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Interdisciplinaridade, estágios clínicos e desenvolvimento de competências

Interdisciplinariedad, práticas clínicas y el desarrolo de las competencias

Interdisciplinarity, clinical placements and development of competences

Resumos

A natureza do exercício profissional dos enfermeiros na actualidade e os caminhos da sua formação ganham sentido, se perspectivados numa lógica de cruzamentos disciplinares de saberes interpessoais, interprofissionais e interinstitucionais. Os estágios clínicos, momentos de aproximação à vida profissional, emergem como componentes relevantes no processo de formação. Neste artigo explora-se a natureza interdisciplinar da abordagem de supervisão clínico-reflexiva de matriz ecológica baseada na acção, na interacção e na reflexão.

Estágio clínico; Avaliação em enfermagem; Sociedades de enfermagem; Educação em enfermagem


La naturaleza del ejercicio profesional de los enfermeros actualmente, y los caminos de su formación ganan significado, cuando estos se analizan desde una lógica de cruzamientos disciplinarios de saberes interpersonales, interprofesionales e interinstitucionales. Las prácticas clínicas, como momentos de aproximación en la vida profesional surgen como componentes relevantes en el proceso de formación. En este artículo se explora la naturaleza interdisciplinar del abordaje de la supervisión clínica-reflexiva de matriz ecológica con base en la acción, la interacción y en la reflexión.

Prácticas clínicas; Evaluación en enfermería; Sociedades de enfermería; Educación en enfermería


Nursing professional activities in present times and training modalities become more meaningful if viewed in the interplay of interpersonal, interdisciplinary, inter-professional and inter-institutional dimensions. Clinical placements as approaching steps to professional life are key components in the education of health professionals. The clinical-reflective ecological approach to supervision of becoming nurses is discussed. Based on action, interaction and reflection, it highlights the interdisciplinary characteristics of competent nursing.

Clinical Internship; Nursing assessment; Nursing Societies; Nursing Education


ARTIGO ORIGINAL

REFLEXÃO

Interdisciplinaridade, estágios clínicos e desenvolvimento de competências

Interdisciplinarity, clinical placements and development of competences

Interdisciplinariedad, práticas clínicas y el desarrolo de las competencias

Isabel AlarcãoI; Marília RuaII

IDoutorada em Educação. Professora catedrática no Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa. Universidade de Aveiro. Portugal

IIEnfermeira Especialista em Saúde Materna e Obstétrica. Mestre em Ciências de Enfermagem. Professora Adjunta da Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro, Portugal

Endereço Endereço: Isabel Alarcão Departamento de Didática e Tecnologia Educativa, Universidade Aveiro, Campo Universitário de Santiago 3840-193 Aveiro, Portugal. Email: ialarcao@dte.ua.pt

RESUMO

A natureza do exercício profissional dos enfermeiros na actualidade e os caminhos da sua formação ganham sentido, se perspectivados numa lógica de cruzamentos disciplinares de saberes interpessoais, interprofissionais e interinstitucionais. Os estágios clínicos, momentos de aproximação à vida profissional, emergem como componentes relevantes no processo de formação. Neste artigo explora-se a natureza interdisciplinar da abordagem de supervisão clínico-reflexiva de matriz ecológica baseada na acção, na interacção e na reflexão.

Palavras-chave: Estágio clínico. Avaliação em enfermagem. Sociedades de enfermagem. Educação em enfermagem.

ABSTRACT

Nursing professional activities in present times and training modalities become more meaningful if viewed in the interplay of interpersonal, interdisciplinary, inter-professional and inter-institutional dimensions. Clinical placements as approaching steps to professional life are key components in the education of health professionals. The clinical-reflective ecological approach to supervision of becoming nurses is discussed. Based on action, interaction and reflection, it highlights the interdisciplinary characteristics of competent nursing.

Keywords: Clinical Internship. Nursing assessment. Nursing Societies. Nursing Education.

RESUMEN

La naturaleza del ejercicio profesional de los enfermeros actualmente, y los caminos de su formación ganan significado, cuando estos se analizan desde una lógica de cruzamientos disciplinarios de saberes interpersonales, interprofesionales e interinstitucionales. Las prácticas clínicas, como momentos de aproximación en la vida profesional surgen como componentes relevantes en el proceso de formación. En este artículo se explora la naturaleza interdisciplinar del abordaje de la supervisión clínica-reflexiva de matriz ecológica con base en la acción, la interacción y en la reflexión.

