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A epistemologia de Ludwick Fleck: subsídios para a prática interdisciplinar em saúde

La epistemología de Ludwick Fleck: subsidios para la práctica interdisciplinaria en el área de la salud

The epistomology of Ludwick Fleck: subsidies for interdisciplinary health care practice

Resumos

Este artigo tem como objetivo apresentar uma síntese sobre o pensamento de Ludwick Fleck de modo a contribuir para a reflexão da interdisciplinaridade em saúde. Inicialmente são apresentadas as teorizações de Fleck acerca da produção do conhecimento no interior das comunidades científicas, da formação e existência de um modo próprio de pensar dessas comunidades e da maneira como o conhecimento circula entre diferentes cientistas e diferentes comunidades de cientistas. A partir desta teorização discute-se as potencialidades da interdisciplinaridade para a prática dos profissionais de saúde na atualidade.

Saúde; Equipe de assistência ao paciente; Promoção da saúde


Este artículo tiene como objetivo presentar una síntesis del pensamiento de Ludwick Fleck con la finalidad de contribuir para la reflexión sobre la interdisciplinariedad en el área de la salud. Inicialmente, se presenta la teoría de Fleck al respecto de la producción del conocimiento dentro de las comunidades científicas, de la formación y la existencia de un modo propio de pensar de estas comunidades y, de la manera, como el conocimiento circula entre los diferentes profesionales y las diferentes comunidades científicas. A partir de esta teoría se discute también, las potencialidades de la interdisciplinariedad para la práctica de los profesionales de la salud en la actualidad.

Salud; Grupo de atención al paciente; Promoción de la salud


This article presents a synthesis of the line of thinking of Ludwick Fleck in a way that contributes to the current reflection upon interdisciplinary practices in health care. Initially, Fleck's theories concerning knowledge production within the scientific community as well as the formation and existence of an individual method of thought within this community are laid out. From this theory, the article discusses the potential for interdisciplinary practices among current health care professionals.

Health; Patient care team; Health promotion


ARTIGO ORIGINAL

REFLEXÃO

A epistemologia de Ludwick Fleck: subsídios para a prática interdisciplinar em saúde

The epistomology of Ludwick Fleck: subsidies for interdisciplinary health care practice

La epistemología de Ludwick Fleck: subsidios para la práctica interdisciplinaria en el área de la salud

Eliane MatosI; Jadete R. GonçalvesII; Flávia Regina Souza RamosIII

IEnfermeira chefe da Divisão de Enfermagem em emergência e ambulatório do hospital universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Enfermagem pela UFSC. Doutoranda em enfermagem pela UFSC

IIPsicóloga. Professora adjunta do Departamento de Psicologia e do Curso de Especialização e Residência em Saúde da Família da UFSC. Especialista em Psicologia Clínica e Psicologia Hospitalar. Doutoranda em Enfermagem pela UFSC

IIIDoutora em Filosofia em Enfermagem. Professora do Departamento de Enfermagem e do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Pesquisadora na Área de Processo de Trabalho e Filosofia e Saúde/CNPq

Endereço Endereço: Eliane Matos R. Europa, 150, Apto 634 88036-000 Trindade, Florianópolis, SC. E-mail: elianematos@hotmail.com

RESUMO

Este artigo tem como objetivo apresentar uma síntese sobre o pensamento de Ludwick Fleck de modo a contribuir para a reflexão da interdisciplinaridade em saúde. Inicialmente são apresentadas as teorizações de Fleck acerca da produção do conhecimento no interior das comunidades científicas, da formação e existência de um modo próprio de pensar dessas comunidades e da maneira como o conhecimento circula entre diferentes cientistas e diferentes comunidades de cientistas. A partir desta teorização discute-se as potencialidades da interdisciplinaridade para a prática dos profissionais de saúde na atualidade.

Palavras-Chave: Saúde. Equipe de assistência ao paciente. Promoção da saúde.

ABSTRACT

This article presents a synthesis of the line of thinking of Ludwick Fleck in a way that contributes to the current reflection upon interdisciplinary practices in health care. Initially, Fleck's theories concerning knowledge production within the scientific community as well as the formation and existence of an individual method of thought within this community are laid out. From this theory, the article discusses the potential for interdisciplinary practices among current health care professionals.

Keywords: Health. Patient care team. Health promotion.

