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(Re)presentar: contribuições das teorias feministas à noção da representação

Represent: feminists contributions to the notion of representation

Resumos

Este artigo se propõe a problematizar a categoria da representação, em suas esferas política, social e estética, a partir das contribuições trazidas por algumas teorias feministas - compreendidas aqui em seu sentido mais amplo. Em sua parte inicial, apresentará um breve mapeamento de alguns possíveis significados da representação; em seguida introduzirá as críticas dos estudos feministas a essa categoria; por fim, na última parte do artigo, utilizaremos alguns conceitos dos Genders Studies.

representação; teorias feministas; Genders Studies


This article intends to debate the notion of representation including the social, political and aesthetic aspects. The point of departure will be some feminists theories' contributions to the concept of representation. Firstly, we will present some possible meanings of representation; then, in the second part, we will present the feminists' critics to this concept; finally, we will work with some Gender Studies categories.

Representation; Feminist Theory; Gender Studies


ARTIGOS TEMÁTICOS PALAVRA E IMAGEM: REPRESENTAÇÕES IDEOLÓGICAS

(Re)presentar: contribuições das teorias feministas à noção da representação

Represent: feminists contributions to the notion of representation

Eduardo Ramalho RabenhorstI; Raquel Peixoto do Amaral CamargoII

IUniversidade Federal da Paraíba

IIUniversidade Federal da Paraíba

RESUMO

Este artigo se propõe a problematizar a categoria da representação, em suas esferas política, social e estética, a partir das contribuições trazidas por algumas teorias feministas – compreendidas aqui em seu sentido mais amplo. Em sua parte inicial, apresentará um breve mapeamento de alguns possíveis significados da representação; em seguida introduzirá as críticas dos estudos feministas a essa categoria; por fim, na última parte do artigo, utilizaremos alguns conceitos dos Genders Studies.

Palavras-chave: representação; teorias feministas; Genders Studies.

ABSTRACT

This article intends to debate the notion of representation including the social, political and aesthetic aspects. The point of departure will be some feminists theories’ contributions to the concept of representation. Firstly, we will present some possible meanings of representation; then, in the second part, we will present the feminists’ critics to this concept; finally, we will work with some Gender Studies categories.

Key Words: Representation; Feminist Theory; Gender Studies.

Introdução

Em A sociedade do Espetáculo, o cineasta e teórico francês Guy Debord parte de um aforismo famoso segundo o qual a marca da sociedade capitalista contemporânea é o espetáculo. Nas condições atuais de produção, diz Debord:1 1 Guy DEBORD, 1997, p. 13. "Tudo que era vivido diretamente tornou-se uma representação". Essa frase do teórico francês expressa muito mais do que a mera denúncia da profusão de imagens na vida contemporânea: ela é a constatação de que o espetáculo é um estágio no desenvolvimento do capitalismo, isto é, do fato de que atualmente o capitalismo tem sua mercadoria menos na coisa e mais na imagem que dela é produzida.

No veredicto traçado por Debord,2 2 DEBORD, 1997. sobressai a importância da categoria da representação, sobretudo da representação imagética, como característica fundamental de nosso tempo. A bem da verdade, o ser humano sempre se utilizou de representações para atribuir significado às coisas e às relações. Porém, não se pode negar que o ato de representar, bem como as implicações que ele enseja, vem se tornando bem mais complexo. O propósito deste artigo não é discutir as questões atinentes ao engenho da representação propriamente dita, ou mesmo pensar a complexa tese de que vivemos na era da predominância das imagens, aliás, já abordada por muitos autores contemporâneos, a exemplo de Jean Baudrillard3 3 Jean BAUDRILLARD, 1991. e F. Jameson.4 4 Fredric JAMESON, 2001. Interessa, na realidade, conectar uma discussão mais abrangente sobre o ato de representar – o que é, como se verifica, quais são os seus limites – com as reflexões propostas por algumas teóricas feministas sobre o tema, especialmente no que concerne à representação das mulheres.

1 Problematizando a representação

As primeiras discussões sobre o tema da representação na cultura clássica grega, que concernem mais ao campo artístico do que ao plano da política, já trazem consigo inúmeras indagações. Se um dos primeiros significados do ato de representar é tornar presente aquilo que está ausente, estar-se-ia, portanto, diante de uma impossibilidade? De que maneira é possível tornar presente o que está ausente? A única possibilidade, parece, seria fazê-lo alegoricamente, no sentido exato da palavra: "dizer o outro". A representação, no entanto, e é isso que vem a torná-la problemática, não pretende apenas "dizer o outro", mas "dizer pelo outro". O representante é, assim, ao mesmo tempo um "lugar-tenente" e um "porta-voz".5 5 O termo latino repraesentatio, originado no campo do direito, também alude a essa ideia de uma presença ausente. O representante, seja ele procurador, tutor ou guardião, é aquele que fala e age em nome de outro. Contudo, o termo em latim também conota a ideia de similitude ou semelhança. No final do Império Romano, há, em todas as cidades do Império, uma estátua do imperador que ostenta o título de divus, e que através de seus traços representa os traços do deus. No cristianismo, por sua vez, é por similitude representativa, como diz Agostinho, que conhecemos a Deus, e não diretamente. (ENCYCLOPÉDIE PHILOSOPHIQUE UNIVERSELLE, 1990).

Em português, a palavra representação expressa, em primeiro lugar, a ação ou efeito de expor, exibir, figurar, produzir ou simular uma imagem de algo.6 6 André JACOB, 1990. Tal significado diz respeito aos aspectos mentais, linguísticos e artísticos (representar algo através de pensamento, palavra, símbolo ou imagem) inerentes ao processo de representação. Do ponto de vista filosófico, especialmente nas esferas da epistemologia e da estética, a categoria da representação enseja uma série de complicados problemas teóricos, já que ela supõe, simultaneamente, movimentos de "presentificação" e de repetição.

Inicialmente, no ato de representar, deve sempre existir uma distância entre o elemento que representa ou substitui e aquilo que é representado ou substituído. Tal dissociação, na verdade, é a razão mesma de ser da representação. Do contrário, haveria uma fusão entre o representante e o representado, que tornaria a representação inútil, como o mapa fabulado por Jorge Luis Borges,7 7 Jorge Luis BORGES, 1982. que de tão perfeito correspondia exatamente e exaustivamente ao tamanho do império que se propunha modelar. Mapa dispensável, portanto, já que o êxito completo de uma representação condenaria esta última à inutilidade, ou, em outras palavras, a relação de perfeita equivalência entre a representação e o objeto representado retira a razão de ser daquela.

