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Poulantzas e a teoria crítica do valor: críticas à ontologia presente em As classes sociais no capitalismo de hoje

Poulantzas and the critical theory of value: criticisms of the ontology present in The Social Classes in Today’s Capitalism

Resumo

Poulantzas é um autor incontornável para o entendimento da categoria Estado moderno no campo marxista. Há em sua obra diferenças existentes, reconhecidas pelo próprio autor, entre suas primeiras produções teóricas e seu último trabalho – Estado, poder e socialismo. O presente artigo procura esboçar algumas críticas à figuração de mundo (ontologia) de Poulantzas, expostas na obra As classes sociais no capitalismo hoje. Para isso explora as possibilidades de diálogo entre este trabalho e a teoria crítica do valor, tomando por referência, em particular, a leitura da teoria do valor de Marx feita por Moishe Postone. O foco da crítica são as categorias capital, Estado, classes sociais e luta de classes.

Palavras-chave
Marx; Karl (1818-1883); Poulantzas (1936-1979); Postone (1942-2018)

Abstract

Poulantzas is an essential author for the understanding of the category Modern State in the Marxist field. His work shows differences, recognized by the author himself, between his first theoretical productions and his last work – State, power, socialism. This article seeks to outline some criticisms of Poulantzas’ world figuration (ontology), exposed in the work Classes in Contemporary Capitalism. For that, it explores the possibilities of dialogue between this work and the critical theory of value, taking as reference, in particular, the reading of Marx’s theory of value made by Moishe Postone. The focus of criticism is the categories capital, State, social classes, and class struggle.

Keywords
Marx; Karl (1818-1883); Poulantzas (1936-1979); Postone (1942-2018)

1 Introdução

Crítica verdadeira, não por acaso a crítica que Marx faz à economia política, é a crítica à figuração de mundo que sustenta e estrutura a teoria criticada, sendo, portanto, uma crítica ontológica negativa. Por esse motivo iniciamos nossa exposição da figuração de mundo ou da ontologia que estrutura a nossa própria crítica, para em seguida proceder à crítica da figuração de mundo de Poulantzas presente em sua obra As Classes Sociais no Capitalismo de Hoje. A escolha desse trabalho se deve à ideia de que Poulantzas oferece uma súmula muito interessante do que parece ser seu projeto de constituição de uma Teoria Marxista geral das classes sociais e do Estado.

O auge do pensamento marxiano, acreditamos, é facilmente identificado na sua teoria do valor, tal como exposto em O Capital, sendo os Grundrisse e Para a Crítica da Economia Política precursores imediatos das descobertas expostas no Livro 1 de O Capital. Dessa maneira, e seguindo o procedimento (retrodutivo) de Marx, tomamos O Capital como uma chave explicativa da gênese do pensamento de Marx; com isso, sustentamos que a compreensão mais adequada dos trabalhos que antecedem à crítica da economia política exige que se parta dessa revolução teórica instaurada por Marx. Esse enquadramento torna evidente que o tratamento dispensado por Marx a categorias como Estado, propriedade privada, trabalho, classes sociais, luta de classes etc. nos trabalhos anteriores a 18571 (1) Ano em que Marx escreve os Grundrisse. é diferente do que ele oferecerá após a sua crítica ontológica da economia política.

Já na primeira seção do Livro 1 de O Capital, a categoria valor – cuja substância é o trabalho abstrato e que é mensurada pelo tempo de trabalho socialmente necessário gasto em média para sua produção – é apresentada em toda a sua centralidade constitutiva da sociedade do capital. De início, o valor surge como a forma específica de riqueza (riqueza abstrata) das sociedades em que domina o modo de produção capitalista. Em seguida, Marx evidencia que o valor é a categoria que permite a mediação social dessas sociedades, revelando que a forma específica de sociabilidade da sociedade do capital é indireta; portanto, as relações sociais são intermediadas pelo valor, que é parte constitutiva da categoria mercadoria. Ao contrário das sociedades pré-capitalistas, nas quais a sociabilidade era direta e manifesta, o capitalismo, que produz o ápice da divisão social do trabalho, transforma o ser humano que trabalha em produtor de mercadorias, ou seja, em produtor de uma coisa que não tem valor de uso para ele e que tem que ser levada ao mercado para ser trocada pelos valores de uso necessários ao atendimento das suas necessidades. As trocas, que são igualação de valores de uso desiguais, só acontecem por igualarem o valor (trabalho humano abstrato mensurado pelo tempo de trabalho socialmente necessário gasto na fabricação da mercadoria) das mercadorias trocadas. Do que se conclui que o valor, enquanto categoria que viabiliza as trocas, é a categoria garantidora da mediação social indireta do mundo do capital. Os seres humanos, aqui, se relacionam indiretamente entre si e as mercadorias (objetificação do trabalho determinado por mercadoria) se relacionam diretamente, socialmente, por serem valores.

No último item do capítulo 1 do Livro 1 (O fetiche da mercadoria e seu segredo), Marx (1890)MARX, K. H. O capital: crítica da economia política: livro 1: o processo de produção do capital. São Paulo: Boitempo, (1890 [2017]). 894p. demonstra que o valor é também a forma específica de dominação do capital. Ou melhor, ele explicita que a dominação específica da sociedade do capital não é uma dominação pessoal, como ocorria nas formações pré-capitalista. Ao contrário, a dominação é uma dominação abstrata do valor sobre as pessoas. Como o valor em seu aspecto qualitativo é homogêneo (trabalho humano abstrato) e só se diferencia em seu aspecto quantitativo (sendo mensurado pelo tempo de trabalho), estamos diante de uma dominação abstrata temporal, uma dominação dos humanos pelo tempo. A isso podemos acrescentar que a práxis do trabalho em geral (não só o determinado por mercadorias) produz objetos (objetificação) e, ao mesmo tempo, modifica o sujeito que trabalha (exteriorização). No caso do trabalho determinado por mercadorias, como o objetificado é a própria relação social, a exteriorização é de pura reificação e o estranhamento atinge seu paroxismo em relação às formações sociais pré-capitalistas.

Marx, no primeiro parágrafo do capítulo 1 do Livro 1 de O Capital, nos diz que a riqueza no capitalismo aparece como uma imensa coleção de mercadorias. Portanto, se há uma aparência é porque que há algo além dela, uma essência; nesse modo de produção, uma riqueza essencial e abstrata que se amalgama na forma fenomênica da mercadoria. Essa riqueza essencial, abstrata e, portanto, específica do capitalismo, como dito, é o valor. Na seção 2, capítulo 4 (Transformação do dinheiro em mercadoria) do Livro 1 de O Capital, Marx nos mostra o sujeito automático que modela o mundo dos seres humanos nas sociedades capitalistas: o valor em expansão. Dessa maneira, o valor explicita seu caráter automediador, modelando, estruturando, moldando, a objetividade e as subjetividades necessárias à sua perpétua auto-expansão. De tal maneira que podemos dizer que se o que o trabalho objetiva são relações sociais, então objetivação é alienação (Entfremdung) (Postone, 1993POSTONE, Moishe. Tempo, trabalho e dominação social: uma reinterpretação da teoria crítica de Marx. São Paulo: Boitempo, 1993 [2014]. 483p., p. 187) e isso é uma característica particular da sociedade do capital.

Em suma, o valor é forma de mediação social (indireta), forma específica de riqueza (abstrata), forma de dominação social (abstrata) e forma autoestruturante/automediadora. Como a substância do valor é o trabalho abstrato que só existe na sociedade do capital, enquanto categoria que realiza todo do seu dynamis, podemos concluir, com Marx, que o trabalho é o centro da vida humana na sociedade do capital e somente nela. Em outras palavras, o trabalho é fundante do ser social (Lukács, 2013LUKÁCS, G. Para uma ontologia do ser social II, São Paulo: Boitempo, (1986 [2013]), 845p.) e só é central na sociedade do capital (Postone, 1993POSTONE, Moishe. Tempo, trabalho e dominação social: uma reinterpretação da teoria crítica de Marx. São Paulo: Boitempo, 1993 [2014]. 483p.), na qual toda a vida humana gira em torno da obrigatoriedade do trabalho2 (2) Cf. Duayer e Araujo (2015; 2020a; 2020b; 2022). . Tanto a objetividade quanto a subjetividade constituidoras dessa sociabilidade têm por prioridade ontológica o trabalho determinado por mercadorias. Por fim, e sendo redundante, como capital é valor em expansão e como valor é trabalho, Marx está nos dizendo que capital é trabalho abstrato em expansão não controlada pelos humanos que trabalham e que domina a vida da humanidade, invertendo a relação sujeito-objeto e transformando o ser humano de sujeito do trabalho em objeto de suas objetificações.

