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Autonomia e submissão na autoexposição digital e na exposição violenta de mulheres

Autonomía y sumisión en la auto exposición digital y exposición violenta de mujeres

Resumo:

O artigo discute os significados das experiências de mulheres que passaram pela exposição não autorizada da intimidade, com foco nas possibilidades e desafios ao exercício da autonomia na vivência da sexualidade. Parte-se dos debates nos campos da teoria política feminista e da exposição na cultura digital. Foi realizado trabalho de campo que consistiu em entrevistas em profundidade com 17 meninas e mulheres que tiveram imagens íntimas divulgadas de modo não autorizado, bem como com dez profissionais da saúde e da assistência que atenderam mulheres nessa situação. Observa-se que a problematização das diversas dimensões do desejo, e não apenas da diferenciação da violência, é um caminho frutífero para a compreensão das possibilidades de vivência da sexualidade por parte das mulheres de forma autônoma, sobretudo em suas manifestações contemporâneas.

Palavras-chave:
exposição da intimidade; sexualidade; autonomia; desejo

Resumen:

El artículo discute los significados de las experiencias de mujeres que han pasado por exposición no autorizada de la intimidad, enfocándose en las posibilidades y desafíos para ejercer la autonomía en la experiencia de la sexualidad. El debate se lleva a cabo desde los campos de la teoría política feminista y la exposición en la cultura digital. El trabajo de campo consistió en entrevistas en profundidad a 17 niñas y mujeres a las que se les difundieron imágenes íntimas de manera no autorizada, así como a diez profesionales de la salud y la atención que asistieron a mujeres en esta situación. Se observa que la problematización de las diferentes dimensiones del deseo, y no solo la diferenciación de la violencia, es una forma fructífera de comprender las posibilidades de vivir la sexualidad de las mujeres de manera autónoma, especialmente en sus manifestaciones contemporáneas.

Palabras clave:
exposición de la intimidad; sexualidad; autonomía; deseo

Abstract:

The article discusses the meanings of the experiences of women who have undergone unauthorized exposure to intimacy, focusing on the possibilities and challenges to exercising autonomy in the experience of sexuality. It starts with debates in the fields of feminist political theory and exposure in the digital culture. Field work consisted of in-depth interviews with 17 girls and women who had intimate images disseminated in an unauthorized manner, as well as with 10 health and care professionals who assisted women in this situation. It is observed that the problematization of the various dimensions of desire, and not just the differentiation of violence, is a fruitful way to understand the possibilities of experiencing sexuality by women autonomously, especially in its contemporary manifestations.

Keywords:
Exposure of intimacy; Sexuality; Autonomy; Desire

Introdução

Existe um vasto debate sobre a articulação entre transgressão, prazer e risco nas relações eróticas de mulheres (Maria Filomena GREGORI, 2014GREGORI, Maria Filomena. “Práticas eróticas e limites da sexualidade: contribuições de estudos recentes”. Cadernos Pagu, v. 42, p. 47-74, jun. 2014. (Dossiê Antropologia, Gênero e Sexualidade no Brasil: Balanço e Perspectivas)). A publicação Prazer e Perigo, de Carole Vance (1984VANCE, Carole (Org.). Pleasure and Danger: exploring female sexuality. Boston: Routledge & Kegan Paul, 1984.), foi muito influente nos estudos de gênero e sexualidade no Brasil (Regina FACCHINI, 2016FACCHINI, Regina. “Prazer e perigo: situando debates e articulações entre gênero e sexualidade”. Cadernos Pagu, v. 47, 2016. (Prazer e Perigo: 30 Anos de Debate); GREGORI, 2014; Júlio SIMÕES, 2016SIMÕES, Júlio Assis. “O Brasil é um paraíso sexual - para quem?”. Cadernos Pagu, v. 47, 2016.). Em resposta à tendência conservadora de redução da sexualidade à opressão de gênero, ao risco à violência e à objetificação das mulheres, o texto problematiza a sexualidade como campo que representa, para as mulheres, simultaneamente, perigo, repressão, prazer e descoberta, em que é preciso contemplar as múltiplas questões, sob risco de desconsiderar a desigualdade de gênero ou reforçar o desamparo das mulheres ao ignorar sua possibilidade de atuação (VANCE, 1984VANCE, Carole (Org.). Pleasure and Danger: exploring female sexuality. Boston: Routledge & Kegan Paul, 1984.; SIMÕES, 2016).

Vance (1984VANCE, Carole (Org.). Pleasure and Danger: exploring female sexuality. Boston: Routledge & Kegan Paul, 1984.) defende que o feminismo deve tratar da sexualidade feminina sob o aspecto da opressão que se manifesta na violência, mas também na repressão do desejo, e defender o prazer como direito. A sexualidade deve ser, portanto, um campo de luta, e não domínio de um grupo privilegiado. Entretanto, a autora alerta para o risco de transformar depoimentos pessoais de mulheres sobre suas vivências sexuais em probabilidades ou em prescrições sobre o que é o melhor a ser feito ou evitado.

Este trabalho parte dessas reflexões iniciais para debater a prática, entre mulheres, de compartilhar a própria mídia digital erótica, que tem sido chamada, fora do Brasil, de sexting, e as situações que envolvem violência na divulgação não autorizada dessas mídias, tornada crime no Brasil em 2018 por meio da Lei Federal n.º 13.718 (BRASIL, 2018BRASIL. Lei Federal 13.718, de 24 de setembro de 2018. Dispõe sobre os crimes de importunação sexual. Brasília, 2018. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13718.htm.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...
). Trata-se de um esforço em compreender as fronteiras entre a vivência autônoma da sexualidade e as experiências que envolvem não apenas violência, mas demais aspectos de sujeição das mulheres.

Conforme aponta Yolinliztli Pérez (2017PÉREZ, Yolinliztli. “California define qué es ‘consentimiento sexual’”. Sexualidad, Salud y Sociedad - Revista Latinoamericana, v. 25, p. 113-133, abr. 2017.), o campo dos estudos feministas brasileiro, em comparação ao restante da América Latina, tem se destacado por problematizar, desde a última década, a questão do consentimento na violência sexual contra as mulheres. A autora afirma que o estabelecimento de leis que partem da definição de consentimento - como é o caso da legislação brasileira - eclipsa o debate político que tem como proposta desnaturalizar os comportamentos referentes aos papéis de gênero e relações de poder. Tal debate, dentre demais questões, contribui para a compreensão de que o consentimento não presume autonomia por parte das mulheres ou ausência de violência nas relações, conforme será discutido neste trabalho.

Este artigo está organizado na apresentação dos Métodos empregados na realização do trabalho de campo, seguido dos debates sobre autonomia das mulheres na teoria política feminista e sobre exposição na cultura digital. Posteriormente, são discutidas experiências femininas envolvendo a prática do sexting e a divulgação não autorizada da intimidade, focando nos aspectos da possibilidade de exercício da liberdade e do próprio desejo.

Métodos

Foram realizadas 27 entrevistas em profundidade por videochamada durante o segundo semestre de 2020. Dezessete das entrevistadas eram mulheres que haviam passado pela divulgação não autorizada da intimidade e as outras dez eram profissionais da saúde e da assistência que atenderam mulheres nessa situação. O recrutamento para participação na pesquisa foi realizado via divulgação em redes sociais. Foi disponibilizado um número de WhatsApp da pesquisadora para que mulheres interessadas em compartilhar suas experiências entrassem em contato.

Entre as mulheres que passaram pela experiência da exposição, a faixa de idade compreendeu 17 a 50 anos no momento da entrevista, e as profissionais da saúde e da assistência tinham idade entre 18 e 62 anos. Foram entrevistadas psicólogas, assistentes sociais e estudantes, pertencentes a órgãos de acolhimento às mulheres, quais sejam, jurídicos, de segurança pública, de saúde mental, atendimento privado e projeto voluntário. Foi possível abranger uma diversidade étnico-racial, socioeconômica e também territorial. As entrevistadas pertenciam a diferentes categorias de cor/raça, assim como a diferentes origens sociais. As mulheres que passaram pela experiência da violência pertenciam a dezoito cidades de seis estados brasileiros (uma mulher foi exposta também no contexto de uma cidade de grande porte no exterior), sendo capitais, cidades do interior, litorâneas, e regiões metropolitanas de pequeno e médio porte. Entre as profissionais, foram abrangidos cinco municípios de um mesmo estado - capital, município de região metropolitana de pequeno porte e municípios do interior de médio e pequeno porte.

