obrera.53 53 Lucia Tosí. "El movimiento feminista y su impacto". Nosotras, Paris, n. 15, mar. 1975.

A opressão feminina seria específica e exigiria métodos de luta também específicos. No trecho abaixo, Mariza e Danda procuram explicitar a diferença entre a opressão feminina e a dominação de classe no nível mais fenomênico das personificações de uma e outra forma de dominação:

Ao se falar na luta contra o sistema econômico que oprime a todos (homens e mulheres) e da necessidade de se acabar com uma opressão poder-se-ia acreditar que ela é idêntica para todo mundo. Entretanto a opressão da mulher vai mais além daquela exercida pelo patrão sobre o empregado.

Oprimida economicamente (mas não somente ou nem sempre) por um patrão particular ou estatal, ela também o é pelo homem ao qual estiver diretamente ligada. No lar a mulher é sempre dominada por outro patrão: pai, marido ou amante.54 54 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.

Encontramos no Boletim a ideia de uma universalidade da "opressão feminina". Para além das diferenças de classe, regionais etc., as mulheres partilhariam uma opressão universal. Essa ideia implica a noção de que haveria uma autonomia, em maior ou menor medida, desse "sistema de opressão" em relação a outras relações sociais, isto é, a opressão das mulheres seria uma forma específica de opressão/dominação, a qual se fundamentaria em causas/relações também específicas, não coincidentes, por exemplo, com aquelas da estrutura de classes. A negação desse postulado era considerada, como se pode ver no trecho a seguir, uma forma de antifeminismo:

Uma das maneiras clássicas de reação ao feminismo, é alegar que "cada grupos de mulheres (exemplo, as burguesas e as proletárias) teriam problemas diferentes", negando assim universalidade da posição de mulher, resultante da universalidade da ideologia patriarcal.55 55 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.

Mas a ideia de um patriarcado universal não necessariamente apaga as diferentes formas que esse assume segundo os contextos. Vimos isso através da discussão sobre as particularidades da situação da mulher latino-americana. A 'opressão feminina' estaria permeada por diferenças socioeconômicas e de classe. Haveria, dessa forma, um entrelaçamento dialético de relações sociais. Assim, a superação de uma opressão específica implicaria uma transformação de todo o complexo social: "Cada 'reivindicação específica' feminina pode ser situada a longo prazo no contexto social integral de cada país e sua realização significa a transformação de todas as estruturas sociais".56 56 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974. Por isso a estratégia de luta seria não uma luta isolada, apartada de outros movimentos, mas uma "convergência" das reivindicações dos "grupos oprimidos":

No mundo atual, todas as reivindicações de grupos discriminados são convergentes. O que não se pode negar é a importância da característica particular de cada análise, de cada reivindicação específica, de cada luta organizada, pois seja ela contra o sexismo, o racismo ou contra qualquer sistema econômico opressor, elas têm um só e mesmo sentido e é irresponsável condenar como sectarista ou divisionista qualquer movimento espontâneo de organização de grupos com opressões particulares além das genéricas e comuns a todos.57 57 Danda e Mariza. "Feminismo". Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.

Cabe ressaltar ainda em relação à essa discussão que uma das 'clivagens' entre mulheres mais debatidas no contexto francês foi, certamente, aquela ligada à estrutura de classes. Nos grupos de mulheres latino-americanas essa era uma questão presente. Para nos limitarmos a um só exemplo de como a questão era colocada por um outro grupo, mais próximo da corrente "luta de classes", o Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris, que surge em 1976, também na França, podemos citar o seguinte trecho:

A opressão das mulheres toca diferentemente cada classe social de um lado se combina com privilégios, de outro com exploração. Não consideramos portanto, que existam questões exclusivamente femininas que unificariam todas as mulheres numa luta comum contra uma opressão comum.58 58 CÍRCULO DE MULHERES BRASILEIRAS EM PARIS. Carta Política. São Paulo: CIM, 1976. v. I.