Uma vez constituída a crítica ontológica da economia política por Marx, há uma alteração na sua compreensão da categoria classe social. Em seu nível mais fulcral, a explicação do que são as classes sociais não repousa na forma jurídica da propriedade. Ao contrário, as classes fundamentais e nelas, em particular, proletários e personificações do capital (capitalistas) são dadas pelo valor em seu inexorável processo de autovalorização. Logicamente que a forma jurídica da propriedade é pressuposta no Livro 1, contudo, o autor não deixa margem para dúvidas ao dizer, já no primeiro capítulo, que seu estudo é sobre as sociedades em que dominam o modo de produção capitalista. Por conseguinte, a forma da propriedade é pressuposta e não dada nas primeiras seções de O Capital, tratando-se de uma abstração razoável que busca capturar as categorias centrais para a estruturação do mundo pela lógica do valor. O processo de produção de valor e mais-valor, que é o próprio valor em expansão (capital), exige a relação social entre proletário (trabalhador produtivo, portanto, que valoriza valor) e personificação do capital. Sendo crucial a compreensão de que tal relação é determinada pela própria lógica do valor. Ou, dizendo de outro modo, a prioridade ontológica entre valor que se valoriza e classes sociais é do valor. Não nos parece ser um mero acaso as afirmações que Marx faz já no capítulo 2 do Livro 1 ao dizer que as máscaras econômicas das pessoas, nesse livro, são personificações das relações sociais. Como ele esclarece, tais relações sociais na sociedade do capital são postas pelo valor como um tipo específico de compulsão abstrata. Desse modo, no capítulo 4, finalmente são postos no texto proletários e personificações do capital (capitalistas, nesse caso). Ambos determinados posicionalmente pelo sujeito automovente, o valor em expansão, no interior da relação social específica do capital que exige a contraposição entre o vendedor da mercadoria força de trabalho e o comprador dessa mercadoria e organizador do processo de trabalho determinado por mercadorias. As classes são estabelecidas relacionalmente e estão dispostas contraditoriamente. Trata-se de relação social necessariamente contraditória, antagônica – o vendedor da força de trabalho tem o interesse de trabalhar o mínimo possível, em extensão e intensidade e o comprador exige o inverso. O destaque a ser feito é que, em sua essência, tal determinação não tem na forma de propriedade jurídica a chave explicativa. Em seu nível mais abstrato e mais crucial, a determinação é dada pelo valor e não pela propriedade (jurídica) privada dos meios de produção. Com isso, não estamos dizendo que tal propriedade não exista no mundo do capital ou que não tenha importância. Estamos afirmando algo distinto: as classes sociais, assim como a forma jurídica da propriedade, o Estado moderno e a política, são determinadas, em seu nível essencial, pelo valor3 (3) Cf. Araujo (2016a; 2018; 2020b). .

Diante do exposto, podemos concluir que, ao contrário de outros livros e artigos de Marx, em O capital, e no Livro Primeiro em particular, além das classes serem pressupostas de início e posteriormente concretizadas e postas no texto, elas operam de forma inercial (Fausto, 1987FAUSTO, R. Marx, lógica e política, tomo II. São Paulo: Brasiliense, 1987. 331p. ). Ou seja, elas aparecem quando se torna necessário o desvelamento de algum aspecto específico da dinâmica da ampliação do valor. Elas se movem na explanação dessa dinâmica, mas não com a totalidade constitutiva de sua concretude conforme se manifesta na forma da aparência. Em suma, sua presença no texto não conta com a descrição, análise e entendimento de suas formas específicas de organização, seu aparato ético-moral, seus representantes e lideranças com seus conflitos e interesses políticos e econômicos. Marx realiza algo neste sentido em materiais como Lutas de classe em França, O dezoito Brumário, Guerra Civil em França etc.

Sustentamos que a categoria Estado moderno, assim como a categoria classe social, é determinada pela categoria valor e advogamos que o Livro 1 de O Capital desvela a instauração societária produzida pelo valor. Contudo, ao contrário do que se verificou para as classes sociais, aqui sequer há um início de apresentação do Estado (Fausto, 1987FAUSTO, R. Marx, lógica e política, tomo II. São Paulo: Brasiliense, 1987. 331p. , p. 287). Antes de tratar especificamente desse aspecto, é necessário lembrar que para Marx capital é contradição em processo. Desde seus microfundamentos até seus aspectos macro e globais, essa sociabilidade engendrada pelo capital é atravessada por profundas contradições. Diante disso, torna-se bastante evidente a necessidade de uma instância reguladora, reparadora dos danos provocados pela contradição em processo. Uma instância que garanta a unidade da totalidade que é necessariamente cindida. Em outras palavras, estamos diante de um tipo de sociabilidade que só pode se reproduzir modelando a objetividade do mundo (Estado, instituições etc.) conforme os seus desígnios, sem esquecer que, ao mesmo tempo que estrutura essa objetividade, ela enforma a subjetividade das singularidades.

Dizendo de outro modo: capital e Estado moderno são os dois lados da mesma moeda, são irmãos siameses para os quais a vida de um depende da manutenção da vida do outro4 (4) Cf. Chasin (2000a; 2000b) e Mészáros (1995). . O valor em expansão modela o Estado moderno e esse retroage sobre o valor em expansão, garantindo as condições de sua reprodutibilidade. Por isso, o Estado não é a superestrutura da sociedade civil. Ambos são modelados pelo valor em expansão e se põem em uma relação de complementariedade. Cabe ao Estado moderno o uso da violência enquanto conteúdo real das várias formas (fenomênicas) que ele possa vir a assumir. De modo que, para Marx, não se trata de aperfeiçoar o Estado, suas formas de gestão, as formas de participação ou da radicalização da democracia. A tarefa é a eliminação simultânea do Estado moderno e do capital.

2 Poulantzas de As classes sociais no capitalismo de hoje

Do nosso ponto de vista, Poulantzas (1974)POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , constrói um modelo lógico trans-histórico que tem por arrimo a categoria exploração. Essa, por sua vez, tem por causa explicativa a divisão social entre proprietários e não proprietários. O autor deduz da forma jurídica da propriedade as classes sociais. De tal maneira que, para ele, as classes surgem com as figuras jurídicas do proprietário e do não proprietário. Ele sustenta que um modo de produção, que é uma abstração (segundo explica), coloca, a partir da lógica econômica, as classes sociais e suas ideologias. Para ele, todo modo de produção possui duas classes fundamentais. As outras classes, por ventura existentes, se associam a outros modos de produção não dominantes. A classe social possui um sentimento de classe inato, ainda que este não se manifeste abertamente, o que irá permitir a identificação da classe revolucionária em cada modo de produção.

O autor sustenta que as classes existem na luta de classes e nunca fora dela, logo são relacionais e posicionais. Enfatiza a divisão entre trabalho manual e intelectual e parece incorrer em uma certa dificuldade para tratar da contradição entre forças produtivas e relações de produção.

Na busca de afirmar seu modelo lógico e trans-histórico, Poulantzas demonstra (no texto em análise) desconhecimento sobre o que é o trabalho (universal/geral) produtor de valores de uso, portanto, de riqueza material. Em decorrência, há desconhecimento sobre as formas como esse trabalho se manifesta em cada processo de trabalho no interior das várias relações de produção. Isso o leva a desconsiderar a especificidade do trabalho determinado por mercadorias, sua função de mediação social e de produtor da riqueza abstrata e da dominação abstrata (que são especificidades da sociedade do capital, assim como o próprio trabalho determinado por mercadorias).

Seu conjunto axiomático tem por corolário que os poderes das classes sociais, associados às relações políticas e ideológicas, são a tradução das relações de produção e daquilo que as constitui: relações de propriedade econômica e de posse.

Poulantzas insiste que uma sociedade em sua concretude real só comporta mais do que duas classes sociais porque é composta por vários modos e formas de produção. Dessa maneira, toda formação social – lembrando que o autor se propõe a instaurar uma teoria geral das classes sociais e do Estado – tem duas classes fundamentais que são dadas pela contradição essencial do modo de produção dominante nesta formação social. O que ele realiza é uma projeção do que julga ser o existente na sociedade capitalista, para formações sociais pré-capitalistas – um anacronismo típico do marxismo tradicional. Dessa maneira, a história humana tem um dinamismo imanente e uma teleologia operante.

Para além disso, é um contrassenso atribuir ao modo de produção capitalista apenas duas classes fundamentais – segundo o autor burgueses e operários (ouvrier) –, e tomar as outras classes que, porventura, operem na existência real da formação social, como pertencentes a outros modos de produção que continuam a existir, no interior dessa formação social, como modos de produção subordinados ao principal. Reafirmamos que Marx, em O Capital, colocando a lógica do valor como momento causal explicativo ou como categoria que possui prioridade ontológica na elucidação da sociabilidade do capital, explica as classes fundamentais da sociedade capitalista: capitalistas, proletários, proprietários de terra e rentistas. Isso elucida a distância de Poulantzas (1974)POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. em relação ao pensamento marxiano e sinaliza as dificuldades em que recai por não compreender adequadamente a teoria crítica do valor de Marx.

Poulantzas ampara a ideia de que classe social é um

conceito que designa o efeito da estrutura na divisão social do trabalho (as relações sociais e práticas sociais). Este lugar abrange assim o que eu chamo de determinação estrutural de classe, isto é, a própria existência da determinação da estrutura – relações de produção, lugares de dominação – subordinação política e ideológica – nas práticas de classe: as classes só existem na luta de classes

(1974, p. 14).