RESUMEN

Este artículo tiene como objetivo presentar una síntesis del pensamiento de Ludwick Fleck con la finalidad de contribuir para la reflexión sobre la interdisciplinariedad en el área de la salud. Inicialmente, se presenta la teoría de Fleck al respecto de la producción del conocimiento dentro de las comunidades científicas, de la formación y la existencia de un modo propio de pensar de estas comunidades y, de la manera, como el conocimiento circula entre los diferentes profesionales y las diferentes comunidades científicas. A partir de esta teoría se discute también, las potencialidades de la interdisciplinariedad para la práctica de los profesionales de la salud en la actualidad.

Palabras clave: Salud. Grupo de atención al paciente. Promoción de la salud.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE O CONHECIMENTO E A PRÁTICA EM SAÚDE

As últimas décadas registram uma profunda crise mundial, que afeta todos os aspectos da vida humana a saúde, o modo de vida, o meio ambiente, as relações sociais, a economia, a tecnologia, a política. Entre os aspectos que caracterizam tal crise, dita sem precedentes na história humana, há o ressurgimento e o avanço de doenças extintas do planeta, o surgimento de novas doenças, e formas inéditas de ocorrência de antigos fenômenos, como a guerra e a violência, entre outros. Nesta realidade, especialistas de diversas áreas do conhecimento se defrontam com os limites de abordagem dos problemas a partir das óticas e instrumentos restritos ou exclusivos às suas respectivas áreas de especialização.1

O intenso crescimento científico e tecnológico, a excessiva especialização do conhecimento, a fragmentação característica do pensamento em geral e das disciplinas acadêmicas, deixaram ao campo da saúde a herança de visões e práticas científicas reducionistas, que limitam a compreensão dos profissionais de saúde sobre o complexo fenômeno da enfermidade. A redução da complexidade deste fenômeno, definido como objeto de intervenção a partir de o estudo de partes cada vez menores e separadas de sua existência na vida humana concreta, produz formas de conhecer detalhadas, minuciosas e parciais, além de prerrogativas de atuação valorizadas como verdadeiras, corretas e "boas".1

No ocidente medicina e biologia desenvolveram-se lado a lado com uma visão mecanicista do processo saúde/doença, resultando no chamado modelo biomédico de atenção à saúde, o qual influencia toda a produção de conhecimento e a prática dos profissionais das distintas áreas medicina, enfermagem, psicologia, nutrição e outras, até os dias atuais.1

As insuficiências deste modelo, que configuram uma prática que não consegue responder aos problemas de saúde/doença da população, que expressam a incapacidade dos profissionais em responder as questões mais amplas que envolvem o processo saúde/doença, assim como o esgotamento deste modelo de atenção a saúde, têm levado os profissionais a discutir alternativas de articulação dos saberes com vistas a propor mudanças à realidade atual.

Neste sentido, amplia-se a discussão sobre a interdisciplinaridade em saúde, seja do ponto de vista da formação acadêmica e da construção do conhecimento, ou da necessidade de implementação de práticas interdisciplinares efetivas no atendimento a saúde. Em nossa prática nos serviços de saúde convivemos com as dificuldades impostas por este modelo e atuamos em grupos interdisciplinares que buscam construir novas alternativas de atenção a saúde.

Na perspectiva de contribuir com estas práticas fomos buscar na epistemologia de Ludwick Fleck, subsídios para pensar a interdisciplinaridade em saúde. As teorizações deste autor ainda hoje são pouco conhecidas, mesmo quando consideramos a atualidade de sua abordagem sobre o desenvolvimento do conhecimento científico, das comunidades dos cientistas, da produção do conhecimento, da formação e existência de um modo próprio de pensar dessas comunidades e da maneira como o conhecimento circula entre os cientistas e as diferentes comunidades. Seu entendimento pode, no entanto, subsidiar o debate acerca da interdisciplinaridade na saúde, considerando o saber historicamente construído e a prática dos profissionais que integram a área.

A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO EM LUDWICK FLECK

Ludwick Fleck, médico bacteriologista, imunologista e epistemólogo de origem judaico-polaca, nasceu na cidade de Lwów, Polônia e desenvolveu suas idéias acerca da ciência em meio à turbulenta realidade da Polônia dividida, durante a segunda Guerra Mundial.2

Suas atividades profissionais estiveram ligadas, invariavelmente, à área de laboratório, ensino de medicina e produção científica. Suas elaborações sofreram forte influência do clima verdadeiramente interdisciplinar reinante na Escola Polonesa de Medicina na época, e de cientistas como: Biernarki, Chalubinski, Biegansk, Kramstyk, cujas idéias sintetizou em sua obra.2

Com base na investigação médica, desenvolveu suas proposições epistemológicas, escreveu diversos artigos científicos e em 1935 produziu seu livro "A Gênese e o desenvolvimento de um fato científico", no qual discute suas idéias sobre a construção coletiva do saber científico a partir da história da sífilis e da reação de Wassermann para detecção da doença. Essas contribuições fornecem importantes contribuições sobre o papel das práticas profissionais na construção e validação dos fatos científicos, permitindo leituras pertinentes à diversas disciplinas na área da saúde, bem como na questão da prática interdisciplinar.

