Acessibilidade / Reportar erro

Thirlwall ou Solow?: uma análise para a economia brasileira entre 1947 e 2008

Thirlwall or Solow?: an analysis of the Brazilian economy between 1947 and 2008

Resumos

Algumas evidências e teorias apontam para a existência de uma relação entre crescimento econômico e saldo da conta-corrente. De acordo com essa abordagem, é fundamental um bom desempenho do setor exportador de forma a manter conta-corrente equilibrada para que um determinado país consiga bom nível de investimentos e de crescimento de forma sustentável. Na literatura sobre crescimento, no entanto, existe ênfase na relação entre desempenho econômico e acumulação de fatores de produção. Levando em consideração as duas abordagens teóricas, o presente estudo tem como objetivo estruturar, de forma inicial, um modelo teórico que relacione ambas e analisar o impacto da restrição externa nos investimentos em capital físico e capital humano, consequentemente, no desempenho da economia brasileira entre 1947 e 2008.

Exportações; Capital físico; Capital humano; Taxa de câmbio real; Desempenho econômico


Certain evidence and theories point to the existence of a relationship between economic growth and the current account balance. According to this approach, positive external sector performance is a key element for an economy to reach sustainable rates of investment and economic growth. On the other hand, literature on economic growth emphasizes the association between economic performance and production factors accumulation. Taking into consideration these two theoretical approaches, the present study aims to develop a model relating these two different approaches and investigate how the balance of payments constraint impacts physical and human capitals investments and, consequently, the Brazilian economy's performance between 1947 and 2008.

Exports; Physical capital; Human capital; Exchange rate; Economic performance


Thirlwall ou Solow? Uma análise para a economia brasileira entre 1947 e 2008

Thirlwall or Solow? An analysis of the Brazilian economy between 1947 and 2008

Luciano Nakabashi

Professor Doutor da FEA-RP/USP e pesquisador do CNPQ. E-mail: nakabashi@fearp.usp.br

RESUMO

Algumas evidências e teorias apontam para a existência de uma relação entre crescimento econômico e saldo da conta-corrente. De acordo com essa abordagem, é fundamental um bom desempenho do setor exportador de forma a manter conta-corrente equilibrada para que um determinado país consiga bom nível de investimentos e de crescimento de forma sustentável. Na literatura sobre crescimento, no entanto, existe ênfase na relação entre desempenho econômico e acumulação de fatores de produção. Levando em consideração as duas abordagens teóricas, o presente estudo tem como objetivo estruturar, de forma inicial, um modelo teórico que relacione ambas e analisar o impacto da restrição externa nos investimentos em capital físico e capital humano, consequentemente, no desempenho da economia brasileira entre 1947 e 2008.

Palavras chaves: Exportações; Capital físico; Capital humano; Taxa de câmbio real; Desempenho econômico.

ABSTRACT

Certain evidence and theories point to the existence of a relationship between economic growth and the current account balance. According to this approach, positive external sector performance is a key element for an economy to reach sustainable rates of investment and economic growth. On the other hand, literature on economic growth emphasizes the association between economic performance and production factors accumulation. Taking into consideration these two theoretical approaches, the present study aims to develop a model relating these two different approaches and investigate how the balance of payments constraint impacts physical and human capitals investments and, consequently, the Brazilian economy's performance between 1947 and 2008.

Keywords: Exports; Physical capital; Human capital; Exchange rate; Economic performance.

JEL C20; O11; O14; O23; O54.

Introdução

Existe uma relação enfatizada por alguns economistas, há certo tempo, entre crescimento econômico e saldo da conta de transações corrente, conhecido como lei de Thirlwall. De acordo com essa abordagem, é fundamental um bom desempenho do setor exportador de forma a manter a conta-corrente equilibrada para que um determinado país consiga elevados níveis de investimentos e de crescimento econômico.

O desempenho da balança comercial e da conta de transações correntes pode ser relevante para o montante de investimentos e o crescimento de um determinado país, pois, caso suceda uma piora no saldo das mesmas, efeitos contracionistas ocorrem sobre os setores diretamente afetados pelo aumento das importações e/ou queda das exportações.

Outro ponto importante é que país algum pode desenvolver-se mais rápido que a taxa de crescimento com equilíbrio no Balanço de Pagamentos (BP), ao menos no longo prazo, pois um déficit crescente na conta de transações correntes financiado pela conta capital aumentaria o risco de desvalorizações cambiais até o ponto em que não valesse mais a pena investir em tal país. Desse modo, teria de ajustar-se à nova situação por meio de medidas recessivas, sendo elas espontâneas ou forçadas junto a crises de confiança, com consequente fuga de capital, grande depreciação da moeda doméstica, levando a uma fragilidade financeira e redução dos investimentos.

Por fim, um déficit crescente na conta de transações correntes levaria o país a praticar taxas de juros mais elevadas para atrair fluxos de capital, estimulando a valorização financeira do capital em prejuízo do investimento produtivo e crescimento real. Um bom desempenho do setor exportador, portanto, de forma a manter em equilíbrio o saldo da conta de transações correntes é essencial para a manutenção de um bom desempenho econômico de forma sustentada.

Além de relaxar a restrição do setor externo, altas taxas de crescimento das exportações dinamizam a economia pela possibilidade que se abre na produção de bens mais intensivos em tecnologia, pois ocorre um processo de descolamento entre o consumo e a produção domésticos. Adicionalmente, os preços das exportações são inelásticos em relação à quantidade produzida, como argumentando por Eichengreen (2008). Vale mencionar ainda que um bom desempenho do setor exportador, com ganhos de participação deste no Produto Interno Bruto (PIB), estimula o crescimento econômico porque ele possui grande capacidade de absorver tecnologia do resto do mundo, além do maior potencial de ganhos de learning by doing quando se compara aos demais setores da economia (Eichengreen, 2008).

Como enfatizado por Solow (1956) ou Mankiw, Romer e Weil (1992), em contrapartida, a única maneira de se alcançar crescimento econômico de forma sustentável acaba sendo por meio da acumulação de fatores de produção, com especial ênfase ao progresso tecnológico. Essa abordagem enfatiza, portanto, o lado da oferta na determinação do crescimento econômico, enquanto aquela salienta fatores relacionados à demanda.