Às mulheres que foram expostas foi solicitado que narrassem como suas imagens íntimas foram produzidas e divulgadas, de que modo isso as afetou e se buscaram algum tipo de ajuda, seja no âmbito das relações pessoais ou institucionais, como em serviços de apoio jurídico ou de saúde. As entrevistas com as profissionais envolveram a descrição detalhada dos casos atendidos, os danos causados, os cuidados dispensados e os desafios para com esse tipo de atendimento. Às mulheres expostas e às profissionais foi perguntado suas perspectivas sobre os cuidados e atenção às mulheres que passam por essa experiência, tema explorado em outro trabalho (Laís PATROCINO; Paula BEVILACQUA, 2021PATROCINO, Laís Barbosa; BEVILACQUA, Paula Dias. “Divulgação não autorizada de imagem íntima: danos à saúde das mulheres e produção de cuidados”. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v. 25, p. 1-15, 2021a.a).

A duração média das entrevistas foi superior a 70 minutos. As entrevistas foram gravadas e registradas por escrito. Os registros foram enviados e validados por todas as participantes da pesquisa. Foi empregada a análise de conteúdo (Romeu GOMES, 2001GOMES, Romeu. “A Análise de Dados em Pesquisa Qualitativa”. In: MINAYO, Maria Cecília de Souza. Pesquisa Social. Teoria, método e criatividade. 18 ed. Petrópolis: Vozes, 2001.), com unidades e categorias de análise definidas com base em estudos prévios e nas questões trazidas pelas participantes.

Os procedimentos de pesquisa foram previamente avaliados e aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Para participação de menor de idade, foram assinados termos de consentimento e assentimento por responsável legal. As descrições étnico-raciais foram feitas com base na autodeclaração. Os nomes utilizados no trabalho são fictícios, como meio de preservar a identidade das participantes.

Autonomia das mulheres: entre a defesa e a desconfiança

Flávia Biroli (2013BIROLI, Flávia. “Autonomia, opressão e identidades: a ressignificação da experiência na teoria política feminista”. Revista Estudos Feministas, v. 21, n. 1, p. 81-105, abr. 2013a.a; 2013BIROLI, Flávia. “Democracia e Tolerância à Subordinação: Livre-escolha e Consentimento na Teoria Política Feminista”. Revista de Sociologia e Política, v. 28, n. 48, p. 127-142, dez. 2013b.b) traz grande contribuição ao debate sobre autonomia das mulheres e democracia confrontando diferentes perspectivas no campo da teoria política feminista. No primeiro artigo (BIROLI, 2013BIROLI, Flávia. “Autonomia, opressão e identidades: a ressignificação da experiência na teoria política feminista”. Revista Estudos Feministas, v. 21, n. 1, p. 81-105, abr. 2013a.a), a autora explora e tenta encontrar caminhos para superar, pensando especificamente a condição das mulheres, o que é considerado o dilema sociológico clássico, a oposição entre a agência e autonomia dos sujeitos sociais e as forças coercitivas exercidas pelas instituições produtoras das individualidades. O que se pretende é pensar em que medida os comportamentos das mulheres podem ser considerados como reação às formas de opressão, mas também modos de reproduzi-las.

Neste trabalho, tal questão é pensada com relação à prática do sexting por parte das mulheres. Questiona-se em que medida a prática compreende autonomia na vivência da sexualidade, nos modos de se representar, mas também submissão a valores androcêntricos, sobretudo no que concerne à objetificação e à padronização do corpo feminino.

Biroli (2013BIROLI, Flávia. “Autonomia, opressão e identidades: a ressignificação da experiência na teoria política feminista”. Revista Estudos Feministas, v. 21, n. 1, p. 81-105, abr. 2013a.a; 2014BIROLI, Flávia. “O debate sobre pornografia”. In: BIROLI, Flávia. Feminismo e Política. São Paulo: Boitempo, 2014. p. 131-138.) chama atenção para o risco de, ao enfocar a opressão em detrimento da autonomia das mulheres, produzirmos desvalorizações de suas vivências e dos modos de ressignificação das normas, tanto do ponto de vista político quanto cognitivo. Por outro lado, não se pode deixar de considerar o poder das estruturas opressivas e os modos como produzem comportamentos adaptativos. A partir da revisão feita por Biroli (2013a) pode-se contrapor perspectivas de influência fenomenológica que enfocam as vivências e subjetividades, não estando essas totalizadas nas estruturas sociais e categorias de análise como gênero, raça e classe, e os estudos pós-críticos que enfatizam a impossibilidade de experiências puras, anteriores às influências socioculturais.

Ainda no campo da primeira perspectiva, Biroli (2013BIROLI, Flávia. “Autonomia, opressão e identidades: a ressignificação da experiência na teoria política feminista”. Revista Estudos Feministas, v. 21, n. 1, p. 81-105, abr. 2013a.a) faz referência aos estudos maternais, como, por exemplo, as primeiras produções sobre a teoria do cuidado, que enfatizavam, de um ponto de vista positivo, a construção de uma ética própria das mulheres. Além das questões relativas à maternidade e ao cuidado, a autora ainda cita produções que exaltam a possibilidade de práticas voltadas para os padrões de beleza de forma autônoma, como sendo apenas uma questão de escolhas livres de coerção. A esse mesmo contexto, podem ser relacionados diversos modos de comportamento que expressam de maneira mais evidente as ambiguidades entre submissão e autonomia, entre os quais poderíamos citar, além do tema tratado neste trabalho, a relação das mulheres com a música funk no Brasil (Samyra RODRIGUES, 2018RODRIGUES, Samyra Ferreira Ramos. O feminino em multissemioses: os discursos da e sobre a mulher no funk brasileiro. 2018. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino) - Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, PB, Brasil.).

Em oposição a esses estudos, está o argumento de que a valorização de papéis tradicionais obstaculiza a consideração de projetos de vida alternativos, considerando também que tais padrões de identificação carregam em si modos de opressão e hierarquização. Nesse caminho, Biroli (2013BIROLI, Flávia. “Autonomia, opressão e identidades: a ressignificação da experiência na teoria política feminista”. Revista Estudos Feministas, v. 21, n. 1, p. 81-105, abr. 2013a.a) ressalta a produção de Catharine MacKinnon (1987), para quem contextos de relações de gênero assimétricas impossibilitam experiências livres de opressão. O domínio da perspectiva masculina no Estado e na indústria cultural obstaculiza a definição das mulheres como sujeitos, por constituir os referenciais subjetivos para as próprias mulheres. Uma das questões caras à análise da autora é a sexualidade. Para MacKinnon (1987), o modo de dominação erotizado é vivenciado como sexo. Na contramão da defesa da existência de comportamentos autônomos, a autora defende justamente o amplo processo de compreensão de que não são. A base para a transformação seria a consciência de que os valores opressivos são comuns às mulheres e de que as privam de sua identidade autônoma, possibilitando-as ressignificar suas experiências.

MacKinnon (1987) ironiza a perspectiva de que a livre expressão da sexualidade das mulheres reduziria a violência sob justificativa de que o sexo estaria mais disponível aos homens e ajudaria a distinguir a confusão entre sexo e violência. Para a autora, seria como se o ato de aceitar ou de deixar de resistir anulasse a violação sexual. O perigo nas relações sexuais é tratado como fetiche, e as reivindicações das mulheres são apropriadas pelos homens na produção de pornografia. A autora afirma: “Hablando en términos de roles, el que vive placer en la ilusión de libertad y seguridad dentro de la realidad de peligro es la ‘muchacha’; el que vive placer dentro de la realidad de libertad y seguridad en la ilusión del peligro es el ‘muchacho’” (MacKINNON, 1987MacKINNON, Catharine A. Toward a Feminist Theory of the State. Cambridge: Harvard University Press, 1987. (Revisado por Deborah Schwenk) Disponível em Disponível em https://heinonline.org/HOL/LandingPage?handle=hein.journals/worts12÷=24&id=&page= . Acesso em 19/06/2020.
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, p. 11).