Segundo Guadilla, divergências relacionadas a essa discussão seriam um dos motivos para uma cisão do grupo em janeiro de 1975. Uma das partes enfatizaria mais o fator 'classe' como desestabilizador de uma unidade das mulheres e outra ressaltava a 'sororidade' entre mulheres. Esta última continuaria elaborando o boletim Nosotras, enquanto a primeira reunir-se-ia em torno de um grupo de estudos sobre a situação da mulher na América Latina e ao menos uma parte desse seria responsável por reunir informações sobre o tema e redigir o livro Mujeres, publicado pela editora Des femmes no ano de 1977.59 59 COLLECTIF DES FEMMES LATINO-AMERICAINES, 1977.

Para Angela Cunha Neves, o Grupo Latino-Americano era percebido pela comunidade brasileira no exílio como um "corpo estranho", algo "exótico". Seu "caráter apolítico", continua, teria tornado-o suspeito aos olhos dos militantes políticos, homens e mulheres.60 60 Angela CUNHA-NEVES, 1982, p. 114. Como exemplo de como as posições do grupo eram percebidas por uma parte da comunidade exilada brasileira, podemos citar um trecho de um balanço interno do grupo Campanha.61 61 O grupo Campanha surgiu no Chile, em 1972, a partir da iniciativa de militantes da organização brasileira Fração Bolchevique e se estruturava a partir da confecção de um jornal homônimo. Para tal agremiação, num documento cuja data precisa desconhecemos mas, ao que tudo indica, é do ano de 1976-1977, o Grupo Latino-Americano enfatizaria a luta das mulheres e, por isso, era considerado como "sexista", como se vê no trecho a seguir: "Nosotras: Grupo de intelectuais latinoamericanas com a participação de mulheres como Danda Prado, Norma Benguel, com fortes características sexistas e psicoanalíticas e com pouca influência na colônia".62 62 Documento do grupo Campanha, arquivado com os materiais do Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris.

"Sexista" era a forma como muitas vezes se denominavam as tendências do movimento que enfatizavam mais a luta das mulheres do que a luta de classes ou ignoravam esta última. Para citarmos outro exemplo dessa caracterização, no panfleto que chamava a criação do Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris, Por uma tendência feminina e revolucionária,63 63 CÍRCULO DE MULHERES BRASILEIRAS EM PARIS. Por uma tendência feminina e revolucionária. São Paulo: CIM, 1976. v. I. no qual estavam presentes militantes do grupo Campanha, mas também de outras organizações e 'independentes', criticavam-se as iniciativas de organização das mulheres brasileiras já realizadas, considerando-as "iniciativas amplas, comitês de massa [...] sem falar nas iniciativas dos grupos sexistas".64 64 CÍRCULO DE MULHERES BRASILEIRAS EM PARIS. Por uma tendência feminina e revolucionária. São Paulo: CIM, 1976. v. I. Embora o texto não nomeasse o Grupo Latino-Americano, fazia clara referência a esse quando mencionava as "iniciativas dos grupos sexistas".

Para Danda Prado, o grupo teria enfrentado uma viva oposição da comunidade exilada. Segundo Prado, um grupo identificado como 'Front' teria ameaçado retirar ajuda financeira às mulheres que tivessem participação no grupo, o que teria provocado a saída de várias delas do grupo. Infelizmente não conseguimos nenhuma outra informação sobre esse fato.