Considerando as duas diferentes abordagens acima citadas, o presente estudo busca estruturar, de forma preliminar, um modelo formal que as relacione de forma a explicitar uma relação já enfatizada por McCombie e Thirlwall (1994), ou seja, que a restrição externa afeta o crescimento econômico via acumulação de fatores de produção. Outro ponto tratado no presente artigo é a avaliação empírica do impacto do desempenho do setor exportador e da conta de transações correntes nos investimentos em capital físico e capital humano e, consequentemente, no desempenho da economia brasileira entre 1947 e 2008. Os resultados encontrados indicam a importância da restrição externa no processo de acumulação dos fatores de produção, principalmente, dos efeitos do crescimento do resto do mundo sobre as exportações.

Além da presente introdução, conta-se com uma revisão da bibliografia na segunda seção. Na terceira, realizou-se a elaboração do modelo formal que explicita a ideia proposta por McCombie e Thirlwall (1994) de que a restrição externa possui um papel crucial na acumulação de fatores de produção e serve também de base para as estimações econométricas. Em seguida, a metodologia e os dados utilizados são apresentados, sendo esta seguida pela análise empírica e discussão dos resultados.

1. Revisão bibliográfica

1.1. Crescimento econômico e desempenho da balança comercial

A base teórica para a relação entre crescimento econômico e restrição externa está no modelo desenvolvido por Thirlwall (1979) que enfatiza o papel da demanda externa sobre o crescimento. Nesse modelo, as elasticidades renda das importações e exportações são elementos chaves para um bom desempenho econômico de longo prazo (McCombie; Roberts, 2002).

Posteriormente, o modelo original de 1979 foi estendido por Thirlwall e Hussain (1982) para incluir fluxos de capital. Moreno-Brid (1998) trouxe avanços adicionais ao introduzir uma restrição que limita o crescimento do déficit em conta-corrente como proporção da renda doméstica. De acordo com esse modelo, o país tem de manter certa proporção entre déficit externo e nível de renda de modo a obter um crescimento sustentável no longo prazo. McCombie e Thirlwall (1997) fazem avanços similares no sentido de introduzir uma restrição para que a razão entre os déficits comerciais e a renda seja constante.

Barbosa-Filho (2002) mostra, no entanto, que tal condição não é suficiente para impedir uma elevação da dívida externa em níveis não sustentáveis, pois, mesmo com uma razão constante entre déficit em conta-corrente e renda doméstica, a trajetória do crescimento da dívida pode provocar crises de confiança de modo a tornar insustentável o padrão atual de crescimento. O autor inclui na análise, de forma explícita, o pagamento de juros e a dinâmica da dívida externa para contornar o problema.

Todas essas versões do modelo original de Thirlwall (1979) preservam sua ideia central, ou seja, que a taxa de crescimento do produto no longo prazo precisa respeitar a restrição do Balanço de Pagamentos (BP). Em algum momento da trajetória de crescimento, a restrição externa fará sentir-se, impondo ajustes ou limitando a taxa de crescimento.

A essência do modelo é que o país deve manter o saldo do BP em equilíbrio, no longo prazo, pois um país não pode endividar-se continuamente sem nunca ter de pagar sua dívida. Caso o país tenha um déficit persistente na conta de transações correntes, chegará um momento em que ele deverá reduzir seu crescimento, elevar o montante de bens e serviços exportados e/ou reduzir as importações para revertê-lo.

Como uma elevada taxa de crescimento é seguida por incrementos no montante das importações de forma quase proporcional, para que um determinado país mantenha um crescimento econômico de forma sustentável é necessário que o seu setor exportador obtenha um bom desempenho de forma a manter o saldo da conta de transações correntes em equilíbrio.

A dependência das exportações é ainda mais relevante aos países em desenvolvimento visto que a conta de serviços dos mesmos permanece negativa na maior parte do tempo. Tal situação ocorre devido às entradas anteriores de capitais que pressionam a conta de serviços pela remessa de lucros e pagamento de juros aos investidores externos. A economia brasileira é exemplar, nesse sentido.

As várias vertentes do modelo já foram testadas inúmeras vezes, inclusive para o caso brasileiro. Bértola, Higachi e Porcile (2002) fazem uso do modelo mais simples e encontram uma relação de longo prazo entre o desempenho do PIB brasileiro, os termos de troca e o crescimento da renda mundial, no período 1890-1973, favorecendo a Lei de Thirlwall. Na análise do período 1955-1998, Jayme Jr. (2003), utilizando o método de cointegração em séries temporais, encontra que há cointegração entre o crescimento das exportações e o crescimento econômico, indicando a validade do modelo de Thirlwall. Abordagem semelhante foi utilizada por Lima e Carvalho (2008), em que os autores encontram que exportações e renda cointegram-se, enquanto os fluxos de capitais e termos de troca não são variáveis relevantes, no período de 1930 a 2004. Ferreira e Canuto (2003) consideram os efeitos das remessas de lucros, dividendos e pagamentos de juros na restrição externa e mostram que ela continua válida, além de que essas remessas ao exterior reduziram o crescimento médio anual da economia brasileira em 1%, no período 1949-1999.

Em uma análise relacionando os parâmetros estruturais do modelo de Thirlwall (1979) e a restrição externa em diferentes subperíodos do período 1930-2004, Carvalho e Lima (2009) também apresentam evidência da relevância das restrições externas sobre o crescimento da economia brasileira. Nakabashi (2007) aponta que, apesar da relevância do modelo para explicar o crescimento da economia brasileira, é preciso lembrar que as elasticidades variam e fazem parte do ajuste da economia.

Porcile, Curado e Bahry (2003) e Barbosa-Filho (2004), em contrapartida, empregam o modelo de Thirlwall para analisar questões de curto prazo. Os primeiros combinam o modelo de Thirlwall com o conceito minskyano de fragilidade financeira adaptado para uma economia aberta para analisar a conjuntura econômica latino-americana, enquanto o segundo tem, como objetivo, estudar o trade-off entre crescimento e taxa de câmbio. Os resultados apresentados por Barbosa-Filho (2004) indicam que para elevar a taxa de crescimento da renda da economia brasileira em 1% seria necessária uma desvalorização cambial de 7% para que a razão saldo da balança comercial/PIB se mantivesse constante. As conclusões de seu estudo são de que a elasticidade-renda das importações da economia brasileira é muito elevada e as elasticidades-preço das importações e exportações baixas, prejudicando o crescimento.