Para MacKinnon (1987), o sexo representado na indústria hegemônica é constituído da violência, não sendo essa externa - o universo da sexualidade na cultura androcêntrica é violento em si. Na visão hegemônica, não faz sentido separar sexo e violência; da sexualidade masculina, se deduz pornografia. O crescimento da indústria pornográfica, observado pela autora, corroborou sua perspectiva.

A indistinção entre manifestação sexual e violência se faz fortemente presente no contexto da prática do sexting e da divulgação não autorizada da intimidade, até mesmo no campo acadêmico-científico, questão debatida pelas autoras em outro trabalho (PATROCINO; BEVILACQUA, 2021PATROCINO, Laís Barbosa; BEVILACQUA, Paula Dias. “Sobre risco, violência e gênero: revisão da produção da saúde sobre o sexting entre jovens”. Ciência & Saúde Coletiva, v. 26, p. 2709-2718, 2021b.b). Ademais, há uma exploração comercial, por parte da indústria pornográfica, de mídias eróticas de mulheres divulgadas, e, às vezes, produzidas sem autorização, e até mesmo em situações de violência sexual, conforme relatado em estudo e em denúncia jornalística (Beatriz LINS, 2019LINS, Beatriz Accioly. Caiu na rede: mulheres, tecnologias e direitos entre nudes e (possíveis) vazamentos. 2019. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social) - Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.; Megha MOHAN, 2020MOHAN, Megha. “Eles me estupraram e postaram o vídeo do crime em um site pornô”. BBC News Brasil, 2020. Disponível em Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/geral-51409142 . Acesso em 21/07/2020.
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). Embora algumas páginas pornográficas anunciem que não expõem mídias não autorizadas, não parece haver qualquer esforço em se certificar sobre isso, culminando em uma sequência de violações às mulheres, cujas imagens passam a servir também a fins comerciais. No contexto desta pesquisa, algumas mulheres revelaram temer que suas mídias fossem hospedadas em páginas de pornografia.

Segundo MacKinnon (1987), a coisificação da mulher é tão grande que afirmar que a mulher tem possibilidade de escolha seria uma estratégia de conservar a saúde mental diante da falta de alternativa. A sexualidade das mulheres, para a autora, lhes pertence como não lhes pertence, não se tratando de um valor intrínseco, mas ao fato de que sua forma é uma resposta à falta de poder, criada a partir de opressão e exclusão.

[...] interpretar la sexualidad femenina como una expresión de la acción y la autonomía de las mujeres, como si el sexismo no existiera, siempre es denigrante, bizarro y reduccionista [...] Mientras la desigualdad sexual siga siendo desigual y sexual, los intentos por valorar la sexualidad como propio de las mujeres, posesiva como si las mujeres la poseyeran, seguirá formando parte del acto de limitar a las mujeres a su actual definición de lo que son. Fuera de revelaciones fugaces realmente momentáneas y ocasionales (aunque la mayoría de la gente cree que vive su vida sexual entera dentro de ellas) la búsqueda de una sexualidad igualitaria sin una transformación política equivale a buscar la igualdad bajo condiciones de desigualdad (MacKINNON, 1987MacKINNON, Catharine A. Toward a Feminist Theory of the State. Cambridge: Harvard University Press, 1987. (Revisado por Deborah Schwenk) Disponível em Disponível em https://heinonline.org/HOL/LandingPage?handle=hein.journals/worts12÷=24&id=&page= . Acesso em 19/06/2020.
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, p. 22).

Nesse sentido, MacKinnon (1987), usar o consentimento como a referência que diferencia o sexo da violência serve apenas a fins legais conformistas. Esta questão é debatida por Biroli (2013BIROLI, Flávia. “Democracia e Tolerância à Subordinação: Livre-escolha e Consentimento na Teoria Política Feminista”. Revista de Sociologia e Política, v. 28, n. 48, p. 127-142, dez. 2013b.b) na confrontação do conceito de consentimento na teoria política feminista com as concepções neoliberais. Tais perspectivas divergem pela premissa feminista de que as escolhas dos indivíduos remetem a suas posições sociais, em oposição à concepção liberal de autonomia e voluntarismo. Nessa perspectiva, as escolhas são entendidas como cálculos mentais individuais que pressupõem livre-escolha, sem sofrer qualquer modo de coerção ou estabelecer relação com o contexto externo. Já para o feminismo, e especialmente para autoras como MacKinnon (1987), não se pode presumir consentimento de modo autônomo em contextos assimétricos e de relações de dominação e opressão. Ademais, em sociedades democráticas, o estabelecimento de contratos pressupõe, ao mesmo tempo, autonomia para firmá-los, mas sua negação na concessão de direitos. Tal debate remete ainda ao fato de que, nas teorias clássicas do contrato, as mulheres eram incapazes de consentir (BIROLI, 2013BIROLI, Flávia. “Democracia e Tolerância à Subordinação: Livre-escolha e Consentimento na Teoria Política Feminista”. Revista de Sociologia e Política, v. 28, n. 48, p. 127-142, dez. 2013b.b).

Ainda que o trabalho de MacKinnon possa ser interpretado como um modo de reprodução da vitimização das mulheres e uma descrença em sua capacidade de compreensão e manejo dos mecanismos de opressão (BIROLI, 2013BIROLI, Flávia. “Democracia e Tolerância à Subordinação: Livre-escolha e Consentimento na Teoria Política Feminista”. Revista de Sociologia e Política, v. 28, n. 48, p. 127-142, dez. 2013b.b; 2014BIROLI, Flávia. “O debate sobre pornografia”. In: BIROLI, Flávia. Feminismo e Política. São Paulo: Boitempo, 2014. p. 131-138.), não se pode perder de vista a centralidade de seu questionamento sobre as estruturas de poder que controlam os discursos e dão mais visibilidade a uns que a outros, e seus efeitos sobre a construção social das desigualdades e violências (BIROLI, 2013b).

Autoexposição no espaço digital: entre conquistas e reproduções

E ninguém me entendia, admiravam-se que, depois de tantos anos de reclusão e disciplina, eu só quisesse, só aspirasse à liberdade e aos prazeres proibidos. Como se a prisão acostumasse o prisioneiro, e ele, depois de solto, não desejasse mais nada senão voltar à farda de preso e à ronda noturna no pátio! As Três Marias (Rachel de QUEIROZ, 1973QUEIROZ, Rachel. As Três Marias. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1973.)

A reconhecida obra A sociedade do espetáculo, escrita por Guy Debord (2003DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. eBooks Brasil, 2003.) na década de 1960, no contexto de expansão capitalista e dos meios de comunicação, e, consequentemente, da cultura mercadológica e de consumo, trouxe a ideia do espetáculo como a expressão máxima do capitalismo, revelado na relação social mediada por imagens. Nessa relação, a realidade é esvaziada de sentido. Há uma degradação anterior do ‘ser’ em ‘ter’, que culmina no ‘parecer’. Seu meio é seu próprio fim e sua reprodução envolve uma aceitação social passiva. Esse modo de vida é assim explicado por Debord: “À medida que a necessidade se encontra socialmente sonhada, o sonho torna-se necessário. O espetáculo é o mau sonho da sociedade moderna acorrentada, que ao cabo não exprime senão o seu desejo de dormir. O espetáculo é o guardião deste sono” (DEBORD, 2003DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. eBooks Brasil, 2003., p. 21). Para o autor, há uma relação direta entre a apropriação desse modo de vida, cada vez mais disseminado, e a alienação de si.

A alienação do espectador em proveito do objeto contemplado (que é o resultado da sua própria atividade inconsciente) exprime-se assim: quanto mais ele contempla, menos vive; quanto mais aceita reconhecer-se nas imagens dominantes da necessidade, menos ele compreende a sua própria existência e o seu próprio desejo. A exterioridade do espetáculo em relação ao homem que age aparece nisto, os seus próprios gestos já não são seus, mas de um outro que lhos apresenta. Eis porque o espectador não se sente em casa em parte alguma, porque o espetáculo está em toda a parte (DEBORD, 2003DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. eBooks Brasil, 2003., p. 30).

Para além da exposição da imagem que é intensificada com a expansão do acesso à internet, está a questão da intimidade. Edvaldo Couto (2015COUTO, Edvaldo de Souza. “Educação e redes sociais digitais: privacidade, intimidade inventada e incitação à visibilidade”. Em Aberto, v. 28, n. 94, p. 51-61, dez. 2015.) retoma Walter Benjamim para discutir como a intimidade e a privacidade da vida doméstica dão lugar à vida pública com o processo histórico de modernização, tecnologização e consumo. Na cibercultura, a intimidade é reivindicada a ponto de passar a existir abstratamente, apesar das reivindicações sobre segurança na internet.