Outro problema reside na sutil, porém crucial, distinção feita por algumas línguas germânicas entre a representação no sentido de tornar presente ou visível algo que já existe e a representação como criação de um acontecimento original. Essa nuance semântica é de fundamental importância para os estudos de representação no teatro, por exemplo, já que esta existe apenas no presente, isto é, na medida em que uma encenação, mesmo que partindo de um texto prévio, põe diante dos olhos dos espectadores algo novo e único, um acontecimento absolutamente original.

Na língua inglesa o termo performance (to perform) expressa bem essa ideia contida na dinâmica teatral de uma ação produzida no e pelo ato mesmo de sua apresentação.8 8 Sobre o tema, ver CARLSON, 2010. A ação teatral seria, nesse sentido, performativa, visto que é capaz de criar realidades novas. Umberto Eco,9 9 Umberto ECO, 1989. no entanto, justifica a permanência do uso no italiano, tal como ocorre no português, do termo representação (rappresentazione) no teatro, exatamente porque, segundo ele, chamar a ação teatral de performance acentuaria suas características de execução, porém diminuiria suas características de ostentação de uma realidade ficcional.

Prosseguindo com a problematização, voltemos à ideia inicial de representação como substituição de algo ou alguém que se encontra ausente. Ao transferir esse sentido para as áreas da Política e do Direito, o ato de representar aparece como um mandato ou uma delegação que habilita alguém ou uma entidade a agir no lugar de outra pessoa ou de outra entidade.10 10 Nicolas TENZER, 1994. Também nesse contexto aparece mais um emaranhado de problemas teóricos, dessa vez bastante familiar aos juristas e aos cientistas políticos. O que significa, afinal, atuar em nome de outrem? A dificuldade surge claramente nos debates sobre a distinção entre aquilo que no campo do direito processual pode ser chamado de "atuação substitutiva condicionada" e "atuação substitutiva independente". De fato, os representantes políticos, por exemplo, deveriam atuar em seus próprios termos, isto é, como ocupantes de um lugar, ou deveriam atuar apenas restritamente como delegados, tão somente reproduzindo as opiniões e interesses daqueles que os elegeram?

Hanna Pitkin11 11 Hanna PITKIN, 2006. chama atenção para o fato de que, na língua alemã, diferentemente do que ocorre no inglês (ou no português, poderíamos acrescentar) existem três palavras para expressar distintos aspectos da representação: darstellen, vertreten e repräsentieren. Segundo a autora, darstellen significa retratar ou colocar algo no lugar de; vertreten designa a atuação como agente de alguém; e repräsentieren a representação de interesses estatais mais elevados. Assim, interesses privados seriam representados no segundo sentido, enquanto interesses públicos seriam repräsentieren.

Imprecisão semântica, somada a tantos problemas teóricos, não poderia ter ensejado outra coisa senão o que se convencionou chamar contemporaneamente de "crise da representação". Tal expressão faz referência a um leque imenso de aspectos, como mostra Pierre Glaudes12 12 Pierre GLAUDES, 1999. em obra sobre o assunto, tendo como elemento unificador a denúncia da separação irredutível existente entre o homem, suas capacidades de simbolização e o real.

No nível da estética, a crise da representação pode ser traduzida pelo fato de que a arte há muito abandonou a pretensão de querer ser representativa. A Linguística, por sua vez, já não supõe a interdependência clássica entre a linguagem e a realidade

Já no campo da política, a expressão "crise da representação" designa outro amálgama de temas e problemas, relacionado com os desafios de se criar e manter instituições livres e de se assegurar que os eleitos representem os eleitores, bem como os mandatários representem os mandantes. Muitas constituições contêm dispositivos que afirmam que a soberania do povo ou da nação é exercida por representantes ou mesmo que a constituição é representativa. Assim, malgrado os diversos problemas teóricos, segue-se com uma perspectiva, senão descritiva, ao menos normativa da representação, em que a expressão "crise da representação" não expressa a obsolescência pura e simples desse conceito, mas apenas a tendência contemporânea de repensá-lo.

Uma boa pista de trabalho é começar a pensar a representação em termos ficcionais, aliás, como tinham em mente os juristas medievais no momento de criação do vocábulo.13 13 André-Jean ARNAUD, 1999. A importância da ficção no Direito, por exemplo, que não passou despercebida a Kelsen e a Perelman, conhece novo interesse por parte dos juristas contemporâneos, especialmente entre aqueles que se dedicam a discutir o lugar do imaginário no campo jurídico. Sobre esse aspecto, Bernard Edelman14 14 Bernard EDELMAN, 2007. tem uma obra interessante.

2Teorias feministas e representação

Uma das acepções do termo representação em português, que coincide com outras línguas latinas, é exatamente o de queixa fundamentada ou reclamação, em que se exige de uma autoridade um direito ou benefício, ou se endossa um projeto qualquer.15 15 AULETE, 1980. Na França do Antigo Regime, existiram os famosos Cadernos de queixas e reclamações, nos quais eram consignadas as representações e protestos da população dirigidos ao rei pelos Estados Gerais ou provinciais. Durante o período revolucionário, tais cadernos foram um canal importante de expressão de reivindicações igualitárias por parte das mulheres francesas. Eles formam, pois, fazendo um trocadilho, "representações" que postulam uma "representação": ao mesmo tempo que eles expressam queixas concernentes aos problemas diariamente enfrentados por essas mulheres, formulam também reivindicações por visibilidade política e pertencimento das mulheres ao corponação francês, naquele momento em reconfiguração.16 16 O mesmo argumento será retomado por Olympe de Gouges em 1791 em sua Declaração dos direitos da Mulher e da cidadã e por alguns pensadores iluministas, entre os quais Condorcet. Para o pensador francês, o direito natural e os princípios de uma república exigem a participação de todos os indivíduos. Por outro lado, estes não podem ser representados senão por aqueles que possuem os mesmos interesses. Ver Marquis de CONDORCET; Olympe DE GOUGES e Jean Le Rond DE LAMBERT, 1993; e Gabriella GROPPI e Angela BONACCHI, 1995.

Interessante pensar que muitas dessas representações são apócrifas. O anonimato ou o uso de pseudônimos, sem falar no recurso de dissipar a autoria de um texto, sugerindo ser uma tradução, foram estratégias comumente utilizadas por mulheres que ousavam escrever nesse período. Um dos mais famosos cadernos, produzido na província de Caux por uma suposta Madame B*** B***, cuja autoria jamais foi identificada, reivindica a admissão das mulheres nos Estados Gerais a partir de um argumento de autorreferencialidade, que remete à necessidade de identidade de interesses entre representantes e representados. No entender da reclamante, do mesmo modo que um nobre não poderia representar um plebeu nas decisões políticas, um homem tampouco poderia representar uma mulher:

[...] estando justamente demonstrado que um nobre não pode representar um plebeu e vice-versa, do mesmo modo que um homem não poderia, com maior equidade, representar uma mulher, dado que os representantes devem ter absolutamente os mesmos interesses dos representados, por conseguinte, as mulheres só poderiam ser representadas por mulheres.17 17 BONACCHI e GROPPI, 1995, p. 92.