Nas entrevistas podemos encontrar também referências a esses debates e conflitos. Vera Tude relembra-se de sátiras no seio do grupo sobre a existência da "turma da política" e da "turma da sexualidade" no início do Grupo Latino-Americano. Não é difícil notar que essa oposição sexualidade/política orbitava ainda nos termos pelos quais a própria esquerda se posicionava muitas vezes diante do feminismo. Mais interessante, porém, é observar até que ponto essa oposição atravessa os discursos das tendências presentes, contrapondo como esferas diferentes e não comunicáveis com o universo da sexualidade e o universo da política ou da economia. A diferença encontra-se frequentemente apenas na positividade ou na negatividade com que são recobertos os termos dessa dicotomia. Tanto havia quem enfatizasse a centralidade da questão da sexualidade, em sua exterioridade à esfera política ou econômica, para o movimento feminista, como também havia quem enfatizasse a centralidade das questões ditas 'políticas' do movimento feminista (legalização do aborto, por exemplo) e desvalorizasse as "questões da sexualidade" como pertinentes a uma esfera privada e apolítica. É emblemático o seguinte trecho, extraído de uma entrevista dada por Norma Bengell ao jornal Crítica, em 1974, que ilustra bem o primeiro caso mencionado:

Feminismo pra mim é isso: descobrir que você é mulher. É uma questão de sexualidade. Tem o problema econômico também, mas esse a gente resolve depois. [...] Se eu fizesse um grupo feminista lá [no Brasil], faria um grupo de amigas que conversassem. [...] A mulher é feminista quando descobre que é mulher até os pés. Ainda não tem movimento feminista no Brasil porque até agora as mulheres estavam preocupadas em fazer infra-estrutura de outras coisas. Ou por falta de informação, né?65 65 CRÍTICA, n. 18, 2 dez. 1974 citada por GOLDBERG, 1987, p. 81.

Diferentemente de Norma Bengell, Cecília Comegno relata que lhe desagradava que as reuniões do grupo resvalassem em algo que mais se parecia a "uma sessão de terapia coletiva", pois, "se eu quiser resolver meus problemas [pessoais], vou resolver no divã do psicanalista". Descontentava-lhe que fosse priorizado esse tipo de questão em detrimento da mobilização em torno de bandeiras como a legalização do aborto e o salário igual ao do homem, bem como em torno da questão considerada vital no momento: a derrubada da ditadura no Brasil. Comegno rememora que "a gente queria que aquelas mulheres se manifestassem contra a ditadura, e elas não queriam".66 66 Entrevista com Cecília Comegno.

Ainda sobre essa polarização, Mariza Figueiredo comenta referindo-se às brasileiras que vinham do Chile:

[...] elas vinham, mas elas questionavam o feminismo. Elas questionavam porque elas achavam que ser feminista era uma coisa de direita, não era de esquerda. Um monte de bobageira, mas, enfim, era umas idéias bem PCzão, umas idéias bem antiquadas para o meu gosto. Então havia muita discussão sobre isso mas que não levava a nada. Então elas vinham e saíam, porque elas queriam transformar aquilo numa extensão da coisa de esquerda.67 67 Entrevista com Mariza Figueiredo.

Por essas e outras divergências, muitas mulheres foram a algumas reuniões e não se interessaram ou abandonaram o grupo, antes mesmo do início da publicação do Boletim. Posteriormente algumas delas engajar-se-iam em outros grupos. Segundo Naty Guadilla,

[p]or razones ideológicas muchas mujeres brasileñas fueron saliendo del grupo y crearon el Círculo de Mujeres Brasileñas, más en relación directa con las organizaciones políticas de la izquierda brasileña en el exilio. El Grupo Latinoamericano quedó reestructurado con mujeres estudiantes, a las que se agregaron, después del golpe chileno en Sep. 73, nuevas exiladas latinoamericanas.68 68 GUADILLA, 1980, p. 11.

Embora Naty Guadilla faça referência ao Círculo de Mulheres, trata-se, ao que tudo indica, segundo depoimentos e outras fontes, de um outro grupo ligado à figura de Zuleika Alambert, militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Cecília Comegno relembra que o Grupo Latino-Americano foi "[se] dividindo, dividindo, mas criou alguma unidade entre um outro grupo de pessoas. Quando Zuleika Alambert voltou do Chile, ela começou a chamar uma série de pessoas".69 69 Entrevista com Cecília Comegno. Trata-se de um comitê ligado ao PCB, mas aberto a mulheres de diferentes filiações cujas primeiras reuniões ocorreram, segundo documentos desse partido, em março de 1974.70 70 "Trabalho do Partido entre as Mulheres" (1975). Documentos do Partido Comunista Brasileiro, Seção Feminina, arquivados no CEDEM em São Paulo.

