Acessibilidade / Reportar erro

Globalização e poder efetivo: transformações globais sob efeito da ascensão chinesa

Globalization and effective power: the rise of China

RESUMO

Este artigo examina as principais transformações na era da globalização econômica, destacando o papel desempenhado pela China nos anos 2000, bem como analisa os impactos desse processo sobre o poder efetivo dos países de maior importância na arena internacional. A análise da evolução do poder efetivo dos países abarca as esferas comercial, produtiva, tecnológica, monetária e financeira. Os principais resultados foram: o crescente poder da China na economia mundial, a manutenção do elevado poderio econômico dos Estados Unidos, mesmo após a crise de 2008, e a elevada vulnerabilidade externa estrutural de algumas das principais economias do mundo em desenvolvimento.

Palavras-chave:
Globalização econômica; China; Estados Unidos; Poder efetivo; Vulnerabilidade externa

ABSTRACT

This paper analyses the main changes in the global economy, highlighting the role played by China in the 2000s. The effects of these changes on the real power of the most powerful countries are also analyzed. The analysis of the evolution of the effective power in the era of economic globalization deals with the trade, productive, technological, monetary and financial dimensions. The main conclusions found were: the relative increase of the economic power of China; the relative stability of the economic power of the United States after the 2008 crisis; and, the significant structural external vulnerability of some of the principle developing economies in the world.

Keywords:
Economic globalization; China; United States; Effective power; External vulnerability


Introdução

O processo de globalização econômica avançou significativamente a partir das últimas duas décadas do século passado. Este processo tem provocado profundas transformações estruturais na economia mundial. Em particular, tem havido alterações no poder dos mais importantes países. No conjunto das transformações, a mais evidente é, de um lado, a manutenção de níveis elevados de poder econômico dos Estados Unidos, mesmo com certa redução desse poderio após a crise de 2008, e, de outro, a ascensão da China como poder econômico. No mundo desenvolvido e em desenvolvimento constatam-se mudanças nas posições relativas no sistema econômico internacional nas esferas comercial, produtiva, tecnológica, monetária e financeira. Portanto, configura-se uma nova divisão internacional da produção e do trabalho. Vale ressaltar que essas transformações globais têm também agravado a situação de vulnerabilidade externa estrutural de países que não têm sido capazes de se proteger (por meio de estratégias nacionais) dos problemas causados pelo processo da globalização.

Diante disto, este artigo tem como objetivos examinar as principais transformações na era da globalização econômica, destacando o papel desempenhado pela China nos anos 2000, e analisar os impactos dessa globalização sobre o poder efetivo das maiores economias do sistema internacional. Para a análise do poder efetivo desses países serão utilizados indicadores que abarcam as esferas comercial, produtiva, monetária e financeira.

O artigo está dividido em quatro seções que seguem esta introdução. A seção 1 apresenta de forma concisa os fundamentos conceituais e analíticos. Na seção 2 são analisadas as principais mudanças nas esferas comercial, produtiva, tecnológica, monetária e financeira das relações econômicas internacionais que afetam os principais países. São apresentadas evidências da manutenção do elevado poder efetivo dos Estados Unidos, do crescente papel da China, que se tornou a "fábrica do mundo", e da vulnerabilidade externa estrutural das principais economias do mundo em desenvolvimento. A seção 3 examina importantes processos globais da década de 2000 decorrentes do dinamismo da economia da China (denominado "efeito China"). O artigo é concluído com a síntese dos principais resultados.

1 Breve arcabouço conceitual: globalização econômica, poder efetivo e vulnerabilidade externa estrutural

Os conceitos-chave usados neste texto são os seguintes: globalização econômica, poder efetivo e vulnerabilidade externa estrutural.

A era da globalização é considerada aqui como o período em que ocorre o desmantelamento da ordem socioeconômica de Bretton Woods (pautada no keynesiano/fordista) associada à generalização do modelo neoliberal que tem como características marcantes: liberalização financeira, abertura comercial e integração produtiva.

A liberalização financeira, iniciada na década de 1970, permitiu a livre movimentação e valorização dos fluxos financeiros e acelerou vertiginosamente a sua velocidade permitindo, assim, a integração estreita desses mercados e a ampliação da acumulação financeira. Isso gerou a diminuição acentuada das restrições com as quais as empresas se deparavam para obter um diferencial de rentabilidade positiva ao privilegiar as aplicações financeiras em detrimento dos investimentos produtivos. Como resultado, a dinâmica dos sistemas financeiros (nacionais e internacionais) passou a influenciar fortemente a evolução da renda e do emprego em escala mundial (Chesnais, 1997CHESNAIS, F. A emergência de um regime de acumulação mundial predominantemente financeiro. São Paulo: Hucitec, 1997, p. 19-46. (Estudos Marxistas, n. 3).; Mcnally, 1999McNALLY, D. The present as history: thoughts on capitalism at the millennium. Monthly Review, v. 51, n. 3, p. 134-145, Jul,/Aug. 1999.; Salama, 2000SALAMA, P. Du productif au financier et du financier au productif en Asie et en Amérique latine. Rapport CAE, n. 25: Développement, p.75-126, 2000.; Carcanholo et al., 2008CARCANHOLO, M. & PINTO, E. & FILGUEIRAS, L. & GONCALVES, R. Crise Financeira Internacional - natureza e impacto. In: WANSETTO, R. & QUINTELA, S. (Org.). Ilegitimidade da Dívida Pública: quem deve a quem? Alternativas desde o Sul. São Paulo: Expressão Popular, 2008, v. 2, p. 12-18.).

Esse processo de liberalização financeira foi impulsionado pelas decisões de políticas tomadas pelo governo dos Estados Unidos em sua busca pela ampliação dos espaços de circulação de seus capitais, especialmente o bancário-financeiro, garantindo para suas instituições financeiras a capacidade plena na função de gestora das finanças e da moeda de referência mundial (dólar dos EUA). Isso ampliou a centralidade dos Estados Unidos no sistema financeiro e monetário mundial em decorrência da ampliação do papel desempenhado pelo dólar (moeda de curso internacional em todas as funções, sobretudo na condição de reserva de valor), visto que o padrão monetário internacional é marcado por uma clara hierarquia monetária associada à função de reserva de valor de uma dada moeda (Seabroke, 2001SEABROKE, L. US power in international finance. The Victory of dividends, Palgrave, 2001.; Serrano, 2002SERRANO, F. Do ouro imóvel ao dólar flexível. Economia e Sociedade, Campinas, n. 20, 2002.).

A segunda característica marcante da era da globalização, a abertura comercial (por meio da redução das barreiras comerciais não tarifárias e, sobretudo, as tarifárias), gerou maior concorrência entre as empresas nacionais e multinacionais. Essa maior contestabilidade dos mercados vem forçando a busca pela elevação da produtividade e pela redução dos custos que, por sua vez, também transbordou para o âmbito da produção.

O processo de integração produtiva em escala mundial - o terceiro elemento característico da era da globalização -, em curso desde o início dos anos 1980, é fruto da configuração de novas formas de gestão do trabalho, de padrões de automação informatizada (modularização) e de organização industrial. Esse processo ganhou uma generalização na década de 2000, sobretudo nos países em desenvolvimento da Ásia, tendo a China como eixo articulador, e passou a ser denominado de "cadeia de produção global". Essas mudanças permitiram a geração de novos bens e serviços e a redução dos custos de transação das operações internacionais em decorrência do aumento do controle sobre essas operações (Sturgeon, 2002STURGEON, T. Modular production networks: a new American model of industrial organization. Industrial and Corporate Change, v. 11, n. 3, p. 451-496, 2002.; Whittaker et al., 2008WHITTAKER, D.; ZHU, T.; STURGEON, T.; TSAI, M.; OKITA, T. Compressed development. IPC/MIT, 2008. (Working Paper Series, n. 08-005).).

Esses elementos possibilitaram às grandes empresas multinacionais maior controle e expansão de seus ativos em escala internacional a partir de dois mecanismos: i) por meio da expansão crescente de suas filiais (novas unidades) descentralizadas territorialmente, tendo o investimento direto externo (IDE) como principal instrumento; e ii) por meio do processo de terceirização da atividade produtiva, configurando novas formas de organização industrial em que ocorrem a "deslocalização" e a "desverticalização" do processo manufatureiro de partes e componentes, que antes eram produzidos na fábrica central do grupo, para empresas juridicamente independentes e em outros espaços nacionais. A grande companhia (especialmente a que possui o brand) estabelece controle significativo sobre o processo produtivo de outras empresas, sem que tenha de absorvê-la para isso (Hiratuka; Sarti, 2010HIRATUKA, C.; SARTI, F. Investimento Direto e Internacionalização de empresas brasileiras no período recente. In: ACIOLY, L.; CINTRA, M. A. M. (Ed.).Inserção internacional brasileira: temas de economia internacional. Brasília: Ipea, 2010. v. 2.;OECD, 2013OECD. Implications of global value chains for trade, investment, development and jobs OECD, WTO, UNCTAD. Prepared for the G-20 Leaders Summit. São Petersburgo, 6 Aug. 2013. Disponível em: Disponível em: http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/ unctad_oecd_wto_2013d1_en.pdf . Acesso em: 16 set. 2013.
http://unctad.org/en/PublicationsLibrary...
; Unctad, 2013UNCTAD. . Global Value Chains: Investment and Trade for Development. Genebra, United Nations Conference on Trade and Development, 2013.).