Meireles, Jayme Jr. e Libânio (2009) introduzem no debate de controle de capitais a necessidade de satisfazer a lei de Thirlwall. Os autores enfatizam a necessidade de controles de capitais para que se alcance crescimento sem esbarrar na restrição externa.

1.2. Câmbio, exportações e crescimento

A relação entre desempenho das exportações e crescimento pode ser percebida pelo modelo de Thirlwall mencionado na seção anterior, no entanto, além de relaxar a restrição externa, o crescimento das exportações favorece o crescimento econômico por meio de outras vias.

A primeira delas seria o descolamento entre o consumo e a produção domésticos, segundo Eichengreen (2008). Esse processo de descolamento possibilita uma elevação da produção de bens de maior conteúdo tecnológico com destino aos países desenvolvidos. Isso ocorre porque a demanda interna de países em desenvolvimento tende a ser direcionada, principalmente, para bens de baixo valor agregado e reduzido conteúdo tecnológico como consequência do baixo nível de renda média da população.

A segunda via também destacada por Eichengreen (2008) é que o aumento da oferta de bens para a economia mundial não tem efeitos significativos nos preços devido ao tamanho do mercado mundial em relação à economia doméstica, ou seja, um crescimento dos bens exportados não teria impactos negativos relevantes sobre seus respectivos níveis de preço.

A terceira e mais importante de todas as vias é formada pelos maiores ganhos de produtividade do setor exportador provenientes do processo de absorção de tecnologia do resto do mundo e por seu maior potencial de learning by doing quando se compara aos demais setores da economia (Eichengreen, 2008).

Se o desempenho das exportações é tão importante para explicar a taxa de crescimento de uma economia, necessita-se da busca dos elementos que determinam seu comportamento. Uma das variáveis mais relevantes é a taxa de câmbio real, por isso tal variável está no centro das discussões em qualquer modelo que trate do crescimento puxado ou dependente das exportações. Considerando que a condição de Marshall-Lerner11) Se a condição de Marshall-Lerner é satisfeita, isso indica que uma depreciação real da moeda doméstica conduz a uma elevação nas exportações líquidas, ou seja, melhora o saldo da balança comercial tanto pelo estímulo às exportações quanto pela retração das importações. Essa condição, no entanto, não é satisfeita no curtíssimo prazo, pois o efeito sobre os preços acaba sendo maior do que sobre as quantidades, ou seja, após uma depreciação cambial real, as exportações líquidas tendem a piorar para depois apresentarem melhora. Esse fenômeno é conhecido como Curva J. Veja, por exemplo, Boyd, Caporale e Smith (2001). ( seja satisfeita, depreciações reais da taxa de câmbio levam a uma melhora no desempenho das exportações líquidas. Vários estudos empíricos mostram que a citada condição é satisfeita22) Citam-se alguns estudos que mostram essa relação como Krugman e Baldwin (1987) para a economia norte-americana, Gupta-Kapoor e Ramakrishnan (1999) para a economia japonesa, Boyd, Caporale e Smith (2001) para os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Onafowora (2003) para os países do leste asiático, além de Gomes e Lourenço (2005) para a economia brasileira. (.

Esse tipo de estímulo às exportações (depreciação cambial) é ainda mais importante em países em desenvolvimento, de acordo com Rodrick (2008). O autor ressalta que o setor de bens comercializáveis sofre relativamente mais com o fraco arcabouço institucional e com as falhas de mercado existentes em tal grupo de países. Assim, uma maneira de amenizar os dois tipos de problemas seria a adoção de uma política de depreciação da taxa de câmbio real de forma a estimular o investimento no setor de bens comercializáveis.

Outro ponto relevante é que uma taxa real de câmbio depreciada ou desvalorizada pode ser utilizada como um incentivo para a alocação de recursos ao setor de manufatura ou à indústria em detrimento dos bens não comercializáveis e das commodities, de acordo com Eichengreen (2008). Nos países em desenvolvimento, o setor de commodities é intensivo em recursos abundantes nos mesmos (terra e trabalho), além de este ser estimulado pela demanda externa em vários momentos. Significa que o setor de commodities é "naturalmente" competitivo, enquanto o setor de bens manufaturados não o é devido à dotação de fatores, às instituições em processo de consolidação e às falhas de mercado.

A depreciação cambial também eleva o nível de poupança e investimentos de forma a estimular o processo de acumulação de capital, de acordo com Bresser-Pereira (2004). Segundo o autor, uma taxa de câmbio competitiva mantém os salários reais em níveis baixos, assim como o consumo. Em contrapartida, o câmbio depreciado provoca oportunidades de obtenção de lucros para as empresas do setor exportador, o que acaba promovendo uma elevação nos investimentos.

Assim, pelos argumentos apontados acima, a taxa de câmbio é um preço chave não só na determinação do desempenho das exportações, como também dos investimentos e do desenvolvimento do setor de manufaturados.

2. Modelo teórico

Seguindo o modelo desenvolvido por Thirlwall e Hussain (1982), com a inclusão de fluxos de capitais, ele se inicia com a suposição de equilíbrio no BP (e possível desequilíbrio na balança de transações correntes) medido em unidades de moeda doméstica:

em que X representa o volume de exportações, F o valor nominal do fluxo de capitais em moeda doméstica, Pd é o preço das exportações, em moeda doméstica, M é a quantidade de importações, Pf é o preço das importações, em moeda estrangeira, E é a taxa de câmbio nominal (preço doméstico da moeda estrangeira) e o subscrito t representa o período em questão.

Transformando em taxas de crescimento, obtém-se:

em que as letras minúsculas representam as taxas de crescimento das variáveis, θ e (1 - θ) são as parcelas das exportações e dos fluxos de capitais somados aos da conta de serviços no total das receitas obtidas pelo setor externo, ou seja, qual a parcela do total de importações é paga pelas exportações e qual é pela entrada de capitais.