É importante ressaltar que, posteriormente, outro grupo, com características distintas, formar-se-ia a partir de algumas mulheres que fizeram parte do Comitê, o Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris (1976-1979). Mas foge ao escopo deste trabalho analisá-lo.

Procuramos, neste artigo, analisar alguns debates e embates feministas presentes em Nosotras. Partindo de problemas colocados por suas vivências como mulheres latino-americanas na Europa e da impossibilidade de separar seus diversos "pertencimentos", essas mulheres procuraram tematizar a articulação de múltiplas formas de dominação e elaborar estratégias de lutas e alianças que pudessem fazer face a essa realidade complexa. Concernidas tanto pelos contextos de origem como pelos do país que as acolheu, elas foram, com suas experiências particulares, parte de um movimento múltiplo cuja diversidade permanece ainda à espera de novas incursões.

Outros materiais

CÍRCULO DE MULHERES BRASILEIRAS EM PARIS. Coleção Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris. São Paulo, SP: Centro Informação Mulher (CIM). Materiais encadernados em 5 volumes.

Nosotras, Paris (n. 1, jan. 1974; n. 2, fev. 1974; n. 5, maio 1974; n. 7, jul. 1974; n. 8/9/10, ago./set./out. 1974; n. 13/14, jan./fev. 1975; n. 15, mar. 1975; n. 16/17/18, abr./maio/jun. 1975; n. 21/22, set./out. 1975; n. 23/24, nov./dez. 1975; n. 25/26, 1. e 2. trim. 1976).

Seção Feminina do PCB. Fundo PCB. Coleção Asmob. São Paulo, SP: Centro de Documentação da Unesp (CEDEM).

[Recebido em 3 de setembro de 2012 e aceito para publicação em 13 de março de 2013]