Como o objetivo é a constituição de uma teoria geral marxista para as classes sociais e o Estado, Poulantzas precisa postular que as formações sociais (categorias mais concretas) não são a simples expressão da contradição de um modo de produção. Daí que sustenta que um modo de produção não pode existir e se reproduzir em sua pureza e não pode ser “historicamente periodizado” nessa pureza. Conclui enfatizando que: “É a luta de classes nas formações sociais que é o motor da história: o processo histórico tem como lugar de existência essas formações” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 24). Não é difícil perceber que o autor opera com a lógica formal aqui. Vejamos: a estrutura da formação social provoca um efeito na divisão social do trabalho que são as classes sociais. E as classes, que só existem em suas lutas, ao lutarem, produzem a história das formações sociais. Em suma, a estrutura de qualquer formação social produz, endogenamente, sua história.

Logo em seguida, Poulantzas acrescenta que

Consequências consideráveis decorrem da análise das classes sociais: as classes de uma formação social não poderiam ser ‘deduzidas’, em sua luta concreta, de uma análise abstrata dos modos e formas de produção que se encontram presentes, pois não se encontram na formação social tais quais.

(1974, p. 24).

Aqui é preciso destacar a dificuldade do autor na apreensão das categorias “análise” e “abstração”. Haveria, por acaso, análise que não proceda à abstração? Em Marx, as abstrações são reais, razoáveis5 (5) Cf. Marx (2011, p. 41) e Chasin (2009, p. 121 e ss.). . A análise parte da realidade dada e é o separar, o dividir, o decompor, de aspectos dessa realidade. Portanto, ao analisar, tomo uma parte constitutiva do todo existente abstraindo o todo, evidenciando-se que analisar é abstrair. Como para Poulantzas os modos e formas de produção não existem em sua pureza – talvez aqui ele se refira à pureza das abstrações, do que se poderia inferir que não se trata de abstrações reais –, ele interdita a apreensão adequada, em termos de Marx, das classes sociais. Nesse ponto é preciso esclarecer que Marx não utiliza deduções para explicar as categorias – que para ele “são formas do ser, determinações da existência” (Marx, 1857-58MARX, K. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da crítica da economia política. São Paulo: Boitempo, 1857-1858 [2011]. 788p., p. 59). Na verdade, ele opera com a retrodução (cf. Bashkar, 2008BASHKAR, R. A realist theory of science. London: Verso, 2008. 284p.). Mais uma vez, Marx parte do que existe, analisa, ou seja, abstrai, e reconstitui capturando a dinâmica do devir categorialmente posto. Por isso, em O Capital, as classes sociais são explicadas em seu nível mais crucial (ou têm por fundamento ontológico) o valor em sua perpétua autoexpansão. Elas não são deduzidas do modo de produção. Ao contrário, uma vez estabelecida a sociabilidade do capital e dissolvidos todos os laços sociais diretos específicos das formações pré-capitalistas, Marx, retrodutivamente, demonstra a determinação das classes sociais a partir do valor. Com isso, evidencia-se a dificuldade presente na posição de Poulantzas. Postular que um modo de produção não pode se manifestar em sua pureza parece ser algo distante do que sugere Marx. Além disso, tal postulação parece indicar que o autor opera com modelos lógicos apriorísticos que podem ser confrontados com a realidade; para Poulantzas, modelos que postulem pureza do modo de produção devem ser descartados.

Acompanhando o argumento do autor, ele afirma que se as classes sociais não podem ser deduzidas, em suas lutas concretas, de uma análise abstrata, elas (as classes) são “afetadas, na sua própria existência, pela luta concreta que se desenvolve no seio da formação social” (1974, p. 24). O autor procura, com isso, reforçar que as classes são determinadas pela luta de classes. E essa, por sua vez, pela estrutura que põe e reproduz a divisão social do trabalho – manual, intelectual etc. Após interditar a abstração e, portanto, a categoria constitutiva do mundo do capital – o valor em expansão –, só lhe resta explicar as classes a partir das estruturas sociais e lidar com a dificuldade em situar o momento causal dessa articulação: estrutura social, classe social e luta de classes. Dessa maneira, confunde as determinações cruciais das classes sociais (o valor) com as manifestações fenomênicas (que constituem a especificidade das classes em cada formação social nacional e em cada contexto histórico da sociedade do capital).

O modelo lógico estruturalista o leva, no nosso entendimento, a mais algumas afirmações polêmicas sobre as classes sociais:

Por um lado elas são afetadas, na sua própria existência, pela luta concreta que se desenvolve no seio da formação social: é principalmente aqui que reside o fenômeno de polarização das outras classes em torno das duas classes fundamentais, a burguesia e a classe operária nas sociedades capitalistas, o que provoca efeitos decisivos e complexos sobre essas outras classes, mas também sobre as duas classes fundamentais. Por outro lado, as classes de uma formação social só existem nas relações desta formação com outras formações, e portanto nas relações das classes desta formação com aquelas das outras formações

(Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 24).

O raciocínio armado na lógica formal se evidencia aqui: um modo de produção que nunca se manifesta de modo puro, em que fica excluída a possibilidade de identificar a prioridade ontológica constitutiva da sociabilidade, é dominante – ou seja, vários modos de produção coexistem e um deles é o dominante. O que é o dominante produz duas classes fundamentais e antagônicas, cuja luta polariza, no seu entorno, todas as classes e frações de classe. Essa luta e polarização produz efeitos decisivos e complexos sobre todas as classes. O que o autor postula é que burguesia e operariado são fundamentais por suas funções econômicas. Ainda que não apresente quais seriam essas funções econômicas, atribui a elas o fundamento da missão histórica do operariado: emancipar o trabalho. Esse é o solo a partir do qual o autor irá formular seus conceitos de bloco histórico e bloco no poder, conforme veremos mais adiante.

Como o movimento de abstração, para Poulantzas, é algo puramente subjetivo, não é da própria sociabilidade humana, em particular aquela do capital, não pode compreender que o valor – trabalho humano abstrato – seja a categoria, no nível mais crucial, causal das classes sociais. O que lhe resta é hipostasiar a classe como definida por suas lutas e estas explicadas pela estrutura. Como ele não percebe que a sociabilidade indireta do valor dissolve todos os laços sociais diretos característicos das formações sociais pré-capitalistas, e isso faz com que essas desapareçam enquanto modos de produção6 (6) Cf. Marx (2011, p. 104, 105, 412, 413 e ss.). , ele busca transições inacabadas, nas quais modos de produção pré-capitalistas coexistem com o modo de produção capitalista, inclusive na Europa do século XX. O paroxismo da aplicação à força de seu modelo lógico à realidade é postular que as classes sociais da sociedade capitalista só podem existir a partir de suas lutas com as classes sociais das formações pré-capitalistas. O que o leva a mais um axioma questionável: “A isto se chamou o problema do imperialismo e da corrente imperialista: imperialismo que, precisamente, como reprodução ampliada do capitalismo, tem como lugar de existência as formações sociais e não o modo de produção capitalista enquanto tal” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 24-25).

É como se o autor considerasse que o modo de produção capitalista fosse uma abstração ideal-mental que nunca se manifesta na efetividade real. Na realidade das formações sociais, o capitalismo se reproduz de forma ampliada imperialista. No entanto, sem perceber, o autor já não consegue explicar o imperialismo enquanto necessidade lógica do modo de produção capitalista. Só lhe restando o politicismo como chave explicativa.

Na continuação de sua exposição, o autor nos diz que as frações e camadas de classe, das diversas classes, são diferenciadas a partir das distinções do econômico e do papel particular das relações políticas e ideológicas. Isso valeria para a burocracia e os intelectuais. Adverte que a burocracia de Estado e os intelectuais são definidos pelo seu papel de elaboração e realização da ideologia. Dependendo da conjuntura concreta, frações, camadas e categorias podem assumir um papel de forças sociais relativamente autônomas e destaca que não se trata de “grupos sociais” exteriores ou ao lado das classes sociais; na verdade, ele postula um pertencimento de classe para esses grupos.

Procurando aproximar sua discussão, até então conceitual, de uma aplicação prática, Poulantzas tentará articular a “determinação estrutural de classe e as posições [conjunturais] de classe no seio de uma formação social” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 25). Sugere que as conjunturas têm por lugar de existência (locus) a formação social e as posições de classe aí tomadas. Para tratar dessas questões, o autor nos diz que são requeridos conceitos particulares que ele chama de conceitos de estratégia. Tais conceitos abrangem os fenômenos da polarização e da aliança de classes. Ele destaca – ao lado da dominação de classe – o conceito de “bloco no poder”. Esse conceito designa “uma aliança específica das classes e frações de classe dominantes” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 26). Acrescenta, em seguida, que o conceito de povo e de classes dominantes, também são conceitos de estratégia. Povo, nesse caso, é tratado como uma aliança específica das classes dominantes. Destaca-se que no conceito de povo, as classes e frações de classe, que o constituem, não perdem sua determinação de classe. Ainda que isso aponte para “contradições no seio do povo” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 26). Em suma, esses conceitos (bloco no poder e dominação de classe) apontam para os fenômenos de polarização e de alianças de classes. Entretanto, sustenta o autor, esses conceitos não têm o mesmo estatuto dos conceitos anteriormente expostos (classes e frações de classe). Pois uma classe ou fração fazendo parte de uma aliança não se dissolve no interior da aliança, não perde sua determinação de classe. Lembrando-se que tal determinação é dada pelo econômico, podemos inferir que, para o autor, esses conceitos de estratégia – alianças, blocos e dominação de classe – não possuem tal determinação rígida, sendo flexíveis o suficiente para os arranjos exigidos na aplicação prática da luta política.