[...] as agonias felizes do estatuto do eu cada vez mais ficcional nas redes criam outros intensos aprisionamentos e submissões, provavelmente mais tirânicos do que aqueles da privacidade. Parece que, quanto mais as pessoas se expõem e conquistam visibilidade, mais vulneráveis se tornam na esfera pública (COUTO, 2015COUTO, Edvaldo de Souza. “Educação e redes sociais digitais: privacidade, intimidade inventada e incitação à visibilidade”. Em Aberto, v. 28, n. 94, p. 51-61, dez. 2015., p. 59).

Em meio aos debates sobre vulnerabilidade, submissão e reprodução de normas culturais, estão as perspectivas analíticas que se dispõem a considerar as potencialidades do uso do espaço digital como ferramenta comunicadora. Couto e colaboradoras, em outro trabalho (COUTO; Joseilda SOUZA; Barbara NEVES, 2013COUTO, Edvaldo Souza; SOUZA, Joseilda Sampaio de; NEVES, Barbara Coelho. “Acepções de Tecnologia: Ciborgues Interpretativos e Cultura Digital”. Artefactum Revista de Estudos em Linguagem e Tecnologia, n. 1, p. 1-15, maio 2013.), afirmam: “O que percebemos é que a condição de sermos todos ciborgues interpretativos nos faz habitar alegremente o ciberespaço” (COUTO; SOUZA; NEVES, 2013, p. 12). O autor e as autoras se apoiam na teoria de André Lemos e no conceito de ciborgue interpretativo - que pressupõe influência no espaço digital - e defendem que a conectividade limita o poder da cultura de massa e se opõe ao consumo passivo.

Outros ganhos políticos são identificados nos novos modos de se afirmar e relacionar por redes sociais, que dizem respeito ao fortalecimento de grupos minoritários. A autoexposição tem sido analisada a partir dos conceitos de hipervisibilidade (Andrew KEEN, 2012KEEN, Andrew. Vertigem Digital: por que as redes sociais estão nos dividindo, diminuindo e desorientando. Rio de Janeiro: Zahar, 2012.; Carla ABREU, 2015ABREU, Carla Luzia de. “Hipervisibilidade e self-disclosure: novas texturas da experiência social nas redes digitais”. Visualidades, v. 13, n. 2, p. 194-219, dez. 2015.) e autorrevelação (ABREU, 2015) que discutem, respectivamente, a mercantilização das pessoas por meio do excesso de autoexibição e exibição da intimidade, alheias ao processo de fornecimento de dados pessoais a empresas, e das narrativas da intimidade e do cotidiano direcionadas a um público não necessariamente conhecido. Por um lado, há fortes críticas à cultura da hipervisibilidade e uma descrença de que as relações construídas nas redes sociais possam gerar algum avanço no que concerne ao respeito às diversidades a partir da multiplicação das afirmações de identidades - mas o contrário, cada vez mais vulnerabilidade pela exposição, ausência de comunicações de qualidade, intolerância e violência (KEEN, 2012). Por outro lado, observa-se o reconhecimento de efeitos positivos na comunicação das próprias experiências, sobretudo para grupos socialmente marginalizados, na afirmação de suas identidades, na visibilidade política e na conexão intragrupal (ABREU, 2015).

Demais trabalhos têm apontado para ganhos especificamente para mulheres no uso de novas tecnologias. Para Carla Ganito (2010GANITO, Carla. “Women on the move: the mobile phone as a gender technology”. Comunicação & Cultura, n. 9, p. 77-88, 2010.), o uso do celular tanto reforça papéis tradicionais de gênero como os transforma, desafiando normas, mediando modos de resistência a opressões e legitimando a presença das mulheres no espaço público. Cabe ponderar, entretanto, os riscos envolvidos nos modos de resistência no uso de tecnologias feministas para denunciar violências e ocupar espaços masculinizados. É comum observarmos, em denúncias de violências na internet, a exposição e vulnerabilização de mulheres enquanto homens permanecem ocultados.

Mireille Miller-Young (2007MILLER-YOUNG, Mireille. “Sexy and smart: Black women and the politics of self-autorship in netporn”. In: JACOBS, Katrien; JANSSEN, Marije; PASQUINELLI, Matteo (Orgs.). C’Lick Me: A netporn studies reader. Institute of Network Cultures, 2007.) aponta, ainda, para a autonomia em papéis tradicionalmente compreendidos como de subordinação. A autora discute os modos como mulheres negras estado-unidenses que trabalham no mercado pornográfico - conduzindo a própria carreira por meio do conhecimento de novas tecnologias - desconstroem padrões dominantes de gênero e raciais, e reivindicam valores associados à agência e à intelectualidade.

No que concerne especificamente à questão da nudez, Paula Sibilia (2014SIBILIA, Paula. “A politização da nudez: Entre a eficácia reivindicativa e a obscenidade real”. In: ENCONTRO ANUAL DA COMPÓS, XXIII, 2014, Belém. UFPA, Anais... Belém: 2014, p. 1-17.) discute as mudanças nas relações sociais que a tornaram muito mais presentes e aceitáveis - sobretudo a nudez das mulheres, apropriada já não apenas mercadologicamente, mas em ações políticas. A prática da exposição da nudez tem se apresentado por pessoas de diversos contextos e também em variadas formas, com atenção àquelas que reivindicam a representação do corpo real, em oposição aos padrões de beleza e aos recursos tecnológicos que manipulam as imagens para adequá-las a esses padrões. A autora questiona qual seria a eficácia de causar impacto por meio da exposição da nudez, tendo sido a prática já, de certo modo, banalizada. Tal indagação sugere, então, a reflexão sobre a relação entre a condenação da nudez e seu contexto de produção, estando fortemente relacionada, no caso da divulgação não autorizada de imagens íntimas, à ainda persistente condenação da manifestação da sexualidade das mulheres, conforme discutido em outros trabalhos (Luciane MAZZARDO, 2014MAZZARDO, Luciane de Freitas. Interfaces da desigualdade de gênero: os julgamentos morais implícitos nas ambiências sociais e judiciárias e a relevância da transversalidade das políticas públicas frente à violação dos direitos humanos das mulheres. 2014. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Direito) - Universidade de Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil.; Isabela PETROSILLO, 2016PETROSILLO, Isabela Rangel. Esse nu tem endereço: o caráter humilhante da nudez e da sexualidade feminina em duas escolas públicas. 2016. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Antropologia) - Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, Brasil.; Rossana PINHEIRO, 2018PINHEIRO, Rossana Barros. Tratamento da pornografia de vingança pelo judiciário maranhense: avaliando a atual divisão de competências entre Vara de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher e Juizado Especial Criminal a partir do critério efetividade. 2018. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Direito e Instituições do Sistema de Justiça) - Universidade Federal do Maranhão, São Luiz, MA, Brasil.; Liziane RODRÍGUEZ, 2018RODRÍGUEZ, Liziane da Silva. Pornografia de vingança: vulnerabilidades femininas e poder punitivo. 2018. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.; Katrine JOHANSEN; Bodil PEDERSEN; Tine TJØRNHØJ-THOMSEN, 2019JOHANSEN, Katrine Bindesbøl Holm; PEDERSEN, Bodil Maria; TJØRNHØJ-THOMSEN, Tine. “Visual gossiping: non-consensual ‘nude’ sharing among young people in Denmark”. Culture, Health & Sexuality, v. 21, n. 9, p. 1029-1044, set. 2019.).

No campo do debate sobre o ato de se autofotografar, a assim chamada selfie é compreendida, na perspectiva semiótica, como contentora de propostas a serem negociadas entre quem envia e quem recebe. A prática envolve uma regulação de normas de comportamento. O que é negociado não é a relação, mas as diferentes perspectivas daquilo que é representado. Nesse sentido, a interpretação depende de quem envia, quem recebe e do contexto em que é enviada (Sumin ZHAO; Michele ZAPPAVIGNA, 2018ZHAO, Sumin; ZAPPAVIGNA, Michele. “Beyond the self: Intersubjectivity and the social semiotic interpretation on the selfies”. New Media and Society, v. 20, n. 5, p. 1735-1754, 2018.).