Palabras clave: Prácticas clínicas. Evaluación en enfermería. Sociedades de enfermería. Educación en enfermería.

ENQUADRAMENTO

Mudanças paradigmáticas, entendidas como "mudanças profundas nos pensamentos, percepções e valores que formam uma visão particular da realidade"1:11 têm repercussões ao nível do conhecimento, da profissionalidade e da formação e educação e justificam plenamente o tratamento do tema em questão.2

Concebe-se hoje o conhecimento como dinâmico, pessoalizado, contextualizado, socialmente construído, interligado nas suas parcelas. Exige-se dos profissionais competência, responsabilidade, trabalho em equipa e desenvolvimento colaborativo de saberes. Entende-se a formação como um processo contínuo de apropriação pessoal do saber em contextos interactivos. Aspira-se a que a educação conduza a um mundo mais humanizado. Aceita-se uma perspectiva holística, ecológica.

É neste contexto cultural que se situa o paradigma ecológico de enfermagem que,3 emergindo do paradigma holístico, vem acentuar a relação da pessoa com o seu habitat, o seu eco (do grego oikos). O paradigma holístico apresentava já, relativamente ao paradigma mecanicista, de orientação biológica estrita, uma evolução, ao salientar a coerência e a harmonia sistémicas do todo nas suas componentes, por oposição à consideração isolada de cada uma das partes. No paradigma ecológico, o todo que é o ser humano é considerado na sua relação com o seu meio envolvente ou, melhor dizendo, com os vários meios que, à semelhança da pedra lançada à agua, se desdobram e criam envolventes múltiplas.

É também no contexto deste paradigma que defendemos, para os estágios, uma abordagem clínico-reflexivo de matriz ecológica, de que falaremos mais adiante. Por agora, deter-nos-emos sobre o conceito de interdisciplinaridade.

INTERDISCIPLINARIDADE

A actual visão da realidade de que falámos na secção anterior resulta da consciência que hoje se tem relativamente à relação interactiva e interdependente que existe entre os fenómenos físicos, químicos, biológicos, psicológicos, sociais, económicos e culturais.

Esta visão, integradora, não se coaduna com uma abordagem formativa e investigativa enformada pela compartimentação do conhecimento em disciplinas fechadas sobre si mesmo. Por isso assume, hoje em dia, tão grande relevância o regresso ao pensamento interdisciplinar. Contudo, a multiplicidade de conceitos e de práticas que se associam a interdisciplinaridade e conceitos afins exige um esforço de clarificação conceptual que estabeleça a diferença entre interdiscipli-naridade, multidisciplinaridade ou pluridisciplinaridade e transdisciplinaridade e a sua relação com o conceito básico que lhes subjaz: disciplina.

O conceito de disciplina pressupõe um domínio especializado do conhecimento com o seu próprio objecto de estudo, a sua metodologia, as suas leis.

Disciplinaridade, um termo derivado de disciplina, remete, entre outros, para a exploração e construção científica da disciplina como domínio específico e homogéneo.4

O prefixo "inter" que, com o radical "disciplinaridade", compõe o termo interdisci-plinaridade, introduz a ideia de relação dinâmica entre saberes, de abertura a outras áreas disciplinares, de co-construção motivada por um interesse comum que implica colaboração e articulação, não obstante poder também representar perda de exclusividade e de poder disciplinar. Não se trata de uma justaposição de saberes ideia presente nas designações de pluri ou multidisciplinaridade mas de um corpo de conhecimentos integrado, lógico e coeso (ex: biologia molecular).4 A interdisciplinaridade implica uma interpretação e reorganização dos conhecimentos em função dos objectivos de análise e admite níveis e modalidades diferentes.4

O prefixo "trans", presente em transdiscipli-naridade, aponta para um nível mais profundo de interligação, criando uma ruptura com as fronteiras disciplinares e remetendo para uma visão sistémica, alargada, do saber.