Empenhando-se para avançar na concretização de sua exposição, e constatando que a reprodutibilidade da sociabilidade do capital não pode prescindir do Estado moderno, o autor afirma que o principal papel dos aparelhos de Estado é conservar a “unidade e coesão de uma formação social” fundada em classes sociais. Desse modo, “as relações ideológicas se materializam e se encarnam, como práticas materiais nos aparelhos de Estado” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 26). Relembrando que o autor se propõe a constituir uma teoria marxista geral do Estado, o que entendemos ser uma impossibilidade, tendo em vista a crítica ontológica de economia política feita por Marx, assinalamos que o Estado moderno ou integral7 (7) Cf. Gramsci (2000, p. 257). só pode se apresentar após a total dissolução, pelo valor (forma de mediação indireta), dos laços sociais manifestos, diretos, característicos das formações pré-capitalistas. Somente após esta dissolução, os aparelhos de Estado – partes constitutivas do Estado integral – terão a tarefa de “manter a unidade e a coesão de uma formação social que concentra e consagra a dominação de classe” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 26). Considerando, como já apontamos acima, que as classes sociais só devêm, enquanto tais, na sociedade do capital, que é uma sociabilidade estruturada pelo valor, na qual a forma de dominação específica é abstrata e que suas estruturas são estruturas pseudo-objetivas moldadas pelo valor8 (8) Cf. Postone (1993, p. 46-48, 150, 176, 186, 189-191, 305, 346, 408). ; assinalamos que é adequada a afirmação de Poulantzas (1974, p. 26)POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. de que relações de classe são reproduzidas a partir da ação objetiva das relações políticas e ideológicas que “se materializam e se encerram, como práticas materiais nos aparelhos de Estado”. Todavia, dessa maneira, escapamos do mero politicismo explícito na ontologia do autor.

Na continuidade de sua exposição, Poulantzas (1974, p. 26-27)POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. apresenta os aparelhos de Estado (repressivo, ideológico e econômico) e suas subdivisões e, com isso, revela por completo a lógica formal que arrima seu modelo que é desconectado da teoria marxiana do valor e limitado ao mais puro politicismo. Inspecionando com mais atenção, evidencia-se que o autor procura modelar o conceito de Estado integral de Gramsci (consenso + coerção ou ditadura = hegemonia), ainda que não o diga explicitamente. Para o autor, hegemonia devém pelos aparelhos de Estado (AE) e neles se articulam consenso (aparelhos ideológicos) e coerção (aparelho repressivo). Parece-nos que o autor entende que esses dois momentos se apresentam no aparelho econômico. Além disso, ele procura articular classes, luta de classes e aparelhos de Estado, ainda que, no nosso entendimento, ele incorra em mais um argumento circular. Vejamos: “Na medida em que a determinação das classes apela para relações políticas e ideológicas, e só existem materializadas nos aparelhos, uma análise das classes (luta de classes), só pode ser realizada em suas relações com os aparelhos e principalmente com os aparelhos de Estado” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 27). De imediato é preciso destacar que nesse trecho a análise do autor está em um nível mais concreto de manifestação categorial, as classes sociais estão mais próximas de suas manifestações fenomênicas. Não obstante, se anteriormente, por não possuir uma teoria do valor, o autor era incapaz de apontar causalidades explicativas adequadas da categoria classe social, assentando toda a explicação nos axiomas do seu modelo lógico – força produtiva x relações de produção, propriedade privada e exploração; agora, as classes são sobre determinadas por relações políticas e ideológicas e tais determinações só existem materializadas nos aparelhos, de tal modo que a análise das classes e de suas lutas só pode ser realizada em suas relações com os aparelhos. O que nos coloca uma questão: o que explica, qual é a causa, dos aparelhos?

De forma direta, o autor (1974, p. 27) nos diz que os aparelhos de Estado detêm um papel constitutivo para as classes e luta de classes, os aparelhos não se sobrepõem às classes, mas as constituem. As dificuldades em que o autor se enreda, em nosso modo de ver, tem por raiz a inexistência de causalidade real na determinação da classe social. Com isso, ele termina colapsando a determinação abstrata da classe posta pelo valor (que Poulantzas não reconhece) com a sobredeterminação, que põe as classes em maior grau de concretude dada pelo aparelho de Estado mais a ideologia etc. Como já dito, sustentamos que o valor tem prioridade ontológica, e é o momento predominante, em relação às classes sociais. A manifestação, fenomênica, no cotidiano da sociedade do capital, dessa determinação crucial, envolve uma maior quantidade de mediações sociais – aparelhos de Estado, formas ideológicas etc. – que também são plasmadas a partir do imperativo lógico do valor; isso sugere que os aparelhos de Estado são formas concretas da dominação abstrata do valor.

Na sequência de sua exposição, o autor incorre em um novo argumento circular ao defender que a luta de classes possui a predominância fundamental em relação aos aparelhos de Estado. Estes são a “materialização e a condensação das relações de classe” e pressupõem as classes em sentido lógico e não como “uma relação de causalidade cronológica” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 27). Vejamos com mais cuidado a questão: acima vimos que autor argumenta que o aparelho de Estado constitui as classes e suas lutas, agora a relação se inverte e eles pressupõem as classes. As classes e suas lutas detêm o papel primeiro e fundamental, ainda que não estejam envolvidos em uma causalidade cronológica, do que deduzimos, trata-se de uma causalidade lógica. Sem embargo, em nosso entendimento, isso só pode ocorrer se cronologicamente classes e aparelhos surgirem em conjunto, ambos plasmados pelo valor. Diferentemente dessa leitura, o autor aponta como causa sui das classes e dos aparelhos a divisão social do trabalho, a propriedade privada, a divisão trabalho manual/trabalho intelectual e a exploração. Aceitando-se que se trata de um par em determinação de reflexão, o autor não apresenta o momento que possui a prioridade ontológica. O que instaura o referido argumento circular e afasta a presença de uma contradição dialética que se resolve por suprassução. Ainda assim, há aqui algo relevante na reflexão do autor, sua afirmação de que “os aparelhos são apenas a materialização e condensação das relações de classe”. Pensamos que aqui é possível a abertura para se compreender as classes e o Estado, partindo do valor, com maior grau de concretude. Logicamente há espaços no Estado moderno que podem ser disputados, sendo esse o lócus da luta de classes e da condensação na forma de aparelhos de Estado. O fato do Estado moderno, já sabemos, ser a contraparte necessária do capital, instaura limites lógicos e empíricos para a luta de classes na materialização e condensação dos aparelhos de Estado. Ainda assim, os aparelhos de Estado, em definitivo, não constituem as classes, nem mesmo logicamente – o que de resto, afirma Poulantzas – ainda que sobredeterminem a constituição das classes, que têm no valor sua geratriz. Em seu surgimento fenomênico, as classes se estruturam a partir do valor, de suas lutas contra os laços sociais manifestos herdados de outras formações pré-capitalistas, pela sua cultura, folclore, tradições e formas religiosas, pela solidariedade na vida cotidiana (ou pelo individualismo) etc. Esses surgem como os traços gerais que, com a consolidação da sociabilidade do valor, perdem seus aspectos, em potência (dýnamis), revolucionários. As configurações que o Estado moderno assume em cada período histórico e em cada espaço geográfico, podem ser explicadas, em sua manifestação aparente, pelas relações de classe e pelas suas histórias de constituição enquanto classes.

Após esses esclarecimentos, Poulantzas (1974, p. 28)POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. passa a tratar da distinção entre poder de Estado e aparelho de Estado. Aparelhos não possuem poder próprio, mas materializam, concentram, relações de classe. Relações de classe, para ele, são abrangidas pelo conceito de poder, apesar disso, lhe escapam as questões mais importantes: o que é esse poder? Qual sua origem? Qual sua lógica? Como se manifesta? Consideramos que na sociedade do capital, o poder, em seu nível mais crucial, é abstrato, o poder é a manifestação, que se modifica conforme a quantidade de mediações sociais, do valor, do trabalho humano abstrato mensurado pelo tempo. As relações de classe, de fato, são abarcadas por esse poder provindo do valor. Avaliando com mais cuidado a afirmação de que “aparelhos de Estado não possuem poder próprio, mas materializam e concentram relações de classe” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 28), concluímos que se o aparelho de Estado materializa o poder que abrange as relações de classe, estamos diante de algo neutro em sua própria constituição, cujo caráter será preenchido pelo vetor final dessa relação de força-poder.

