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As influências ambientais e a interação homem-ecossistema no planejamento e implementação da atenção à saúde materno-infantil na prática de enfermagem

The environment influences and human-ecosystem interaction in planning and implementing practices in maternal and child health nursing

Las influencias ambientales y la integración hombre-ecosistema en el planeamiento y la implantación de la atención para la salud materno-infantil en la práctica de enfermería

Resumos

Este ensaio teórico tem como objetivo ressaltar a importância a ser dada pelo enfermeiro à questão ambiental e, especificamente, à poluição ambiental, no planejamento e implementação de ações de saúde, no que se refere à reprodução e a saúde materno-infantil. São apontados alguns efeitos de poluentes sobre a fertilidade, resultados gestacionais e crescimento e desenvolvimento da criança. É questionado o conhecimento do enfermeiro sobre esses aspectos e apresentadas considerações sobre a necessidade de aprofundar a investigação para identificar fatores de risco ambientais para a reprodução e saúde do binômio mãe-filho. A aquisição desse conhecimento pode ser uma das estratégias adotadas para que a atenção ao ambiente, incluindo as inter-relações homem-ecossistema, transforme-se em subsídio real para a adoção, pelo enfermeiro, de novas práticas em saúde. Finalmente, enfatiza a necessidade de que o enfermeiro participe em equipes multidisciplinares, nas quais sejam abordadas questões de risco para a saúde decorrentes do ambiente.

Enfermagem; Saúde materno-infantil; Meio ambiente


This theoretical work emphasizes the importance attached by nurses, about environmental questions, specifically environmental pollution, for planning and implementing health actions in maternal and child health. Some pollutant effects on fertility, gestational results and growth and child development are pointed out. The knowledge of nurses is questioned about these aspects and considerations are made about the necessity of going thoroughly into the research process to identify the environmental risk factor for reproduction and health of the mother-child binome. Knowledge acquisitions could be a strategy in order that attention to environment as a whole and its influences, including the human-ecosystem inter-relationships, should not be any more part of discourse and should change into an actual support for nurses by adoption of new health care. Finally, the study emphasizes the necessity for the nurse to participate in a multidisciplinary health team, in which the questions of health risks due to environmental questions are met.

Nursing; Maternal and child health; Environment


Este ensayo teórico tiene como objetivo resaltar la importancia destacada por el enfermero a la cuestión ambiental, específicamente, a la contaminación del ambiente, en el planeamiento e implementación de las acciones de salud, particularmente en relación a la reproducción y a la salud materno-infantil. Son señalados algunos daños de contaminación sobre la fertilidad, gestación y, el crecimiento y desarrollo del niño. Se cuestiona sobre el conocimiento del enfermero respecto a esos aspectos donde se muestra la necesidad de profundizar la investigación para identificar los factores de riesgo en el ambiente para la reproducción y la salud del binómio madre-niño. La obtención de estos conocimientos puede ser una de las estrategias adoptadas para que la atención del ambiente como un todo y sus influencias, incluyendo las relaciones hombre-ecosistema, se transformen en una ayuda real para la adopción de nuevas prácticas de salud de parte del enfermero. Finalmente destaca la necesidad de que el enfermero participe en equipos multidisciplinarios donde sean abordadas cuestiones de riesgo para la salud proveniente del ambiente.

Enfermería; Salud materno-infantil; Medio ambiente


REFLEXÃO

As influências ambientais e a interação homem-ecossistema no planejamento e implementação da atenção à saúde materno-infantil na prática de enfermagem

The environment influences and human-ecosystem interaction in planning and implementing practices in maternal and child health nursing

Las influencias ambientales y la integración hombre-ecosistema en el planeamiento y la implantación de la atención para la salud materno-infantil en la práctica de enfermería

Maria Cristina F. SoaresI; Aline A. VeledaII; Marta R. Cezar-VazIII

IDoutora em Fisiologia da Reprodução, DCF. Docente do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Fundação Universidade Federal do Rio Grande- FURG