Se, do mundo da investigação e da formação (contextos em que esta linguagem é utilizada) passarmos para o mundo do exercício profissional, quase poderemos dizer que a actuação profissional do enfermeiro experiente (como de muitos outros profissionais) se situa a um nível que está para além das disciplinas. Ao agir, já não pensa nas disciplinas, embora parte do seu saber tenha uma sustentação disciplinar. O seu saber profissional resulta da fusão de saberes provenientes de várias fontes (disciplinares e experienciais) que lhe dá uma visão ampla da realidade. Ao referirmo-nos a "profissional experiente", queremos salvaguardar que esta afirmação não é igualmente válida quando temos em mente o aluno em situação de aprendizagem pré-profissional. O período de formação é um período estruturante de saberes que as situações de prática mobilizarão e ajudarão a integrar. Daí que, a nível da formação graduada, se tenha de considerar a interdisciplinaridade e até tornar evidentes os contributos disciplinares. Aliás, uma questão que não deve ser esquecida é a de que, quer os saberes interdisciplinares, quer os transdisciplinares, se constroem sobre os saberes disciplinares.5

No desenvolvimento do tema que nos propusemos abordar, importa agora considerar o perfil do enfermeiro na actualidade. Associamos-lhe algumas reflexões sobre a noção de competência, noção que, hoje em dia, assume uma importância considerável.

O PERFIL DO ENFERMEIRO NA ACTUALIDADE: A NOÇÃO DE COMPETÊNCIA

O profissional de saúde, na actualidade, enfrenta uma situação caracterizada por:

- aparecimento de novas doenças e risco de propagação generalizada de algumas delas;

- envelhecimento progressivo da população;

- constantes e importantes descobertas científicas e tecnológicas com implicações na saúde;

- degradação do meio ambiente e necessidade de compreensão dos factores de risco;

- maior exigência de qualidade de cuidados e de responsabilidade profissional;

- necessidade de articulação entre saúde e acção social;

- disponibilidade para trabalhar em equipas de multi-profissionais;

- capacidade de mobilizar saberes de base sólidos, atitudes e métodos de reflexão sobre as práticas.

No paradigma sócio-profissional da actualidade e de acordo com o Código Português Deontológico do Enfermeiro,6 o enfermeiro é o profissional com reconhecida competência técnica, científica e humana para a prestação de cuidados de enfermagem gerais aos indivíduos, família, grupos e comunidade.

Nesta perspectiva a sua competência deve alicerçar-se num conjunto de características entre as quais destacamos:

- uma personalidade equilibrada e humanista, responsável;

- conhecimentos científicos e técnicos sólidos e actualizados;

- capacidade de analisar os fenómenos e acontecimentos criticamente, de tomar decisões, de agir perante o inesperado, de trabalhar em equipas multidisciplinares;

- uma atitude de aprendizagem continuada.

Quando hoje se fala em profissionais, a noção de competência é associada a essa representação. Um profissional competente é aquele que evidencia qualidade no seu desempenho, vulgo, é "aquele que executa bem, que não falha", aquele que proporciona qualidade aos "clientes" com os quais interage. O desempenho competente é a face visível da competência. O que é então a competência?

Também nesta matéria se impõe algum esforço de clarificação.

Em primeiro lugar para pôr em evidência que a competência profissional é composta de micro-competências. A competência profissional do enfermeiro envolve, em si mesmo, três sub-competências fundamentais: 1) a competência cognitiva; 2) a competência técnica e 3) a competência comunicacional. Por sua vez, cada uma destas pode ainda ser desdobrada em micro-competências. Assim, a competência cognitiva implica, entre outros componentes: a identificação das necessidades do cliente; a análise e interpretação da informação recolhida; a planificação das actividades de acordo com as prioridades de cada situação; a justificação das intervenções; a avaliação da evolução de cada situação clínica. Por seu turno, a competência técnica pode sub-dividir-se também em micro-competências: efectuar correctamente os procedimentos respeitando as normas estabelecidas; possuir destreza manual; utilizar o material adequado a cada situação. E o mesmo se pode dizer da competência comunicacional que implica um conjunto de micro-competências, como: saber ouvir; comunicar de forma adequada às características do cliente/família; efectuar ensinos oportunos; registar de forma sistematizada a informação; transmitir informações correctas e pertinentes; estabelecer uma relação de ajuda.

O esforço de clarificação dirige-se, em segundo lugar, para a compreensão do significado profundo de competência. A palavra competência deriva do latim competens, que significa: o que vai com..., o que é adaptado a ...