Na sequência de sua exposição, o autor acrescenta que o Estado não tem uma “essência instrumental intrínseca”, o Estado é uma relação, a condensação do poder entre as classes. Dado seu esforço pela constituição de uma teoria geral marxista do Estado, sustenta que o poder (político) põe o Estado e com isso elide a categoria valor com todos os sentidos que possui ontologicamente, inclusive como o momento causal e explicativo do poder político. O autor compreende, corretamente, que afirmar que o Estado é a condensação de uma relação de classe, significa que as funções que os aparelhos de Estado possuem na reprodução das relações sociais (econômicas, políticas, ideológicas) não são neutras em si. “Tais funções dependem do poder de Estado inscrito na própria estrutura de seus aparelhos” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 28). Esse poder de Estado é conferido pelas classes e frações de classe que ocupam o terreno da dominação política e esta dominação é solidária, interdependente, recíproca, com a existência e o funcionamento dos aparelhos de Estado. Em suma: as funções dos aparelhos de Estado (econômicas, políticas e ideológicas) não são neutras em si, dependem do poder de Estado e esse poder está inscrito, registrado, na estrutura dos aparelhos de Estado. Como o poder abrange as classes e frações, ele depende delas e de sua dominação política e não haverá dominação política sem a existência e o funcionamento dos aparelhos de Estado. Isso nos coloca frente a uma estranha situação: os aparelhos de Estado constituem as classes sociais, suas funções na reprodução social não são neutras, pois dependem do poder de Estado inscrito nelas e esse poder é dado pelas classes e frações que exercem a dominação política. O argumento circular é reposto e não tem resolução utilizando a contraposição entre lógico e cronológico. O autor, dado o grau de concretude que seu modelo opera, e sem perceber, coloca aparelhos de Estado e classes sociais em determinação recíproca. A única solução para o argumento circular e para a ausência de causalidade, ao nosso juízo, seria através da teoria do valor e pela limitação do modelo geral poulantziano à sociedade do capital. De todo modo, ainda assim, estaríamos distantes da crítica ontológica marxiana e mais próximos do positivismo lógico.

Outro aspecto a ser ressaltado é que o modelo em questão opera no interior dos preceitos do chamado marxismo-leninismo: como as funções dos aparelhos de Estado dependem do poder de Estado (“blocos no poder, classe ou fração de classe hegemônica etc., alianças de classe e classe apoio”)9 (9) Cf. Poulantzas (1974, p. 28). e o poder de Estado é a manifestação da dominação política de determinada classe ou fração de classe, ao se modificar a classe dominante, modifica-se o poder de Estado e os aparelhos de Estado, mas o Estado e seus aparelhos permanecem10 (10) Cf. Araujo (2016a; 2018; 2020b) e Duayer e Araujo (2020). . E chegamos a uma justificativa lógica para a constituição de “Estados Operários”, o que demonstra que para Poulantzas, ao contrário do afirmado por ele, o Estado é neutro. Ele toma o Estado como transistórico e, como decorre da existência de classes sociais, ele (o Estado) condensa as relações de classe. A neutralidade opera pelo postulado de que o Estado se modifica conforme a classe dominante no período. A crítica torna-se patente quando consideramos o Estado moderno e a sucessão de classes e frações de classe que se tornam dominantes ao longo da história da sociedade capitalista. Nesses casos, o Estado e seus aparelhos e funções se adaptam, pois o autor os toma como maleáveis e neutros. Não obstante, quando a dominação política é do “operariado”, é exigida a quebra e destruição dos aparelhos do Estado burguês e sua imediata substituição pelo Estado “operário” e seus aparelhos. De tal forma que o Estado permanece e, assim, a contraparte necessária para a continuidade da autoexpansão do valor, da sociabilidade indireta, da dominação abstrata e da extração de mais-valor; ainda que Poulantzas não compreenda essas questões. Com isso fica esclarecida a distância entre a modelagem do autor e o que sustenta Marx sobre a destruição do Estado moderno e a instauração da comuna, uma forma política que guarda funções análogas às do Estado moderno, mas já não é mais um Estado, pois com ela se inicia a reabsorção do poder político pelos indivíduos. O que só pode vir a ser a partir da modificação da sociabilidade indireta baseada no valor por uma sociabilidade direta entre os humanos.

Poulantzas, coerentemente com sua ontologia, procura atribuir a Marx uma dinâmica histórica arrimada na luta de classes e, portanto, trans-histórica. Sem perder tempo com seu axioma de que classes sociais são dadas pela divisão entre proprietários e não proprietários, exploradores e explorados (e não pelo valor, o que as tornaria exclusivas da sociedade capitalista), o que lhe permite identificar classes sociais em quase todos os períodos de existência da espécie humana, cabe refutar a conclusão de que o capitalismo só produz sua própria reprodução, portanto, nada além da burguesia e do proletariado. Tudo indica que o autor retira tais conclusões da Seção VII do Livro 1 de O Capital, em particular dos capítulos 21 e 22. Em sendo esse o caso, o autor desconhece o grau de abstração da exposição de Marx e, portanto, o fato de Marx só se referir a essas duas classes por serem elas as fundamentais para a reprodução do valor naquele grau de abstração. Contudo, é evidente que o capitalismo ao se reproduzir, produz e reproduz muito mais – proprietários de terra, rentistas, burocracia estatal, etc. Vide, por exemplo, as Seções IV, V e VI do Livro Terceiro de O Capital, em que outras classes e frações comparecem e cumprem papéis decisivos para a reprodução do capitalismo.

Ao tratar do processo de reprodução da sociedade capitalista, Poulantzas sustenta que o lugar desse processo não é unicamente o espaço econômico e não consiste “em um automatismo autorregulador da acumulação social. A reprodução, apreendida precisamente como reprodução ampliada das classes sociais, significa, em um e mesmo movimento, a reprodução de relações políticas e ideológicas da determinação de classe” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 29). Tal postulação, portadora de certo realismo trivial, perderá seu poder explicativo pelo desconhecimento do autor de que no capitalismo as relações sociais não são manifestas, mas intermediadas pelo valor. De tal modo, o autor colapsa as relações sociais indiretas em relações de classe – das duas classes fundamentais (desconhecendo, pelo menos, os proprietários fundiários e rentistas) e de suas lutas. O resultado é que ele hipostasia o papel dos aparelhos de Estado e, em especial, a importância dos aparelhos ideológicos. É evidente que a sociabilidade do capital não pode se reproduzir sem a presença dos aparelhos de Estado e dos aparelhos ideológicos em particular, sem embargo, eles, por si, não garantem a reprodução dos laços sociais indiretos, não garantem a produção e reprodução do valor. Por extensão, pode-se afirmar que tampouco a constituição de aparelhos ideológicos alternativos e contrários aos da burguesia podem, por si, garantir a emancipação humana do valor – ainda que essa emancipação não possa devir sem tais aparelhos ideológicos opostos aos da burguesia e suas várias frações.

Como dito, Poulantzas atribui um peso excessivo ao papel dos aparelhos ideológicos na reprodução das relações sociais. Na defesa de seu ponto, nos diz que as relações de produção dominam o conjunto da reprodução social, principalmente a reprodução da força de trabalho e dos meios de trabalho. Tal dominação seria devida ao “fato de que as relações de produção, em sua relação constitutiva com as relações de dominação e subordinação política e ideológica, dominam o processo de trabalho que se encontra no seio do processo de produção” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 30). Acrescenta que a reprodução ampliada das classes sociais tem dois aspectos: (a) a necessidade da reprodução ampliada dos lugares ocupados pelos agentes sociais, sendo que tais lugares assinalam “a determinação estrutural das classes, isto é, a maneira pela qual a determinação pela estrutura (relações de produção, dominação e subordinação política e ideológica) opera nas práticas de classe” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 30); (b) “reprodução e distribuição dos próprios agentes para esses lugares” (1974, p. 30). Prossegue dizendo que as relações de produção – fundadas na exploração e extração de mais-valor – dominam o processo de trabalho com o auxílio das relações político e ideológicas de dominação. Como não apreende adequadamente a teoria crítica do valor de Marx e toma o processo de trabalho e os meios de produção como neutros, toda sua crítica se resume à exploração e desaparece da análise a forma específica da dominação capitalista: a dominação abstrata.

Antes de prosseguir, é interessante considerar o tipo de tratamento que Marx dá à categoria ideologia nos parágrafos finais do capítulo 4 do Livro Primeiro de O Capital. A ideologia (liberdade, igualdade, propriedade e Bentham) é a manifestação do que ocorre na esfera da circulação. Portanto, não se trata de falsa consciência. Nesse caso, a causalidade repousa na produção do valor – valor, em um nível crucial, determina e é a chave explicativa para aquelas formas ideológicas. Portanto, em um nível mais concreto da exposição, a ideologia é posta como uma estrutura de dominação cuja causalidade é a abstração do valor. Decorre que a ideologia é uma forma e estrutura de dominação abstrata.