Já se pode ter aqui uma breve ideia do emaranhado de problemas que envolvem o conceito de representação na esfera política, para os quais Hanna Pitkin18 18 Hanna PITKIN, 1967, 2006. chamou tanta atenção. No entendimento moderno e liberal do processo democrático, a noção de representação está articulada à delegação de poderes, por meio de votos, a um conjunto proporcionalmente reduzido de indivíduos, na expectativa de que estes representem, isto é, ajam no lugar e defendam interesses dos eleitores.

A reflexão teórica feminista contemporânea, especialmente aquela produzida por autoras que abraçam uma postura dita pós-estruturalista, vem desempenhando um papel importante na crítica ao conceito de representação. Na realidade, as conhecidas lutas feministas por justiça distributiva e reconhecimento intersubjetivo19 19 Na acepção que Emmanuel Renault e Axel Honneth atribuem à expressão. Ver Emmanuel RENAULT 2004; e Axel HONNETH, 2006. se inscrevem também no horizonte de uma luta por representação nas suas variadas conotações: representação política, é claro, mas também representação social, estética e como princípio semiótico, segundo o qual algo substitui uma coisa ausente.

Situadas na órbita dos chamados "estudos culturais", muitas teóricas feministas, assim como muitos estudiosos das questões de raça, sexualidade e colonialismo, têm denunciado os mecanismos políticos da representação. Afinal, o que significaria representar? Quais regras, parâmetros, esquemas ou convenções determinariam as representações? Quem teria a prerrogativa de representar? Toda representação não seria, no fundo, uma construção que refletiria posições, poderes e interesses dominantes?

É interessante lembrar que Foucault,20 20 Michel FOUCAULT, 1985. em As palavras e as coisas, ao discutir o surgimento das ciências sociais a partir de uma análise do significado da representação nos âmbitos da linguagem e da pintura na cultura ocidental em diferentes épocas, sustenta que a função representativa tornou-se problemática no final do século XVI. Desde então, teria ocorrido uma cisão entre a linguagem e o mundo: o sujeito representante, isto é, o homem, tomando consciência de sua existência, se transformou ele mesmo em objeto. Para Foucault, a melhor alegoria dessa transformação seria o intrigante quadro Las meninas, de Velazquez (1656), no qual o pintor espanhol retratou uma cena da família do rei Filipe IV de modo bastante inusitado: o pintor se introduziu na tela e, com o auxílio de um espelho, que reflete o que se passa fora dela, fez com que a representação viesse a representar a si mesma.

No campo das teorias feministas, o tema da representação parece ser discutido ao menos em três grandes planos: (1) representação social, que remete à representação do próprio feminismo enquanto movimento social e político; (2) representação política, que compreende as discussões acerca da identidade entre o sujeito que representa e os interesses das pessoas representadas, bem como o complexo modelo de representação que busca tornar presente aquilo que está ausente; (3) representação estética, que abrange as discussões da representação no campo da arte.

2.1 Representação social

A categoria da representação em termos do que se convencionou chamar de "representações sociais" consiste em formas de conhecimento socialmente construídas que concorrem à elaboração de uma realidade, por assim dizer, mental, comum a um conjunto social. O ressurgimento desse conceito remete à obra seminal de Serge Moscovici, qual seja La Psychanalyse, son image, son public, que se insere no campo da Psicologia Social e inaugura, no fim da década de 1960, a chamada teoria das representações sociais. As representações sociais, assim concebidas, permitem captar os significados que as pessoas, em suas vidas cotidianas, atribuem de forma mais ou menos coletiva aos fenômenos sociais que as cercam. Tais representações são expressas por discursos que definem e ensejam interpretações, as mais diversas possíveis, de todos aqueles fenômenos que, de alguma maneira, concernem à vida em sociedade.

Ao aproximarmos a categoria de representações sociais ao conceito de gênero e de feminismo, é possível constatar que, entre os discursos construídos socialmente sobre o feminismo e as identificações mais pessoais com as injustiças sofridas pelas mulheres, há um enorme abismo. Em outras palavras, é comum que as representações sociais em torno do feminismo reflitam um julgamento a priori negativo, enquanto algumas reivindicações desse movimento são percebidas como justas, apesar de estarem inseridas nesse contexto de negatividade.

Essa constatação se fundamenta, sobretudo, nas observações cotidianas do "mundo da vida".21 21 Jürgen HABERMAS, 1999. É muito comum, ao curso de conversas que envolvam tal sujeito, que as pessoas que defendem alguma posição sobre direitos das mulheres iniciem suas falas com observações do tipo: "não que eu seja feminista, mas...". Ora, normalmente empregamos esse tipo de alerta, no caso, uma conjunção adversativa, quando tememos ser identificados com algo ruim, tal como na frase "não que eu seja preconceituoso, mas...". Discursivamente, é comum que o "feminismo" já esteja a priori marcado pela negatividade.

Trata-se então de tentar compreender por que o feminismo enseja comumente uma reação hostil, inclusive entre as próprias mulheres, mesmo quando as suas reivindicações parecem justas e legítimas. Em outras palavras, interessa indagar por que o feminismo não corresponde às expectativas existentes em torno de como deveriam ser as relações entre homens e mulheres ou de como as mulheres gostariam de ser vistas.

Hipoteticamente, faremos algumas suposições com base nas possibilidades de exercício da imaginação sociológica,22 22 Charles Wright MILLS, 2006. que nos permite articular problemas sociais com os nossos dilemas pessoais.

Assim, uma primeira suposição pode ser assim colocada: a justificativa discursiva de não ser feminista encontra uma razão no receio apresentado por algumas mulheres de serem associadas à ampla gama de lutas políticas contemporaneamente vinculadas ao movimento feminista. Supostamente, a adesão a tais propostas poderia contrariar valores dos quais muitas não gostariam de abrir mão, tais como feminilidade e um projeto de vida pautado pelo desejo de casamento e de maternidade.

Uma segunda suposição, que não se desvincula da primeira, diz respeito à existência de certa resistência à aceitação de novos modelos de família, que inclui a união/casamento de pessoas gays, famílias mononucleares, entre outros arranjos. Tal resistência pode ser facilmente associada, entre outros fatores, a tensões decorrentes de alguns modelos religiosos que condenam as possibilidades acima mencionadas e colocam muitas pessoas na difícil situação de se verem obrigadas a realizar escolhas complicadas.

Traduzindo em hipóteses discursivas, poderíamos, pois, pensar em justificativas do tipo: "não que eu seja feminista e concorde com a descriminalização do aborto ou defenda a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, porém, ainda assim, acredito que as mulheres sofrem injustiças", frise-se, "mesmo sem ser feminista".