Em linhas gerais, pode-se afirmar que a globalização é o processo marcante da economia mundial, que captura suas principais tendências e se caracteriza pela ocorrência simultânea de 3 processos: 1) expansão da internacionalização da produção e dos fluxos internacionais de capital; 2) maior contestabilidade do mercado internacional de bens, serviços e capital; e, 3) maior interdependência entre sistemas econômicos nacionais nas esferas comercial, produtiva, monetária e financeira. Em outras palavras, o funcionamento dos mercados em cada país é cada vez mais influenciado por pressões, fatores desestabilizadores e choques no resto do mundo e, em particular, nos epicentros do sistema econômico internacional que hoje são os Estados Unidos e a China.

Vejamos agora os outros conceitos-chave utilizados neste artigo. O conjunto de recursos materiais (base material) de poder de cada país expressa o seu poder potencial. Ou seja, a capacidade/potencial que o país dispõe para exercer sua vontade independente da vontade alheia. Inúmeros são os recursos utilizados para medir o poder potencial do país, dentre as variáveis (objetivas e subjetivas) mais utilizadas podemos destacar: população, território, geração de riqueza, capacitação tecnológica, forças armadas, preparação militar e prestígio (Morgenthau, 1985, cap. 9; Gonçalves, 2005GONÇALVES, R.. Economia política internacional. Fundamentos teóricos e as relações internacionais do Brasil Rio de Janeiro: Elsevier, 2005., cap. 5).

O poder potencial não coincide, necessariamente, com o poder efetivo. Em outras palavras, um país que detém poder potencial não necessariamente consegue exercê-lo plenamente no sistema internacional, uma vez que as relações entre os Estados são delineadas a partir das constantes disputas por mais poder ("quem não sobe cai") econômico, político e ideológico que, em última instância, determinam a posição hierárquica de cada país no sistema internacional.

É evidente que o poder potencial só se transforma em efetivo se o país consegue ampliar sua capacidade de resistir a pressões, fatores desestabilizadores e choques externos em função das opções de suas respostas e dos custos de enfretamento. Essa capacidade de resistência externa de um país é denominada de vulnerabilidade externa estrutural e decorre de sua posição relativa no que diz respeito ao padrão de comércio internacional, à eficiência do seu aparelho produtivo, ao dinamismo tecnológico e à robustez do seu sistema financeiro.

Nesse sentido, a vulnerabilidade externa estrutural incorpora tanto a dimensão conjuntural (que depende positivamente das opções de políticas disponíveis e negativamente dos custos do ajuste externo) como a dimensão estrutural atrelada à posição relativa de um país nas esferas comercial, produtiva, tecnológica, monetária e financeira. Portanto, a vulnerabilidade externa estrutural, sob a era da globalização, é determinada, principalmente, pelos processos de desregulação e liberalização nas esferas comercial, produtivo-real, tecnológica e monetário-financeira das relações econômicas internacionais do país.

Em suma, o poder efetivo de um país significa a sua probabilidade real de exercer sua própria vontade independentemente da vontade alheia; ou de resistir a pressões, fatores desestabilizadores e choques externos. Contrario sensu, a vulnerabilidade externa estrutural expressa a capacidade, em razão inversa, de resistência a pressões externas. Ou seja, alta vulnerabilidade externa estrutural significa baixo poder efetivo e vice-versa. Portanto, ainda que a base material de poder informe o poder potencial do país, as condições de vulnerabilidade externa estrutural definem o poder efetivo.

2 Transformações globais e poder efetivo: principais indicadores

O sistema de estatísticas das Nações Unidas tem registros para 237 países. No entanto, o sistema internacional é muito hierarquizado visto que 25 países concentram a maior parte da população, do território e da renda. De fato, o "top" 25 responde por 75% da população e do território e 85% da renda global. Isto significa que a base material de poder (população, território e renda) dos países varia significativamente.

Na era da globalização, os dois fatos mais marcantes foram: i) a ascensão da China que é evidenciada pelo aumento de sua participação na renda mundial, sobretudo a partir dos anos 2000 (de 2,2% em 1980 para 15,6% em 2013); eii) a manutenção de elevada participação da economia dos Estados Unidos, mesmo com a sua queda após a crise de 2008 (de 24,7% em 1980 para 23,5% em 2000 e para 18,6% em 2013) (Tabela 1).

A participação acumulada das 10 maiores economias mundiais aumentou de 60,6% em 1980 para 62,6% em 2013 (Tabela 1), ampliando a concentração do poder econômico dessas economias. Os Estados Unidos foram, sem dúvida alguma, o maior perdedor em decorrência, principalmente, do forte impacto da crise 2008. Vale ressaltar que o ganho relativo da China ocorreu em detrimento de todas as maiores economias do mundo, com exceção da Índia, que experimentou aumento de sua participação relativa entre 1980 (2,5%) e 2013 (5,8%). O Brasil, por exemplo, sofreu redução de sua participação de 3,9% em 1980 para 2,8% em 2013 (Tabela 1). Entre 1980 e 2013, a China passou do papel de figurante a um dos atores principais no processo de produção e geração de renda em escala global.

Tabela 1
Participação percentual das principais economias na renda mundial: 1980-2018

Esse dinamismo da economia chinesa foi expresso pela variação da sua participação relativa na renda mundial (13,4 pontos de percentagem) e pela sua taxa de crescimento médio anual da renda per capita (8,6% no período 1980-2013) (Tabela 2). Vale notar que o conjunto dos 10 países com maiores ganhos relativos foi composto de países asiáticos: China, Índia, Coreia do Sul, Indonésia, etc. Por outro lado, houve uma dispersão geográfica no conjunto dos perdedores: Ásia (Japão), Europa (as maiores economias - Alemanha, França, Itália, Reino Unido e Espanha) e as maiores economias das Américas (Estados Unidos, Brasil, México e Canadá) (Tabela 2).

No rank mundial de perdedores entre 1980 e 2013, o Brasil ocupou a 7ª posição segundo a variação da participação relativa, e a 1ª posição (juntamente com a Itália) quando se considerou o crescimento médio anual da renda per capita (0,9%). Comparativamente aos grandes players, cabe destacar que a taxa de crescimento médio anual da renda per capita do Brasil foi um nono da taxa correspondente da China e, praticamente, um quarto da taxa da Índia e metade da taxa dos Estados Unidos (Tabela 2).

Tabela 2
Variação da participação percentual das principais economias na renda mundial

Agora, analisaremos mais detalhadamente a evolução do poder efetivo dos países na era da globalização por meio de indicadores específicos referentes às esferas comercial, produtiva, tecnológica, monetária e financeira.

A característica marcante da globalização comercial é, indubitavelmente, o aumento da competitividade internacional da China no sistema mundial de comércio de bens. A participação chinesa nas exportações mundiais de bens saltou de 0,9% em 1980 para 11,2% em 2012. Com isso, a China tornou-se o maior exportador de bens do mundo, especialmente os industrializados, seguida dos Estados Unidos e da Alemanha. Esse aumento ocorreu em detrimento da participação das principais economias desenvolvidas. Os 10 principais exportadores mundiais de bens respondiam por 49,6% do valor das exportações em 2012 e países como Brasil, Reino Unido, Índia e México, que estão entre as 10 maiores economias do mundo, não faziam parte desse grupo (Tabela 3).

Tabela 3
Participação percentual nas exportações mundiais de bens: 1980-2012 (anos selecionados)

No que se refere à globalização comercial de serviços, também se observou o significativo crescimento da competitividade internacional da China. A participação chinesa nas exportações mundiais de serviços aumentou de 0,7% em 1990 para 4,3% em 2012 (Tabela 4). Esse aumento também ocorreu em detrimento dos países desenvolvidos, principalmente dos Estados Unidos. Entretanto, essa competitividade internacional da China não é comparável à sua competitividade internacional no comércio mundial de bens. Para ilustrar, em 2012, as participações da China no comércio mundial de bens e de serviços foram 11,2% e 4,3%, respectivamente. Portanto, esses indicadores apontam que a competitividade internacional da China em bens foi de aproximadamente 3 vezes maior do que sua competitividade internacional em serviços em 2012. Ademais, em 2010 a China tornou-se a maior potência mundial no comércio de bens, porém, ela ocupa a 5ª posição no que se refere ao comércio mundial de serviços. Ainda que a China tenha avançado significativamente no comércio mundial de serviços, os Estados Unidos continuam com o protagonismo.