IIAcadêmica do curso de Graduação em Enfermagem e Obstetrícia da Fundação Universidade Federal do Rio Grande - FURG

IIIDoutora em Enfermagem, DENF - Docente do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem Fundação Universidade Federal do Rio Grande - FURG

Endereço Endereço: Maria Cristina Flores Soares Av. Presidente Vargas, 323, Bl 39, apto 101 96202-100 - Rio Grande - RS E-mail: mcflores@vetorialnet.com.br

RESUMO

Este ensaio teórico tem como objetivo ressaltar a importância a ser dada pelo enfermeiro à questão ambiental e, especificamente, à poluição ambiental, no planejamento e implementação de ações de saúde, no que se refere à reprodução e a saúde materno-infantil. São apontados alguns efeitos de poluentes sobre a fertilidade, resultados gestacionais e crescimento e desenvolvimento da criança. É questionado o conhecimento do enfermeiro sobre esses aspectos e apresentadas considerações sobre a necessidade de aprofundar a investigação para identificar fatores de risco ambientais para a reprodução e saúde do binômio mãe-filho. A aquisição desse conhecimento pode ser uma das estratégias adotadas para que a atenção ao ambiente, incluindo as inter-relações homem-ecossistema, transforme-se em subsídio real para a adoção, pelo enfermeiro, de novas práticas em saúde. Finalmente, enfatiza a necessidade de que o enfermeiro participe em equipes multidisciplinares, nas quais sejam abordadas questões de risco para a saúde decorrentes do ambiente.

Palavras-chave: Enfermagem. Saúde materno-infantil. Meio ambiente.

ABSTRACT

This theoretical work emphasizes the importance attached by nurses, about environmental questions, specifically environmental pollution, for planning and implementing health actions in maternal and child health. Some pollutant effects on fertility, gestational results and growth and child development are pointed out. The knowledge of nurses is questioned about these aspects and considerations are made about the necessity of going thoroughly into the research process to identify the environmental risk factor for reproduction and health of the mother-child binome. Knowledge acquisitions could be a strategy in order that attention to environment as a whole and its influences, including the human-ecosystem inter-relationships, should not be any more part of discourse and should change into an actual support for nurses by adoption of new health care. Finally, the study emphasizes the necessity for the nurse to participate in a multidisciplinary health team, in which the questions of health risks due to environmental questions are met.

Key words: Nursing. Maternal and child health. Environment.

RESUMEN

Este ensayo teórico tiene como objetivo resaltar la importancia destacada por el enfermero a la cuestión ambiental, específicamente, a la contaminación del ambiente, en el planeamiento e implementación de las acciones de salud, particularmente en relación a la reproducción y a la salud materno-infantil. Son señalados algunos daños de contaminación sobre la fertilidad, gestación y, el crecimiento y desarrollo del niño. Se cuestiona sobre el conocimiento del enfermero respecto a esos aspectos donde se muestra la necesidad de profundizar la investigación para identificar los factores de riesgo en el ambiente para la reproducción y la salud del binómio madre-niño. La obtención de estos conocimientos puede ser una de las estrategias adoptadas para que la atención del ambiente como un todo y sus influencias, incluyendo las relaciones hombre-ecosistema, se transformen en una ayuda real para la adopción de nuevas prácticas de salud de parte del enfermero. Finalmente destaca la necesidad de que el enfermero participe en equipos multidisciplinarios donde sean abordadas cuestiones de riesgo para la salud proveniente del ambiente.

Palabras clave: Enfermería. Salud materno-infantil. Medio ambiente.

INTRODUÇÃO

Uma das maneiras de melhor identificar as necessidades e atender às demandas de uma população é compreendendo as relações que estas estabelecem com o ecossistema na qual estão inseridos. As interações homem-ecossistema devem ser avaliadas constantemente a fim de que possa ser identificado e quantificado o impacto de um sobre o outro. Sob o ponto de vista do eco-socialismo/marxismo, o homem produz e é, ao mesmo tempo, produto do seu meio1. Portanto, é de fundamental importância que os profissionais de saúde conheçam de forma adequada os fatores de risco ambientais para a reprodução e para a saúde do binômio materno-infantil, identificando os indivíduos mais vulneráveis.