  • ABREU, Maira. Feminismo no exílio: o Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris e o Grupo Latino-Americano de Mulheres em Paris 2010. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2010.
  • BILGE, Sirma. "De l'analogie à l'articulation: théoriser la différenciation sociale et l'inégalité complexe". L'Homme et la Société, n. 2, p. 176-177, 2010.
  • CARDOSO, Elisabeth. Imprensa feminista brasileira pós-64 2004. Dissertação (Mestrado em Ciências da Comunicação) Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2004.
  • COLLECTIF DES FEMMES LATINO-AMÉRICAINES. Mujeres. Paris: Des femmes, 1977.
  • COSTA, Albertina et al. Memórias das mulheres do exílio Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
  • CROW, Barbara (Org.). Radical Feminism: A Documentary Reader Nova York/Londres: New York University Press, 2000.
  • CUNHA-NEVES, Angela. "Femmes brésiliennes en exil: la quête d'une identité". Cahiers des Ameriques Latines, n. 26, p. 103-126, 1982.
  • ECHOLS, Alice. Daring to be Bad: Radical Feminism in America 1967-1975 Minneapolis/Londres: University of Minnesota Press, 1993.
  • ERGAS, Yasmine. "O sujeito mulher: o feminismo dos anos 1960-1980". In: DUBY, Georges; PERROT, Michelle. História das mulheres no Ocidente. Lisboa: Afrontamento; São Paulo: Ebradil, 1990. v. 5. p. 583-611.
  • FIGUEIREDO, Mariza (Org.). La Liberacion de la Mujer. Dossier México: Associées, 1974.
  • FOUGEYROLLAS-SCHWEBEL, Dominique. "Controverses et anathèmes au sein du féminisme français des années 1970". Cahier du Genre, n. 39, p. 13-26, 2005.
  • GOLDBERG, Anette. Feminismo e autoritarismo: a metamorfose de uma utopia de liberação em ideologia liberalizante 1987. Dissertação (Mestrado em Sociologia) Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1987.
  • GUADILLA, Naty Garcia. "Historiando". Herejias, mar. 1980.
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  • JACKSON, Stevi. "Marxisme et féminisme". In: BIDET, Jacques (Org.). Dictionnaire Marx contemporain. Paris: PUF, 2001. p. 665-293.
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  • LAROCHE, Martine; LARROUY, Michèle (Org.). Mouvements de presse des années 1970 à nos jours: luttes féministes et lesbiennes. Paris: ARCL, 2009.
  • LÉPINARD, Eléonore. "Malaise dans le concept: différence, identité et théorie féministe". Cahier du Genre, n. 39, p. 107-135, 2005.
  • PEDRO, Joana. "Nosotras, Nós Mulheres, Nos/Otras, Noidonne: Rede de divulgação feminista dos anos 70 e 80". In: WOLFF, Cristina Scheibe; FAVERI, Marlene de; RAMOS, Tânia Regina de Oliveira (Org.). Leituras em rede: gênero e preconceito Florianópolis: Mulheres, 2007. p. 265-293.
  • PICQ, Françoise. "Un homme sur deux est une femme: les féministes entre égalité et parité (1970-1996)". Les Temps Modernes, n. 597, p. 219- 237, abr./maio 1997.
  • ______. Libération des femmes: les années-mouvement Paris: Editions-dialogues.fr, 2011.
  • QUESTIONS FEMINISTES. "Variations sur des thèmes communs". Questions Féministes, n. 1, p. 3-19, nov. 1977.
  • ROLLEMBERG, Denise. Exílio: entre raízes e radares. Rio de Janeiro: Record, 1999.
  • SARACHILD, Kathie. "Un programme pour 'l'éveil d'une conscience' féministe". Partisans, n. 54/55, p. 65-69, jul./out. 1970.
  • 1
    Este artigo é uma síntese do Capítulo 3 de minha dissertação, defendida na Unicamp em 2010, intitulada
    Feminismo no exílio: o Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris e o Grupo Latino-Americano de Mulheres em Paris, sob a orientação da Prof.a Dr.a Angela Maria Carneiro Araújo. Essa pesquisa foi realizada com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Agradeço a leitura atenciosa e sugestões de Helena Hirata. Agradeço também outras pessoas que leram diferentes versões deste texto, entre elas Marcilio Lucas, Danielle Tega e Rafael Afonso da Silva.
  • 2
    Clare HEMMINGS, 2009.
  • 3
    HEMMINGS, 2009, p. 229.