A quantidade demandada de importações pode ser especificada como uma função multiplicativa dos preços das importações (medidas em unidades monetárias domésticas), dos preços de seus substitutos e da renda doméstica:

em que α é uma constante, φ é a elasticidade-preço da demanda por importações (φ < 0), Y é a renda doméstica e π é a elasticidade-renda da demanda por importações (π > 0).

Em taxas de crescimento, tem-se:

A quantidade demandada de exportações também pode ser representada por uma função multiplicativa dos preços das exportações, do preço das mercadorias que competem com as exportações (medidas em unidades de moeda doméstica) e do nível da renda mundial:

em que β é uma constante, η é a elasticidade-preço da demanda por exportações (η < 0), Z é a renda mundial e ε é a elasticidade-renda da demanda por exportações (ε > 0). Transformando em taxas de crescimento, tem-se:

Substituindo as equações (4) e (6) em (2) e isolando y do lado esquerdo da equação, encontra-se:

Nessa equação, a variável dependente (yb) é a taxa de crescimento com equilíbrio no BP. Vale ressaltar que a equação (7) é sempre satisfeita no longo prazo, pois o país só pode crescer a taxas mais elevadas do que aquela que mantém a conta de transações corrente em equilíbrio caso ocorra uma entrada positiva de recursos externos via conta capital. Quando ocorrer, entretanto, uma reversão desses fluxos, o país terá de crescer a uma taxa inferior em relação àquela que equilibra o saldo das transações correntes33) A equação (7) não precisa ser satisfeita no curto prazo visto a possibilidade de ocorrência de variações no nível de reservas. (.

Ainda na equação (7), notamos que a taxa de crescimento de uma economia depende da taxa de variação da taxa real de câmbio, da taxa de crescimento real do resto do mundo multiplicada pela elasticidade renda (do resto do mundo) das exportações e elasticidade renda (doméstica) das importações.

Considerando, nesse momento, o modelo de crescimento neoclássico, uma possível função de produção seria:

em que Y é o nível de renda, K é o nível de capital físico, H é o nível de capital humano, A é o nível de tecnologia e L é a quantidade do fator trabalho usado no processo de produção. Novamente, o subscrito t refere-se ao tempo t. Adicionalmente, α, β, e 1 - α - β são as parcelas de cada um dos fatores na renda44) Na equação (8), faz-se a suposição de que a elevação do trabalho e dos dois tipos de capital trazem um retorno constante de escala. Esse não é, no entanto, necessariamente o caso. Para uma discussão voltada ao fator de produção capital humano, ver Dias, Dias e Lima (2009).. Derivando a equação (8) em relação ao tempo e transformando as variáveis em taxa de crescimento, obtém-se:

Pela equação (9), nota-se que o crescimento da renda só é possível caso ocorra uma elevação em pelo menos um dos fatores de produção da economia (capital físico, capital humano, trabalho ou tecnologia). Igualando as equações (7) e (9), chega-se a:

Pela equação (10), nota-se que a acumulação de fatores de uma determinada economia depende do resultado do BP da mesma. Pode-se observar ainda, a partir dessa equação, que um aumento da taxa de acumulação de fatores de produção depende de um crescimento da entrada de fluxos de capitais, mantendo tudo o mais constante. À primeira vista, esse resultado é semelhante à tradicional conclusão que se chega a partir das contas nacionais, em que os investimentos de um país igualam-se à poupança global (privada, do governo e externa).

A equação (10), entretanto, é muito mais complexa, pois todas as variáveis estão em taxa de crescimento e a restrição está relacionada à taxa de acumulação de qualquer um dos fatores de produção da economia. Adicionalmente, a relação acima depende de outros fatores, como da mudança da taxa real de câmbio, da taxa de crescimento do resto do mundo, além das elasticidades renda das importações e exportações. Também, é preciso lembrar que, embora sendo o crescimento com poupança externa maior do que sem a utilização da mesma, quando o pagamento dos juros e do principal for realizado, a taxa de crescimento será menor, como apontado por Ferreira e Canuto (2003).

Pela equação (10), pode afirmar ainda que uma elevação do crescimento do resto do mundo, o que traz impactos positivos nas exportações, favorece a acumulação de capital físico e humano, além de propiciar um crescimento do nível de tecnologia. Essa relação deve-se a uma restrição externa menos rígida que, por sua vez, permite ocorrer acumulação dos fatores de produção com o consequente aumento da renda.

Apesar de a equação (10) não explicitar a elevação dos investimentos com base nas exportações como outro ponto relevante, ela é mais sólida do que aquela fundamentada na entrada de divisas via conta capital. Chega-se a essa conclusão de acordo com os argumentos apresentados anteriormente. Lima e Carvalho (2008) apontam evidências empíricas da maior importância das exportações em relação ao fluxo de capitais para explicar o relaxamento da restrição externa e, assim, o crescimento da economia brasileira.

Isolando os fatores de produção capital físico e, posteriormente, capital humano do lado esquerdo da equação (10), encontram-se as equações (11) e (12).

Pelas equações (11) e (12) não se afirma que exista relação de causalidade entre os fatores de produção. Só se coloca esses fatores do lado direito das equações para isolar o efeito da restrição externa sobre a taxa de variação do capital físico, de acordo com a equação (11) e, do capital humano, na equação (12). Quando não se introduz a taxa de variação da tecnologia de forma explícita, ela representa o resíduo em cada uma das equações acima. Essas duas equações formalizam a série de relações entre desempenho do setor externo e acumulação de fatores de produção.

3. Metodologia e fonte dos dados

A análise empírica foi realizada a partir de dados anuais para o período que vai de 1950 até 2008. A escolha desse período deve-se à limitação dos dados de capital físico para períodos anteriores.