Os efeitos deletérios das influências ambientais sobre a saúde da população vêm atraindo a atenção daqueles que se preocupam com a saúde pública em todo o mundo. Se por um lado a industrialização proporcionou uma melhora da qualidade de vida da população em geral, de outro, a localização de parques industriais nas periferias das grandes cidades, freqüentemente, são responsáveis pela liberação de substâncias químicas nocivas à saúde que contaminam o ar, a água, e o solo2. Somando-se a esses elementos poluidores de origem industrial, não podemos deixar de citar a influência de outros poluentes como os agrotóxicos e os resíduos eliminados por escapamentos de veículos automotores. Em nosso país, na grande maioria das vezes, os efeitos desses poluentes sobre a saúde das pessoas que habitam essas regiões são potencializados pelos p roblemas decorrentes de condições de moradia insalubres, problemas de desnutrição e outros fatores de risco, o que faz com que as pessoas mais pobres sejam, em geral, mais expostas à poluição ambiental3.

A exposição a poluentes ambientais em diferentes fases da vida colocam em risco a saúde da mãe, do pai e da criança em sua fase embrionária, fetal ou pós-natal. A exposição ambiental dos pais pode produzir dano genético ou mutagênese, antes e/ou depois da concepção, por ação direta sobre o embrião ou sobre o complexo fetoplacentário (teratogênese). Os agentes tóxicos, depois de poluírem o ar, o solo, a água (rios, lagos e oceanos), também contaminam o homem por meio das cadeias alimentares, pois estes poluentes atingem os seres vivos que constituem o plâncton do qual se alimentam os peixes e outros alimentos consumidos pelo homem. Além do risco ambiental, a exposição ocupacional também pode afetar as células germinativas paternas e maternas antes da concepção ou as células somáticas do embrião após a concepção, levando ao aparecimento de anomalias ou mesmo inviabilidade embrionária e/ou fetal4. Portanto, no que se refere à função reprodutiva e à saúde do binômio mãe-filho, os agentes tóxicos originados da exposição ambiental e/ou ocupacional determinam alterações da fertilidade feminina e masculina, podem ser causas de abortos espontâneos, comprometem a saúde da mulher, colocam em risco a integridade do sistema nervoso da criança, bem como de seu crescimento e desenvolvimento.

Nesse estudo, realizamos uma breve revisão sobre as influências dos fatores ambientais sobre a saúde materno-infantil, bem como reflexões acerca do planejamento de ações e da prática de enfermagem nessa área, com os seguintes objetivos: identificar os principais efeitos dos poluentes ambientais sobre a fertilidade e a saúde do binômio mãe-filho; contribuir para o aprofundamento da discussão entre os enfermeiros e demais profissionais de saúde sobre os fatores de risco ambientais para a saúde humana; refletir sobre a observação da relação homem-ecossistema no planejamento de ações e na prática de enfermagem em saúde materno-infantil; sugerir estratégias que auxiliem na tomada de consciência por parte do enfermeiro da importância que deve ser dada à questão ambiental no desenvolvimento da sua prática.

INFLUÊNCIA DE FATORES AMBIENTAIS SOBRE A FERTILIDADE E SAÚDE DO BINÔMIO MATERNO-INFANTIL

Os estudos que avaliam a influência dos poluentes ambientais sobre a fertilidade são direcionados para os efeitos desses agentes, tanto sobre o homem como sobre a mulher. Em células germinativas humanas, as anormalidades cromossômicas numéricas e estruturais são relativamente freqüentes. A redução na fertilidade e a ocorrência de abortos espontâneos podem ser decorrentes de modificações no DNA, como distúrbio da segregação meiótica do cromossomo, fragmentação do DNA, mutações genéticas individuais e distúrbios na estrutura do DNA por modificações na integridade da cromatina. Essas alterações podem ser provocadas pela exposição a poluentes ambientais como pesticidas e metais pesados5-6.