No mesmo caminho, Theresa Senft e Nancy Bayam (2015SENFT, Theresa M.; BAYAM, Nancy K. “What does a Selfie Say? Investigating a Global Phenomenon”. International Journal of Communication, v. 9, p. 1588-1606, 2015.) defendem a multiplicidade de perspectivas em torno da análise da selfie. Em revisão sobre as produções de diferentes países, as autoras argumentam contra a patologização da prática e apontam para alguns dos significados que elas podem assumir conforme o contexto específico - podem reforçar valores hegemônicos ou contestá-los, e podem ser reapropriadas de modo a reverter sua intenção inicial, como no caso da divulgação não autorizada de imagens íntimas de mulheres, que transforma a direção de poder inicialmente proposta. Este é o tema debatido na sequência.

Entre a autoexposição e a exposição não autorizada da intimidade de mulheres: em busca de experiências livres e prazerosas

A prática de se autofotografar e compartilhar suas imagens, assim como o fato de ter tido a intimidade divulgada sem autorização, assume distintos significados para as mulheres. Observou-se, a partir das experiências das mulheres participantes da pesquisa, que as mídias são produzidas e divulgadas em condições muito diferentes.

No caso da divulgação não autorizada das imagens, conforme argumentam Spencer Sydow e Ana Castro (2017SYDOW, Spencer Toth; CASTRO, Ana Lara Camargo de. Exposição pornográfica não consentida na internet: da vingança ao lucro. Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. v. 01. (Coleção Cybercrimes)), diferentes modos de violência não podem ser reduzidos ao que é comumente chamado de vingança. Seria preciso atentar se existe ilegalidade ou não na obtenção e distribuição das mídias, já que elas podem ser não apenas divulgadas, mas também obtidas sem autorização, ou em situações de ameaça, como é o caso do que tem sido chamado de ‘sextorsão’. A extorsão sexual que envolve mídias pode ter tanto a obtenção das imagens como fim ou como meio de ameaça para o estupro - ambas as situações foram descritas por mulheres no contexto desta pesquisa.

Entre as experiências das participantes da pesquisa, as motivações para a exposição envolveram sextorsão, vingança, controle e condenação da sexualidade, comercialização e afirmação da masculinidade. Algumas experiências envolveram não a exposição da sexualidade em si, mas de outras situações, como consumo de álcool e brigas, revelando controle e patologização de demais comportamentos das mulheres. Além disso, as exposições foram iniciadas por pessoas com diferentes ligações com as mulheres, como em relações familiares e de amizade.

Cabe acrescentar que a própria produção da mídia pode ser realizada de modo não autorizado e até mesmo sem o conhecimento de quem está na situação de exposição - caso também relatado no âmbito da pesquisa e em outro trabalho (LINS, 2019LINS, Beatriz Accioly. Caiu na rede: mulheres, tecnologias e direitos entre nudes e (possíveis) vazamentos. 2019. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social) - Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.). Para além disso, o que interessa aqui como ponto de debate é pensar em que medida, nas situações em que as mídias são produzidas pelas mulheres, seu desejo e autonomia se manifestam nessas experiências.

Observou-se que, em muitas situações, a divulgação não autorizada das mídias ocasionou a reflexão, para as mulheres expostas, sobre a prática de se expor. Contudo, entre profissionais que atenderam adolescentes que foram expostas, houve relatos de que as meninas não se percebiam como tendo sido alvos de ações violentas. Tal fato foi também descrito no trabalho de Paulo Silva Júnior e Leandro Brito (2020SILVA JÚNIOR, Paulo Melgaço da; BRITO, Leandro Teofilo de. “Entre nudes, acontecimentos e performatizações: normatizações/deslocamentos de gênero e sexualidade no cotidiano escolar”. Interfaces Científicas, v. 2, n. 8, mar. 2020.). Conforme descreveram, o que mais indignou direção e docentes de uma escola em que ocorreu divulgação de fotos íntimas de meninas foi o fato de que, de nove meninas expostas, apenas uma se incomodou de seus “nudes” terem sido compartilhados sem autorização. Uma profissional da escola entrevistada sugeriu que, entre famílias de classe alta, há incômodo com a questão, mas, entre famílias de classes populares, não há participação quanto a isso.

Úrsula, negra, de 36 anos, psicóloga de um órgão de segurança pública de capital, relatou um atendimento que havia feito recentemente de quatro adolescentes moradoras de periferia, com idade entre 14 anos, que participaram de uma gravação de videoclipe musical erótico, sem conhecimento de sua produção e divulgação. No contexto da gravação, outra adolescente foi estuprada por aproximadamente sete meninos, o que também foi gravado e divulgado. A denúncia foi realizada pela adolescente, que passou a ser perseguida. As demais adolescentes expostas não consideraram haver problema no fato de não terem sido informadas da gravação e divulgação das imagens, pois haviam participado do clipe por espontânea vontade.

Tainá, branca, de 28 anos, psicóloga de atendimento privado de uma cidade de pequeno porte do interior, havia acompanhado um caso recente de uma adolescente branca de 15 anos que tinha enviado cerca de 15 fotos nuas para um homem com quem conversava na internet e que nunca tinha visto. Seu pai, político de uma cidade vizinha, foi extorquido e pagou para que as fotos não fossem divulgadas. Após o episódio, o homem nunca mais procurou pela adolescente, o que foi o motivo de sofrimento para ela, diferente da apropriação de suas fotos para extorsão de seu pai. Na avaliação de Tainá, o episódio representou, para a adolescente, uma tentativa de rompimento com a infantilização que vivia no contexto familiar.

Entre algumas mulheres, o fato de terem sido expostas, apesar dos danos sofridos, não afetou a prática de se autofotografar. Já outros relatos indicaram uma mudança na relação como as mulheres passaram a se manifestar, sobretudo nas redes sociais.

Olga, branca, de 29 anos, foi exposta pelo ex-namorado abusivo que havia invadido suas contas na internet no contexto de uma capital brasileira e de uma cidade de grande porte no exterior três anos antes da entrevista. Ela, que se manifestou publicamente por rede social sobre o fato, revelou que, a partir do ocorrido, perdeu o medo de se expor. Entretanto, nunca mais se autofotografou, algo que, anteriormente, tinha um valor positivo para ela. Ela também relatou efeitos negativos na relação com o próprio corpo e na sua relação com o atual companheiro.

Letícia, branca, de 27 anos, foi exposta aos 21 anos em uma capital por um homem com quem estava se relacionando e que a fotografou durante a prática de ato sexual sem seu conhecimento. Ela relatou que alterou o conteúdo do que compartilha nas redes sociais e também se tornou mais restritiva quanto a quem pode ter acesso a suas redes. Letícia deixou de ter interesse em divulgar fotos em que seu corpo aparecia em evidência e atraía mais visibilidade e comentários masculinos, e passou a compartilhar mais imagens sobre viagens.

A não percepção da violência esteve presente apenas em experiências de adolescentes. Entretanto, a maioria delas sofre grandes danos decorrentes do fato de terem sido expostas. Conforme afirmou Adriana, branca, de 62 anos, psicóloga de um órgão de acolhimento a mulheres de uma capital, a exposição de adolescentes tem como agravante o fato de ainda terem estrutura emocional mais frágil.

Nas seções seguintes, serão discutidas as percepções das mulheres sobre sua autonomia e desejo no ato de expor suas imagens. Conforme se argumentou, tais reflexões foram influenciadas pelo fato de terem sido expostas de modo não autorizado.

Sobre Liberdade

Meu catavento tem dentro o vento escancarado do Arpoador Teu girassol tem de fora o escondido do Engenho de Dentro da flor [...] Sei que um depende do outro só pra ser diferente, pra se completar Sei que um se afasta do outro, no sufoco, somente pra se aproximar Cê tem um jeito verde de ser e eu sou meio vermelho Mas os dois juntos se vão no sumidouro do espelho. Catavento e Girassol (Aldir Blanc MENDES, 1993MENDES, Aldir Blanc. Catavento e girassol. São Paulo: Gravadora Galeão, 1993.)