No que se refere à globalização produtiva, a China ultrapassou o Japão como a segunda maior indústria de transformação no final dos anos 2000. Em 2011, a China detinha 16,9% do valor adicionado da indústria de transformação mundial. Este avanço ocorreu em detrimento dos países desenvolvidos e os maiores perdedores foram a Alemanha e o Japão. Apesar da redução da participação dos Estados Unidos, esse país manteve a posição de maior produtor mundial de manufaturas (20,9% do total mundial em 2011) (Tabela 4).

Tabela 4
Participação percentual nas exportações mundiais de serviços: 1980-2012 (anos selecionados)

Outros países asiáticos (Índia, Coreia do Sul e Taiwan) também experimentaram aumentos das suas participações relativas no valor adicionado da indústria de transformação mundial. Por outro lado, países em desenvolvimento, como México e Brasil, experimentaram quedas das suas participações relativas. A participação do Brasil caiu de 2,7% em 1980 para 1,7% em 2011 (Tabela 5). Esses indicadores expressam o processo de desindustrialização relativa da economia brasileira na fase pós-1980 (Cano, 2012CANO, W. A desindustrialização no Brasil Campinas, Unicamp. IE, jan. 2012. (Texto para Discussão. IE/Unicamp, n. 200).; Gonçalves, 2013GONÇALVES, R. Desenvolvimento às avessas. Verdade, má-fé e ilusão no atual modelo brasileiro de desenvolvimento Rio de Janeiro: LTC, 2013.)1 (1) Estudos de Bairoch (1982) e Maizels (1970) apontam como principais indicadores de industrialização: a razão entre o PIB da indústria de transformação e o PIB do setor primário, o PIB per capita da indústria de transformação, a variação média anual do PIB per capita da indústria de transformação, a razão entre o PIB per capita da indústria de transformação do país e o PIB per capita da indústria de transformação do resto do mundo. Quedas nesses indicadores apontam para a desindustrialização. A participação do PIB na indústria de transformação no PIB total não é um indicador adequado tendo em vista o processo de terciarização (crescente participação do setor de serviços na renda). .

Tabela 5
Participação percentual do valor adicionado da indústria de transformação mundial: 1980-2011

Além da participação da indústria de transformação, o investimento estrangeiro direto é uma importante variável para compreender as mudanças contemporâneas no âmbito da globalização produtiva. A primeira delas foi a perda de importância relativa dos países desenvolvidos como receptor de investimento estrangeiro direto (IED, estoque). Quedas significativas ocorreram na Alemanha, Reino Unido, Canadá, Hong Kong e Itália. Ganhos relativos ocorreram na China, Brasil, Rússia e Cingapura. Vale notar que a participação relativa do Brasil e da Índia no estoque mundial de IED é aproximadamente igual às suas participações no PIB mundial (cerca de 3%). No caso da China, a participação no estoque mundial de IED (3,7%) está muito aquém da sua participação na renda mundial (15,3% em 2012) (Tabela 6). Isto implica baixo coeficiente de desnacionalização da economia chinesa; ou seja, baixo grau de vulnerabilidade externa estrutural na esfera produtiva-real.

Tabela 6
Investimento estrangeiro direto nas principais economias

A ruptura do paradigma tecnológico foi uma das causas da globalização. Esse paradigma, assentado na informática e nas telecomunicações, tem gerado novos bens e serviços e também reduziu os custos de transação das operações internacionais. No que concerne à questão tecnológica, a Tabela 7 apresenta os dez países com as maiores participações na renda mundial e seus índices de inovação tecnológica (Índice de Produção de Inovação - IPI). O Índice de Produção de Inovação (IPI) mostrou o alto desempenho de países desenvolvidos como Reino Unido, Alemanha, Estados Unidos e França. A surpresa foi o Japão, que ocupa a 33ª posição no rank mundial do IPI. É provável que o menor dinamismo tecnológico do Japão em relação aos outros países desenvolvidos seja a principal explicação do fato de que, com a ascensão da China, o Japão tenha sido o principal perdedor de posições no sistema econômico internacional. No conjunto dos países em desenvolvimento, o destaque é a China que ocupa a 25ª posição no rank mundial do IPI. O Brasil tem desempenho fraco visto que ocupa a 7ª posição no rank da renda mundial e a 68ª posição no rank mundial do Índice de Produção de Inovação.

Tabela 7
Participação na renda mundial e Índice de Inovação Tecnológica, "Top" 10 países

A esfera monetário-financeira internacional se expandiu de forma significativa na era da globalização. A liquidez internacional, informada pelo estoque das reservas internacionais, cresceu 25 vezes no período 1980-2012. Vale notar que, nesse período, o PIB nominal mundial cresceu 7 vezes. A globalização monetária também implicou mudança significativa na distribuição das reservas mundiais. Mais uma vez, a China ganhou papel de destaque, uma vez que sua participação nas reservas mundiais passou de 0,7% em 1980 para 29,0% em 2012 (mais de US$ 3,3 trilhões). No ciclo de expansão da liquidez na primeira década do século XXI alguns países em desenvolvimento (principalmente Brasil, Índia e Rússia) tiveram aumento expressivo das suas reservas internacionais. Neste período, as perdas de posição relativa foram particularmente evidentes no Japão e alguns países asiáticos (Coreia do Sul, Hong Kong, Cingapura, etc.) (Tabela 8).

No que diz respeito à liquidez, cabe mencionar ainda a elevada concentração. O "top" 20 tem mais de 80% das reservas mundiais. De fato, China e Japão detêm 40% das reservas mundiais. O fato é que somente a China detinha 29,0% das reservas mundiais em 2012 (mais de US$ 3,3 trilhões) (Tabela 8). Neste ponto, a China e o Japão são os dois maiores países detentores de títulos do Tesouro dos Estados Unidos. Em dezembro de 2012, a China detinha US$ 1,2 trilhão e o Japão US$ 1,1 trilhão, respectivamente, 21,1% e 19,9% do total do valor dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos nas mãos de estrangeiros2 (2) Ver Tesouro dos Estados Unidos. Disponível em: http://www.treasury.gov/resource-center/data-chart-center/tic/Pages/index.aspx). Acesso em: 11 nov. 2013. .

Tabela 8
Reservas internacionais dos principais países: 1980-2012 (anos selecionados) (% e US$ bilhões)

Ainda no que tange à globalização monetária, cabe mencionar que o mercado mundial de câmbio expandiu-se de forma acelerada. O montante médio diário de transações em moedas aumentou de US$ 1.633 bilhões em 1995 para US$ 5.056 bilhões em 2010. O crescimento foi particularmente forte na primeira década do século XXI. O Japão e os países europeus perderam posição relativa, com a exceção do Reino Unido que aumentou ainda mais seu protagonismo no sistema financeiro internacional. Os Estados Unidos apresentaram pequeno ganho relativo no período em questão. Outros países com significativa base material de poder (China, Rússia, Brasil, Índia, etc.) não desempenharam papel relevante no mercado de câmbio global (Tabela 9).

Tabela 9
Mercado de câmbio global - distribuição geográfica das transações: 1995, 2001 e 2010

Como mostra a Tabela 10, o dólar e o euro responderam por 85,3% das transações dos principais pares de moedas no mercado de câmbio global em 2010. A terceira moeda de maior importância foi o ien japonês. As moedas dos países em desenvolvimento, com elevada base material de poder (China, Índia, Rússia, Brasil, etc.), apresentam usos restritos no sistema monetário internacional não somente como meios de pagamento e reserva de valor, mas também como unidade de conta.

Tabela 10
Mercado de câmbio global - distribuição das transações por pares de moedas: 1995-2010

A criação do euro em 1999 e sua entrada em circulação (notas e moedas) em 2002 poderia ameaçar a hegemonia do dólar dos Estados Unidos. Entretanto, o euro não expandiu a sua participação no total das reservas internacionais quando se considera o peso relativo do conjunto das moedas europeias que ele substituiu (marco alemão, franco francês, florim holandês e European Currency Unit). Mais recentemente (crise financeira internacional de 2008), a participação do euro caiu de 16,1% em 2007 para 13,3% em 2012 entre as reservas identificadas dos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Nesse sentido, o euro não afetou o poder do dólar (Cintra; Martins, 2013CINTRA, M.; MARTINS, A. O papel do dólar e do renminbi no sistema monetário internacional., Brasília: Ipea 2013. Mimeografado.).