Os dados do PIB da economia brasileira foram retirados do site do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) que fornece o PIB a preços constantes e tem como fonte original o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A variável utilizada para mensurar a variação dos trabalhadores é a população residente em 1º de julho, também do IBGE. Para mensurar o capital físico, foram utilizados os dados do estoque bruto total de capital fixo retirados do site do IPEA, sendo a fonte original Morandi e Reis (2004). Para mensurar o capital humano, foi empregado o percentual de pessoas de 15 ou mais anos de idade que sabem ler e escrever um bilhete simples do IBGE, que é 1 (um) menos a taxa de analfabetismo. Como os dados estão disponíveis apenas a cada dez anos, essa porcentagem foi estimada para os demais anos (entre os anos censitários), utilizando-se a função spine cúbica do software Matlab. O saldo da conta capital e financeira foi empregado para mensurar a entrada líquida de capitais e tem como fonte o Boletim do Banco Central do Brasil, assim como as exportações. Ambas as séries foram deflacionadas pelo Consumer Price Index (CPI) do US Bureau of Labor Statistics. Para encontrar a taxa real de câmbio, além do Consumer Price Index (CPI), fez-se o uso da taxa média de câmbio de venda - R$ / US$ - comercial do boletim do Banco Central do Brasil e do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fipe e da Fundação Getúlio Vargas (FGV). O IPC dessas duas instituições foram somados e divididos por 2 (dois). Para mensurar o crescimento do resto do mundo, o PIB a preço constantes dos Estados Unidos foi utilizado como proxy. A fonte é o Bureau of Economic Accounts do US Department of Commerce. Todas as variáveis estão em valores reais.

O método utilizado para estimar a relação entre as variáveis de acordo com as especificações apresentadas em (11) e (12) é o de defasagens distribuídas para captar o efeito defasado das variáveis explicativas e, também, porque ajuda a controlar o problema de endogeneidade destas. Tal método consiste em empregar os estimadores de Mínimos Quadrados Ordinários (MQO) com a utilização das variáveis explicativas em períodos passados.

Em algumas especificações, foram encontrados problemas de não normalidade dos resíduos. O método utilizado para a correção foi o dos mínimos quadrados iterativos com redistribuição de pesos (Iteratively Reweighted Least Squares - IRLS). Método o qual consiste em estimar a regressão pelo Método dos Mínimos Quadrados Ordinários (MQO) e desconsiderar os valores residuais muito elevados. Posteriormente, o processo iterativo começa com pesos atribuídos a cada resíduo e, assim, os com maiores valores recebem os menores pesos. O processo iterativo termina quando a maior variação de um peso para o outro, na mudança de iteração, não ultrapassa um determinado valor mínimo.

Outro problema grave encontrado em algumas especificações foi o de multicolinearidade. Para minimizar isso, utilizou-se a variável nível de exportações no lugar do PIB dos EUA. Em alguns momentos, a substituição foi o suficiente para eliminar o problema, enquanto que, em outros, a correlação entre algumas variáveis explicativas continuou elevada e tornou os resultados encontrados nessas especificações menos confiáveis. O software utilizado na estimação dos parâmetros das equações (11) e (12) é o Stata 9.1.

4. Relações entre renda, fatores de produção e restrição externa

Na Tabela 1, encontram-se os resultados das estimações das equações (7) e (9). Todas as variáveis estão em logaritmo natural e os coeficientes, portanto, são interpretados como elasticidades. A utilização do logaritmo natural é feita porque facilita a interpretação dos mesmos. Ademais, como os coeficientes representam efeitos de variações percentuais dos regressores sobre o regressando, sua interpretação fica mais próxima dos modelos apresentados em que as variáveis estão em taxa, aproveitando a relação de longo prazo entre elas. Isso não seria possível empregando taxas. Todas as variáveis explicativas estão defasadas em 1 (um) período, o que corresponde a 1 (um) ano, para minimizar problemas de endogeneidade das mesmas.

Nas sete primeiras colunas da Tabela 1 são apresentados os resultados testando a Lei de Thirlwall, enquanto nas quatro últimas estão os resultados para o modelo neoclássico que, da forma como é apresentado, seria mais adequado chamá-lo de modelo de oferta de fatores de produção.

Utilizam-se as exportações como uma das variáveis explicativas devido à ênfase dada na literatura apresentada anteriormente que ressalta seu papel na determinação do nível e crescimento da renda em uma economia, também, por problemas de multicolinearidade. Outra vantagem é que, por se utilizar o crescimento da economia norte-americana como proxy para o desempenho da economia mundial, as exportações refletem melhor os efeitos do crescimento da economia mundial sobre o relaxamento das restrições externas.

De acordo com os resultados apresentados na Tabela 1, as quatro primeiras estimações mostram a importância de cada uma das variáveis que relaxa a restrição externa ao crescimento para elevar o PIB brasileiro, entre 1950 e 2008, quando consideradas de forma isolada. Significa que uma depreciação cambial de 1% eleva o PIB, em média, em 1,06%, enquanto as mesmas variações na renda externa, nas exportações e entrada líquida de capitais têm efeitos sobre o PIB de 1,47%, 0,78% e 0,82%, respectivamente. Todos os coeficientes mostraram-se positivos e significativos ao nível de 1%.

Ao testar a equação (7), com os resultados apresentados na quinta coluna, percebe-se que o crescimento da economia mundial é indispensável para dinamizar a economia brasileira. Outra variável relevante, se bem que em menor magnitude, é a entrada líquida de capitais. A elevação do PIB da economia mundial em 1% tem um impacto positivo sobre o PIB da economia brasileira de 1,5%. Controlando para essas duas, o efeito do câmbio torna-se negativo, embora seu efeito seja pequeno e significativo apenas ao nível de 5%.

Quando se utiliza o crescimento das exportações no lugar do crescimento da economia mundial, nota-se que seu efeito é positivo, sendo esta a única variável significativa na explicação do desempenho do PIB brasileiro. Uma elevação de 1% em tal variável tem um impacto positivo sobre o PIB de 0,77%. Isso ocorre pela importância das exportações em relaxar as restrições externas além de seus efeitos destacados por Eichengreen (2008).

Comparando os resultados apresentados nas colunas (5) e (7), percebe-se que são semelhantes, ou seja, a inclusão da variável nível de exportações não provocou alterações relevantes e seu coeficiente não foi estatisticamente diferente de zero. Isso indica que o modelo mais adequado é aquele que contém o logaritmo natural da proxy para renda mundial. Como o Fator de Inflação da Variância (FIV) é baixo em todos os casos, pode-se dizer que a não significância das exportações ocorre de fato, porque a variável relevante para explicar o relaxamento das restrições externas é o comportamento da renda mundial. Esta, por sua vez, altera as exportações.