Para responder à questão do que determina o pertencimento do indivíduo à classe social, Poulantzas irá articular a ocupação do lugar, na classe social, pelo agente e a reprodução desses lugares. Infelizmente, o que se evidencia é a dificuldade da modelagem do autor em identificar as causalidades constitutivas da sociabilidade do capital. Vejamos os axiomas e o primeiro corolário: se a determinação das classes se dá pelos “lugares, e não (...) [pelos] agentes que ocupam esses lugares” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 31), e se esses lugares são uma determinação estrutural que não se limita à situação econômica das classes, a conclusão lógica é que só resta aos aparelhos de Estado (encarnação e materialização das relações ideológicas e políticas), em particular ao ideológico, a determinação da reprodução dos lugares e a definição e determinação das classes sociais. Após essa conclusão, o autor procura evitar uma abordagem institucionalista e busca a causa primeira da reprodução das classes. O faz recorrendo ao seu axioma fundamental e gerador de sua ontologia: a centralidade da luta de classes nas sociedades humanas. Assim nos diz: “Pode-se, de fato, falar de uma reprodução primeira – [...] – das classes sociais na e pela luta de classes, onde se desempenha a reprodução ampliada da estrutura, aí compreendidas as relações de produção, e que preside ao funcionamento e ao papel dos aparelhos” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 31). Nessa reprodução primeira transcorre “a reprodução ampliada da estrutura, aí compreendidas as relações de produção, e que preside ao funcionamento e ao papel dos aparelhos” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 31), o que explica que tal reprodução só pode ocorrer com lutas e contradições em vir a ser – como ela só pode acontecer recorrendo aos aparelhos de Estado e como esses são determinados pela luta de classes, o conflito na reprodução ampliada é endógeno ao processo. O que coloca outro corolário: como reprodução ampliada das relações sociais depende da luta de classes, sua transformação revolucionária depende, do mesmo modo, dessa luta.

Na sequência, o autor acrescenta um axioma ao modelo: a reprodução primária das classes sociais, além das relações políticas e ideológicas, só pode ser explicada adequadamente considerando a divisão social do trabalho. A divisão social do trabalho opera como um eixo em torno do qual o autor articula relações políticas, ideológicas e de produção, e nas relações de produção, destaca a divisão técnica do trabalho. Aparentemente, os axiomas primeiros do modelo agora estão completos: a divisão técnica do trabalho domina as relações de produção e essa dominação é resultado da “dominação das relações de produção sobre o processo de trabalho no seio do processo de produção” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 32). Aqui se evidencia mais um argumento circular: as classes e suas lutas determinam a reprodução social e, portanto, a si mesmas. O autor não expõe diretamente esse raciocínio, ao contrário, ele nos diz que a relação primária envolve as relações de produção (esfera econômica = lugares na reprodução + autorreprodução econômica) e os aparelhos de Estado (em particular os políticos e ideológicos). Isso sucede porque a divisão social do trabalho abrange relações políticas e ideológicas que incidem diretamente (de forma decisiva) nas relações de produção. Tal incidência decisiva ocorre porque a divisão social do trabalho, ao afetar as relações de produção, explicita que a divisão técnica do trabalho domina o interior das relações de produção e é consequência “do fato de que com o processo de produção, as relações de produção são dominantes sobre o processo de trabalho” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 32). Como as relações de produção são o espaço da luta de classes, são as classes e suas lutas que tudo determinam. Assim, o autor pressupõe o que deveria explicar: o que fundamenta a relação primária das classes?

Dessa maneira, se explicita uma falsa ontologia materialista que é incapaz de discernir as formas de manifestação (fenomênica) da forma valor, da sua presença constitutiva (essência) da sociedade do capital. Produzindo hipóstase e fetichização das relações entre aparelhos de Estado e classes sociais e luta de classes – que são partes constitutivas da sociabilidade real do capital –, mas não são a causa explicativa última das classes sociais. Por fim, o que lhe resta é o mais puro politicismo ou uma fé hierática na política como a instância da emancipação humana da dominação específica da sociedade capitalista.

O modelo de Poulantzas, por desconsiderar a teoria marxiana do valor, não consegue diferenciar entre a luta de classes do cotidiano ou econômicas e a luta de classes revolucionária ou emancipatória. No primeiro caso, mesmo que o proletariado seja vitorioso, a valorização do valor não é afetada em seu nível social total, ocorrendo, na verdade, o oposto: essas vitórias podem funcionar como acicate para o aperfeiçoamento da extração de mais-valor. Além disso, o modelo não pode apreender a determinação mais crucial da categoria proletário (trabalhador que valoriza valor para a personificação do capital) pois lhe escapam dois fatos cruciais: (a) o proletariado se afirma como sujeito livre e “ser humano egoísta” ao lutar pelas melhores condições de venda de sua mercadoria (força de trabalho); (b) o proletário sofre subsunção real ao trabalho morto quando a forma específica da organização produtiva capitalista (grande indústria) é adotada. Por fim, o autor acrescenta ao modelo a “história da formação social” como espaço do qual dependem e no qual ocorreram e ocorrem as formas concretas da luta de classes. A história da formação é um elemento constitutivo das características particulares, concretas e objetivas que cada classe social adquire em cada espaço nacional. Todavia, essa constatação, que é correta, não só não resolve a circularidade da causalidade última em que o modelo está aprisionado como opera para ampliar a hipóstase da luta de classes.

Outro acréscimo, feito pelo autor, é com a introdução da contradição entre trabalho manual e intelectual. Ele associa essa divisão com as relações políticas e ideológicas e diz que ela se manifesta no processo de trabalho (aparelho econômico e empresa) – através da “autoridade e direção do trabalho ligadas ao trabalho intelectual e ao segredo do saber” – e na totalidade da divisão social do trabalho – “relações políticas e ideológicas que intervêm na determinação dos lugares das classes sociais” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 33). Arremata dizendo que não são os aparelhos ideológicos que criam essa divisão entre trabalho manual e intelectual (e tampouco criam a ideologia, como veremos em seguida) e também não são os fatores primeiros da reprodução dessa divisão. Ainda que atuem na produção dessa divisão e sejam, ao mesmo tempo (na sociedade capitalista) “o efeito dessa divisão e de sua reprodução na e pela luta de classes”. Poulantzas utiliza como exemplo a escola, que na sociedade capitalista já possui uma natureza capitalista e se situa em um contexto geral caracterizado pela divisão entre trabalho manual e intelectual; enquanto aparelho ideológico, essa escola é reproduzida em função dessa divisão. Essa divisão ultrapassa a escola e estabelece seu papel: “a separação da escola da produção associa-se à separação e espoliação do produtor direto dos meios de produção” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 33).

Parece-nos que o autor se apega à divisão entre trabalho manual e intelectual a partir da argumentação exposta por Marx e Engels em A Ideologia Alemã. Nesse livro, seguindo o que Marx já delineara nos Manuscritos de 1844, a divisão em questão possui destaque, assim como a crítica à especialização do trabalho, à divisão social do trabalho e à propriedade privada. Todavia, a partir dos Grundrisse e da instauração da teoria marxiana do valor, esse conjunto categorial perde centralidade na ontologia marxiana. Além disso, Marx apresenta, nos Grundrisse, outro tipo de reflexão que se explicita no assim chamado Fragmento das Máquinas: a dinâmica do valor em expansão obriga as personificações do capital a revolucionar permanentemente as formas de produção, de tal maneira que há uma separação entre a produção de riqueza material (valores de uso) e produção da riqueza abstrata, especificamente capitalista (valor). O valor contido em cada unidade de mercadoria reduz-se efetivamente devido à substituição do capital variável (força de trabalho) pelo capital constante (máquinas, equipamentos, insumos e matérias-primas). Tudo isso só é possível porque o conhecimento humano sobre o funcionamento do mundo orgânico, inorgânico e social se amplia, porque as barreiras naturais são afastadas da pura sociabilidade específica do ser social. Melhor dizendo, para a lógica do capital, em sua perpétua autoexpansão, o que importa cada vez mais é o conhecimento, o trabalho intelectual, o general intellect, em detrimento do trabalho manual, imediato. A própria lógica do valor aponta para a perda de importância da dicotomia tão valorizada por Poulantzas. O que permite um acréscimo: nesse quadro teórico, a especialização do trabalho não desaparece, mas se aprofunda, pois será impossível a compreensão da totalidade das legalidades específicas dos seres social, orgânico e inorgânico, por um único indivíduo. Naturalmente, tal tendência geral, leva à redução da produção social total de valor e mais-valor, que se manifesta, tendencialmente, na redução da taxa social média de lucro e no predomínio do capital portador de juros e do capital fictício na acumulação de capital11 (11) Cf. Araujo (2020c) e Duayer e Araujo (2020a). .