As mudanças no sistema monetário e no sistema financeiro internacional impactaram a posição líquida de investimento internacional (PLI) dos países. A PLI é a diferença entre o ativo e o passivo externo. Desequilíbrios de estoque caracterizam situações de vulnerabilidade externa estrutural na esfera financeira para países que não detêm moedas conversíveis. Os Estados Unidos tiveram o mais elevado passivo externo líquido (PLI negativo de US$ 3,9 trilhões em 2012), seguido da Espanha, Austrália e Brasil (Tabela 11). Não obstante, vale lembrar que os Estados Unidos não possuem esse tipo de vulnerabilidade, pois possuem o dólar que é a moeda de curso internacional.

No conjunto dos países mais importantes, os que têm os mais elevados ativos externos líquidos (PLI positivo) são Japão, China e Alemanha. Portanto, esses países têm baixa vulnerabilidade externa estrutural na esfera financeira. No mundo em desenvolvimento, os países com maior vulnerabilidade externa estrutural financeira são Brasil, México, Turquia, Indonésia e Índia. O Brasil, por exemplo, estava "a descoberto" em US$ 727 bilhões em 2012, ao passo que a China estava com PLI positiva de US$ 1,7 trilhão. Considerando esse indicador de desequilíbrio de estoque, o Brasil é, de longe, o país em desenvolvimento com a maior vulnerabilidade externa estrutural financeira. Vale notar, ainda, que o passivo externo líquido do país duplicou entre 2006 e 2012 (Tabela 11).

Tabela 11
Posição líquida de investimento internacional (US$ bilhões, anos e países selecionados) - 2006-12

Na era da globalização, os Estados Unidos deixaram de ser o maior credor para se tornarem o maior devedor do mundo. Em 1986, o passivo externo dos Estados Unidos superou o seu ativo externo. Como mostra a Tabela 12, em 2012, o passivo externo dos Estados Unidos foi de US$ 25,4 trilhões e o ativo externo foi de US$ 21,3 trilhões, ou seja, a posição líquida de investimento internacional foi negativa (US$ 3,9 trilhões).

Tabela 12
Posição de investimento internacional dos Estados Unidos (US$ milhões): 1976-2012

Apesar dessa situação, os EUA mantêm elevado poder econômico em virtude de ser o emissor da principal moeda internacional. No atual padrão monetário internacional, o país emissor da moeda-chave não enfrenta qualquer tipo de restrição externa, já que seu passivo "externo" é composto por obrigações denominadas na sua própria moeda. Com isso, os EUA podem incorrer em déficits permanentes e crescentes em conta corrente sem se preocupar com o fato de seu passivo externo líquido estar aumentando (Serrano, 2002SERRANO, F. Do ouro imóvel ao dólar flexível. Economia e Sociedade, Campinas, n. 20, 2002.). Assim, nos Estados Unidos, a política macroeconômica é focada exclusivamente nos problemas internos como, por exemplo, manutenção da competitividade dos seus setores industriais, ampliação dos seus setores financeiros e combate à inflação e ao desemprego.

Essa posição do dólar no sistema monetário internacional ficou evidente durante a crise financeira que eclodiu em 2008, que teve como epicentro os Estados Unidos. A "fuga para a qualidade" dos investidores (privados e públicos) mundiais foi na direção dos títulos do Tesouro norte-americano mesmo com a redução das taxas de juros para níveis próximos de zero. Isso evidenciou o papel desses títulos como ativos líquidos de última instância da economia mundial (Cintra; Martins, 2013CINTRA, M.; MARTINS, A. O papel do dólar e do renminbi no sistema monetário internacional., Brasília: Ipea 2013. Mimeografado.; Pinto, 2011bPINTO, E.. A crise americana: dívida, desemprego e política. Boletim de Economia e Política Internacional, v. 8, p. 7-26, 2011b.).

A "força do dólar" possibilitou a superioridade financeira das empresas e, sobretudo, dos bancos norte-americanos; entretanto a apreciação cambial causou deterioração da competitividade da indústria manufatureira no território norte-americano. O elevado déficit na conta corrente do balanço de pagamentos dos Estados Unidos é a expressão dessa perda de competitividade. Isso não representou o enfraquecimento da grande empresa americana, mas sim a redução da competitividade dessas empresas localizadas em território nacional. Em busca de maior competitividade, essas empresas terceirizam o seu processo de produção ou deslocaram suas fábricas para as regiões de menor custo relativo da mão de obra. Em consequência, ocorreu um processo de redistribuição espacial e organizacional da produção manufatureira em escala global em que a China tornou-se o eixo dinâmico desse processo (Pinto, 2011aPINTO, E. O eixo sino-americano e as transformações do sistema mundial. In: LEÃO, R.; PINTO, E.; ACIOLY, L. (Org.). A China na nova configuração global: impactos políticos e econômicos., Brasília: Ipea 2011a.; Cintra; Martins, 2013CINTRA, M.; MARTINS, A. O papel do dólar e do renminbi no sistema monetário internacional., Brasília: Ipea 2013. Mimeografado.).

Nesse sentido, o dinamismo chinês na indústria de transformação foi influenciado de forma significativa pela integração produtiva entre esse país e os Estados Unidos. Essa integração (eixo sino-americano) pode ser descrita a partir de três circuitos: (1) o investimento externo dos EUA na China (subsidiárias de empresas transnacionais com matriz nos EUA), cuja produção é orientada tanto para as exportações como para o mercado interno chinês; (2) as cadeias produtivas industriais globalizadas que, por meio do comércio entre firmas, articularam as empresas americanas, detentoras de grandes marcas mundiais, e as grandes empresas de países asiáticos que fornecem suprimentos (máquinas, equipamentos, peças e componentes) para a indústria chinesa; esta, por seu turno, transforma e reexporta produtos acabados para o mundo, sobretudo para os EUA3 3 De forma mais especifica ao segundo circuito, Sturgeon (2002) e Whittaker et al. (2008), após analisarem vários casos da indústria americana (IBM, Nortel, Apple Computer, 3Com e Hewlett Packard), afirmam que essa nova forma de organização industrial (cadeias globais de produção) tem sido adotada pelas grandes empresas de brand dos Estados Unidos, especialmente as de eletrônica. Essas empresas, que detêm marcas mundiais (brand), vêm terceirizando o seu processo de produção (fabricação de peças e componentes e montagem final), ao mesmo tempo em que estabelece o controle/coordenação significativo sobre o processo produtivo globalizado, o que, por sua vez, lhes garante maior valor agregado das cadeias produtivas globalizadas. ; e (3) o segmento da indústria de consumo não durável (vestuário, material esportivo, brinquedos etc.) liderado pelas cadeias varejistas dos EUA, que envolve as firmas da China e do seu entorno como fornecedores. A articulação desses três circuitos fez com que a China se tornasse o centro global de montagem e produção de manufaturas (Sturgeon, 2002STURGEON, T. Modular production networks: a new American model of industrial organization. Industrial and Corporate Change, v. 11, n. 3, p. 451-496, 2002.; Whittaker et al., 2008WHITTAKER, D.; ZHU, T.; STURGEON, T.; TSAI, M.; OKITA, T. Compressed development. IPC/MIT, 2008. (Working Paper Series, n. 08-005).; Pinto, 2011aPINTO, E. O eixo sino-americano e as transformações do sistema mundial. In: LEÃO, R.; PINTO, E.; ACIOLY, L. (Org.). A China na nova configuração global: impactos políticos e econômicos., Brasília: Ipea 2011a.).

Nesse novo rearranjo de organização industrial, as empresas chinesas ainda capturam um valor bem menor do que as grandes empresas americanas que permanecem no topo do processo da globalização produtiva. Portanto, parte dos déficits comerciais do EUA em relação à China esconde a geração de valor para as empresas americanas, que eleva substancialmente a lucratividade dessas empresas. Pelo lado chinês, o tipo de participação de suas empresas na cadeia global não significa que elas sejam apenas maquiladoras, ao estilo mexicano (Branstetter; Lardy, 2006BRANSTETTER, L.; LARDY, N. China's embrace of globalization. Cambridge, MA: NBER, 2006. (NBER Working Paper, n. 12373).). Além das atividades de processamentos de exportações realizadas nas zonas especiais, houve na China o desenvolvimento de capacidades tecnológicas que geraram impactos significativos sobre o conjunto do setor exportador e sobre o setor substituidor de importações. Embora as empresas chinesas ainda participem das cadeias globais em posições inferiores, o governo chinês tem utilizado instrumentos de financiamento e de política industrial com o objetivo de fortalecer as empresas nacionais, tornando-as players no mercado mundial (Rodrik, 2006RODRIK, D. What's so special about China's exports?, Cambridge, MA: NBER 2006. (Working Paper, n. 11947).; Filipe et al., 2010FILIPE, J.; KUMAR, U.; USUI, N.; ABDON, A. Why has China succeeded - and why it will continue to do so. New York: Levy Economics Institute of Bard College, 2010 (Working Paper n. 611). Disponível em: http://www.levyinstitute.org/ pubs/wp_611.pdf
http://www.levyinstitute.org/ pubs/wp_61...
). Dentre esses "grandes jogadores" chineses, pode-se mencionar a Lenovo (computadores), a Huawei (equipamentos de telecomunicações), a Haier (eletrodomésticos e eletroeletrônicos) e a Chery Automobile (automóveis)4 4 Para uma análise detalhada da evolução da indústria automobilística chinesa, verRichet (2013). .