A competência tem uma dimensão contextu-alizada; manifesta uma actuação adaptada à situação. Significa uma actuação que vai bem com a situação. Poderemos dizer que ser competente implica saber o que fazer em cada situação concreta. Mas saber o que fazer em cada situação concreta pressupõe uma compreensão e um juízo sobre a situação e uma intencionalidade de acção. Pressupõe, também, uma mobilização das micro-competências adequadas, que funcionam como átomos da competência global.

Entre os vários autores que se têm dedicado ao estudo das competências, salientamosalguns,7-8 pela influência que ambos têm exercido sobre as questões da formação, tema central deste artigo.

Um deles acentua a relação da competência com os saberes e com os contextos, ao afirmar que ter competência é saber mobilizar saberes e ao clarificar que a competência é a capacidade de utilizar os saberes para agir em situação7. Na mesma linha de pensamento, afirma ainda que a competência "é uma mais-valia acrescentada aos saberes"7:12 e salienta que "não existe competência sem saberes"7:12 mas a competência recorre a eles (saberes) e mobiliza-os.

Ao acentuar a relação com os conhecimentos, o autor responde às críticas dirigidas às abordagens formativas baseadas em competências, muitas vezes consideradas como desvalorizadoras dos conhecimentos.

O outro autor reconhece também que a competência requer um "equipamento" de saberes; porém, salienta que não se reduz a esse "equipamento".8

É hoje comum afirmar-se que a competência é o saber em uso. Parece-nos, porém, que tal afirmação não dá suficiente atenção ao aspecto essencial da pessoalidade o ser elemento essencial na integração dos saberes e das atitudes que a pessoa mobiliza em função da compreensão que tem da situação com que se defronta. Preferimos, pois, dizer que a competência é a capacidade de agir em situação, o que implica a manifestação de uma resposta articulada entre: o que fazer, a quem, porquêe para quê. Implica mais ainda. Implica conhecer os limites do seu saber, isto é, o seu não-saber. O conhecimento dos limites do seu saber, para além de poder evitar actuações erradas, é condição necessária (embora não suficiente) para uma aprendizagem continuada.

A competência é, assim, o que resulta de um conjunto de micro-competências que se mobilizam na acção, de uma míriade de atitudes e saberes de vários tipos (substantivos, processuais, contextuais). A situacionalidade da competência é um elemento fundamental a ter em conta se quiser seguir uma abordagem formativa centrada nas competências mais do que nos conhecimentos. "A abordagem por competências não pretende mais do que permitir a cada um aprender a utilizar os seus saberes para actuar".7:17

Esta afirmação constitui um bom ponto de partida para abordarmos a questão da mobilização de saberes e da interdisciplinaridade nos estágios clínicos.

ESTÁGIOS CLÍNICOS: MOMENTOS EM QUE O SER MOBILIZA OS SABERES NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLI-NAR CONTEXTUALIZADA

Por estágios clínicos entendemos, neste artigo, os momentos de observação e intervenção em contextos de serviços de saúde e afins, com o objectivo de desenvolver capacidades, atitudes e competências. Neste ambiente formativo é suposto que o aluno desenvolva atitudes e processos de auto-regulação e integre, mobilize e estimule os conhecimentos adquiridos no ensino teórico e prático, através da interacção com situações reais em contextos diferenciados. A importância desta componente de formação para o desenvolvimento da competência profissional é inegável, pois ela oferece um contexto de aprendizagem que favorece:

- o contacto com a prática (na sua previsibilidade e imprevisibilidade);

- a mobilização, integrada e contextualizada, de diferentes saberes (seleccionados em função da sua pertinência);

- a caminhada para a identidade profissional.

"Os contextos de trabalho são o local indicado e adequado para a construção de saberes e gestos profissionais, relacionando o saber formalizado com a prática, isto é, o saber, com o saber fazer e o saber ser (da acção), construindo o saber cognitivo (saber emergente de reflexão na acção)".9-13

Os estágios clínicos são por vezes vistos numa lógica de meros momentos de aplicação linear de um determinado saber disciplinar. Porém, a riqueza e a natureza das aprendizagens que eles podem proporcionar justifica que se considerem os estágios clínicos numa perspectiva interdisciplinar e que, com os alunos, se reflicta sobre este aspecto interdisciplinar, integrador, que é inerente à actuação profissional.