  • 4
    Ver, por exemplo, HEMMINGS, 2009; e Barbara CROW, 2000.
  • 5
    Neste trabalho refiro-me a exílio num sentido amplo, englobando a saída de pessoas do Brasil por banimento, isto é, militantes libertados em troca de reféns, e em consequência direta ou indireta de perseguição, pressão ou insatisfação política, incluindo autoexílios que, em alguns casos, se deram sob a forma "camuflada" de cursos de graduação, pós-graduação ou simplesmente viagem (Anette GOLDBERG, 1987).
  • 6
    Para mais informações, ver Liliane KANDEL, 1980; e Martine LAROCHE e Michèle LARROUY, 2009.
  • 7
    EDITORIAL.
    Nosotras, Paris, n. 16/17/18, abr./maio/jun. 1975. Os textos publicados no Boletim não eram necessariamente assinados e, quando consta o nome das autoras, na maioria dos casos, não consta o sobrenome. Essa era uma prática corrente no Mouvement de libération des femmes (MLF). Para mais informações, consultar Françoise PICQ, 2011, p. 494 (item "Sur l'anony-mat"). Por essa razão, as citações serão feitas com as informações de que dispomos. Além disso, todas as citações são transcrições, mantive a língua do original, mesmo quando há mistura de línguas.
  • 8
    EDITORIAL.
    Nosotras, Paris, n. 1, jan. 1974.
  • 9
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 10
    Naty GUADILLA, 1980, p. 11. O texto publicado no boletim
    Herejias é assinado por "Naty", mas, através da entrevista realizada com Naty Garcia Guadilla, sabemos que a autoria é dela.
  • 11
    Eis alguns exemplos: "Algumas estadísticas sobre La mujer venezolana" (n. 1), "Venezuela: la madre marginada" (n. 2), "Mujer e escuela en Venezuela" (n. 3), "Del matrimonio: critica dela código civil equatroriano" (n. 7), "As verdadeiras razões do incentivo à mão-de-obra feminina no Brasil" (n. 7), "La mujer en Bolívia" (n. 8/9/10), "La condición de la mujer en las sociedades indigenas latinoamericanas" (n. 11), "El comportamiento sexual des venezolanos" (n. 12), "La participación de la mujer latinoamericana en la actividad economica" (n. 16/17/18), "La femme de couleur en Amérique Latine" (n. 16/17/18), "Análise geral e conclusões finais do seminário pesquisa sobre o papel e o comportamento da mulher brasileira" (n. 19/20) e "Bolívia: analisis de la situacion actual y general de la mujer" (n. 23/24).
  • 12
    Diana e Maria Elena. "Herbert Marcuse en Paris...".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 13
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 14
    Vera. "Novos lançamentos:
    Feminisme et revolution...".
    Nosotras, Paris, n. 2, fev. 1974.
  • 15
    "Algunos aspectos sobre o machismo em America Latina".
    Nosotras, Paris, n. 7, jul. 1974.
  • 16
    "Dos experiencias del grupo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 17
    O conceito de intersecionalidade, dentre outros, é tributário, em larga medida, de questões postas no seio do movimento feminista. Ver, entre outros, Sirma BILGE, 2010.
  • 18
    EDITORIAL
    . Nosotras, Paris, n. 13/14, jan./fev. 1975.
  • 19
    EDITORIAL
    . Nosotras, Paris, n. 13/14, jan./fev. 1975.
  • 20
    NOSOTRAS. Paris, n. 1, jan. 1974.
  • 21
    NOSOTRAS. Paris, n. 13/14, jan./fev. 1974.
  • 22
    Kathie SARACHILD, 1970, p. 66.
  • 23
    Entrevista com Danda Prado citada por Elisabeth CARDOSO, 2004, p. 77.
  • 24
    Entrevista com Mariza Figueiredo.
  • 25
    Maricota da SILVA citada por Albertina COSTA et al., 1980, p. 39.
  • 26
    SILVA citada por COSTA et al., 1980, p. 40.
  • 27
    Lucia Tosí. "Algunas reflexiones a proposito del articulo de Françoise Collin...".
    Nosotras, Paris
    , n. 23/24, nov./dez. 1975.
  • 28
    "Três Mulheres, três atrizes semi-profissionais e a condição feminina", texto escrito por Wadad Alamedine, Catherine Lemaire e Evelyne Perard, autoras e atrizes da peça "Histoires de bonnes femmes", e distribuído na entrada do teatro. NOSOTRAS. Paris, n. 8/9/10, ago./set./out. 1974.