Fleck percebia as doenças como entidades complexas, que não podem ser descritas em termos de causalidade simples. Na doença existe sempre interação entre dois organismos complexos - hospedeiro e parasita e estes são pensados de diferentes pontos de vista, dependendo daquele que o aborda (médico, bioquímico, serologista, sociólogo). Uma visão global da questão não se faz possível, de imediato. O que temos são diversos pontos de vista sobre um mesmo fenômeno. A enfermidade para ser compreendida deve ser considerada sobre distintos ângulos, ou seja, deve envolver o olhar de cada uma das disciplinas, pois não existe uma consideração unitária. Uma compreensão global do fenômeno exige a consideração das diversas perspectivas para uma aproximação da totalidade. Entre os diversos pontos de vista há certa dificuldade de entendimento, ao que chamou de incomensura-bilidade/incomunicabilidade/incongruência. Tal visão pressupõe uma perspectiva interdisciplinar do saber acerca da enfermidade, como evento.2

Pensando a partir da forma como se dá a construção do conhecimento na área médica, Fleck desenvolve sua teorização acerca dos estilos e coletivos de pensamento. Parte do pressuposto de que a ciência é um empreendimento levado a cabo por pesquisadores, de forma cooperativa e de que é impossível pensar a ciência a partir de um cientista individual. No desenvolvimento histórico do descobrimento da reação de Wassermann para detecção da sífilis, destaca o trabalho de inúmeros investigadores em diferentes lugares, a participação de diferentes colaboradores e a forma como inúmeras contribuições se relacionavam, num mútuo apoio entre os trabalhos específicos. Ao descobrir-se à reação tornava-se impossível distinguir a contribuição individual de cada um. Para a efetivação da investigação Fleck vai afirmar que o trabalho científico é concebido a partir de um coletivo de pensamento/estilo de pensamento.2

Esclarecendo o que o autor chama de estilo/coletivo de pensamento, podemos entende-lo como um perceber dirigido, que corresponde a uma elaboração intelectiva e objetiva do que é percebido e que, também, corresponde a uma prática.3 Fleck submete a teoria da ciência ao postulado do máximo de experiência, ao que considerava a lei máxima do pensar científico. O estilo de pensamento contempla as pressuposições sobre as quais o coletivo constrói seu edifício teórico.

Um estilo de pensamento não existe individualmente. Existe no interior de determinado coletivo de pensamento, ou seja, o coletivo de pensamento é portador de um estilo de pensamento. Coletivo de pensamento para o autor designa a unidade social da comunidade de cientistas, ou de um campo determinado do saber (grupo profissional).2

Um fato científico é como uma regra desenvolvida por um grupo de pessoas unidas por um estilo de pensamento comum, que tenta abranger os pressupostos sobre os quais o grupo constrói seu estoque específico de conhecimento, sua unidade conceitual e prática. Um estilo de pensamento constrói seu corpo de práticas; métodos e ferramentas para a investigação e critérios para julgar seus resultados. Define também o que deve ser considerado como um problema científico e como lidar com este problema. O estilo de pensamento de uma dada comunidade de cientistas molda, portanto, "os fatos científicos" (conceitos, objetos ou métodos) produzidos por esta comunidade.2

Mas o autor defende, ainda, que na construção e desenvolvimento de uma descoberta não está presente, no entanto, apenas a contribuição de um grupo de cientistas. Cada descoberta, cada novo conhecimento, é um produto da comunidade de cientistas, que foi moldada pelas múltiplas interações desta comunidade com outros grupos e estruturas sociais: pacientes, familiares, clínicos gerais, políticos, outros profissionais e, até mesmo, Estados.4

Para o autor não existe na atividade investigativa o observar livre de pressuposições. O observar, no contexto do conhecimento, ocorre de duas maneiras principais, entre as quais há formas intermediárias: em primeiro lugar como o confuso ver inicial e depois, com o ver formativo direto e desenvolvido. O ver formativo, no sentido do observar científico, não é um observar ingênuo, mas algo que só é possível por traz de uma introdução teórico-prática e certa experiência em um campo. Apenas os iniciados e aqueles que já adquiriram a práxis necessária têm a capacidade para o observar científico.2