A autonomia das mulheres na manifestação de sua sexualidade, desde o início da pesquisa pensada como questão a ser analisada, também se apresentou como ponto de reflexão entre participantes da pesquisa. Mais do que isso, a autonomia no exercício da liberdade sexual ou no ato de se expor voluntariamente foi questionada e comparada à própria repressão sexual.

Na canção de Aldir Blanc, o comportamento de um homem contido é contraposto ao de uma mulher expansiva, para, na sequência, ambos os comportamentos serem apresentados como espelho um do outro. Os dois modelos são aqui pensados como diferentes possibilidades de conduta entre as mulheres.

Flávia, preta, de 20 anos, moradora de uma cidade de pequeno porte do interior, teve o celular com mídias suas e da namorada nuas furtado em 2016. Ela relatou ter ficado, em torno de dois anos, com muito medo das mídias serem divulgadas, e até então evitava tocar no assunto com a namorada. Após o episódio, elas não voltaram a produzir as mídias e isso se deve ao fato de, segundo Flávia, terem amadurecido e também por criticidade à sexualização da mulher negra. Ela contou que acredita que vivemos em uma liberdade ilusória e parcial.

E muitas vezes essa liberdade que a gente aprende é uma liberdade maquiada. Na verdade, a gente não é livre, a gente tá se prendendo, se podando, o tempo todo. Eu acho uma falsa, um falso conceito de liberdade. Por exemplo, tem gente que acha que ficar com várias pessoas te faz livre, né. Na verdade, não. [...] Poderia ser pior, a gente poderia tá sendo, tá vivendo uma vida pior do que a gente leva. Então, é, tipo, menos pior, né. É pior você não ter nenhum tipo de liberdade. Assim, nem que seja uma liberdade que você tem na sua cabeça que existe. Igual você nem conseguir pensar nessa liberdade. Liberdade sexual, por exemplo.

A perspectiva de Flávia corroborou as ideias de se tornar vulnerável com a exposição (COUTO, 2015COUTO, Edvaldo de Souza. “Educação e redes sociais digitais: privacidade, intimidade inventada e incitação à visibilidade”. Em Aberto, v. 28, n. 94, p. 51-61, dez. 2015.) e de reprodução de valores hegemônicos (SENFT; BAYAM, 2015SENFT, Theresa M.; BAYAM, Nancy K. “What does a Selfie Say? Investigating a Global Phenomenon”. International Journal of Communication, v. 9, p. 1588-1606, 2015.). A percepção de reprodução de padrões estéticos esteve presente em outros depoimentos. Raquel, branca, de 18 anos, moradora de uma cidade de médio porte do interior, preside um projeto voluntário de acolhimento a mulheres em situação de violência iniciado por ela após ter vivido um relacionamento abusivo aos 15 anos. Ela, que já teve uma foto sua de biquíni exposta em uma página na internet de fofoca, cuja legenda insinuava seu desejo por sexo, falou sobre o esforço das meninas em corresponder a padrões estéticos.

Todas elas aparecem em todos os vídeos e fotos completamente depiladas, assim, perfeitas, bem ‘pornificadas’ mesmo, parece que elas acabaram de sair do filtro, porque elas usam até mesmo as expressões faciais. [...] E as meninas, elas se rendem muito a isso, pelo menos assim, a maior parte das meninas que eu conheço, as que, todas que não são ativistas feministas, elas se esforçam o tempo todo pra se encaixarem nesse padrão, principalmente as que a gente cuida. Então, direto as meninas que a gente cuida mandam uma coisa gordofóbica no grupo.

O comportamento das meninas e seu nível de autonomia foram analisados e diferenciados também com relação a suas reações após terem sido expostas. Uma tese defendida no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade de Brasília (Bruno CRAESMEYER, 2017CRAESMEYER, Bruno Ramos. Caiu na net: violação de intimidade e regime de vigilância distribuída. 2017. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em Comunicação) - Universidade de Brasília, Brasília, Brasil.) tipificou três reações, uma que se rende à política da exposição e lucra com ela, uma que atua em defesa da exposição voluntária em oposição à violenta e outra que atua politicamente em instâncias legais.

A primeira, sugere um “vacinar-se” ‒ adiantar-se e internalizar, extinguindo o sofrimento, tornando-o produtivo e produtor - contra esses castigos provocados pelo escracho obsceno e, diante da admissão da inevitável exposição como norma ‒ como postulam Bell (2009) e ativismos pós-pornográficos ‒, voluntariamente submeter-se, gozar e, até mesmo, lucrar com o olhar do outro. Uma ação política preventiva com potencial econômico. A segunda possibilidade instiga as vítimas a remediar o sofrimento causado por uma divulgação não autorizada “reclamando de volta” a soberania sobre a imagem do próprio corpo ao se expor novamente, mas então voluntariamente. Uma ação política reativa que visa demonstrar, provar, que o “problema” não é a nudez ou a sexualidade, mas sim a ausência de voluntariedade. A terceira possibilidade consiste em atuar politicamente “fora da imagem”, em instâncias normativas, legais e em campanhas para conter a circulação não consensual de imagens da sexualidade e do corpo alheio, seja pela educação ou pela criminalização e regulação da divulgação desse tipo de imagem (CRAESMEYER, 2017CRAESMEYER, Bruno Ramos. Caiu na net: violação de intimidade e regime de vigilância distribuída. 2017. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em Comunicação) - Universidade de Brasília, Brasília, Brasil., p. 98).

O autor hierarquiza essas reações, classificando a primeira como a que mais internaliza a vigilância do livre mercado, sob aparência de ativismo. Thereza Silva (2018SILVA, Thereza Nardelli E. “Seremos nosso porta-retrato e já estamos portando essa tela”: miradas em nudes autopublicados no Tumblr Bucepowergang. 2018. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.) aponta justamente para a direção contrária ao discutir como o capitalismo financeiro se apropria, material e simbolicamente, das lutas políticas.

Na análise de Paul Preciado (2011PRECIADO, Paul. “Transfeminismo no Regime Farmacopornográfico”. In: BORGHI, Liana; MANIERI, Francesca; PIRRI, Ambra (Orgs.). Le cinque giornate lesbiche in teoria. Roma: Ediesse, 2011.), o regime capitalista incide sobretudo na produção e controle da sexualidade. O autor parte de uma perspectiva foucaultiana sobre o controle político dos corpos e afirma que a produção da sexualidade é transformada em força de produção do capital. Nesse sentido, a sexualidade deixa de ser apenas um elemento da gestão política dos corpos e passa a ser, também, base da produção capitalista, no âmbito da construção das subjetividades. Apesar de ambos adotarem Foucault como referencial, diferentemente de Preciado (2011), na análise de Craesmeyer (2017CRAESMEYER, Bruno Ramos. Caiu na net: violação de intimidade e regime de vigilância distribuída. 2017. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em Comunicação) - Universidade de Brasília, Brasília, Brasil.) a questão de gênero é praticamente inexistente, além de apresentar verdadeiro ceticismo quanto à possibilidade de liberdade das mulheres em manifestar sua sexualidade a partir da autoexposição de seus corpos. Para Craesmeyer (2017), as formas de reação à violência envolvem autoengano e apenas se diferem em níveis de adaptação à sociedade do controle.

Kiara, negra, de 25 anos, moradora de capital, contou que aos 18 anos foi demitida de uma fábrica da FIAT onde trabalhava como mecânica, após ter sido produzida e divulgada uma montagem de seu rosto com um corpo feminino nu. Ela, que não conseguiu voltar a exercer a profissão que tinha escolhido, fez um ensaio fotográfico sensual aos 21 anos e o exibiu nas redes sociais durante algum tempo. Kiara afirmou que, mesmo o fato de ela ter produzido e exibido as fotos ter sido usado contra ela durante uma discussão política (mais precisamente, ela foi tratada com deboche por ter pelos pubianos), não se tratou de algo marcante, e de modo algum ela sentiu o mesmo sofrimento quanto o provocado pela perseguição e assédio vivenciados no trabalho. Ela acredita que a revolta com o ocorrido a influenciou na decisão de fazer o ensaio, mas não exclusivamente. Atualmente, ela produz fotos sensuais de si mesma e troca com o marido. Seu relato transpareceu elevado nível de reflexão e consciência de si. A experiência de Kiara corresponde à perspectiva de contestação de valores hegemônicos de Senft e Bayam (2015SENFT, Theresa M.; BAYAM, Nancy K. “What does a Selfie Say? Investigating a Global Phenomenon”. International Journal of Communication, v. 9, p. 1588-1606, 2015.), assim como ilustra a questão da apropriação que pode romper com o objetivo inicial de produção da mídia.