A evolução da economia chinesa tem, cada vez mais, significativo impacto sobre o desempenho da economia mundial, como discutiremos na seção seguinte. Não há dúvida entre os diversos analistas que a China hoje assumiu posição de destaque, principalmente nas esferas produtiva e comercial e das relações econômicas internacionais. Em consequência, a China e seu entorno5 5 À medida que as empresas chinesas sobem "degraus" nas cadeias globais de valor - em virtude de suas estratégias tecnológicas e da elevação do preço da mão de obra - abriram-se espaços para a relocalização de empresas nos países do Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático formada pelos seguintes países: Tailândia, Filipinas, Malásia, Cingapura, Indonésia, Brunei, Vietnã, Mianmar, Laos e Camboja). O governo e, sobretudo, as empresas chinesas têm, cada vez mais, explorado a complementaridade produtiva com seus vizinhos asiáticos. Em consequência, a China apresenta déficits comerciais com boa parte dos países do Asean, com a exceção do Vietnam, e direciona seu investimento externo para os países do seu entorno. Esse processo regional permitiu certa convergência do dinamismo econômico da China com o Leste Asiático, homogeneizando as taxas de crescimento com os países menores da região (Baumann, 2010). O elevado grau de competitividade das exportações chinesas é também fruto da complementaridade regional (comércio, investimento e estrutura produtiva) que aumentou significativamente a eficiência da produção, cuja origem, portanto, deve ser encarada como um bloco de países, e não apenas o país que aparece em frente ao nome made in gravado na mercadoria. tornaram-se atores principais de dois dos eixos estruturantes da globalização: o aumento da contestabilidade (acirramento da concorrência) e a interdependência no sistema econômico internacional.

A economia chinesa não substituiu os Estados Unidos como locomotiva da economia mundial. Na realidade, o que se verifica é uma crescente interdependência entre a economia chinesa - comandada por um capitalismo de estado chinês - e a economia norte-americana - direcionada por um capitalismo liberal/financeiro. Esses dois países estão entrelaçados de inúmeras maneiras: i) maiores consumidores de energia e importadores de petróleo do mundo; ii) o segundo maior parceiro comercial um do outro; iii) os Estados Unidos são os maiores investidores diretos na China, ao passo que a China é o maior credor externo americano; iv) China é a maior nação exportadora do mundo, ao passo que os Estados Unidos são os maiores importadores. Hoje esses dois países são os principais atores da economia mundial (Shambaugh, 2012SHAMBAUGH, D. Tangled titans: conceptualizing the U.S.-China relationship. In: SHAMBAUGH, D. (Org.). Tangled titans: The United States and China. Rowman & Littlefield Publishers, 2012. ; Kissinger, 2011KISSINGER, H. On China. Penguin Canada, 2011.).

3 "Efeito China" e as transformações globais

O crescimento da economia da China (9%-10% a.a entre 1980 e 2013), sobretudo nos anos 2000, esteve associado ao desenvolvimento de sua indústria de transformação e ao rápido processo de modernização. Esses processos geraram profundas modificações nas estruturas produtiva e social da China. Em 1978, quando houve o take-off(implementação das reformas de Deng), o país tinha 956 milhões de habitantes e era eminentemente rural (taxa de urbanização de 18,7%). Em 2010 a população chinesa saltou para 1.338 milhões (aproximadamente 20% da população mundial) e tem havido processo acelerado de urbanização (44,9% da população total nas áreas urbanas). Esse rápido processo de urbanização e modernização tem provocado tanto o aumento do consumo de energia6 6 O consumo per capita de energia elétrica aumentou de 246,5 kwh em 1978 para 2.631,4 kwh em 2009 (crescimento médio ao ano de 30,2%). , de bens duráveis7 7 Entre 1998 e 2010, a quantidade de telefones fixos e móveis por 100 pessoas aumentou, respectivamente, de 0,98 para 22,0 e de 0,02 para 64,2 entre 1992 e 2010; e (iii) o número de televisores a cores, automóveis e motocicletas por cada 100 famílias aumentou, respectivamente, de 69,0 para 124,6, de 0,2 para 6,5 e de 13,4 para 40,8. Esses dados foram obtidos na base Ceicdata. Disponível em: http://www.ceicdata.com. e não duráveis e de alimentos, como também mudanças no padrão de consumo do país.

Apesar da elevação do consumo per capita de diversos produtos, a China ainda está muito distante do padrão de consumo per capita dos países desenvolvidos. Em 2009, por exemplo, os consumos per capita de energia elétrica nos Estados Unidos, na União Europeia e no Japão (12.913,7 kwh, 6.065,7 kwh e 7.819,1 kwh, respectivamente) eram muito superiores ao consumo chinês.

A expansão econômica chinesa tem proporcionado a ascensão impressionante desse país que, cada vez mais, ocupa posição central na economia mundial. Pode-se afirmar que boa parte das transformações internacionais recentes, que configuram uma nova divisão internacional do trabalho, decorrem dos efeitos direto e indireto do crescimento da economia da China. Essa expansão, associado ao seu aumento na participação da renda mundial, tem afetado diretamente a economia mundial tanto pelo lado da oferta global como pelo lado da demanda global.

Nesse sentido, a China passou a desempenhar um novo papel na dinâmica mundial. Pelo lado da oferta global, o país tornou-se o principal produtor e exportador mundial de produtos de tecnologia da informação (TI) e de bens de consumo industriais intensivos em mão de obra e em tecnologia destinados, principalmente, aos mercados americanos e europeus, e, portanto, transformou-se na "fábrica do mundo" (Medeiros, 2006MEDEIROS, C. A. A China como um duplo polo na economia mundial e a recentralização asiática. Revista de Economia Política, São Paulo: Ed. Nobel, v. 26, n. 3. p. 577-594, jul./set. 2006.; Pinto, 2011aPINTO, E. O eixo sino-americano e as transformações do sistema mundial. In: LEÃO, R.; PINTO, E.; ACIOLY, L. (Org.). A China na nova configuração global: impactos políticos e econômicos., Brasília: Ipea 2011a.).

Pelo lado da demanda global, a China tornou-se um grande mercado consumidor: (i) para a produção mundial de máquinas e equipamentos de alta tecnologia e produtos finais, notadamente da Alemanha, do Japão e da Coreia do Sul e; (ii) para a produção de commodities (petróleo, minerais, produtos agrícolas, etc.) originárias de países africanos, latino-americanos e asiáticos (Ibid).

Esse duplo papel (lado da oferta e demanda) desempenhado pela China provocou transformações significativas na economia mundial, sobretudo na década de 2000. Dentre esses processos, cabe destacar: 1) o aumento significativo dos preços internacionais das commodities; 2) o pequeno aumento dos preços dos produtos manufaturados; 3) a melhora dos termos de troca dos países em desenvolvimento exportadores de produtos primários; e 4) a melhora do padrão de consumo de massa em escala global (Castro, 2011CASTRO, A. B. As novas tendências pesadas que estão moldando a economia mundial. In: CASTRO, A. C.; CASTRO, L. B. (Org.). Antonio Barros de Castro: o inconformista - homenagem do Ipea ao Mestre. Brasília: Ipea, 2011. 8 8 Antonio Barros de Castro, em versão inacabada e datada de 12 de fevereiro de 2008, destacou a “a emergência da economia chinesa como a força transformadora da economia mundial”, criando novas “tendências pesadas”. Esse artigo só veio a público em 2011 em obra póstuma editada pelo Ipea que reuniu parte representativa do pensamento desse autor que nos últimos tempos cada vez mais se dedicava aos estudos sobre a China ; Pinto; 2011aPINTO, E. O eixo sino-americano e as transformações do sistema mundial. In: LEÃO, R.; PINTO, E.; ACIOLY, L. (Org.). A China na nova configuração global: impactos políticos e econômicos., Brasília: Ipea 2011a.).

A elevação dos preços internacionais das commodities e a manutenção desses preços em níveis altos, pelos padrões históricos recentes, decorreram do efeito direto e indireto da demanda chinesa e também da elevação dos custos de produção desses produtos. Houve expressivo aumento desses preços na década de 2000 em relação aos anos 1990 (Tabela 13). Boa parte dos preços das commodities cresceu acima de 7% (média anual) nos anos 2000. Os grupos de produtos energéticos e minerais foram os que apresentaram as maiores majorações de preços no referido período (14,7% e 13,7% a.a, respectivamente). Entre 2002 e 2012, as maiores altas dos preços das commodities foram observadas nos seguintes produtos: minério de ferro (41,2%), cobre (17,4%), soja (15,6%), petróleo cru (15%) e cereais (14,2%) (Tabela 13).