Os estudos que se focalizam sobre os aspectos da fertilidade masculina mostram que os agentes químicos de ação tóxica e seus metabólitos podem modificar a espermatogênese, alterando a motilidade e a morfologia dos espermatozóides. Esses agentes provenientes da exposição ocupacional e/ou do meio ambiente podem, também, modificar a quantidade de sêmen e a composição das secreções das glândulas sexuais7-9.

A redução na fertilidade também pode ser decorrente de contaminação da cadeia alimentar por agentes poluidores que permanecem estáveis no ambiente durante anos10.

A influência de poluentes industriais sobre a saúde da mulher devido à exposição ocupacional ou por residência próxima a fontes poluidoras também tem sido responsável por irregularidades do ciclo menstrual, abortos espontâneos, endometriose e câncer do seio11-2.

A exposição intrauterina a pesticidas e herbicidas, sobretudo no primeiro trimestre da gestação, pode estar associado a um risco aumentado de malformações ao nascimento13. As fontes de exposição materna a pesticidas incluem o trabalho e/ou somente a residência materna em zonas rurais4, assim como a exposição durante a utilização destes produtos em atividades como jardinagem14. Alguns desses efeitos sobre o desenvolvimento embriológico também pode ser devido a flutuações no perfil hormonal materno, decorrentes da exposição a determinados agentes químicos, já que nesta fase certos hormônios desempenham um papel crítico na diferenciação de muitos tecidos4.

Outro fator ambiental, às vezes considerado em certos estudos como hábito materno, é o tabagismo. O tabagismo é duplamente nocivo pois, além de seus próprios efeitos, potencializa os efeitos deletérios de outros poluentes. O fumo modifica o perfil hormonal da mulher, reduzindo as concentrações de prolactina e estrógenos15. Também são observados aumento na adrenalina e somatostatina, esse último um possível inibidor da prolactina16-7. Durante a lactação, a utilização de fumo pela mãe modifica o volume do leite e a sua constituição, reduzindo as concentrações de vitaminas C e E.18-20. O fumo materno reduz a capacidade de sucção da criança, aumenta as cólicas e reduz o ganho de peso21-3. Todos esses fatores parecem estar envolvidos na redução no período de amamentação. O fumo passivo, decorrente do tabagismo p aterno e da exposição materna no ambiente de trabalho, também está associado à redução no período de amamentação.

A saúde do binômio mãe-filho também pode ser atacada através da cadeia alimentar. Poluentes, como as dioxinas, são encontrados no leite de mães que se alimentam de produtos contaminados. A presença desses agentes tóxicos no leite materno aumenta o risco de morte do recém-nascido, devido a sua pequena massa corporal24.

Os efeitos de agentes tóxicos podem afetar a criança em diferentes períodos da vida. Em geral, quanto mais precocemente a criança for atingida, mais sérios são os agravos para a sua saúde25. Exposições no período embrionário e/ou fetal podem ser responsáveis por situações irreversíveis e os efeitos são mais graves quanto maior o tempo de exposição26. Entre as alterações mais freqüentemente associadas à exposição a poluentes ambientais têm-se, inicialmente, a prematuridade, o baixo peso ao nascer, a presença de anormalidades congênitas cardíacas e do trato urinário e, na vida pós-natal, prevalência aumentada de afecções respiratórias e de câncer27-9. Crianças abaixo de cinco anos sofrem até 40% mais o impacto global de doenças provocadas por fatores ambientais. Isso ocorre, em parte , porque elas comem, respiram e bebem mais do que os adultos em proporção ao seu peso, e, por isso, estão expostas a níveis mais altos de compostos químicos tóxicos. Outros aspectos também contribuem para que a criança esteja mais exposta aos efeitos neurotóxicos dos poluentes ambientais. As regiões do sistema nervoso possuem sensibilidades diferentes a esta exposição, decorrente da compartimentalização de suas funções e da distribuição regional dos neurotransmissores, variando, também, a vascularização e a distribuição do sangue. Além disso, diferentemente do adulto, a imaturidade da barreira hemato-encefálica na criança em desenvolvimento determina um maior impacto dos agentes tóxicos sobre o cérebro infantil30. Os efeitos neurotóxicos podem determinar múltiplas disfunções na criança. Entre essas disfunções encontramos o atraso de desenvolvimento neur opsicomotor, retardo mental e desordens comportamentais e de aprendizado como hiperatividade, déficits de atenção, redução de QI e deficiências de memória e aprendizado31. Maior prevalência de autismo também tem sido atribuída à exposição a poluentes ambientais32.