As críticas à principal obra de Simone de Beauvoir, O segundo sexo, ilustram bem o fato de que as reações acima descritas, guardadas as devidas proporções, apresentam alguma semelhança com aquelas que tiveram lugar da década de 1950. Como nos narra a própria autora,23 23 MILLS, 2010. não foram poucas as acusações por ela sofridas de corrupção dos bons costumes, desconsideração dos sentimentos maternais existentes entre mãe e filha e incentivo à promiscuidade. Justificativas como as que se seguem, apresentadas por Beauvoir, nos permitem perceber as críticas feitas à época ao que hoje podemos chamar de pensamento feminista:

[...] eu teria negado todo valor ao sentimento maternal e ao amor: não. Eu pedi que a mulher os vivesse de forma verdadeira e livre, tendo em vista que normalmente eles servem de álibi para que ela se aliene, ao ponto que a alienação permanece, o coração já tendo secado. Eu preguei a liberdade sexual, mas eu nunca aconselhei a ninguém dormir com quem quer que seja, aonde quer que seja; o que eu penso é que nesse domínio as escolhas, os consentimentos, as recusas não devem obedecer às instituições, às convenções, aos interesses.24 24 Simone BEAUVOIR, 2010, p. 228, tradução nossa.

O que se pode, portanto, perceber, mais uma vez valendo-nos das representações sociais associadas ao exercício da imaginação sociológica, é que tais discursos hipoteticamente formulados apontam para um reconhecimento de que, ao menos parcialmente, os movimentos feministas tinham razão. Em outras palavras, é possível supor certo consenso quanto ao fato de que não se tolera mais determinados níveis de submissão das mulheres aos homens. Porém, devido à diversidade de movimentos aos quais se pode atribuir o status de "feminista" e a amplitude que vem ganhando esse conceito, a identificação com o feminismo pode implicar na aceitação da ampla gama de propostas associadas a esse movimento.

De maneira muito superficial, poderíamos afirmar, sem pretensões conclusivas, que o ponto de tensão entre as representações sociais do feminismo e a identificação das mulheres com algumas propostas feministas reside na dificuldade de desconstrução de alguns paradigmas, ou, para dizê-lo com Bourdieu,25 25 Pierre BOURDIEU, 2009. poderíamos falar em um habitus masculino, isto é, um modo de agir masculino, já consolidado e que impediria a desnaturalização de algumas construções sociais, tais como o casamento ou a maternidade. Esta, mesmo dependendo de elementos biológicos, tem seu componente social no fato de que pode ser encarada como uma escolha. A discussão, no entanto, é bastante complexa e não se pretende saturá-la aqui, pois sempre se pode invocar o argumento da escolha consciente ou da negação consciente da desconstrução.

2.2 Representação política

No momento histórico de eclosão das reivindicações de direitos das mulheres, século XVIII, portanto, a identidade feminina (o que hoje seria chamado mais de subjetivação) não era exatamente um problema – a não ser em termos de sua representação negativa, isto é, a mulher como criatura não apta a ocupar a esfera pública e a fazer política. Contemporaneamente, ao contrário, ela passou a ser seriamente questionada, mormente com a aparição dos ditos Gender Studies e especialmente do que se convencionou chamar de queer theory. Esses questionamentos acerca de processos de subjetivação trazem novos e complexos problemas para a categoria da representação.

Judith Butler, considerada por muitos como a principal teórica dos estudos de gênero, criticou duramente a representação da mulher enquanto categoria estável e permanente. Partindo das teses de Foucault sobre a constituição da subjetividade, Butler26 26 Judith BUTLER, 1977. entende que toda representação é função normativa, de tal sorte que não existe "a mulher" antes de sua formação discursiva. Em outros termos, é a própria representação que produz os sujeitos que ela supostamente pretende apenas representar.

Em um segundo momento, seguindo a crítica de J. Derrida27 27 Jacques DERRIDA, 1973. ao conceito de representação, Butler28 28 BUTLER, 1997. sustenta que o gênero é construído performativamente, isto é, que ele toma corpo não por uma ação única, mas por meio de reiterações, de tal sorte que ele é sempre uma citação, incapaz, como tal, de repetir o original ausente. O gênero é produção ritualizada, performance.

Como consequência prática, se inexiste "a mulher", enquanto categoria mais ou menos universal que fornece uma identidade clara no interior da dualidade sexual, o feminismo entra numa "crise" sem precedentes. Como sempre ocorre nesses casos, alguns acreditam que a crise seria positiva, já que com ela outros e novos sujeitos também poderiam passar a representar o feminismo, tais como os gays e os transexuais, por exemplo. As feministas mais tradicionais, no entanto, manifestam resistências em relação a essa ideia nominalista segundo a qual "mulher" é apenas uma palavra e, como tal, pura ficção. Afinal, qual seria o fundamento de uma política feminista que desconstruiria o sujeito feminino?

Uma possível saída para o impasse é flexibilizar a categoria "mulher", passando do sujeito abstrato ao sujeito concreto, reconhecendo assim que se a mulher não existe como universal, isto é, como sujeito uno, existem, no entanto, mulheres concretas, heterogêneas, múltiplas, que compartilham, cada uma a seu modo, uma série de opressões, e que podem, então, no mínimo como estratégia de ação política, compartilhar também de um objetivo comum.

O que se tem aqui, por conseguinte, é o transporte para o campo dos estudos sobre o gênero de um problema político considerado fundamental e extremamente complexo no mundo contemporâneo: como dizer o "um", o coletivo, em meio a tamanha fragmentação identitária e em um contexto de reivindicação cada vez maior do reconhecimento (político e jurídico) das subjetividades? Em outras palavras, ainda seria possível, nos dias atuais, "representar" politicamente?

Young29 29 Iris Marion YOUNG, 2006. aborda a representação política considerando o modelo identitário de representação e o problema de como fazer com que as minorias sejam representadas, mormente no que concerne às mulheres. Parte a autora da premissa de que os modelos identitários de representação cristalizariam identidades que, a bem da verdade, estariam em constante movimento de construção e reconstrução:

O processo unificador requerido pela representação de grupos buscaria congelar relações fluidas numa identidade unificada, o que poderia recriar exclusões opressivas.

[...]

Nenhum representante único poderia falar por qualquer grupo, já que os indivíduos que o compõem mantém relacionamentos por demais entrecruzados.30 30 YOUNG, 2006, p. 142.