Tabela 13
Preços das commodities - variação média anual: 1992-2012 (%)

O primeiro processo significativo - elevação de preços das commodities - resultou da expansão significativa da demanda chinesa. As taxas de expansão do consumo anual médio de energia primária e alimentos na China foram muito maiores do que as taxas correspondentes para o resto do mundo (Tabela 14). Para ilustrar, no período 1991-2001, o consumo mundial de energia primária (carvão, petróleo, gás natural e hidroeletricidade) cresceu à taxa média de 1,6% a.a. e a taxa correspondente para a China foi de 5,1%. No período seguinte (2001-11), esse diferencial foi ainda maior (consumo mundial cresceu 2,7% a.a. e o consumo chinês cresceu 15,1% a.a.). O "efeito China" expressa aqui a contribuição relativa da China para a expansão do consumo mundial. No período 1991-2001, o "efeito China" foi de 27,4% no caso da energia primária, ou seja, a China respondeu por mais de um quarto do crescimento do consumo mundial de energia primária. No período 2001-11, essa contribuição duplicou - a China respondeu por mais da metade da expansão do consumo mundial. O "efeito China" também foi responsável pela expansão do consumo mundial de produtos alimentícios, tais como soja e algodão.

Tabela 14
Consumo de energia e alimentos do mundo e da China

A evolução das importações não deixa dúvida a respeito do efeito China sobre a economia mundial. As importações chinesas (como proporção das importações mundiais) aumentaram de 3,9% em 2002 para 11,6% em 2012 (Tabela 15). O aumento da importância relativa na demanda mundial por importações foi ainda mais evidente no grupo de produtos minerais (aumento de 11,2% em 2002 para 44,6% em 2012). Em 2012, a China respondeu por grande parcela das importações mundiais de produtos, tais como: cobalto (82,6%); níquel (76,5%); minério de ferro (63,5%); e soja em grãos (64,7%). No caso de produtos manufaturados, o peso relativo da China no comércio mundial (importações) foi mais significativo nos produtos intensivos em recursos naturais (madeiras, couros, peles, plásticos e borracha) e bens de capital (máquinas e aparelhos, material elétrico). Esse padrão de comércio, pelo lado das importações, é explicado tanto pela dotação de fatores (escassez relativa de recursos naturais) como pela acelerada acumulação de capital na China.

Tabela 15
Participação percentual das importações da China em relação às importações mundiais por grupos de produtos: 2002 e 2012

A elevação dos preços das commodities também foi influenciada pelo aumento dos custos de produção decorrente da expansão da demanda mundial, inclusive, do "efeito China". A expansão da oferta de produtos primários implicou a exploração de minas, regiões agrícolas e poços de petróleo menos produtivos (por razões geológicas, tecnológicas e regulatórias). O deslocamento da demanda mundial (via "efeito China") e as restrições de oferta (retornos decrescentes) provocaram elevação extraordinária dos preços das commodities e criaram, em certa medida, um piso mínimo para esses preços, dado o atual padrão tecnológico de exploração dos recursos naturais9 9 Serrano (2012) realiza interessante análise sobre o processo de elevação dos preços das commodities na década de 2000; no entanto, atribui peso excessivo aos custos de produção do petróleo e seus fatores geopolíticos. Portanto, a expansão da demanda (efeito China) tem papel secundário .

O segundo processo marcante foi a redução e/ou crescimento mais lento dos preços mundiais dos produtos industrializados em relação aos preços das commodities. Entre 2000 e 2012, o preço médio das manufaturas cresceu 2,3% a.a., ao passo que os preços das commodities energéticas e não energéticas cresceram 16,7% e 8,7% a.a., respectivamente (Tabela 16).

Tabela 16
Variação de preços no mercado mundial segundo o tipo do produto: 2000-12

Essa evolução dos preços das manufaturas foi decorrência da pressão competitiva da produção industrial da China destinada às exportações. Os determinantes básicos do comércio chinês foram salários baixos, economias de escala e de escopo, e novas formas de organização e gestão da produção (simplificação de produtos e processos, denominado de tecnologia frugal, e produção modular) que geraram elevados ganhos de produtividade.

O terceiro processo importante resulta dos anteriores - melhora dos termos de troca dos países em desenvolvimento exportadores de commodities. Os termos de troca são medidos como a relação entre o índice do valor unitário das exportações e o índice de valor unitário das importações de bens. Entre 2000 e 2012, os índices dos termos de trocas das economias em desenvolvimento da África e da América do Sul cresceram 81,7% e 60,5%, respectivamente. Nesse mesmo período, os termos de troca da China, dos países desenvolvidos da Ásia e da Europa decresceram 28,2%, 37,5% e 6,0%, respectivamente (Tabela 18).

Tabela 18
Termos de troca - China e regiões: 2000-2012 (anos selecionados, 2000 = 100)

Esse terceiro processo possibilitou aos países exportadores de commodities, sobretudo os africanos e latino-americanos, reduzirem as restrições externas ao crescimento econômico. Para alguns países, a depender da estrutura produtiva interna, a melhora nos termos de troca representou um bônus macroeconômico, visto que possibilitou maior crescimento sem gerar graves desequilíbrios externos e internos (Fiori, 2011FIORI, J. L. Brasil e América do Sul: o desafio da inserção internacional. In: ACIOLY, L.; CINTRA, M. Inserção internacional soberana: temas de política externa., Brasília: Ipea 2011. Livro 3, v. 1.; Pinto; Balanco, 2012 PINTO, E.; BALANCO, P. Transformações do capitalismo contemporâneo e os impactos para a América Latina: retrospectivas, mudanças e perspectivas. Revista Olho da História, n. 19, dez., 2012.).

O quarto e último processo relevante foi a ampliação, em escala global, do padrão de consumo de massa em virtude da mudança de preços relativos de manufaturas e salários. Essa mudança de preços relativos tem permitido que segmentos da população mundial, que até então viviam na condição de subsistência (pobreza absoluta) nos países em desenvolvimento, notadamente os asiáticos, tivessem acesso aos bens de consumo não duráveis e duráveis da indústria de transformação.

A Tabela 19 deixa evidente a redução significativa da pobreza absoluta. Entre 1999 e 2010 ocorreu significativa redução do número absoluto de pessoas que ganham menos de US$ 2 por dia (PPP). Esse fenômeno ocorreu em boa parte dos países em desenvolvimento: 524 milhões na Ásia Oriental e Pacífico; 25 milhões na Europa e Ásia Central; 49 milhões na América Latina e Caribe; e 20 milhões no Oriente Médio e Norte da África. Apenas nos países em desenvolvimento da África subsaariana verificou-se aumento absoluto do número de pobres (103 milhões), a despeito da queda relativa na participação de pobres (que ganham menos do que US$ 2 por dia (PPP)) na população total de 77,4% em 1999 para 69,9% em 2010.

Tabela 19
População e pobreza nas regiões em desenvolvimento (população em milhões): 1999 e 2010

A redução da pobreza absoluta nos países em desenvolvimento e o menor crescimento dos preços das manufaturas têm possibilitado a ampliação do consumo dos produtos industrializados, sobretudo nos países da Ásia. Ou seja, a terceira e quarta tendências são convergentes.

Essas transformações da década de 2000, provenientes do "efeito China", não necessariamente se repetiram nos anos 2010, uma vez que elas podem ser revertidas em função da economia mundial - aumento da competição com os Estados Unidos que vêm se recuperando nos últimos anos - e da dinâmica econômica da China que mostra sinais de desaceleração suave.

No âmbito da dinâmica interna chinesa, a crise de 2008 deixou evidente os problemas da economia chinesa: crescimento das exportações e do investimento em infraestrutura, necessidade de construção de estratégias voltadas ao reforço do consumo das famílias e sustentabilidade do crescimento de longo prazo (Fang et al, 2009FANG, C.; YANG, D.; MEIYAN, W. Crise e oportunidade: resposta da China à crise financeira global. Revista Tempo do Mundo (IPEA), Brasília/DF, v. 1, n. 1, dez. 2009.). Há sinais claros que o governo da China vem buscando ampliar o consumo das famílias em proporção do PIB, o que implicará em uma desaceleração na taxa de investimento. Isso necessariamente impactará nos preços das commodities mundiais em virtude da desaceleração do consumo chinês desses produtos, sobretudo os minerais. O dado do índice de preços das commodities de 2012 já pode estar refletindo esse processo. De fato, o índice de preços das commodities duplicou entre 2003 e 2011. Porém, em 2012 há reversão deste processo e estimativas e projeções do FMI apontam para queda contínua desses preços no período 2012-1510 10 Os índices de preços das commodities (exclusive combustível) do FMI são: 2011 = 190; 2012 = 171; 2013 = 169; 2014 = 163; 2015 = 157; e 2016 = 155. Ver estimativas e projeções do World Economic Outlook do FMI, abril 2014. Disponível em: http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2014/01. Acesso em: 15 set. 2014. .