AS INFLUÊNCIAS AMBIENTAIS E A PRÁTICA DA ENFERMAGEM MATERNO-INFANTIL

Após considerarmos todos estes fatos, alguns questionamentos são inevitáveis. Será que o enfermeiro conhece os efeitos dos fatores ambientais sobre a saúde humana? Será que o enfermeiro leva em consideração as influências ambientais quando planeja e implementa as ações de saúde e, em particular, as de atenção ao binômio materno-infantil? Quando nos reportamos à literatura para tentar responder a esta questão, deparamos-nos com uma enorme lacuna no que concerne ao tema. A tríade ambiente-saúde-enfermagem tem merecido muito pouca atenção dos profissionais desta área, embora, em nível mundial, a consciência sobre a relação entre poluentes e suas ações deletérias sobre a saúde pareça estar se expandindo entre os profissionais de enfermagem33-5. No Brasil, o interesse da enfermagem pela influência ambiental continua focalizado princ ipalmente sobre a visão da necessidade do saneamento básico36, o ambiente de trabalho37 e o destino de resíduos hospitalares38-9. Também tem sido observado o engajamento de enfermeiras nos Programas de Saúde do Trabalhador, onde a exposição ocupacional de homens e mulheres, nos mais diversos ambientes de trabalho, vem sendo investigada. Estudo recente apresenta com riqueza a evolução do interesse pela enfermagem sobre a questão ambiental40. No entanto, no que concerne a saúde materno-infantil, parece que a influência ambiental e, sobretudo, a poluição ainda é bastante esquecida quando do planejamento e implementação de programas e ações direcionadas especificamente para este binômio.

Portanto, é necessário que a enfermagem amplie seu campo de atuação e adote novas estratégias para que suas ações se desenvolvam em um contexto capaz de garantir a eficiência e a qualidade de seus serviços41.

Entre os aspectos que são delineados para compor o perfil do profissional enfermeiro temos a compreensão da política de saúde no contexto das políticas sociais, o reconhecimento dos perfis epidemiológicos das populações, a identificação das relações de trabalho e sua influência na saúde, todos essas dando respostas às especificidades regionais de saúde através de intervenções planejadas estrategicamente42. O papel do enfermeiro, enquanto educador e promotor da saúde, exige que ele se posicione eticamente frente às questões das alterações do meio ambiente e seus efeitos sobre a saúde43. Esta posição é defendida por outros autores que ressaltam que toda ação educativa deve considerar os aspectos sociais, psicológicos, culturais e ambientais do cliente44. Inclusive tem sido discutida a necessidade de incluir o conceito de desenvolvimento sustentável no ensino educativo da enfermagem. No entanto, parece-nos que, embora esse discurso seja bastante difundido e aceito entre os profissionais enfermeiros, em sua prática efetiva tem sido muito pouco aplicado, sobretudo quando se fala de saúde materno-infantil, mostrando um distanciamento entre a teoria e a prática. É necessário que os profissionais de saúde e, em especial, o enfermeiro dirijam mais a sua atenção para os fatores de risco oriundos do ambiente que podem comprometer a saúde das pessoas de uma maneira geral e, em especial, do binômio mãe-filho. Para que o planejamento de determinadas ações seja adequado, é necessário conhecer com profundidade as relações do indivíduo com o ecossistema. Certamente, o cuidado de enfermagem planejado para um cliente deverá ser diferente de uma região para outra se a questão ambiental for levada em consideração. Isso no s faz refletir que as ações normalmente planejadas para serem implementadas em qualquer lugar do país, provavelmente, não contemplam a relação homem-ambiente em sua plenitude. Portanto, é preciso que o enfermeiro realize e/ou participe de estudos que tenham como objetivo identificar as diferentes fontes poluidoras, assim como avaliar o impacto de seus efeitos sobre a saúde de gestantes e de seus filhos, levando-se em consideração as especificidades de cada região. Para isso, a epidemiologia é uma ferramenta de importância extrema na construção dos perfis epidemiológicos que devem subsidiar as ações de saúde da coletividade. Acreditamos que esta possa ser uma das estratégias a ser utilizada pela enfermagem para fazer frente a essa dissociação entre discurso e prática.