A interdisciplinaridade é uma abordagem à realidade que implica uma atitude de abertura à compreensão holística e à actuação situada e colaborativa. A interdisciplinaridade pressupõe a mobilização de saberes disciplinares, sem dúvida. Mas, como salientámos anteriormente, encerra uma dimensão de reconstrução, de reconceptualização de saberes que vai para além da sua linear aplicação. É evidente que, à medida que os estágios progridem, a dimensão de interdisciplinaridade vai igualmente progredindo, não só porque aumentaram os saberes disciplinares a mobilizar, mas também porque a gradual complexidade das situações assim o exige. Por exemplo: no estágio numa Maternidade, nos primeiros dias, o aluno, ao ser responsabilizado pelos cuidados a prestar a uma puérpera e recém-nascido, preocupa-se no imediato com aspectos relacionados com o bem-estar físico da puérpera, como vigilância de sinais vitais, perdas hemáticas e a fome, deixando para segundo plano o recém-nascido e outras necessidades tão importantes como o repouso, a comunicação, a relação mãe filho, os conhecimentos relativos ao cuidar do recém-nascido, entre outros. No decurso do estágio, em situação idêntica, verifica-se que o aluno vai adquirindo competências que lhe permitem identificar as diferentes necessidades da puérpera e do recém-nascido simultaneamente, não só no que se refere às necessidades físicas, que se relacionam mais com competências técnicas, mas também no que diz respeito às necessidades que serão satisfeitas através da vertente relacional dos cuidados. Esta evolução pressupõe a mobilização de conhecimentos de diferentes disciplinas que, no seu conjunto, permitem ao aluno cuidar da pessoa como ser único nas suas dimensões biopsicosociais.

DIMENSÕES FORMATIVAS DOS ESTÁGIOS CLÍNICOS

Os estágios clínicos implicam um processo de construção do saber profissional, saber situacionalmente contextualizado, pessoalmente construído, referenciado a saberes disciplinares que, nesse momento, se percepcionam na sua relevância e interacção e de saberes experienciais transmitidos pelos profissionais já experientes com os quais se convive.

A componente formativa dos estágios clínicos pode dissecar-se num conjunto de dimensões que, de seguida, se explicitam.

- Realista, porque permite ao potencial enfermeiro experienciar o contexto real da actividade dos profissionais de saúde.

- Técnica, porque permite concretizar o princípio de aprender a fazer fazendo (e reflectindo) e possibilita o desenvolvimento de competências específicas, só possível em ambiente real.

- Interactiva, ao aproximar-se daqueles que, na prática, são profissionais e dos usuários do sistema de saúde, razão de ser da sua formação.

- Analítica, porque permite dissecar e compreender a complexidade dos factores que envolvem a vida, a doença e a morte.

- Reflexiva, porque envolve o aluno na exploração dos "como", dos "porquê" e dos "para quê".

- Interdisciplinar, porque convoca saberes de várias áreas disciplinares relevantes para a situação em questão.

- Integradora de saberes e geradora de novas formas de pensar e de agir.

- Projectiva, porque permite ao aluno perspectivar-se em relação à sua vida futura.

- Holística, porque permite mobilizar competências ao nível do conhecimento, da relação e da ética.

- Metapraxeológica, ao desafiar o aluno a reflectir sobre a sua própria acção e as vivências e consequências que a envolvem.

- Metacognitiva, porque o leva a pensar no seu próprio conhecimento numa dinâmica de "conhece-te a ti mesmo".

- Construtivista e transformadora, porque convida a repensar, aprofundar, construir e reconstruir os saberes disciplinares e profissionais.

- Prospectiva, porque deixa antever o que será cada um como futuro enfermeiro.

- Selectiva, porque deve contribuir para impedir a entrada na profissão a indivíduos profissionalmente incompetentes.

Importa, pois, pensar em abordagens formativas que tenham em conta estas dimensões. É neste contexto que faz sentido falar-se de uma abordagem clínico-reflexiva de matriz ecológica sobre a qual nos debruçaremos seguidamente.