Conclusão

Este artigo analisou as principais transformações na era da globalização econômica, destacando os impactos da ascensão da China nos anos 2000. A característica marcante da globalização comercial encontrada foi o aumento extraordinário da competitividade internacional da China no sistema mundial de comércio de bens. A China tornou-se o mais importante exportador de bens do mundo, seguida dos Estados Unidos e da Alemanha.

No que se refere à globalização produtiva, a China tornou-se o país com a segunda maior indústria de transformação. Mesmo com a redução da sua participação no valor da produção mundial, os Estados Unidos mantiveram a posição de maior produtor de manufaturas.

A globalização tecnológica deriva do novo paradigma assentado na informática e nas telecomunicações. Os países desenvolvidos como Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Canadá e França têm os mais avançados sistemas nacionais de inovação. No conjunto dos países em desenvolvimento o destaque é a China, que ocupa a 25ª posição no rank mundial.

A esfera monetário-financeira internacional se expandiu de forma expressiva na era da globalização. A globalização monetária implicou mudanças significas na distribuição da riqueza financeira mundial (reservas, câmbio, etc.). Mais uma vez, verificou-se o papel de destaque da China, que possuía quase um terço das reservas mundiais e mais de um quinto dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos. A despeito disso, verificou-se que o dólar respondeu por boa parte das transações no mercado de câmbio global e que também permanece como a principal moeda de curso internacional.

As mudanças nos sistemas monetário e financeiro internacionais acarretaram desequilíbrios de estoque que caracterizam situações de vulnerabilidade externa estrutural na esfera financeira. Os países que enfrentam as maiores vulnerabilidades nesse campo são Espanha, Austrália e Brasil. Por outro lado, no conjunto dos países com os mais elevados ativos externos líquidos, os destaques são Japão, China e Alemanha. Portanto, esses países têm baixa vulnerabilidade externa estrutural na esfera financeira.

O crescimento da economia da China está associado ao desenvolvimento de sua indústria e ao seu rápido processo de modernização. Entretanto, parte do dinamismo chinês decorre da integração produtiva entre esse país e os Estados Unidos (eixo sino-americano).

O novo papel desempenhado pela China tanto pelo lado da oferta (produtor mundial das manufaturas) quanto pelo lado da demanda (importante consumidor de máquinas e equipamentos de alta tecnologia e de commodities) provocou processos relevantes para a economia mundial na década de 2000. Dentre esses processos, cabe destacar: aumento significativo dos preços internacionais das commodities; aumento relativamente pequeno dos preços dos produtos manufaturados; melhora dos termos de troca dos países em desenvolvimento exportadores de produtos primários. Essas transformações não necessariamente continuarão ao longo dos anos 2010, pois elas podem ser revertidas em decorrência de modificações na economia mundial e na própria economia chinesa (por exemplo, a desaceleração do crescimento econômico e o desenvolvimento tecnológico orientado para a economia de recursos naturais).

Não há dúvida que a evolução da economia chinesa tem significativos impactos sobre o desempenho da economia mundial. Podemos afirmar que a China hoje assumiu posição de destaque, principalmente nas esferas produtiva e comercial das relações econômicas internacionais. Em consequência, a China é protagonista de um dos eixos estruturantes da globalização que é o aumento da contestabilidade no mercado internacional. Entretanto, a economia chinesa não substitui os Estados Unidos como locomotiva da economia mundial. Muito pelo contrário, o que se observa é a crescente interdependência entre as duas maiores potências mundiais.

As análises não deixam dúvidas a respeito, de um lado, do aumento do poderio econômico da China e, de outro, da manutenção do elevado poder econômico dos Estados Unidos, mesmo após os efeitos da crise de 2008. Os EUA ainda são protagônicos na indústria de transformação e têm a moeda de curso internacional e o mercado doméstico com significativo poder aquisitivo. Portanto, os EUA mantêm ostatus de "locomotiva" da economia mundial.