A identificação destes fatores de risco permitirá o planejamento e o desenvolvimento de ações mais eficazes no que diz respeito à atenção em saúde. Da mesma forma, esse conhecimento permitirá a adoção de medidas preventivas para que sejam reduzidos os riscos em populações sabidamente expostas a poluentes ambientais e, portanto, mais vulneráveis a determinados agravos.

Por outro lado, também se faz igualmente indispensável que o enfermeiro participe, cada vez mais, de equipes multidisciplinares responsáveis pela decisão quanto às políticas relativas às questões de saúde e meio ambiente de uma maneira geral e, em especial, no que se refere à saúde materno-infantil. Essa participação e sua divulgação contribuirão para uma tomada de consciência pela classe da atenção que, urgentemente, deve ser dada à questão ambiental quando pensamos em ações que visem a prevenção da saúde e a assistência da mulher e da criança.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Portanto, os agentes tóxicos originados da exposição ambiental e/ou ocupacional podem determinar alterações da função reprodutiva e causar agravos à saúde do binômio mãe-filho. São observadas alterações da fertilidade feminina e masculina, podendo causar abortos espontâneos e afetar a saúde da mulher. Para a criança, esta exposição coloca em risco a integridade do seu sistema nervoso, comprometendo seu crescimento e desenvolvimento. Todos esses fatores necessitam ser levados em consideração quando da tomada de decisão e planejamento de ações que visem atender às necessidades de saúde do binômio mãe-filho. Para tanto, é imprescindível que o enfermeiro lance mão de estratégias a fim de melhor conhecer a realidade de seu cliente e a da coletividade em que o mesmo encontra-se inserido.

Como produto de nossa reflexão sobre o tema, sugerimos duas estratégias que, julgamos, possam contribuir para modificação da situação observada atualmente.

- Acreditamos que a participação da enfermagem na construção dos perfis epidemiológicos das comunidades para as quais e nas quais exercem a sua prática pode ser um dos caminhos a serem adotados para que a interação homem-ecossistema seja efetivamente considerada quando se planeja e implementa ações em saúde de uma maneira em geral, e, em particular, quando se pensa na saúde materno-infantil. Identificar os fatores de risco ambientais considerando as especificidades de cada comunidade é, sem dúvida, essencial quando se pretende promover a saúde, prevenir doenças e prestar um serviço de saúde de qualidade.

- Por outro lado, julgamos que a participação efetiva de enfermeiros em equipes multidisciplinares que têm como papel estabelecer as políticas de saúde e meio ambiente nas diferentes esferas governamentais, pode ser uma outra estratégia a ser utilizada para a ampliação da consciência sobre a importância da temática, quando pensamos em ações que visem a promoção e prevenção da saúde, assim como a assistência da mulher e da criança.

Recebido em: 15 de fevereiro de 2004

Aprovação final: 24 de junho de 2004

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Mar 2011
    • Data do Fascículo
      Set 2004

    Histórico

    • Recebido
      15 Fev 2004
    • Aceito
      24 Jun 2004
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