ABORDAGEM CLÍNICO-REFLEXIVA DE MATRIZ ECOLÓGICA

A matriz ecológica

Esta abordagem insere-se, em primeiro lugar, numa perspectiva ecológica de construção e desenvolvimento humano que, de inspiração bronfenbre-niana,10 tem vindo a ser adaptada e desenvolvida em Portugal.11-13

Tomemos como ponto de partida para a sua explicitação a noção de desenvolvimento profissional, adaptado do conceito de desenvolvimento humano:10 "o desenvolvimento profissional resulta da interacção mútua e progressiva entre uma pessoa, activa, em constante crescimento e os contextos em que actua, estes também sempre em transformação. Este processo interactivo é influenciado pelas relações entre os contextos imediatos e os contextos mais vastos em que estes se inserem. É, pois, altamente ecológico". 11:210

Nesta abordagem, essencialmente dinâmica, ecológica e desenvolvimentista, há a considerar:

- a pessoa do aluno e a dinâmica de interacções que este estabelece na multiplicidade dos micro-contextos que vivencia;

- a influência que os contextos exercem uns sobre os outros.

Como elementos influenciadores do desenvolvimento humano, Bronfenbrenner identifica quatro tipos a que chama micro-sistema, meso-sistema, exo-sistema e macro-sistema.10 O desdobramento destes sistemas que, na sua representação gráfica (Fig.1), surgem como círculos concêntricos, constituem o meio ecológico. No epicentro situa-se a pessoa do aluno. Os sistemas são apresentados progressivamente mais afastados deste à medida que a sua relação com ele é menos próxima e directa, não deixando porém de, sobre ele, exercer influências.


Na figura 1 apresenta-se uma representação visual que evidencia os quatro tipos de sistemas referidos:10

- o micro-sistema, como o conjunto de micro-contextos que exercem uma influência directa sobre a pessoa do aluno. A enfermaria em que o aluno está a estagiar é exemplo de um micro-contexto;

- o meso-sistema, representativo da interacção entre micro-contextos, de que é exemplo o clima relacional entre os formadores que orientam o aluno (os da escola e os dos serviços);

- o exo-sistema, constituído pelos contextos que, exercendo uma influência directa sobre outras pessoas que com o aluno directamente interagem, acabam por influenciar também a pessoa do aluno. Como exemplo, pode referir-se a organização hospitalar;

- o macro-sistema, isto é, os elementos sócio-políticos e culturais que, situando-se em contextos mais afastados e aparentemente irrelevantes para o processo, exercem uma influência indirecta muito grande sobre os outros contextos que lhe estão mais próximos. Exemplos de elementos macro-sistémicos são as políticas de saúde e as políticas de formação.

A matriz desenvolvimentalista e sócio-construtivista

A abordagem clínico-reflexiva de matriz ecológica tem uma matriz desenvolvimentista e sócio-construtivista, na medida em que prevê que o desenvolvimento (no caso vertente, do pré-profissional de enfermagem) se processe por transições ecológicas em ambiente de interacção.

Três factores contribuem para que aconteça uma transição ecológica:10

- a realização de novas tarefas;

- o desempenho de novos papéis;

- os contactos com pessoas com as quais até ao momento ainda não se tinha interagido.

Figura 2


Se reflectirmos sobre o que passa na situação de estágios, concluímos que estes momentos do percurso dos alunos em direcção à profissão envolvem a sua interacção, activa e progressiva, com os contextos profissionais, através:

- da realização de tarefas novas (que progressivamente os aproximam mais da profissão);

- do desempenho de novos papéis (de observador a colaborador, de colaborador a executante);

- do estabelecimento de novas e variadas relações interpessoais (com outros enfermeiros, com outros profissionais da saúde, com os utentes dos serviços e seus familiares, etc).

O contexto supervisivo

O que acaba de ser dito remete para uma perspectiva em que o desenvolvimento da pessoa do aluno (que se pretende dinâmico) se processa em interacção com outras pessoas, entre as quais destacamos as que têm a seu cargo orientá-lo na sua aprendizagem em contextos de prática clínica e que, no âmbito deste artigo, designaremos por supervisores, independentemente de se tratar de docentes das Escolas de enfermagem ou dos profissionais em exercício no terreno.

O elemento clínico

O elemento clínico na designação da abordagem "clínico-reflexiva de matriz ecológica" é, por si só, informativo. Aponta para a natureza dos contextos, a tal natureza real, complexa, multifacetada, a exigir actuações em que os saberes se entrecruzam e em que a interdisciplinaridade se torna evidente.