Para resolver esse problema, Young propõe não desacreditar da representação, tampouco pautá-la por uma lógica identitária. A representação identitária, no entender da autora, enseja problemas porque segue o modelo da substituição segundo o qual os representantes só podem fazer o que os representados fariam, uma espécie de copresença que dificultaria bastante e exequibilidade da proposta, considerando a distância que afastaria as pessoas. Um segundo modelo da representação identitária consiste em encontrar traços fortes comuns entre as pessoas que se enquadram em determinada categoria e a partir daí criar uma figura (como uma caricatura) que as represente, ao invés de tentar substituí-las. O problema, no entanto, é encontrar esses traços fortes comuns, considerando a complexidade e a interseccionalidade das relações (e opressões) contemporâneas.

O modelo que pode servir como uma alternativa à representação identitária é a chamada "representação por relacionamento", defendida por Young. Esta, tomando como ponto de partida o conceito derridariano de différence, toma apoio no reconhecimento da existência de uma separação irredutível entre o representante e o representado que não necessariamente deve ser encarada como um problema: "A função do representante de falar por não deve ser confundida com um requisito identitário de que o representante fale como os eleitores falariam, tentando estar presente por eles na sua ausência."31 31 YOUNG, 2006, p. 149.

A representação por relacionamento com base na diferença seria, pois, uma forma de representar pautada na existência de uma conexão entre os representantes e os representados que se constrói ao longo do tempo e na distância. O corpo dos eleitores é diferenciado, e para que eles sejam representados não é preciso encontrar algo que os una, mas apenas não perder a conexão, isto é, a ligação entre eleitores e representante. É essa ideia, de maneira bastante simplificada, que está contida no modelo de representação proposto por Young. Tal formato, por suposto, só poderia ser bem compreendido a partir de uma análise mais apurada de alguns conceitos que lhes são caros, tais como: interesse, temporalidade da representação, opinião, entre outros, que não é passível de ser feita nos limites do presente texto.

Podemos também pensar o problema da representação com base em algumas propostas de Gayatri C. Spivak.32 32 Gayatri C. SPIVAK, 2010. Em seu famoso livro Pode o subalterno falar?, publicado em 1985 e reelaborado algumas vezes pela própria autora, Spivak ajuda-nos a jogar luz sobre algumas perguntas: quem são as mulheres representadas, quem as representa e segundo quais esquemas conceituais?

Partindo da distinção existente na língua alemã entre Vertretung e Darstellung, Spivak sugere a existência de duas formas fundamentais de se representar: a primeira, vertreten, seria endossar ou "vestir a roupa" daquele que é representado; a segunda seria "representar" na acepção do termo Darstellung, no qual o prefixo dar expressa "aqui" e stellen significa pôr ou colocar, logo, representar significa colocar ou pôr.

Entende Spivak33 33 SPIVAK, 2010. que é possível representar por procuração ou por retrato. No entanto, a maneira como essas duas formas de representação se relacionam é extremamente problemática. Os grupos subalternos ou marginalizados não conseguem elaborar um retrato deles mesmos e são, por isso mesmo, representados por outrem, isto é, por aqueles que possuem o poder e os meios de representar. Assim, na representação, conforme observa Neil Lazarus,34 34 Neil LAZARUS, 2006. o que está em jogo é sempre a identidade e a usurpação. Quem representa em sentido político não pode deixar de representar a si mesmo e ao outro no sentido do retrato, e invariavelmente corre o risco de usurpar o espaço alheio, ainda que por inadvertência.

Em outros termos, para Spivak, a representação, no sentido da Darstellung, só é possível dentro do esquema conceitual do pensamento dominante. Logo, o subalterno que aspirar representar sua comunidade, no primeiro sentido evocado por Spivak, isto é, da Vertretung, apenas poderá fazê-lo usando os mesmos esquemas conceituais empregados pelo pensamento hegemônico. Donde o paradoxo: se o subalterno fala a partir de suas próprias representações ele é compreendido; se, ao contrário, ele utiliza esquemas conceituais alheios, corre o risco de deixar de representar sua cultura. Aplicando o raciocínio às perguntas levantadas, pode-se concluir que as mulheres em condição de subalternidade são as "representadas", enquanto aquelas que superam essa condição se colocam como as "representantes".

O objetivo do texto de Spivak não é tanto inviabilizar a representação, alheia ou de si mesmo, mas é especialmente indicar o fato de que os grupos marginalizados são sempre intermediados pela voz de outrem, isto é, por aqueles que possuem o poder de representar e de descrever, e que controlam, assim, a maneira como os que não detêm idênticos poderes serão vistos. A questão que se coloca, no entanto, é saber se existe saída para esse impasse.

É possível imaginar a criação de espaços de interlocução e intermediação nos processos de representação. Nesse sentido, a própria Spivak35 35 SPIVAK, 2010. trabalha com o tema da tradução cultural e lança pistas sobre o assunto. Na instigante interpretação por ela proposta do mito de Eco, a ninfa que repete sempre a última frase que escuta seria ao mesmo tempo metáfora dos sujeitos subalternos, ou seja, todos aqueles privados do direito de falar, e alegoria da tradução e da apropriação subversiva do discurso dominante. Para Spivak, há sempre algo de potencialmente subversivo na reiteração parcial de um discurso, pois a repetição pode produzir efeitos inesperados exatamente a partir do corte ou fragmentação daquilo que foi dito. A apropriação é capaz de incidir, como uma espécie de refluxo, sobre a própria forma como o discurso dominante se configurou originalmente.

2.3 Representação estética

No lugar de oferecer uma resposta ao impasse da representação, debrucemo-nos agora sobre o último sentido do termo aqui indicado: a representação estética. Na realidade, essa representação não deixa de ser também política, posto que não são poucas as relações entre estética e política, como já demonstrou Rancière.36 36 Jacques RANCIÈRE, 2009. A delimitação se dá, pois, pelo fato de que aqui serão abordados temas inseridos propriamente no campo da arte, tais como o olhar e a construção de imagens.

Na esfera dos estudos feministas, os problemas trazidos pela construção de imagens se expressam numa longa trajetória de afirmações e revisões sobre o tema do olhar. Alguns pontos desse percurso são relativamente pacíficos, outros, entretanto, ensejam grande polêmica. O marco inicial da crítica feminista é a ideia de que o olhar não é um ato neutro, mas uma operação submetida a uma gestão social, a um conjunto de instruções bastante precisas. No entender de John Berger,37 37 John BERGER, 1987. por exemplo, autor sempre citado nessa discussão, existe na arte ocidental um "regime do olhar", segundo o qual os homens agem enquanto as mulheres aparecem. São os homens que olham para as mulheres e estas estão sempre se vendo e sendo vistas, ou seja, as mulheres estão relacionadas a uma postura passiva, enquanto a ação, a intervenção no mundo e a capacidade de criação estão destinadas aos homens.