Como adiantamos, Poulantzas sustenta que os aparelhos ideológicos não são os fatores primeiros e não criam a ideologia. A construção do autor sugere que ele busca uma explicação na esfera da produção para a ideologia. Nesse caso, a categoria ideologia adquire um estatuto trans-histórico e sua explicação antecede à sua elaboração pelos intelectuais. Vejamos como ele procede ao tratar da ideologia na economia capitalista:

Quanto às relações ideológicas capitalistas, as análises de Marx referentes ao fetichismo da mercadoria, que se refere precisamente ao processo de valorização do capital, oferecem um excelente exemplo de uma reprodução da ideologia dominante que ultrapassa os aparelhos: o que Marx, aliás, observava, quando falava frequentemente de uma correspondência, que implica uma distinção, das ‘instituições’ e das ‘formas de consciência social’. Em suma, o papel da ideologia e do político na reprodução ampliada dos lugares das classes sociais abrange aqui diretamente a luta de classes sociais, que comanda os aparelhos. Aqui se situa principalmente, do lado da classe operária, o instinto de classe que foi mencionado acima: como não são os aparelhos ideológicos do Estado que criam a ideologia dominante, não são também os aparelhos revolucionários – o partido – da classe operária que criam a ideologia proletária: eles a elaboram e a sistematizam, produzindo a teoria revolucionária.

(Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 34)

Nessa longa citação, surpreende a quantidade de erros evidentes em que Poulantzas incorre ao ler Marx. Em primeiro lugar, em que momento de O Capital Marx diz que fetiche da mercadoria é uma ideologia? Na verdade, fetiche da mercadoria é a forma pela qual a relação social entre os indivíduos se manifesta: objetivada nas mercadorias que esses indivíduos produzem12 (12) Cf. Araujo (2016b). . Por isso, torna-se patente que a relação social direta é entre as mercadorias e indireta entre os seres humanos; e o fetiche nada mais é do que a manifestação da dominação abstrata do valor (que é a forma específica de dominação no capitalismo). Como esclarece Postone: “objetivação é de fato alienação se o que o trabalho objetiva são relações sociais” (Postone, 1993POSTONE, Moishe. Tempo, trabalho e dominação social: uma reinterpretação da teoria crítica de Marx. São Paulo: Boitempo, 1993 [2014]. 483p., p. 187). Rigorosamente, isso independe das formas pelas quais os indivíduos interpretam o mundo do capital; o fetiche está inscrito no (e é produto do) padrão indireto dessa sociabilidade. Consequentemente, não só não é ideologia como não as produz automaticamente. As leituras do mundo do capital podem ser afirmativas do que existe ou a negação do existente; a figuração negativa do mundo do capital é possível porque a forma valor, por só existir enquanto valor em expansão e por ser essa expansão a contradição em processo, não só não interdita a possibilidade da crítica no âmbito da subjetividade humana, como produz e reproduz, permanentemente, a possibilidade da crítica.

Em segundo lugar, ao contrário do que afirma Poulantzas, Marx, ao expor em seu nível mais fundamental o fetiche da mercadoria, não o refere ao processo de valorização do capital. O último item do capítulo 1 do Livro Primeiro de O Capital tem por título O Fetiche da Mercadoria e o Seu Segredo. Esse capítulo compõe a Primeira Seção (Mercadoria e Dinheiro) do Livro Primeiro e em toda essa Seção, a categoria capital, e sua acumulação, estão pressupostas e não postas. Destarte, toda exposição demonstra que a existência do fetiche da mercadoria surge com a própria produção da mercadoria. A prioridade ontológica, portanto, é da forma valor e da dominação abstrata (fetiche) em relação à própria acumulação de capital. Por óbvio, o valor e o fetiche têm que se manifestar nas categorias complexas mais concretas como preço de mercado, lucro, capital produtivo, capital portador de juros (a forma mais fetichizada do capital) etc.

No modelo lógico de Poulantzas, a ideologia, segundo ele, produzida pelo fetiche da mercadoria, é tomada como falsa consciência. Aqui ele escora a ideologia no econômico, na esfera da produção da vida material, sempre sustentando que nessa esfera a geratriz é a luta de classes. Por esse motivo é que ele afirma que os aparelhos ideológicos não produzem ideologia. Os aparelhos de Estado elaboram e sistematizam a ideologia que preexiste a eles e é produzida naquela esfera. Se esses aparelhos só elaboram, podemos concluir que o tipo de elaboração se altera conforme a ideologia produzida na esfera do econômico. Ou seja, mais uma vez, ao contrário do que defende o autor, no seu modelo os aparelhos são neutros. Não obstante, esse conjunto axiomático o leva a problemas e dificuldades intransponíveis quando tem que lidar com a ideologia da (para ele) classe revolucionária do capitalismo. Assim como os aparelhos ideológicos do Estado burguês não criam ideologia, os aparelhos revolucionários da “classe operária” (sic), da mesma forma, não criam a ideologia proletária. Apenas elaboram e sistematizam o instinto de classe existente no proletariado (motivo pelo qual a ideologia proletária não é uma falsa consciência, mas a expressão subjetiva da, por ele atribuída, missão histórica do proletariado), de modo a produzirem a teoria revolucionária. Esse axioma, à luz da teoria do valor e da dominação abstrata, da alienação e fetichização das relações sociais, demonstra-se inadequado. As classes, que em seu nível mais crucial são plasmadas pelo valor, são, portanto, funcionais à autoexpansão do valor. Essa lógica abstrata não engendra classes que neguem ou impeçam, por si, a continuidade do processo de acumulação. O que, por óbvio, não significa que seja possível a emancipação humana do valor sem que se mobilize a massa do povo.

Poulantzas nos fala sobre “aparelhos revolucionários” e apresenta um único – o partido; o que lhe garante um lugar no interior da tradição do marxismo-leninismo. Após advogar, como dito acima, que o aparelho revolucionário não cria a ideologia da classe revolucionária (proletariado), sustenta que essa ideologia já existe no proletariado sob a forma de um instinto de classe. Conclui-se que o partido revolucionário, portador do conhecimento científico codificado pelo marxismo-leninismo, pode elaborar a teoria revolucionária, a partir dessa ideologia que é produto daquele instinto metafísico endógeno à condição do ser proletário. Naturalmente, nesse modelo lógico, a teoria do valor não pode comparecer, as determinações essenciais arrimadas no valor são substituídas por uma forma causada pela lógica do valor – a luta de classes. Essa incorreção permite a extrapolação e a projeção do que é próprio à sociedade do capital (classes e luta de classes) para toda e qualquer formação social com proprietários e não proprietários. Com isso o motor da história é a luta de classes e a história ganha uma teleologia que, na sociedade capitalista, tem no proletariado o portador da missão histórica, do sentido do avanço civilizacional contra a burguesia. Ele é o polo negativo que deve eliminar a propriedade privada e distribuir de forma justa as mercadorias produzidas e a renda e riqueza gerada por essa produção, pondo fim ao principal problema – a exploração do ser humano pelo ser humano. Como não compreende o que é o capital, o modelo aponta para uma sociedade em que se continua a produzir valor, dominação abstrata e capital. Sem que a emancipação humana em relação ao valor possa ocorrer13 (13) Cf. Araujo (2020a). .

Outro aspecto a ser considerado na argumentação do autor é a afirmação de que partido político não é aparelho de Estado, mas aparelho revolucionário. Entretanto, esse aparelho revolucionário deve atuar como aparelho de Estado e isso fragiliza o modelo quando confrontado com a teoria crítica do valor. Pois o Estado moderno, em seu nível mais fulcral, só existe para assegurar a reprodução ampliada do valor. Se não se extingue a produção de valor, portanto, de mercadorias e de capital, faz-se necessária a presença do Estado moderno. Não é mudando o adjetivo desse Estado (Estado proletário) – dirigido pelo partido revolucionário, tomado como intérprete autorizado do instinto de classe do proletariado – que ele deixará de ser a contraparte necessária do capital.

Poulantzas, ao tratar da “reprodução dos lugares das classes sociais nas relações de dominação ideológica e política”, nos diz que além de recorrer aos aparelhos ideológicos e políticos, ela recorre “principalmente ao próprio aparelho econômico” (Poulantzas,1974, p. 34). Por consequência lógica, o econômico também é portador da atribuição da reprodução das relações de dominação e ideológicas e da determinação dos lugares das classes sociais. Para o autor a esfera econômica participa da reprodução ideológica porque no seu interior a divisão social do trabalho produz uma organização despótica do trabalho. O corolário de mais esse axioma é óbvio: reforço do politicismo – havendo modificações nas formas de organização do trabalho no interior da empresa (por exemplo, através da radicalização da democracia participativa ou democracia socialista), serão eliminadas as relações políticas e ideológicas que reproduzem os lugares das classes sociais e, no limite, através desse processo o próprio capital será eliminado. Sendo repetitivo, essa proposição, sob o ângulo da teoria do valor, é inadequada, pois a dominação específica do capitalismo não é exatamente pessoal, ela é abstrata, em última instância é a dominação do tempo (que é a única forma de quantificar a expansão da riqueza abstrata – valor) sobre a vida humana. superação enquanto forma societária.