Considerando o modelo de oferta apresentado nas quatro últimas colunas, é possível verificar que os regressores capital humano, capital físico e trabalho são relevantes para explicar alterações na renda quando considerados isoladamente, ou seja, sem controlar para os efeitos das demais variáveis. Quando considerados os efeitos dos três fatores simultaneamente com os resultados apresentados na última coluna, o único fator significativo para explicar variações no PIB é o capital físico. Como se pode observar pelo FIV, a elevada multicolinearidade compromete, no entanto, a confiabilidade dos resultados ao inflar a variância dos estimadores dos parâmetros populacionais. De qualquer essas variáveis são fundamentais para explicar alterações no PIB da economia brasileira tanto pelo coeficiente de determinação quanto pelo valor da estatística F.

Nas três últimas linhas da Tabela 1, são apresentadas as estatísticas do traço e do autovalor para verificar a existência de vetores de cointegração, de acordo com o teste de cointegração de Johansen, além da existência ou não de tendência e de intercepto na realização dos testes, conforme explicado nas notas da mesma. A realização desses testes é necessária porque todas as variáveis em logaritmo natural apresentam raiz unitária. Assim, corre-se o risco de encontrar uma correlação espúria entre as variáveis se elas não forem cointegradas. Os testes mostram que quando se utilizam os modelos completos, seja o da restrição externa com exportações ou crescimento do resto do mundo, seja o da oferta de fatores, há pelo menos um vetor de cointegração entre as variáveis, sugerindo ser a relação entre elas relevante.

De modo geral, pode-se dizer que os dois modelos explicam as variações na renda da economia brasileira entre 1950 e 2008. Falta testar se a restrição externa determina a acumulação de fatores de produção, como apontado pelas equações (11) e (12).

Na Tabela 2, são apresentados os resultados que testam a importância da restrição externa no processo de acumulação de capital físico de acordo com a especificação apresentada na equação (11). Os resultados apresentados nas quatro primeiras colunas mostram que cada uma das variáveis que relaxa a restrição ao crescimento é relevante para explicar as variações no estoque de capital físico da economia brasileira quando consideradas isoladamente.

Na primeira coluna, os resultados apontam que uma depreciação da taxa de câmbio real em 1% eleva a acumulação de capital físico em 1,29%. Nas três próximas colunas, verifica-se que uma elevação de 1% nas variáveis renda do resto do mundo, exportações e aumento do fluxo líquido de capitais, tem um impacto positivo e significativo no estoque de capital físico de 1,83%, 1,03% e 0,96% respectivamente.

Quando se controla os efeitos de todas as variáveis que relaxam a restrição externa (colunas 5 e 6), os resultados mostram que as fundamentais são crescimento do resto do mundo e exportações. Quando as quatro variáveis são consideradas explicativas ao mesmo tempo (coluna 7), os resultados apontam, novamente, que a variável relevante para explicar o relaxamento da restrição externa é o crescimento do resto do mundo. Os resultados apresentados nas sete primeiras colunas são muito semelhantes aos encontrados quando a variável explicada é o logaritmo natural do PIB brasileiro (Tabela 1).

Incluindo a variável capital humano de forma a aproximar da especificação apresentada na equação (11), nota-se a perda de significância da variável renda do resto do mundo na coluna (8). O FIV indica, no entanto, que a inclusão daquela introduziu o problema da multicolinearidade. Isso infla a variância e faz com que os coeficientes estimados percam sua significância. Ao substituir a variável renda do resto do mundo pelas exportações, verifica-se não haverá problemas de multicolinearidade e estas passam a ser significativas ao nível de 1% na explicação da acumulação de capital físico. Significa que as restrições externas são importantes mesmo quando se controla o efeito do capital humano sobre o capital físico.

Com a especificação da equação (11) completa, obtêm-se resultados semelhantes. A diferença é que a influência da renda do resto do mundo passa a ser negativa e seu coeficiente estatisticamente diferente de zero, ao nível de significância de 1%. É necessário, entretanto, cuidado ao interpretar os resultados pelo grave problema de multicolinearidade apresentado, sobretudo entre as proxies para trabalho, renda do resto do mundo e capital humano.

O problema da multicolinearidade quando se emprega o nível de exportações ainda é pequeno com a especificação completa de acordo com os resultados apresentados na última coluna. Seu efeito no estoque do capital físico continua positivo e significativo, ao nível de 1%, indicando a importância das exportações para relaxar a restrição externa e estimular a acumulação desse fator de produção.

Em relação à taxa real de câmbio, apesar de o efeito de uma depreciação cambial ser positivo na acumulação de capital físico, quando essa variável é considerada isoladamente, ele é negativo ou nulo nas demais especificações. Uma possibilidade para explicar esse fenômeno é o câmbio ser relevante no desempenho do setor exportador como mostrado por vários estudos que analisam a condição de Marshall-Lerner e este, por sua vez, afetar o nível de investimentos. Uma vez controlado para o efeito das exportações ou do crescimento do resto do mundo, seu efeito passa a ser nulo ou mesmo negativo, no longo prazo, já que a depreciação torna os bens de capitais importados mais caros.

Como se verifica nas últimas linhas da Tabela 2, a existência de vetores de cointegração nas especificações em que todas as variáveis que relaxam a restrição externa são empregadas (colunas 5, 6 e 7) indica que a relação entre elas não é espúria, ou seja, a restrição externa é relevante na acumulação do capital físico. Os modelos mais completos, com seus resultados apresentados nas últimas quatro colunas, também apresentam ao menos um vetor de cointegração, indicando a relevância da relação entre as variáveis.

Na Tabela 3, estão os resultados da especificação apresentada na equação (12). Nela, a variável explicada é o logaritmo natural do capital humano. As 11 especificações apresentadas são análogas àquelas da Tabela 2. Nas quatro primeiras colunas, estão os efeitos de cada uma das variáveis que relaxa a restrição externa sobre o fator capital humano.

Os resultados indicam que cada uma delas tem um efeito positivo e significativo na acumulação do fator capital humano, quando considerada isoladamente. O efeito da depreciação da taxa de câmbio real em 1% e da elevação em 1% na renda mundial, nas exportações e na entrada líquida de capitais no PIB é de 0,23%, 0,27%, 0,15% e 0,14%, respectivamente. A magnitude desses efeitos é menor em relação às estimações apresentadas na Tabela 2, quando o capital físico era a variável explicada. Esse resultado é esperado porque as variações nos investimentos em capital humano são mais suaves quando se compara com as dos investimentos em capital físico.