Para Berger, como em uma espécie de mise en abyme, estamos sempre diante de imagens que constroem outra imagem, uma segunda representação, que "determina não só a maioria das relações entre homens e mulheres como também as relações das mulheres consigo próprias".38 38 BERGER, 1987, p. 51. Tais imagens enviam informações sobre "o que é e não é o feminino", ensinam sobre como deve (ou não) parecer e agir uma "mulher", com vistas a um olhar masculino, mas também em relação ao olhar das outras mulheres. Ser feminina, antes de tudo, é aparecer como espetáculo (speculum, espelho) às vistas dos homens e das demais mulheres. Quando as mulheres olham as imagens que delas são produzidas (outrora na pintura, hoje principalmente na publicidade e no cinema), elas não olham a si próprias, mas para um protótipo feminino construído por homens. Ora, pode-se perguntar, existiria um "corpo" feminino antes de sua representação?39 39 Interessante notar que a oposição corpo versus discurso esteve presente nas reivindicações por direitos das mulheres na década de 1970 na Europa. Movimentos feministas que reivindicavam autonomia sobre o próprio corpo consideravam que os discursos eram usados por aqueles que possuíam o "poder da fala" para oprimir, enquanto o "silêncio" dos corpos que reivindicavam fora dos enquadramentos discursivos, com gestos, com movimentos, poderia libertar. Ver, a esse respeito, Alain CORBIN; Jean-Jacques COURTINE e Georges VIGARELLO, 2006.

Sobre o assunto, as feministas estão longe de produzir consenso. Uma estratégia constante tem sido romper com a própria ideia de autenticidade. Para Monique Wittig,40 40 Monique WITTIG, 2007. por exemplo, mais que um dado imediato, "mulher", da mesma forma que "raça", é "marca" criada pela estrutura social. Em outros termos, é uma "formação imaginária", mítica, que faz com que determinados traços físicos sejam socialmente percebidos e interpretados como designandos "à mulher".

Em The Straight Mind, Wittig41 41 WITTIG, 2007. enunciou a famosa frase segundo a qual "as lésbicas não são mulheres". Partindo de uma análise materialista, Wittig sustentou que as lésbicas estariam desde sempre fora da "lei", já que se recusariam a exercer o papel social e político de mulher. Para Wittig, o que define uma lésbica não é a preferência sexual, mas precisamente sua recusa política de ser uma mulher. A atitude lésbica seria, assim, um ato de insurgência; sua própria existência já ensejaria uma reavaliação do mundo social e de sua economia heterossexual. As lésbicas questionariam convenções sobre virilidade e reprodução, entre outras, e escapariam às representações tradicionais da mulher.

Para Wittig,42 42 WITTIG, 2007. as imagens de mulheres que aparecem em filmes, revistas e cartazes publicitários representam não apenas um discurso abstrato, mas uma "violência material" agindo sobre as pessoas. Elas são parte da straight mind, mente reta, direta, hetero, um sistema de signos real, segundo o qual, diz Wittig, ser mulher é agir como "um animal bem domado". Daí que, para ela, o feminismo radical, no lugar de engajar-se pela emancipação da mulher, deveria, na verdade, lutar para fazê-la desaparecer, isto é, para abolir o Outro e torná-lo Um.

Teria, pois, a figura da lésbica, o condão de romper com os estereótipos de feminilidade? Refletindo sobre o assunto, Judith Butler43 43 BUTLER, 1997. tenta mostrar que a mulher lésbica não desmonta por si só o regime da heterossexualidade, simplesmente porque a sexualidade não pode fugir das estruturas de poder. No entanto, partindo da perspectiva de que não existe a mulher original, a estratégia lésbica pode fazer uso da paródia (menos no sentido do humor, e mais na perspectiva da repetição) para desestabilizar, de algum modo, as representações tradicionais. É o caso, por exemplo, de casais lésbicos nos quais uma das partes (butch, em gíria inglesa) age segundo o estereótipo masculino, enquanto a outra (fem) atua segundo as normas de feminilidade. Inexistindo papéis sexuais autênticos, observa Butler, tais casais copiam a cópia, isto é, imitam a própria imagem daquilo que as pessoas pensam ser natural. Tal imitação é de alguma maneira subversiva, na medida em que, ao manusear, de modo ostensivo e excessivo, os supostos traços de feminilidade e masculinidade, ela termina por deformar o significado por completo.

Menos otimista em relação a essa estratégia, Teresa de Lauretis44 44 Teresa DE LAURETIS, 2007. lembra que não existe um sujeito lesbiano unificado, tampouco um espectador generalizado a consumir a reprodução. O grande desafio que se apresenta à estética feminista é, então, criar estratégias de representação que alterem a própria estrutura de referência daquilo que pode ser visto. O que se faz necessário, pois, é outra política de visibilidade que leve em conta a pluralidade de sujeitos envolvidos.

Outro aspecto da representação imagética ao qual a crítica feminista da arte dedicou grande atenção foi o do prazer visual. Para Laura Mulvey,45 45 Laura MULVEY, 2003. autora de um texto clássico sobre o assunto, publicado na década de 1970, o olhar estaria situado em uma relação assimétrica, na qual o observador se encontraria sempre em posição de superioridade em relação ao que é observado. O "olhar" seria uma forma específica de "ver", articulada à "pulsão escópica" (ou escopo-filia) descrita por Freud: o desejo/prazer de ver (voyerismo/narcisismo) e o desejo/prazer de ser visto (exibicionismo). Para Mulvey, as convenções do cinema clássico de Hollywood reproduzem os desejos dos espectadores masculinos: o homem é o sujeito ativo da narrativa enquanto às mulheres cabe o papel passivo de objeto de gozo visual, seja como seres belos e glamorosos, seja como femmes fatales ameaçadoras, cuja história se encerra invariavelmente num episódio trágico.

Nos últimos anos, a crítica feminista da arte tem procurado pensar o tema do olhar de modo mais ampliado, interessando-se não apenas pelo visualizador, mas também pelo olhar que a imagem lança sobre aquele que a observa e pela relação que vem a se estabelecer entre ambos. Perspectivas teóricas mais abrangentes sobre o olhar foram desenhadas pela semiótica social e pelos chamados Gender Studies. Em Alice doesn’t, por exemplo, Teresa de Lauretis46 46 DE LAURETIS, 1984. alerta para a multiplicidade de identificações possíveis entre as espectadoras e as imagens projetadas na tela, que não se reduzem ao simples par projeção/identificação. Criticando a perspectiva de Mulvey,47 47 MULVEY, 2003. Teresa de Lauretis48 48 LAURETIS, 1984. busca mostrar que o prazer proporcionado nas mulheres pela narrativa fílmica convencional não pode ser reduzido ao puro masoquismo. Em outras palavras, um cinema feminista não precisaria ser necessariamente um cinema de contraposição aos modelos narrativos e de feminilidade elaborados especialmente pelos estúdios de Hollywood.