Logo após essa argumentação, o autor inclui o aparato repressivo, ou aparelho repressivo de Estado em sentido estrito, em sua análise. Assim o faz por considerar que esse aparelho tem tanto um papel direto na repressão, enquanto força física organizada, quanto um papel indireto nas relações de produção. Na função direta, a repressão é necessária para garantir a manutenção das “relações de exploração e dominação de classe”. Na função indireta, trata-se da “manutenção das ‘condições’ de produção e exploração (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 34). Poulantzas ilustra as (para ele) diferenças existentes quanto ao uso da força extra-econômica (intervenção direta do aparelho repressivo) existentes entre os modos de produção pré-capitalistas e capitalista. Como nos pré-capitalistas o produtor não estava realmente separado dos meios de produção, era necessária a intervenção direta do aparelho repressivo (força extraeconômica) para que o não proprietário “produzisse o sobretrabalho para o lucro [sic] do proprietário” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 35). Dado que o modelo lógico do autor determina as classes sociais a partir das formas jurídicas de propriedade, ele aplica imediatamente esse axioma na explanação em questão; incorrendo em mais uma dificuldade: o aparelho repressivo tem que garantir a extração do sobretrabalho para o lucro. Destacamos que não é apropriado imputar aos modos de produção pré-capitalista (e feudal em particular, pois é o caso que ele aponta no texto) a busca do lucro como imperativo lógico da organização social. Isto é algo que só devém no capitalismo, cuja sociabilidade é organizada pelo valor em expansão assentada em laços sociais indiretos.

O autor termina sua digressão sobre aparelho repressivo e reprodução dos lugares das classes sociais defendendo que esse aparelho tem um papel ideológico, ainda que secundário (assim como os aparelhos ideológicos teriam um papel repressivo secundário): “[...] o exército, a magistratura e as prisões (a ‘justiça burguesa’) etc., têm pelo seu papel na materialização e na reprodução das relações ideológicas (a ideologia burguesa), um papel eminente na reprodução dos lugares das classes sociais” (Poulantzas, 1974POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. , p. 35). Aqui faz-se necessário assinalar que os aparelhos repressivos têm, de fato, que atuar, não somente porque o trabalhador não tem a posse ou propriedade dos meios de trabalho, mas fundamentalmente porque a dominação abstrata não pode prescindir da coerção em momentos de ruptura e a exige para o disciplinamento formal da sociabilidade, dado que capital é contradição em processo. Por fim, o aparato repressivo materializa uma ideologia (entendida aqui como proposta articulada de resolução de conflitos que se apossa das massas) própria à lógica do capital, sendo tal aparato repressivo a outra face da lógica do capital. Deste modo, o núcleo repressivo da sociedade do capital não é um espaço aberto para a disputa de posições ideológicas em seu interior. Do que se pode concluir que a tarefa a ser executada no processo de emancipação humana será a sua destruição simultânea à da sociabilidade arrimada no valor.

3 Considerações finais

Acreditamos que, em boa medida, o modelo lógico oferecido pelo autor está distante da analítica marxiana, pois sustenta uma teleologia metafísica da história projetando o que é específico da sociedade capitalista para as formações sociais que a antecedem; efetiva uma hipóstase da luta de classes e, por consequência, termina restringido ao puro politicismo - por realizar uma crítica do capitalismo a partir da distribuição do que foi produzido, sem compreender que a crítica radical tem por télos o trabalho específico da sociedade capitalista (trabalho determinado por mercadoria); por atribuir ao proletariado (que ele confunde com operariado) um instinto metafísico para encarnar sua missão histórica; e por não compreender que a dominação específica do capitalismo não é pessoal, mas abstrata ou do valor, que assume a forma dinheiro-mercadoria-dinheiro sobre a humanidade e é quantificado pelo tempo de trabalho.

Essas constatações colocam uma questão: a ausência (e negação prática) da teoria do valor de Marx na ontologia de Poulantzas interdita sua contribuição teórica? Respondendo de modo muito breve, sabemos que o trabalho determinado por mercadoria devém a eixo central do ser social nas sociedades em que domina o valor em expansão. Segue que a esfera resolutiva da emancipação humana da dominação abstrata especificamente capitalista é a produção ou, para dizer o mesmo de outro modo, é emancipação humana do trabalho determinado por mercadoria. Nesse enquadramento, a política surge com práxis necessária, mas não suficiente, para a efetivação da emancipação. Apenas a política que ao se efetivar oblitere as condições da reprodutibilidade do valor pode ser tomada como política radical ou emancipatória. Considerando esse balizamento geral, os conceitos (bloco no poder, alianças de classe, aparelhos de Estado e seu papel na dominação social capitalista etc.) apresentados por Poulantzas, podem e devem ser instrumentalizados na luta pela emancipação humana da dominação abstrata.

  • JEL: B12, B24, B51.
  • (1)
    Ano em que Marx escreve os Grundrisse.
  • (2)
    Cf. Duayer e Araujo (2015DUAYER, M.; ARAUJO, P. H. F. Para a crítica da centralidade do trabalho: contribuições de Lukács e Postone. Revista Em Pauta, v. 13, p. 15-36, 2015.; 2020aDUAYER, M.; ARAUJO, P. H. F.; Desventuras do Marxismo tradicional: notas sobre a polêmica Harvey-Roberts. Revista Outubro, São Paulo, v. 34, p. 63-88, 2020a.; 2020bDUAYER, M.; ARAUJO, P. H. F. Valor como forma de mediação social: interpretação de Marx a partir de Postone. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 57, p. 45-82, 2020b.; 2022)DUAYER, M.; ARAUJO, P. H. F. Trabalho abstrato, objetivação, alienação, fetiche – Marx lido por Postone. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 62, p. 10-41, 2022..
  • (3)
    Cf. Araujo (2016aARAUJO, P. H. F. Marx: Capital, Estado e política: notas. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 43, p. 37-62, 2016a.; 2018ARAUJO, P. H. F. Notas críticas à compreensão de Lênin sobre o Estado: revisitando O Estado e a Revolução. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 50, p. 114-141, 2018. ; 2020b)ARAUJO, P. H. F. As categorias classes sociais e Estado no Livro Primeiro de O capital. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 56, p. 21-47, 2020b..
  • (4)
    Cf. Chasin (2000a; 2000b)CHASIN, J. Estatuto ontológico e resolução metodológica. São Paulo: Boitempo, 2009. 253p. e Mészáros (1995)MÉSZÁROS, I. Para além do Capital. São Paulo: Boitempo, 1995 [2002]. 1102p..
  • (5)
    Cf. Marx (2011, p. 41)MARX, K. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da crítica da economia política. São Paulo: Boitempo, 1857-1858 [2011]. 788p. e Chasin (2009, p. 121 e ss.)CHASIN, J. Estatuto ontológico e resolução metodológica. São Paulo: Boitempo, 2009. 253p..
  • (6)
    Cf. Marx (2011, p. 104, 105, 412, 413 e ss.)MARX, K. H. O capital: crítica da economia política: livro 1: o processo de produção do capital. São Paulo: Boitempo, (1890 [2017]). 894p..
  • (7)
    Cf. Gramsci (2000, p. 257)GRAMSCI, A. Cadernos do cárcere. São Paulo: Civilização Brasileira, 2000. v. 3, 428p..
  • (8)
    Cf. Postone (1993, p. 46-48, 150, 176, 186, 189-191, 305, 346, 408)POSTONE, Moishe. Tempo, trabalho e dominação social: uma reinterpretação da teoria crítica de Marx. São Paulo: Boitempo, 1993 [2014]. 483p..
  • (9)
    Cf. Poulantzas (1974, p. 28)POULANTZAS, N. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974 [1978]. 368p. .
  • (10)

    Cf. Araujo (2016aARAUJO, P. H. F. Marx: Capital, Estado e política: notas. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 43, p. 37-62, 2016a.; 2018ARAUJO, P. H. F. Notas críticas à compreensão de Lênin sobre o Estado: revisitando O Estado e a Revolução. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 50, p. 114-141, 2018. ; 2020b)ARAUJO, P. H. F. As categorias classes sociais e Estado no Livro Primeiro de O capital. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 56, p. 21-47, 2020b. e Duayer e Araujo (2020)DUAYER, M.; ARAUJO, P. H. F.; Desventuras do Marxismo tradicional: notas sobre a polêmica Harvey-Roberts. Revista Outubro, São Paulo, v. 34, p. 63-88, 2020a..
  • (11)

    Cf. Araujo (2020c)ARAUJO, P. H. F. David Harvey: mercadoria, capital, capital de empréstimo e capital fictício – Notas críticas. Marx e o Marxismo, v. 8, p. 269-294, 2020c. e Duayer e Araujo (2020a)ARAUJO, P. H. F. Dominação Abstrata. Capital: Sujeito Histórico. GERMINAL: Marxismo e Educação em Debate, v. 12, p. 348-362, 2020a..
  • (12)

    Cf. Araujo (2016b)ARAUJO, P. H. F. Notas críticas ao artigo Miséria na filosofia marxista: Postone leitor d’O capital, por Bidet. Revista Verinotio, v. 22, p. 120-151, 2016b. .
  • (13)

    Cf. Araujo (2020a)ARAUJO, P. H. F. Dominação Abstrata. Capital: Sujeito Histórico. GERMINAL: Marxismo e Educação em Debate, v. 12, p. 348-362, 2020a..

Referências bibliográficas

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2021
  • Aceito
    26 Abr 2023
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