Nas duas próximas colunas, estão os resultados, considerando-se todas as variáveis que afetam a restrição externa. A diferença é que na quinta coluna emprega-se a renda do resto do mundo, enquanto que na sexta, as exportações. Os coeficientes estimados apontam que a principal variável para aliviar a restrição externa e, assim, influenciar a acumulação de capital humano é a elevação da renda mundial ou as exportações.

Depois de introduzidas as quatro variáveis em uma mesma equação (coluna 7), nota-se que o efeito da renda continua positivo e significativo, enquanto o coeficiente das exportações torna-se negativo e significativo. Isso indica que a variável mais adequada no modelo é a renda do resto do mundo. Quando inserido o capital físico na análise, o coeficiente da variável renda do mundo continua positivo e significativo, apesar do problema da multicolinearidade, como apresentado na coluna (8). Quando utilizadas as exportações no lugar da renda do resto do mundo, os resultados mudam de forma considerável, conforme exposto na coluna (9). Em tal caso, o coeficiente das exportações passa a ter um sinal negativo e significativo, enquanto a depreciação do câmbio exerce um efeito positivo e significativo na variação do capital humano, além do efeito desta ser maior, em módulo, do que o das exportações.

Introduzindo a variável proxy para o fator trabalho, os resultados apresentados nas duas últimas colunas da Tabela 3 mostram que a depreciação do câmbio tem um papel relevante na acumulação do capital humano. Adicionalmente, essa variável não apresenta problemas de multicolinearidade com as demais. O coeficiente da variável proxy para crescimento do resto do mundo apresenta um sinal negativo e é estatisticamente diferente de zero, ao nível de 1%. O elevado grau de multicolinearidade entre as variáveis, entretanto, compromete a estimação dos mesmos. O coeficiente da variável capital físico apresenta, inclusive, um sinal negativo, embora não seja significativo. O coeficiente estimado das exportações também aponta um sinal negativo e significativamente diferente de zero, embora seu efeito seja reduzido.

Nas últimas linhas da Tabela 3, verifica-se que praticamente todas as diferentes especificações possuem ao menos um vetor de cointegração, sugerindo que a relação entre as variáveis que relaxam a restrição externa realmente importam na determinação do nível de capital humano na economia brasileira.

Pelo elevado grau de multicolinearidade quando se introduz a proxy ao fator trabalho, seria prudente não considerar os resultados das duas últimas regressões na análise dos resultados, sendo o mesmo válido para as duas últimas especificações apresentadas na Tabela 2.

Com a exclusão desses resultados, as estimações apresentadas acima indicam que variações da renda mundial, por meio de seus efeitos sobre as exportações da economia, são relevantes na acumulação dos fatores de produção capital físico e capital humano.

O efeito da depreciação cambial parece ser negativo na acumulação de capital físico quando se controla para as demais variáveis. Não se deve esquecer, no entanto, que o câmbio tem impactos positivos na determinação das exportações. Estas, por sua vez, influenciam positivamente o investimento em capital físico. Seus efeitos negativos podem ser porque, uma vez controlado para os impactos sobre as exportações, depreciações cambiais tornam os bens de capital importados mais caros.

A relação das depreciações cambiais com variações no nível de capital humano é ambígua. Em algumas estimações seus efeitos mostram-se negativos (coluna 5), enquanto em outras eles são positivos (colunas 8 e 9). De qualquer forma, é difícil imaginar que o efeito das depreciações cambiais seja positivo na acumulação dos fatores de produção fora seus estímulos sobre as exportações. Uma possibilidade seria o favorecimento dos setores que concorrem com os importados, relaxando ainda mais a restrição externa.

Conclusões

Existe um debate relevante na literatura econômica em relação aos principais fatores que determinam o crescimento de uma economia. Ela é feita, no entanto, de uma maneira separada, ao menos quando se utilizam modelos econômicos formalizados algebricamente. Alguns que se destacam são os modelos baseados na acumulação de fatores de produção de um lado e na restrição externa do outro.

No presente estudo, foi feito um esforço no sentido de elaborar e testar um modelo ainda em fase inicial que formaliza as inter-relações existentes entre as distintas abordagens, embora as ideias contidas nele já estejam expostas em artigos e livros que tratam do tema como, por exemplo, em McCombie e Thirlwall (1994). A elaboração e o teste desse modelo formal ocorrem no sentido de se avançar na compreensão dos fatores chaves que determinam o crescimento da economia brasileira.

Os resultados encontrados mostram que a restrição externa é um elemento importante para explicar a acumulação de fatores de produção da economia. O ideal seria contar com uma proxy para a tecnologia, mas os resultados encontrados já indicam que as acumulações dos fatores capital humano e capital físico de forma sustentada dependem de um bom desempenho do setor exportador, o que favorece as conclusões alcançadas nos estudos teóricos e empíricos baseados no artigo seminal de Thirlwall (1979).