Os Gender Studies, dentro dos quais as autoras acima se inserem, ofereceram ao feminismo uma interessante teoria sobre a representação, a produção cultural, o imaginário social e os processos de subjetivação feminina. Ao mesmo tempo, entretanto, tais estudos foram duramente criticados, entre outras coisas, por terem dissolvido ou fragmentado o sujeito feminista tradicional, dificultando assim a luta política das mulheres. Com efeito, os textos vinculados a esse campo de estudo seguem à risca a ideia de que "a mulher" não pode simplesmente ser pensada como "o Outro", isto é, como diferença per se. A identidade feminina apenas pode ser concebida em parâmetros posicionais, isto é, como identidade aberta, parcial, não definitiva, construída sempre a posteriori, e não como uma identidade dada de antemão. Nesse ponto de tensão, fica muito evidenciada a vinculação entre a representação estética e a representação política. As dificuldades de representar a mulher implicam diretamente na fragilização do sujeito político dos movimentos feministas, pois se a mulher não pode ser representada, fica difícil identificar com nitidez o que seriam as reivindicações "feministas".

Ainda no terreno estético, os Gender Studies também foram responsáveis pela inauguração dos estudos dos corpos associados à tecnologia, ensejando novas formas de representação feminina. A chamada estética queer, uma vertente dos Gender Studies, levou a fundo a ideia do corpo como tecnologia e fez dele o principal cenário artístico, não só através da performance teatral e da dança, mas também fazendo uso de intervenções diretas (mutilações, cirurgias plásticas e implantes de próteses), como exemplificam os trabalhos da artista francesa Orlan.49 49 Artista plástica francesa, nascida em 1947, autora de um manifesto intitulado Arte Carnal, Orlan é conhecida notadamente pelo fato de utilizar o próprio corpo como lugar de intervenção artística através de operações cirúrgicas. Para mais informações sobre o seu trabalho ver: http://www.orlan.eu

A estética queer proporcionou também o surgimento de pontos de vista mais flexíveis sobre o olhar artístico, que levam em consideração a diversidade de espectadores e a pluralidade de estilos. Judy Chicago, Barbara Kruger e Paula Rego,50 50 Judy Chicago adotou como nome artístico a designação de sua cidade natal após o falecimento do pai e do marido como uma espécie de gesto simbólico de libertação do domínio masculino. Com obras espalhadas por grandes coleções e museus do mundo, é considerada uma pioneira do movimento feminista em artes plásticas. Barbara Kruger, por sua vez, é uma artista conceitual que emprega a linguagem dos veículos da mídia para subvertê-los, focalizando, entre outros temas, a condição feminina. Paula Rego, por fim, mais conhecida do público brasileiro, é artista portuguesa que também reclama um ponto de vista feminista sobre a arte, tendo se destacado por obras que causaram escândalo devido às questões da sexualidade e da morte. entre outras, são exemplos de artistas plásticas que romperam com os códigos tradicionais de representação da mulher, trabalhando com imagens femininas nas quais os cânones de beleza se fazem ausentes. Outras artistas questionaram os padrões de representação dominantes através da construção de representações "perturbadoras" do corpo feminino, como a doença, a obesidade e a velhice, trabalhando no plano do que Julia Kristeva chamou de abjeção.

Com efeito, mesmo que a representação estética feminista tradicional tenha sido abalada com o surgimento dos Gender Studies, algumas questões relacionadas com a política do olhar teimam em persistir. Apesar da diversificação das figurações e representações das mulheres na arte contemporânea, bem como do surgimento de práticas que questionam e resistem aos padrões de feminilidade e de heterossexualidade compulsória, a produção artística hegemônica – o chamado mainstream – parece permanecer submetida aos princípios basilares de uma economia visual patriarcal. Dessa forma, passados 60 anos do surgimento da arte de vanguarda, não soa descabido insistir em perguntar se somos, de fato, capazes de olhar e, sobretudo, de produzir imagens femininas de outro modo.

3 Considerações finais

"A sociedade respira e transpira representações", diz Luiz Costa Lima em um instigante livro dedicado ao tema da mímesis.51 51 Costa LIMA, 2003, p. 88. Isso porque o homem não pode prescindir desses esquemas cognitivos que lhe traduzem a realidade (ainda que de modo deformado) e ao mesmo tempo orientam e organizam seus comportamentos. O estatuto da representação, contudo, é objeto de um vastíssimo (e talvez infindável) debate teórico que, nos limites deste trabalho, apenas pôde ser mencionado. O que se pretendeu aqui foi simplesmente apontar alguns caminhos de investigação sobre os problemas que acompanham o ato de representar, em pelo menos três grandes planos, no campo dos estudos feministas, incluindo os Gender Studies. Assim, uma conclusão inicial é a de que a imagem ocupa o núcleo de nossas representações. Em outros termos, falar de representação é sempre tratar da imagem.

Contudo, convém aludir aqui ao sentido original da palavra alemã para imagem, bild, cujo significado, sublinha Olivier Grau,52 52 Olivier GRAU, 2007. remete menos ao pictórico e mais à essência do viver, isto é, ao agir que toma corpo como uma obra. Isso esclarece melhor a dinâmica da representação, não somente como retrato externo de algo, mas enquanto prolongamento daquele que representa, sua reduplicação, seu perfazer-se, tal como ocorre na performance teatral.

Essa ideia de performance é interessante para pensarmos também a representação política. Esta precisa talvez deixar de ser vista como mera substituição do representado ou autorização para alguém tomar decisões em seu lugar, confinada a um espaço determinado (a assembleia), para ser concebida como um processo mais dinâmico, uma representação criada e constantemente recriada a partir de múltiplas fontes de comunicação e responsabilização, como sugere a própria Pitkin53 53 Hanna PITKIN, 2006. em texto citado neste trabalho.

Outra pista de trabalho apontada neste breve artigo é a de que não devemos pensar a representação como um mecanismo passivo que apenas descreve ou imagina a realidade. Bem ao contrário, a representação estabelece um modelo de realidade a ser seguido, um parâmetro a partir do qual as subjetivações são elaboradas. Desse modo, como já havia observado Michelle Perrot, as mulheres, do ponto de vista histórico, mais do que retratadas ou contadas, são concebidas e construídas a partir de um "bloco de representações que as cobrem e que é preciso necessariamente analisar sem saber como elas mesmas as viam e as viviam", daí uma das dificuldades de se fazer uma história das mulheres.54 54 PERROT, 2005.