  • 29
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris
    , n. 5, maio 1974.
  • 30
    EDITORIAL
    . Nosotras, Paris, n. 13/14, jan./fev. 1975.
  • 31
    "Solidariedade às portuguesas".
    Nosotras, Paris, n. 13/14, jan./fev. 1975.
  • 32
    Mariza Figueiredo. "Wanda: crítica de um filme".
    Nosotras, Paris
    , n. 15, mar. 1975.
  • 33
    Ana Tegui. "Testimonio: soy una mujer más".
    Nosotras, Paris, n. 7, jul. 1974.
  • 34
    Yasmine ERGAS, 1990, p. 595.
  • 35
    Alice ECHOLS, 1993.
  • 36
    Eléonore LÉPINARD, 2005, p. 114.
  • 37
    QUESTIONS FEMINISTES, 1977, p. 11.
  • 38
    PICQ, 1997, p. 222. Sobre essa discussão, ver também KANDEL, 2000.
  • 39
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 40
    EDITORIAL
    . Nosotras, Paris, n. 21/22, set./out. 1975.
  • 41
    Lucia Tosí. "Algunas reflexiones a proposito del articulo de Françoise Collin...".
    Nosotras, Paris
    , n. 23/24, nov./dez. 1975, grifos nossos.
  • 42
    PICQ, 1997.
  • 43
    NOSOTRAS. Paris, n. 25/26, 1. e 2. trim. 1976.
  • 45
    A publicação, em 1979, em Paris do texto de Herbert Daniel, "Homossexual: defesa dos interesses?", é apontada como o primeiro documento a discutir a questão da homossexualidade entre as esquerdas brasileiras. Antes dessa publicação, ocorreu um debate promovido pelo grupo de Cultura do CBA (Comitê Brasil Anistia), que gerou controvérsias e, segundo Denise Rollemberg, transformou-se num dos grandes marcos do exílio brasileiro na França. Mas tudo isso ocorreria cinco anos depois de o boletim
    Nosotras começar a tematizar a questão (Denise ROLLEMBERG, 1999).
  • 46
    Anne e Jaqueline. "De un grupo a outro".
    Nosotras, Paris, n. 4, abr. 1974. Esse texto constitui uma versão de uma pichação feita em 1968 em Paris. Ver PICQ, 2011, p. 14.
  • 47
    Stevi JACKSON , 2001.
  • 48
    GUADILLA, 1980, p. 12.
  • 49
    EDITORIAL
    . Nosotras, Paris, n. 1, jan. 1974.
  • 50
    FIGUEIREDO, 1974.
  • 51
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 52
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 53
    Lucia Tosí. "El movimiento feminista y su impacto".
    Nosotras, Paris, n. 15, mar. 1975.
  • 54
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 55
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 56
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 57
    Danda e Mariza. "Feminismo".
    Nosotras, Paris, n. 5, maio 1974.
  • 58
    CÍRCULO DE MULHERES BRASILEIRAS EM PARIS.
    Carta Política. São Paulo: CIM, 1976. v. I.
  • 59
    COLLECTIF DES FEMMES LATINO-AMERICAINES, 1977.
  • 60
    Angela CUNHA-NEVES, 1982, p. 114.
  • 61
    O grupo Campanha surgiu no Chile, em 1972, a partir da iniciativa de militantes da organização brasileira Fração Bolchevique e se estruturava a partir da confecção de um jornal homônimo.
  • 62
    Documento do grupo Campanha, arquivado com os materiais do Círculo de Mulheres Brasileiras em Paris.
  • 63
    CÍRCULO DE MULHERES BRASILEIRAS EM PARIS.
    Por uma tendência feminina e revolucionária. São Paulo: CIM, 1976. v. I.
  • 64
    CÍRCULO DE MULHERES BRASILEIRAS EM PARIS.
    Por uma tendência feminina e revolucionária. São Paulo: CIM, 1976. v. I.
  • 65
    CRÍTICA, n. 18, 2 dez. 1974 citada por GOLDBERG, 1987, p. 81.
  • 66
    Entrevista com Cecília Comegno.
  • 67
    Entrevista com Mariza Figueiredo.
  • 68
    GUADILLA, 1980, p. 11.
  • 69
    Entrevista com Cecília Comegno.
  • 70
    "Trabalho do Partido entre as Mulheres" (1975). Documentos do Partido Comunista Brasileiro, Seção Feminina, arquivados no CEDEM em São Paulo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Set 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 2013

    Histórico

    • Recebido
      03 Set 2012
    • Aceito
      13 Mar 2013
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