Bibliografia

  • BAIROCH, P. International industrialization levels. The Journal of European Economic History, v. 11, n. 2, Fall, p. 269-333, 1982.
  • BAUMANN, R. Regional trade and growth in Asia and Latin America: the importance of productive complementarity. Brasília: Cepal, 2010.
  • BRANSTETTER, L.; LARDY, N. China's embrace of globalization. Cambridge, MA: NBER, 2006. (NBER Working Paper, n. 12373).
  • CANO, W. A desindustrialização no Brasil Campinas, Unicamp. IE, jan. 2012. (Texto para Discussão. IE/Unicamp, n. 200).
  • CARCANHOLO, M. & PINTO, E. & FILGUEIRAS, L. & GONCALVES, R. Crise Financeira Internacional - natureza e impacto. In: WANSETTO, R. & QUINTELA, S. (Org.). Ilegitimidade da Dívida Pública: quem deve a quem? Alternativas desde o Sul. São Paulo: Expressão Popular, 2008, v. 2, p. 12-18.
  • CASTRO, A. B. As novas tendências pesadas que estão moldando a economia mundial. In: CASTRO, A. C.; CASTRO, L. B. (Org.). Antonio Barros de Castro: o inconformista - homenagem do Ipea ao Mestre. Brasília: Ipea, 2011.
  • CHESNAIS, F. A emergência de um regime de acumulação mundial predominantemente financeiro. São Paulo: Hucitec, 1997, p. 19-46. (Estudos Marxistas, n. 3).
  • CINTRA, M.; MARTINS, A. O papel do dólar e do renminbi no sistema monetário internacional., Brasília: Ipea 2013. Mimeografado.
  • CORNELL UNIVERSITY, INSEAD e WIPO. The Global Innovation Index 2013: the local dynamics of innovation. Geneva, Ithaca e Fontainebleau, 2013. Disponível em: Disponível em:http://www.globalinnovationindex.org/content.aspx?page=GII-Home Acesso em: 11 out. 2013.
    » http://www.globalinnovationindex.org/content.aspx?page=GII-Home
  • FANG, C.; YANG, D.; MEIYAN, W. Crise e oportunidade: resposta da China à crise financeira global. Revista Tempo do Mundo (IPEA), Brasília/DF, v. 1, n. 1, dez. 2009.
  • FILIPE, J.; KUMAR, U.; USUI, N.; ABDON, A. Why has China succeeded - and why it will continue to do so. New York: Levy Economics Institute of Bard College, 2010 (Working Paper n. 611). Disponível em: http://www.levyinstitute.org/ pubs/wp_611.pdf
    » http://www.levyinstitute.org/ pubs/wp_611.pdf
  • FIORI, J. L. Brasil e América do Sul: o desafio da inserção internacional. In: ACIOLY, L.; CINTRA, M. Inserção internacional soberana: temas de política externa., Brasília: Ipea 2011. Livro 3, v. 1.
  • GONÇALVES, R. Desenvolvimento às avessas Verdade, má-fé e ilusão no atual modelo brasileiro de desenvolvimento Rio de Janeiro: LTC, 2013.
  • GONÇALVES, R.. Economia política internacional Fundamentos teóricos e as relações internacionais do Brasil Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
  • HIRATUKA, C.; SARTI, F. Investimento Direto e Internacionalização de empresas brasileiras no período recente. In: ACIOLY, L.; CINTRA, M. A. M. (Ed.).Inserção internacional brasileira: temas de economia internacional. Brasília: Ipea, 2010. v. 2.
  • IMF. World Economic Outlook database. Washington: International Monetary Fund. Disponível em: Disponível em:http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2012/01/ weodata/index.aspx Acesso em: 11 set. 2013.
    » http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2012/01/ weodata/index.aspx
  • KISSINGER, H. On China. Penguin Canada, 2011.
  • MAIZELS, A. Growth and trade. Cambridge, University Press, 1970.
  • McNALLY, D. The present as history: thoughts on capitalism at the millennium. Monthly Review, v. 51, n. 3, p. 134-145, Jul,/Aug. 1999.
  • MEDEIROS, C. A. A China como um duplo polo na economia mundial e a recentralização asiática. Revista de Economia Política, São Paulo: Ed. Nobel, v. 26, n. 3. p. 577-594, jul./set. 2006.
  • MORGENTHAU, H. (1985). A política entre as nações A luta pelo poder e pela paz. 5. ed. Brasília: UnB, 2003.
  • OECD. Implications of global value chains for trade, investment, development and jobs OECD, WTO, UNCTAD. Prepared for the G-20 Leaders Summit. São Petersburgo, 6 Aug. 2013. Disponível em: Disponível em: http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/ unctad_oecd_wto_2013d1_en.pdf Acesso em: 16 set. 2013.
    » http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/ unctad_oecd_wto_2013d1_en.pdf
  • PINTO, E. O eixo sino-americano e as transformações do sistema mundial. In: LEÃO, R.; PINTO, E.; ACIOLY, L. (Org.). A China na nova configuração global: impactos políticos e econômicos., Brasília: Ipea 2011a.
  • PINTO, E.. A crise americana: dívida, desemprego e política. Boletim de Economia e Política Internacional, v. 8, p. 7-26, 2011b.
  • PINTO, E.; BALANCO, P. Transformações do capitalismo contemporâneo e os impactos para a América Latina: retrospectivas, mudanças e perspectivas. Revista Olho da História, n. 19, dez., 2012.
  • RICHET, X. L'industrie automobile chinoise: coopération, développement, internationalisation. Paris: Université de la Sorbonne nouvelle. Paris, 2013. Mimeografado.
  • RODRIK, D. What's so special about China's exports?, Cambridge, MA: NBER 2006. (Working Paper, n. 11947).
  • SALAMA, P. Du productif au financier et du financier au productif en Asie et en Amérique latine. Rapport CAE, n. 25: Développement, p.75-126, 2000.
  • SALAMA, P. Les économies émergentes, le plongeon? Paris: Fondation Maison des Sciences de l´Homme, 2013. (Working Papers Series, n. 42).
  • SEABROKE, L. US power in international finance. The Victory of dividends, Palgrave, 2001.
  • SERRANO, F. Do ouro imóvel ao dólar flexível. Economia e Sociedade, Campinas, n. 20, 2002.
  • SERRANO, F.. Notes for a Sraffian interpretation of the change in the trend of terms of trade in in the 2000s. Rio de Janeiro: UFRJ, 2012. Mimeografado.
  • SHAMBAUGH, D. Tangled titans: conceptualizing the U.S.-China relationship. In: SHAMBAUGH, D. (Org.). Tangled titans: The United States and China. Rowman & Littlefield Publishers, 2012.
  • STURGEON, T. Modular production networks: a new American model of industrial organization. Industrial and Corporate Change, v. 11, n. 3, p. 451-496, 2002.
  • UNCTAD. . Global Value Chains: Investment and Trade for Development. Genebra, United Nations Conference on Trade and Development, 2013.
  • WHITTAKER, D.; ZHU, T.; STURGEON, T.; TSAI, M.; OKITA, T. Compressed development. IPC/MIT, 2008. (Working Paper Series, n. 08-005).
  • WORLD BANK. World Development Indicators database Washington: The World Bank. Disponível em: Disponível em:http://data.worldbank.org/data-catalog/world-development-indicators Acesso em: 11 out. 2013.
    » http://data.worldbank.org/data-catalog/world-development-indicators
  • (1)
    Estudos de Bairoch (1982)BAIROCH, P. International industrialization levels. The Journal of European Economic History, v. 11, n. 2, Fall, p. 269-333, 1982. e Maizels (1970)MAIZELS, A. Growth and trade. Cambridge, University Press, 1970. apontam como principais indicadores de industrialização: a razão entre o PIB da indústria de transformação e o PIB do setor primário, o PIB per capita da indústria de transformação, a variação média anual do PIB per capita da indústria de transformação, a razão entre o PIB per capita da indústria de transformação do país e o PIB per capita da indústria de transformação do resto do mundo. Quedas nesses indicadores apontam para a desindustrialização. A participação do PIB na indústria de transformação no PIB total não é um indicador adequado tendo em vista o processo de terciarização (crescente participação do setor de serviços na renda).
  • (2)
    Ver Tesouro dos Estados Unidos. Disponível em: http://www.treasury.gov/resource-center/data-chart-center/tic/Pages/index.aspx). Acesso em: 11 nov. 2013.
  • 3
    De forma mais especifica ao segundo circuito, Sturgeon (2002)STURGEON, T. Modular production networks: a new American model of industrial organization. Industrial and Corporate Change, v. 11, n. 3, p. 451-496, 2002. e Whittaker et al. (2008)WHITTAKER, D.; ZHU, T.; STURGEON, T.; TSAI, M.; OKITA, T. Compressed development. IPC/MIT, 2008. (Working Paper Series, n. 08-005)., após analisarem vários casos da indústria americana (IBM, Nortel, Apple Computer, 3Com e Hewlett Packard), afirmam que essa nova forma de organização industrial (cadeias globais de produção) tem sido adotada pelas grandes empresas de brand dos Estados Unidos, especialmente as de eletrônica. Essas empresas, que detêm marcas mundiais (brand), vêm terceirizando o seu processo de produção (fabricação de peças e componentes e montagem final), ao mesmo tempo em que estabelece o controle/coordenação significativo sobre o processo produtivo globalizado, o que, por sua vez, lhes garante maior valor agregado das cadeias produtivas globalizadas.
  • 4
    Para uma análise detalhada da evolução da indústria automobilística chinesa, verRichet (2013)RICHET, X. L'industrie automobile chinoise: coopération, développement, internationalisation. Paris: Université de la Sorbonne nouvelle. Paris, 2013. Mimeografado..
  • 5
    À medida que as empresas chinesas sobem "degraus" nas cadeias globais de valor - em virtude de suas estratégias tecnológicas e da elevação do preço da mão de obra - abriram-se espaços para a relocalização de empresas nos países do Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático formada pelos seguintes países: Tailândia, Filipinas, Malásia, Cingapura, Indonésia, Brunei, Vietnã, Mianmar, Laos e Camboja). O governo e, sobretudo, as empresas chinesas têm, cada vez mais, explorado a complementaridade produtiva com seus vizinhos asiáticos. Em consequência, a China apresenta déficits comerciais com boa parte dos países do Asean, com a exceção do Vietnam, e direciona seu investimento externo para os países do seu entorno. Esse processo regional permitiu certa convergência do dinamismo econômico da China com o Leste Asiático, homogeneizando as taxas de crescimento com os países menores da região (Baumann, 2010BAUMANN, R. Regional trade and growth in Asia and Latin America: the importance of productive complementarity. Brasília: Cepal, 2010.). O elevado grau de competitividade das exportações chinesas é também fruto da complementaridade regional (comércio, investimento e estrutura produtiva) que aumentou significativamente a eficiência da produção, cuja origem, portanto, deve ser encarada como um bloco de países, e não apenas o país que aparece em frente ao nome made in gravado na mercadoria.
  • 6
    O consumo per capita de energia elétrica aumentou de 246,5 kwh em 1978 para 2.631,4 kwh em 2009 (crescimento médio ao ano de 30,2%).
  • 7
    Entre 1998 e 2010, a quantidade de telefones fixos e móveis por 100 pessoas aumentou, respectivamente, de 0,98 para 22,0 e de 0,02 para 64,2 entre 1992 e 2010; e (iii) o número de televisores a cores, automóveis e motocicletas por cada 100 famílias aumentou, respectivamente, de 69,0 para 124,6, de 0,2 para 6,5 e de 13,4 para 40,8. Esses dados foram obtidos na base Ceicdata. Disponível em: http://www.ceicdata.com.
  • 8
    Antonio Barros de Castro, em versão inacabada e datada de 12 de fevereiro de 2008, destacou a “a emergência da economia chinesa como a força transformadora da economia mundial”, criando novas “tendências pesadas”. Esse artigo só veio a público em 2011 em obra póstuma editada pelo Ipea que reuniu parte representativa do pensamento desse autor que nos últimos tempos cada vez mais se dedicava aos estudos sobre a China
  • 9
    Serrano (2012)SERRANO, F. Do ouro imóvel ao dólar flexível. Economia e Sociedade, Campinas, n. 20, 2002. realiza interessante análise sobre o processo de elevação dos preços das commodities na década de 2000; no entanto, atribui peso excessivo aos custos de produção do petróleo e seus fatores geopolíticos. Portanto, a expansão da demanda (efeito China) tem papel secundário
  • 10
    Os índices de preços das commodities (exclusive combustível) do FMI são: 2011 = 190; 2012 = 171; 2013 = 169; 2014 = 163; 2015 = 157; e 2016 = 155. Ver estimativas e projeções do World Economic Outlook do FMI, abril 2014. Disponível em: http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2014/01. Acesso em: 15 set. 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2015

Histórico

  • Recebido
    14 Jan 2014
  • Aceito
    15 Mar 2015
Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, Publicações Rua Pitágoras, 353 - CEP 13083-857, Tel.: +55 19 3521-5708 - Campinas - SP - Brazil
E-mail: publicie@unicamp.br