Ora, o que vale para o passado pode valer igualmente para o presente. Lorella Zanardo e Marco Malfi Chindemi produziram, no ano de 2009, um instigante documentário, largamente difundido na internet, intitulado "Il corpo dele donne" (O corpo da mulher). Construído a partir da visualização de 400 horas de televisão italiana, canais privados e públicos confundidos, o documentário apontou para a presença constante de uma imagem "contrafática" das mulheres. No entender de Lorella Zanardo (que posteriormente transformou o documentário em livro com idêntico título), as mulheres concretas com as quais convivemos são substituídas nas emissões televisivas por um conjunto de representações que reforçam estereótipos de gênero e buscam disciplinar o corpo do sexo feminino a partir de padrões masculinos.55 55 Lorella ZANARDO, 2010. Isso reforça a última conclusão do presente artigo: as representações elaboram os espaços e esquemas a partir dos quais os sujeitos se veem, posicionam-se e podem falar. Daí a importância de uma compreensão mais rebuscada dessa categoria pelos estudos feministas. Analisar o estatuto das representações do feminino importa porque estamos tratando, afinal, de um aspecto essencial de nossa cultura, de nossa educação, algo que tem consequências práticas que ainda não sabemos exatamente como enfrentar.

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[Recebido em 16 de novembro de 2012, reapresentado em 24 de junho de 2013 e aceito para publicação em 20 de junho de 2013]

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  • 2
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  • 3
    Jean BAUDRILLARD, 1991.
  • 4
    Fredric JAMESON, 2001.
  • 5
    O termo latino
    repraesentatio, originado no campo do direito, também alude a essa ideia de uma presença ausente. O representante, seja ele procurador, tutor ou guardião, é aquele que fala e age em nome de outro. Contudo, o termo em latim também conota a ideia de similitude ou semelhança. No final do Império Romano, há, em todas as cidades do Império, uma estátua do imperador que ostenta o título de
    divus, e que através de seus traços representa os traços do deus. No cristianismo, por sua vez, é por similitude representativa, como diz Agostinho, que conhecemos a Deus, e não diretamente. (ENCYCLOPÉDIE PHILOSOPHIQUE UNIVERSELLE, 1990).
  • 6
    André JACOB, 1990.
  • 7
    Jorge Luis BORGES, 1982.
  • 8
    Sobre o tema, ver CARLSON, 2010.
  • 9
    Umberto ECO, 1989.
  • 10
    Nicolas TENZER, 1994.
  • 11
    Hanna PITKIN, 2006.
  • 12
    Pierre GLAUDES, 1999.
  • 13
    André-Jean ARNAUD, 1999.
  • 14
    Bernard EDELMAN, 2007.
  • 15
    AULETE, 1980.
  • 16
    O mesmo argumento será retomado por Olympe de Gouges em 1791 em sua
    Declaração dos direitos da Mulher e da cidadã e por alguns pensadores iluministas, entre os quais Condorcet. Para o pensador francês, o direito natural e os princípios de uma república exigem a participação de todos os indivíduos. Por outro lado, estes não podem ser representados senão por aqueles que possuem os mesmos interesses. Ver Marquis de CONDORCET; Olympe DE GOUGES e Jean Le Rond DE LAMBERT, 1993; e Gabriella GROPPI e Angela BONACCHI, 1995.
  • 17
    BONACCHI e GROPPI, 1995, p. 92.
  • 18
    Hanna PITKIN, 1967, 2006.
  • 19
    Na acepção que Emmanuel Renault e Axel Honneth atribuem à expressão. Ver Emmanuel RENAULT 2004; e Axel HONNETH, 2006.
  • 20
    Michel FOUCAULT, 1985.
  • 21
    Jürgen HABERMAS, 1999.
  • 22
    Charles Wright MILLS, 2006.
  • 23
    MILLS, 2010.
  • 24
    Simone BEAUVOIR, 2010, p. 228, tradução nossa.
  • 25
    Pierre BOURDIEU, 2009.
  • 26
    Judith BUTLER, 1977.
  • 27
    Jacques DERRIDA, 1973.
  • 28
    BUTLER, 1997.
  • 29
    Iris Marion YOUNG, 2006.
  • 30
    YOUNG, 2006, p. 142.
  • 31
    YOUNG, 2006, p. 149.
  • 32
    Gayatri C. SPIVAK, 2010.
  • 33
    SPIVAK, 2010.
  • 34
    Neil LAZARUS, 2006.
  • 35
    SPIVAK, 2010.
  • 36
    Jacques RANCIÈRE, 2009.
  • 37
    John BERGER, 1987.
  • 38
    BERGER, 1987, p. 51.
  • 39
    Interessante notar que a oposição corpo
    versus discurso esteve presente nas reivindicações por direitos das mulheres na década de 1970 na Europa. Movimentos feministas que reivindicavam autonomia sobre o próprio corpo consideravam que os discursos eram usados por aqueles que possuíam o "poder da fala" para oprimir, enquanto o "silêncio" dos corpos que reivindicavam fora dos enquadramentos discursivos, com gestos, com movimentos, poderia libertar. Ver, a esse respeito, Alain CORBIN; Jean-Jacques COURTINE e Georges VIGARELLO, 2006.
  • 40
    Monique WITTIG, 2007.
  • 41
    WITTIG, 2007.
  • 42
    WITTIG, 2007.
  • 43
    BUTLER, 1997.
  • 44
    Teresa DE LAURETIS, 2007.
  • 45
    Laura MULVEY, 2003.
  • 46
    DE LAURETIS, 1984.
  • 47
    MULVEY, 2003.
  • 48
    LAURETIS, 1984.
  • 49
    Artista plástica francesa, nascida em 1947, autora de um manifesto intitulado Arte Carnal, Orlan é conhecida notadamente pelo fato de utilizar o próprio corpo como lugar de intervenção artística através de operações cirúrgicas. Para mais informações sobre o seu trabalho ver:
  • 50
    Judy Chicago adotou como nome artístico a designação de sua cidade natal após o falecimento do pai e do marido como uma espécie de gesto simbólico de libertação do domínio masculino. Com obras espalhadas por grandes coleções e museus do mundo, é considerada uma pioneira do movimento feminista em artes plásticas. Barbara Kruger, por sua vez, é uma artista conceitual que emprega a linguagem dos veículos da mídia para subvertê-los, focalizando, entre outros temas, a condição feminina. Paula Rego, por fim, mais conhecida do público brasileiro, é artista portuguesa que também reclama um ponto de vista feminista sobre a arte, tendo se destacado por obras que causaram escândalo devido às questões da sexualidade e da morte.
  • 51
    Costa LIMA, 2003, p. 88.
  • 52
    Olivier GRAU, 2007.
  • 53
    Hanna PITKIN, 2006.
  • 54
    PERROT, 2005.
  • 55
    Lorella ZANARDO, 2010.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      16 Nov 2012
    • Aceito
      20 Jun 2013
    • Revisado
      24 Jun 2013
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