O elemento reflexivo

Falta, porém, comentar o elemento "reflexivo", também presente na designação da abordagem a que temos vindo a referir-nos. Reconhecendo a influência,15 advogamos que os estágios clínicos possibilitem aos alunos "uma reflexão dialogante sobre o observado e o vivido", processo que "conduz à construção activa do conhecimento na acção segundo uma metodologia de aprender a fazer fazendo". 16:13

Síntese dos fundamentos

Em resumo, a filosofia subjacente a esta abordagem aponta para a interacção dos formandos com a acção profissional contextualizada, sob a orientação (supervisão) de profissionais que os ajudam a desenvolver conhecimentos, técnicas e atitudes numa perspectiva de construção do seu profissionalismo e da sua identidade profissional, através da mobilização dos conhecimentos adquiridos e emergentes, relevantes para a compreensão do mundo real na sua dimensão ecológica.

Estabelecidos os fundamentos, gostaríamos de considerar agora, ainda que de uma forma muito breve, outros aspectos inerentes a esta abordagem: a noção de supervisão; o papel do aluno; o papel do supervisor; algumas estratégias de aprendizagem/supervisão; as relações interinstitucionais.

Noção de supervisão

Supervisão é definida como "processo em que um (profissional), em princípio mais experiente e mais informado, orienta um outro (profissional) ou candidato a (profissional) no seu desenvolvimento humano e profissional".17:18 Esta concepção de supervisão "tem lugar num tempo continuado", "tem um objectivo" (o desenvolvimento profissional) e "situa-se no âmbito da orientação de uma acção profissional".17:18

A definição apresentada e a concepção que lhe subjaz inserem-se no espírito do que hoje se designa por supervisão clínica em contextos de Saúde, como se pode reconhecer ao analisar a seguinte definição utilizada no âmbito do Serviço Nacional de Saúde Inglês, em que Supervisão clínica é referida como o "termo usado para descrever um processo formal de apoio e aprendizagem profissionais que possibilita a cada um desenvolver conhecimento e competência, assumir responsabilidade pela sua própria prática e melhorar a protecção ao cliente e a qualidade na prestação de cuidados em situações clínicas complexas. Central ao processo de aprendizagem e ao alargamento do âmbito da prática, deve ser considerado um meio de encorajar a auto-avaliação e as competências analíticas e reflexivas".18:525

Embora esta definição se situe no âmbito do exercício profissional e não pré-profissional, como é a situação de estágios clínicos, consideramos que ela é igualmente válida nesta última situação.

O papel do aluno

As práticas de formação e as teorias sobre a aprendizagem evidenciam que ninguém pode aprender pelo aluno. Daí o seu papel como principal actor.

Na sua formação a nível dos estágios clínicos a ele compete fazer uma leitura compreensiva da realidade, uma realidade em que não existem compartimentos disciplinares, mas cuja compreensão é possibilitada pelo referencial disciplinar de que dispõe e pelas relações interdisciplinares que consegue estabelecer. A leitura compreensiva da realidade implica fundamentalmente duas capacidades: a capacidade de observar e a capacidade de interpretar.

Compete-lhe também inserir-se progressivamente nas actividades e desenvolver competências, o que envolve:

- aprender rotinas e técnicas;

- desenvolver capacidades de comunicação;

- construir atitudes deontológicas.

Mas o processo de desenvolvimento implica ser capaz de avaliar as suas capacidades e competências, identificar aspectos fortes e fracos, analisar as suas possibilidades, buscar melhorias, desenvolver o auto-conhecimento e a auto-regulação, tomar decisões relativas à profissão.

Cabem aqui algumas perguntas:

- são os alunos preparados para assumirem este papel?

- é-lhes explicado o valor formativo dos estágios clínicos?

- é explicitada a relação do estágio clínico com as outras componentes curriculares?

O papel do supervisor

Quanto ao papel do supervisor, ele tem de ser facilitador e incentivador do papel do aluno, no que respeita ao que se espera deste. Tem, portanto, de o ajudar a fazer uma leitura compreensiva da realidade, de o apoiar na inserção na vida profissional e na avaliação das suas capacidades e competências.

Num esforço de grande síntese, poderemos dizer que este papel implica:

- um saber profissional muito sólido e uma atitude deontologicamente correcta;

- uma relação interpessoal de ajuda, estimulante, isto é, uma relação formativa.