Trabalho recebido em 24 de fevereiro de 2011

Aprovado em 25 de agosto de 2011

(

  • BARBOSA-FILHO, N.H. Growth, exchange rates and trade in Brazil: a structuralist post-Keynesian approach. Nova Economia, 14 (2), p. 59-86, 2004.
  • __________________. The Balance of Payments Constraint: From Balanced Trade to Sustainable Debt. Center for Economic Policy Analysis Working Paper 06: 1-24, 2002.
  • BÉRTOLA, L.; HIGACHI, H.; PORCILE, G. Balance of payments constraint growth in Brazil: a test of Thirlwall's Law, 1890-1973. Journal of Post-Keynesian Economics, 25 (1): 123-140, 2002.
  • BOYD, D.; CAPORALE, G.M.; SMITH. R. Real exchange rate effects on the balance of trade: cointegration and the Marshall-Lerner condition. International Journal of Finance and Economics, 06 (3): 187-200, 2001.
  • BRESSER-PEREIRA, L.C. Exchange rate: fix, float, or manage it? Fundação Getúlio Vargas - Texto para Discussão, 135: 1-12, 2004.
  • CARVALHO, V.R.S.; LIMA, G.T. Estrutura produtiva, restrição externa e crescimento econômico: a experiência brasileira. Economia e Sociedade, 18 (35): 31-60, 2009.
  • DIAS, J.; DIAS, M. H. A.; LIMA, F.F. Os efeitos da política educacional no crescimento econômico: teoria e estimativas dinâmicas em painel de dados. Revista de Economia Política, 29 (3): 232-251, 2009.
  • EICHENGREEN, B. The Real Exchange Rate and Economic Growth. Comission on Growth and Development, Working Paper No. 4, 2008.
  • ENDERS, W. Applied Econometric Time Series. United States: Wiley Series in Probability and Statistics, 2004.
  • FERREIRA, A.; CANUTO, O. Thirlwall's Law and foreign capital in Brazil. Momento Econômico, 125: 18-29, 2003.
  • GOMES, F.A.R.; LOURENÇO, S.P. Can real exchange rate devaluation improve the trade balance? The 1990 - 1998 Brazilian case. Applied Economics Letters, 12 (9): 525-528, 2005.
  • GUPTA-KAPOOR, A.; RAMAKRISHNAN, U. Is there a J-Curve? A new estimation for Japan. International Economic Journal, 13 (4): 71-79, 1999.
  • JAYME JR., F.G. Balanced-of-payments constrained economic growth in Brazil. Revista de Economia Política, 23 (1): 62-84, 2003.
  • KRUGMAN, P.; BALDWIN, R.E. The Persistence of the U.S. Trade Deficit. Brookings Papers on Economic Activity, 1: 1-43, 1987.
  • LIMA, G.T.; CARVALHO, V.R. Macrodinâmica do Produto sob Restrição Externa: A Experiência Brasileira no Período 1930-2004. Revista de Economia Aplicada, 12 (01): 55-77, 2008.
  • MANKIW, N. G., ROMER, D., WEIL, D. A contribution to the empirics of economic growth. The Quarterly Journal of Economics, v.107, n.2, p.407- 437, 1992.
  • MCCOMBIE, J.S.L., ROBERTS, M. The Role of the Balance of Payments in Economic Growth. In: The Economics of Demand Led Growth, Challenging the Supply-Side Vision of the Long-Run. Edited by Setterfield, M: 87-114, 2002.
  • ______________ ; THIRLWALL, A.P. Economic Growth and the Balance of Payments Revisited. In: Arestis, P., Palma, G., Sawyer, M. (eds). Markets, Unemployment and Economic Policy: Essays in Honour of Geoffrey Harcout. Vol.2, London, Routledge: 498-511, 1997.
  • _________________; _______________. Economic Growth and the Balance of Payments Constraint London: Macmillan Press, 1994.
  • MEIRELES, S.F.; JAYME JR, F.G.; LIBÂNIO, G.A. Mobilidade de Capitais e Crescimento Econômico: Identificando Elementos para uma Síntese Teórica. Economia e Sociedade, 3 (37): 439-467,2009.
  • MORANDI, L.; REIS, E. Estoque de Capital Fixo no Brasil, 1950-2002. 2004. Anais do XXXII Encontro Nacional de Economia - ANPEC, 2004.
  • MORENO-BRID, J.C. On Capital Flows and the Balance-of-Payments-Constraint Growth Model. Journal of Post Keynesian Economics, 21(2): 283-298, 1998.
  • NAKABASHI, L. O Modelo de Thirlwall com variações nas elasticidades. Economia e Sociedade, 16 (1): 93-110, 2007.
  • ONAFOWORA, O. Exchange rate and trade balance in East Asia: is there a J-Curve? Economics Bulletin, 05 (18): 1-13, 2003.
  • PORCILE, G.; CURADO, M.; BAHRY, T. R. Crescimento com restrição no balanço de pagamentos e "fragilidade financeira" no sentido minskyano: uma abordagem macroeconômica para a América Latina. Economia e Sociedade, 12 (1): 25-41, 2003.
  • RODRIK, D. The Real Exchange Rate and Economic Growth. Brookings Papers on Economic Activity, Conference Draft, 2008
  • SOLOW, R. M. A contribution to the theory of economic growth. The Quarterly Journal of Economics, v.70, n.1, p.65-94, 1956.
  • THIRLWALL, A.P. The Balance of Payments Constraint as a Explanation of International Growth Rate Differences. Banca Nazionale del Lavoro Quarterly Review, 128, 1979.
  • ____________; HUSSAIN, M.N. The Balance of Payments Constraint, Capital Flows and Growth Rate Differences Between Developing Countries. Oxford Economic Papers, 10: 498-509, 1982.
  • 1
    ) Se a condição de Marshall-Lerner é satisfeita, isso indica que uma depreciação real da moeda doméstica conduz a uma elevação nas exportações líquidas, ou seja, melhora o saldo da balança comercial tanto pelo estímulo às exportações quanto pela retração das importações. Essa condição, no entanto, não é satisfeita no curtíssimo prazo, pois o efeito sobre os preços acaba sendo maior do que sobre as quantidades, ou seja, após uma depreciação cambial real, as exportações líquidas tendem a piorar para depois apresentarem melhora. Esse fenômeno é conhecido como Curva J. Veja, por exemplo, Boyd, Caporale e Smith (2001).
    (
  • 2
    ) Citam-se alguns estudos que mostram essa relação como Krugman e Baldwin (1987) para a economia norte-americana, Gupta-Kapoor e Ramakrishnan (1999) para a economia japonesa, Boyd, Caporale e Smith (2001) para os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Onafowora (2003) para os países do leste asiático, além de Gomes e Lourenço (2005) para a economia brasileira.
    (
  • 3
    ) A equação (7) não precisa ser satisfeita no curto prazo visto a possibilidade de ocorrência de variações no nível de reservas.
    (
  • 4
    ) Na equação (8), faz-se a suposição de que a elevação do trabalho e dos dois tipos de capital trazem um retorno constante de escala. Esse não é, no entanto, necessariamente o caso. Para uma discussão voltada ao fator de produção capital humano, ver Dias, Dias e Lima (2009).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      24 Fev 2011
    • Aceito
      25 Ago 2011
    Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, Publicações Rua Pitágoras, 353 - CEP 13083-857, Tel.: +55 19 3521-5708 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: publicie@unicamp.br