Diferentemente da análise taxativa de Craesmeyer (2017CRAESMEYER, Bruno Ramos. Caiu na net: violação de intimidade e regime de vigilância distribuída. 2017. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em Comunicação) - Universidade de Brasília, Brasília, Brasil.), em que, do ponto de vista feminista, as reações das mulheres à exposição podem ser compreendidas como indistintas, a entrevistada Raquel também categorizou três tipos de reação, mas atribuindo a elas maior possibilidade de lucidez e exercício da liberdade:

Eu acho que tem três reações pras meninas, né. Uma são as que se retraem, que não querem mais aparecer, por medo, não confiam mais. A outra é essa que acontece muito também, que é tipo, tem meninas que até colocam já na biografia delas, tipo aquela descriçãozinha na internet, tipo “Sou piranha mesmo”. Várias colocam essas coisas, postam isso, tipo, quando os caras vão postar alguma coisa, às vezes [elas] postam “Sou piranha mesmo, pode falar o que quiser”. E tem as que começam a se envolver com o movimento feminista por causa disso. Elas compreendem quem elas são e, tipo assim, elas se sentem livres, sabe. “Cê quer me chamar de puta, pode chamar. Eu não vou me apropriar desse nome porque eu não concordo, né, mas eu vou continuar fazendo as coisas que eu tenho vontade de fazer”. Então acho que essas são as três reações que existem depois que as meninas são divulgadas, mas a maioria realmente fica mais retraída mesmo. [...] Eu acho até que esse “Sou piranha”, às vezes, é um, um passo indo em direção ao feminismo, sabe, de libertação, né. É, ela começa nessa revolta “Já que cê quer me chamar de piranha, eu sou isso mesmo” e dentro disso ela acaba encontrando o movimento feminista. Até que ela entende que ela não precisa se declarar como piranha em si, né, que aquilo é só uma invenção da sociedade. E aí ela se torna uma ativista.

A distinção proposta por Raquel, além do reconhecimento da centralidade do pensamento feminista como apoio às mulheres, encontrou maior correspondência com as experiências narradas no contexto da pesquisa. No mesmo caminho de Ganito (2015), considerou-se o uso das novas tecnologias na reprodução de papéis tradicionais assim como em modos de resistência. Tais reflexões não encerram, entretanto, a pergunta sobre a possibilidade de exercício da liberdade por parte das mulheres no ato de se expor. Na sequência, tal indagação será aprofundada tomando o desejo das mulheres, compreendido em seus múltiplos domínios como ponto de partida para a resposta.

Sobre Desejo

Eu, agora - que desfecho! Já nem penso mais em ti... Mas será que nunca deixo De lembrar que te esqueci? Do amoroso esquecimento (Mario QUINTANA, 1997QUINTANA, Mário. Quintana de bolso. Porto Alegre: L&PM, 1997.)

A partir do debate apresentado neste texto, parte-se do pressuposto de que o desejo manifesta subjetividades constituídas em maior ou menor grau por padrões estruturais, que podem corresponder a modelos socioculturais, pensamentos inconscientes, dentre outras características. Em paralelo à definição de consentimento proposta por Paz Peña e Joana Varon (2019PEÑA, Paz; VARON, Joana. “Consentimento: Nossos Corpos como Dados - contribuições das teorias feministas para o debate da proteção de dados”. Codin Rights, 2019. Disponível em Disponível em https://codingrights.org/docs/consentimento-pt.pdf . Acesso em 22/06/2020.
https://codingrights.org/docs/consentime...
), podemos compreender o desejo como uma questão estrutural, constituída em relações de poder, mas que pode ser consciente, livre e também complexo, não contínuo e não binário.

Nas narrativas das mulheres expostas, chama atenção o fato de que elas não desejavam exatamente produzir as mídias que foram posteriormente expostas, conforme afirmaram algumas delas. Esse foi o caso de Pilar, negra, de 33 anos, exposta aos 23 anos no contexto de uma cidade de pequeno porte do interior. Ela foi filmada em uma pose provocativa por iniciativa de seu então namorado e a gravação foi divulgada pelo homem que formatou o computador dele. Clarice, branca, de 19 anos, exposta aos 14 anos por seu então namorado em uma cidade de pequeno porte de região metropolitana, narrou sentimento semelhante.

Eu nem tava muito a fim, mas mesmo assim eu mandei [a foto] por conta que eu gostava muito dele, simples assim. [...] Hoje em dia, eu evito ao máximo, na verdade, quando eu vou fazer alguma coisa, [...] eu ainda olho se tem algum telefone por perto, essas coisas. Eu ainda tenho isso, eu ainda sou muito insegura, principalmente com homens.

Daniela, parda, de 19 anos, moradora de capital, foi exposta aos 14 anos pelo colega da escola com quem trocava fotos. Posteriormente, ela foi exposta, no contexto familiar, por seu pai, que sempre apresentou comportamento muito repressivo e violento. Ele acessou as fotos pelo celular da filha e mostrou à família (avó, tias e tios de Daniela). O pai afirmava que ela não tinha valor e a expulsou de casa. Daniela foi morar com sua avó materna.

Eu não entendo. Tem dia que eu paro e penso, quando isso vem na minha cabeça, eu fico “Gente, quê que eu tinha na cabeça?”. Eu conversava com meninos muito mais bonitos, mais inteligentes, que eu conhecia há mais tempo, mas não sexualmente, e fui conversar com um menino que, coitado, gente.

Adriana fez o atendimento de uma jovem de 19 anos, exposta pelo então namorado quando ela quis terminar com ele. A jovem, que trabalhava como modelo fotográfica e tinha dezenas de milhares de seguidores em rede social, teve fotos suas, em que estava nua, divulgadas. O atendimento da jovem envolveu o trabalho com autoestima, autoconfiança e projeto de vida. Adriana percebeu que ela queria ser desejada, mas não necessariamente gostava do namorado, segundo contou:

Aí ela me falou “Não, porque ele falou que me amava, ele falou que gostava.”, e eu falei “Tá, e o quê que você sentia por ele?”, “Ah, eu queria que ele me amasse”. Ou seja, não é “Eu amo”, “Eu queria que ele me amasse”.

De modo semelhante, Tainá acredita que há uma confusão pelo fato de a exposição por parte das mulheres estar mais naturalizada, o que aparenta haver maior permissão social. O desejo delas por exibição passa a relacionar-se com o desejo por aceitação. Entretanto, o julgamento, a condenação e a repressão seguem muito fortes. Ela argumenta, com base em experiências observadas em seu consultório, que o ato de se expor exige muita autoconfiança, pois, caso contrário, qualquer retorno negativo pode fragilizar as mulheres. Tainá narrou a experiência de uma jovem com autoestima muito baixa, que corresponde aos padrões de beleza, e publicou em rede social uma foto sua em que estava seminua. Em meio a mensagens positivas sobre empoderamento, a jovem também recebeu “galanteios” masculinos, o que causou nela sofrimento e arrependimento por ter publicizado a foto.

Algumas experiências relatadas pelas mulheres sugeriram conforto com a prática de se autofotografar e se expor, o que envolve o reconhecimento e o manejo tanto do desejo como do risco. Nesse caminho, o trabalho de Abreu (2015ABREU, Carla Luzia de. “Hipervisibilidade e self-disclosure: novas texturas da experiência social nas redes digitais”. Visualidades, v. 13, n. 2, p. 194-219, dez. 2015.) apresentou o depoimento de uma jovem que tem uma página em rede social em que compartilha suas experiências como mulher lésbica e que assume que sente medo por estar muito exposta, mas mantém seu canal por ser uma forma de organizar seus pensamentos e se expressar de forma divertida, que a faz bem. Outros trabalhos analisam as experiências de mulheres de fotografar a própria nudez como autônomas e prazerosas (LINS, 2019LINS, Beatriz Accioly. Caiu na rede: mulheres, tecnologias e direitos entre nudes e (possíveis) vazamentos. 2019. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social) - Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.), como práticas de produção estética-política relativas a questionamentos a padrões de beleza (SILVA, 2018SILVA, Thereza Nardelli E. “Seremos nosso porta-retrato e já estamos portando essa tela”: miradas em nudes autopublicados no Tumblr Bucepowergang. 2018. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.) e heteronormatividade, bem como resistência diante de situações de violência, produção de autoestima e construção de redes de segurança para o compartilhamento das mídias (Luiza SILVA, 2018SILVA, Luiza Cristina Silva. Currículo da Nudez: relações de poder-saber na produção de sexualidade e gênero nas práticas ciberculturais de nude selfie. 2018. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.).