Neste sentido, ao se adquirir a habilidade para perceber determinado fenômeno de acordo com um estilo, vai se perdendo gradativamente a capacidade para observar (ver) coisas que entram em contradição com este ver formativo adquirido. A disposição para o perceber orientado constitui a raiz de todo estilo de pensamento. O ver gestáltico é uma atividade do estilo de pensamento. O ver confuso inicial carece de estilo, está desorientado, é caótico; lhe falta o fixo - o fato. Os fatos, ou a realidade, não são coisas que se ofereçam simples e diretamente, senão que têm que surgir de uma seleção específica do percebido por um coletivo de pensamento. O percebido tem que se experimentar no coletivo de pensamento como uma resistência contra o ver arbitrário e sua forma tem que aparecer ante o coletivo de pensamento como forma direta a experimentar. A isso chama de "coerção de pensamento".2: 23

A constância de certas concepções, pertencentes a um coletivo de pensamento, está unida indissoluvelmente a uma sociedade, a uma situação histórica e a uma cultura; isto parece tão importante, ou inclusive mais importante, que aquilo que pense o investigador individual. Só concebendo o trabalho científico como o trabalho de um coletivo de pensamento se pode compreender que surjam resultados concretos dos esforços de investigação. Em geral, as hipóteses propostas no começo de uma atividade de investigação não levam a nenhum resultado e os objetivos imaginados inicialmente não chegam a materializar-se. Da mesma maneira, o resultado obtido ao final da atividade investigativa normalmente não está presente nos objetivos iniciais dos investigadores se não que esta concepção final vai se desenvolvendo paulatinamente durante o trabalho do coletivo.2

Fleck acreditava que os cientistas que pertencem a diferentes grupos passam por um longo processo de socialização no estilo de pensamento de sua comunidade. O processo inclui a internalização das normas e dos valores da comunidade e a aquisição de habilidades específicas (que incluem a capacidade de perceber fenômenos específicos). O processo de socialização dos cientistas num dado estilo de pensamento pode ser responsável pela estabilidade relativa dos grupos de pensamento dos estilos de pensamento. Afirma, porém, que os grupos não são totalmente fechados. O conhecimento circula entre grupos de uma mesma área, grupos de outras áreas e mesmo entre pessoas não ligadas a produção científica, ou seja, existe certa "comunicação" entre estilos e coletivos de pensamento.2

No entanto, esta comunicação é feita por "tradução" do conteúdo comunicado, pois aquele que recebe precisa traduzi-lo para seu estilo/coletivo de pensamento. Neste processo o conhecimento sofre alterações que podem ser responsáveis pelo surgimento de conhecimentos novos e novas áreas, disciplinas, saberes.2

Em seu trabalho intitulado "Sobre a crise da realidade" analisa de forma sistemática a relação entre objeto, a atividade cognoscitiva e o entorno macrossocial da ciência. Procede uma análise sociológica da ciência e distingue três tipos de fatores sociais influentes em toda atividade cognoscitiva: 1) o peso da formação em que os conhecimentos se compõem em sua maior parte do apreendido, não do novo. Apesar disto, na transmissão do conhecimento, durante o processo de aprendizagem, se produz de forma imperceptível um deslocamento do conteúdo cognoscitivo, no qual o conhecimento transmitido não é exatamente o mesmo para quem comunica e quem recebe; o mesmo se transforma ao passar a outra pessoa; 2) a carga da tradição todo conhecer novo está conformado pelo já conhecido; 3) a repercussão da sucessão do conhecer o que uma vez já foi formulado como concepção limita o campo de movimento das concepções construídas sobre ela.2

Nesse sentido, só tendo em conta as condições sociais e culturais do conhecer, pode se fazer compreensível o aparecimento de outras muitas "validades" junto à realidade estabelecida pelas ciências naturais. Assim como cada indivíduo possui uma realidade própria, todo grupo social dispõe também de sua realidade social, determinada e específica. Portanto, o conhecer, enquanto atividade social, está unido aos condicionantes sociais dos indivíduos que o levam a cabo. Cada "saber" forma, conseqüentemente, seu próprio "estilo de pensamento"; é com ele que compreende os problemas e os orienta de acordo com seus objetivos. Na eleição dos problemas determina a forma de ver específica na observação do objeto. A "verdade" conhecida é, portanto, relativa ao objetivo prefixado do saber.2