E de novo, algumas questões para reflexão:

- está a generalidade dos supervisores preparada para assumir este papel?

- foram-lhes facultados momentos de formação e de reflexão?

- estão as instituições conscientes das implicações deste papel?

Estratégias de aprendizagem/supervisão

A dimensão clínico-reflexiva da abordagem que temos vindo a defender assenta em cinco elementos-chave, representados na figura 3:

- observação;

- acção e reflexão;

- questionamento crítico;

- interacção e comunicação com os vários actores;

- sistematização e reconceptualização de saberes.

Merecem destaque alguns tipos de estratégias de acção e reflexão.16-17

- demonstração, que deve ser acompanhada por explicação informativa ou questionante, promotora da compreensão;

- execução, acompanhada de auto-avaliação e racionalmente justificada e efectivamente apoiada hetero-feedback informativo;

- análise de casos, estratégia interdisciplinar por excelência;

- narrativas de situações e reacções, se possível, por escrito porque o acto de escrita é, por natureza, um acto reflexivo;

- portfólios reflexivos (a testemunhar a caminhada de formação);

- perguntas pedagógicas (que, organizadas em sequências tipológicas, se iniciam com a descrição de acontecimentos, passam pela interpretação dos mesmos e o confronto com outras maneiras de ver e de agir e desembocam na reconstrução de saberes, atitudes ou modos de pensar).


Relações interinstitucionais

A formação dos profissionais de enfermagem não pode ocorrer dentro dos limites das Escolas de Enfermagem. A natureza desta formação implica o contacto com instituições de saúde e a prática profissionalizante nesses contextos. Mas os locais de estágio não podem ser considerados apenas como meros locais de aplicação em que os alunos e os profissionais orientadores são comandados ou telecomandados pelos docentes das Escolas. Importa estabelecer parcerias de colaboração.

Para que esta expressão não seja vazia de sentido, estes partenariados têm de assentar em:

- conhecimento mútuo;

- objectivos de formação comummente assumidos;

- planificação conjunta;

- avaliação conjunta de processos e resultados.

Duas condições são fundamentais neste relacionamento: a capacidade de aberta e construtivamente questionar teorias e práticas e a existência de canais de comunicação permanentemente abertos.

Num espírito de co-aprendizagem interinstitucional, desenvolver-se-á uma cultura de formação partilhada, ambiente indispensável para fomentar o desenvolvimento de profissionais equilibrados, humanistas, detentores de conhecimentos científicos e técnicos actualizados, com capacidade de trabalhar em equipas profissionais e multiprofissionais e com atitudes de aprendizagem continuada, isto é, o perfil que acima definimos para o enfermeiro da actualidade.

CONCLUINDO

Com base na abordagem clínico-reflexiva de matriz ecológica podem construir-se modelos operacionais.19 Os modelos servem de sustentação a estruturas de formação que, tal como defendemos, visam o desenvolvimento de um saber pessoal e social, dinâmico e contextualizado, construído na interacção ecológica dos contextos reais. Esta construção resulta da experiência, da observação e da análise racional das práticas, processos apoiados por diálogos interpretativos numa perspectiva de auto-desenvolvimento. Este ambiente de formação é sustentado pela rede de interacções entre a instituição de formação e os serviços de saúde e por uma relação supervisiva que alia o sistemático desafio, o apoio constante e a exigente avaliação formativa e sumativa.

A competência profissional resulta de um conjunto de micro-interacções:

- com o próprio (interacção intrapessoal);

- com os outros (interacção interpessoal);

- com os saberes na sua relação de interactividade (interacção interdisciplinar).

Ela encontra ambiente favorável para o seu desenvolvimento num exo-contexto caracterizado por boas relações interinstitucionais e num macro-contexto em que concepções, valores e políticas interagem coerentemente. Estamos, então, em presença da dimensão "inter" que caracteriza o mundo globalizado em que vivemos e os actuais paradigmas de investigação, de formação, e de exercício profissional.

Recebido em: 15 de fevereiro de 2005

Aprovação final: 23 de maio de 2005

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  • Endereço:
    Isabel Alarcão
    Departamento de Didática e Tecnologia Educativa,
    Universidade Aveiro, Campo Universitário de Santiago
    3840-193 Aveiro, Portugal.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2005

    Histórico

    • Aceito
      23 Maio 2005
    • Recebido
      15 Fev 2005
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