Joana, branca, de 24 anos, de cidade de pequeno porte do interior, relatou que, aos 18 anos, teve uma foto em que estava nua e o diário exposto por uma amiga. Ela afirmou que a traição e a exposição do diário que continha relatos sobre suas inseguranças a fez sofrer mais que a divulgação da foto. Joana contou que tem compartilhados um vídeo transando com um ex-namorado e outro com um casal, e sente certa insegurança diante da possibilidade de eles serem divulgados - eventualmente, ela confere se foram postados em páginas de pornografia. Ela acredita que isso poderia atrapalhar sua vida profissional ou o relacionamento com familiares de algum companheiro que possa vir a ter. Joana afirmou seguir trocando fotos, mas adota cuidados para preservar sua identidade. Joana também contou que, atualmente, embora mais distante dos padrões de beleza pelo fato de ter engordado, se sente mais confortável com seu corpo. Ela demonstrou não apenas reconhecer o risco, mas, de certo modo, desfrutar dele:

Talvez o risco [de ser exposta] dê o tesão (risos). Mas, é, eu acho que, mas acho que isso tem tudo a ver com a minha personalidade, de como que eu lido com o sexo desde sempre, de ter uma postura muito mais aberta, aberta pra experiências, aberta pra experimentar e tudo mais.

Demais participantes da pesquisa afirmaram seguir com a prática de compartilhar suas mídias após terem sofrido a exposição não autorizada, tendo incorporado alguns cuidados.

A gestão do risco, dentre outros depoimentos, esteve presente no relato de Amanda, branca, de 17 anos, moradora de uma cidade de médio porte do interior e que, no ano anterior, teve uma foto sua retirada da rede social e utilizada para promover uma casa de prostituição. Segundo contou, ela publica muitas fotos, mas não aquelas em que aparece seminua:

Eu fico me admirando, porque minha autoestima é bem alta (risos). Então eu gosto de ficar me olhando né. [...] Fica pra mim mesmo, eu só mostro pra ele [namorado] assim, tipo, “Olha aqui” [...] Ele pede pra não mandar porque ele tem medo que vaze, ele é bem consciente.

O reconhecimento, entre adolescentes, dos riscos que envolvem a prática do sexting e a problematização das violências também foram relatados na pesquisa de Rodrigo Soares (2014SOARES, Rodrigo de Oliveira. Redes Sociais: como os adolescentes lidam com a vida na internet? 2014. Mestrado (Programa de Pós-Graduação em Psicologia) - Universidade Federal do Maranhão, São Luiz, MA, Brasil.).

A partir das experiências aqui relatadas, pode-se pensar a dicotomia entre os comportamentos reprimido e expansivo espelhados a partir da alienação do próprio desejo. Nesse sentido, deixar de se expor por medo da repressão ou pela reversão do sentido que a violência provocou na relação da mulher com o próprio corpo ou imagem, ou se expor em função de uma demanda externa, seja ela do companheiro ou pela aceitação alheia, que não necessariamente corresponde à aceitação por si, constituem-se como oposições pertencentes a um mesmo modelo de comportamento submisso - seja a relações, padrões sociais ou às próprias emoções inerentes a esses processos.

No que diz respeito às questões políticas que atravessam a conformação subjetiva do desejo, cabe pensar na necessidade de afirmação como antítese do sentimento. Como no poema de Mário Quintana, a demanda por manifestar a ausência de afeto revela a permanência dele. O que se propõe como reflexão é a dimensão do desejo diante da demanda externa internalizada, que abre espaço à necessidade. Nesse sentido, seria fundamental pensar em que medida expor-se como afirmação da soberania, por parte das mulheres, sobre o próprio corpo - ou sua afirmação no espaço público, ou como rompimento de padrões de beleza ou afirmação da sexualidade -, obedece à lógica do próprio desejo ou apenas da demanda social e política. Nos termos que têm sido, recentemente, utilizados pelos movimentos sociais, trataria do direito de existir, em detrimento de apenas resistir (Jaime PEIXOTO, 2020PEIXOTO, Jaime. “Resistir para re(existir): reflexões sobre a produção de resistências por estudantes gays na escola de ensino médio”. REVES - Revista Relações Sociais, v. 3, n. 3, p. 191-106, 2020.). Como sugere o relato de Kiara, essa distinção não se apresenta de forma nítida, o que não dispensa a pertinência da pergunta, como meio de compreender mais profundamente o próprio desejo.

Não se pode perder de vista, entretanto, os modos como os marcadores sociais da diferença configuram privilégios, sejam eles relativos à ausência da necessidade da autoafirmação no espaço público ou da aceitação social de sujeitos e corpos historicamente hegemonizados. As experiências das mulheres relatadas na pesquisa foram marcadas por narrativas racistas e gordofóbicas.

A conexão com o próprio desejo se mostra como caminho mais preciso para a vivência da sexualidade de modo autônomo. A compreensão do desejo, constituído em diferentes esferas, é tão complexa como oportuna. As questões externas e sociais que o atravessam precisam ser consideradas de modo não aprisionador. Para Audre Lorde (1984LORDE, Audre. “Use of the Erotic: The Erotic as Power”. In: LORDE, Audre. Sister outsider: essays and speeches. New York: The Crossing Press Feminist Series, 1984. p. 53-59.), a conexão com o erótico é também caminho para a própria atuação política. A tentativa de controle do erotismo feminino se dá justamente por seu poder, sua potencialidade.

Mas quando começamos a viver desde dentro pra fora, conectadas ao poder do erótico dentro de nós e permitindo que esse poder preencha e inspire nossas formas de atuar com o mundo que nos rodeia, então é que começamos a ser responsáveis por nós mesmas no sentido mais profundo. [...] Nossos atos contra a opressão se tornam íntegros com sermos, motivados e empoderados desde dentro. Em contato com o erótico, eu me rebelo contra a aceitação do enfraquecimento e de todos os estados de meu ser que não são próprios de mim, que me foram impostos [...] (LORDE, 1984LORDE, Audre. “Use of the Erotic: The Erotic as Power”. In: LORDE, Audre. Sister outsider: essays and speeches. New York: The Crossing Press Feminist Series, 1984. p. 53-59., p. 57).

Considerações finais

Este texto discutiu as possibilidades de autonomia na vivência da sexualidade das mulheres na prática de autofotografar e expor a própria nudez. As reflexões partiram dos debates sobre autonomia no campo da teoria política feminista e sobre exposição na cultura digital, confrontados com as experiências de mulheres que tiveram imagens íntimas divulgadas de modo não autorizado e de profissionais da saúde e da assistência que atenderam mulheres que passaram por essa situação. A problematização da possibilidade de autonomia das mulheres discutida na teoria política, seja em sua afirmação ou negação, é complexificada diante das práticas contemporâneas de se representar no espaço digital e das possibilidades de manifestar-se e de reproduzir padrões de consumo.

As experiências das mulheres mostraram uma diversidade de contextos e de significados, que atravessam a vivência da autonomia a partir do prazer e da exploração da própria sexualidade, e também a gestão do risco, assim como manifesta reproduções de valores estéticos hegemônicos. A análise empreendida evidenciou a centralidade da compreensão das múltiplas dimensões do desejo - atravessado por questões do campo social, para a vivência da sexualidade de modo autônomo.

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  • Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista:

    PATROCINO, Laís; BEVILACQUA, Paula. “Autonomia e submissão na autoexposição digital e na exposição violenta de mulheres”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 31, n. 3, e84139, 2023.
  • Financiamento:

    O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
  • Consentimento de uso de imagem:

    Não se aplica.
  • Aprovação de comitê de ética em pesquisa:

    Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto René Rachou - Fiocruz Minas (CAAE: 38645120.9.0000.5091).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Set 2021
  • Revisado
    19 Maio 2023
  • Aceito
    27 Jun 2023
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