Ainda no que diz respeito à investigação na medicina, Fleck aponta duas particularidades, que podem servir para compreender também as demais disciplinas da área da saúde. Uma primeira particularidade diz respeito à natureza do conhecimento na medicina que não está dirigido para as regularidades, como em outros campos do saber, mas sim, ao que foge da normalidade, aos estados de enfermidade do organismo. A formulação de regularidades, nos fenômenos da enfermidade, a delimitação de entidades nosológicas, só é possível a partir da observação de cada caso individual. Introduz a compreensão de que os fenômenos relacionados à saúde/doença são vistos sob diversos pontos de vista (sociológico, psicológico, antropológico), dependendo do grupo que o esteja investigando, e que nenhuma percepção isolada consegue dar conta do todo, embora cada qual considere sua posição a única correta.2

Sobre o conhecer em medicina, refere que a meta da disciplina não é, primordialmente, a extensão do saber em si mesmo. O conhecer em medicina tem por objetivo o controle dos estados patológicos, portanto o investigar tem uma necessidade imediata de êxito e isto condiciona determinadas características do pensamento médico. As particularidades nos estados concretos de enfermidade exigem uma variação constante das concepções médicas e o saber médico se desenvolve a partir dos padrões explicativos existentes em cada momento histórico.2

A medicina pretende estabelecer relações causais para explicar seus fenômenos, porém encontra dificuldades bem maiores que outras áreas, pois a enfermidade depende, em cada momento concreto, de duas variáveis inter-relacionadas: a enfermidade em si e o organismo afetado. A enfermidade se desenvolve com o tempo e com isso modifica as funções vitais do organismo, as quais apresentam, assim mesmo um uso temporal próprio e específico. Por isso, o suposto de que as relações entre as observações dos estados de enfermidade podem ser concebidas satisfatoriamente, como desenvolvimentos unidimensionais, não se sustenta na medicina.2

Discute também a partir de estudos de casos, além do caráter coletivo da investigação, a dependência da ciência a fatores externos a ela. São estes fatores externos que põem em movimento a ciência.

Através de sua investigação da gênesis do conceito de sífilis, demonstra que as concepções da ciência moderna são também produtos surgidos historicamente, não sendo possível entendê-los sem recorrer a seu desenvolvimento histórico. Ainda que Wassermann e seu grupo tenham proposto inicialmente outra meta, no transcurso de seu trabalho foi estabelecendo-se em seu lugar um antigo desejo social, sendo justamente este fato o que levou ao êxito do grupo. As concepções científicas não se baseiam meramente nas observações do material empírico, e sim, tanto ou mais, nas idéias cuja gênesis vem de um passado remoto. Como instrumento para reconhecer a conexão das concepções atuais com sua origem histórica, Fleck introduz o conceito de protoidéia (senso comum).

Denomina assim, as concepções surgidas no passado que continuam existindo apesar de todas as variações dos estilos de pensamento. A pesquisa atual, ao reconhecer os elementos de conhecimento de épocas anteriores, faz com que as concepções antigas percam seu contexto original e sejam interpretadas de forma distinta pela época nova, de acordo com seu estilo de pensamento. As protoidéias surgem em determinado momento histórico, mas não são consideradas pertinentes para os estilos hegemônicos e ressurgem noutro momento, quando novos conhecimentos são superpostos como fundamentais para o desenvolvimento de um novo estilo. O valor destas concepções para cada época consiste em que seu conteúdo é entendido sempre de forma nova, de maneira que adquirem uma função heurística e reguladora da investigação científica. As protoidéias devem ser consideradas como esboços histórico-evolutivos das teorias atuais e sua gênese tem que ser compreendida sócio-cognitivamente.

A REALIDADE ATUAL DAS PRÁTICAS DE SAÚDE E A QUESTÃO DA INTERDISCIPLINARIDADE À LUZ DA EPISTEMOLOGIA DE LUDWICK FLECK

A superespecialização, como tendência das práticas em saúde, tem permitido o aprofundamento do conhecimento específico das diversas áreas que integram o campo da saúde. Resultou, no entanto, em um efeito perverso, qual seja, a perda do entendimento da totalidade do homem pelo seu parcelamento e ênfase no seu funcionamento biológico; desconsiderando-o como determinante e determinado por relações afetivas, experiências de vida e integrante de uma totalidade social. O exercício da atenção à saúde, ao transferir-se para os hospitais, com intensa utilização de tecnologias especializadas, influenciaram decisivamente a prática dos profissionais de saúde.5

No cotidiano do trabalho institucional, as diversas especialidades do conhecimento desenvolvem quase sempre um trabalho destituído de reflexão sobre o processo de trabalho que as especifica. Trabalham quase sempre sem planejamento, não têm uma prática de participação dos trabalhadores no pensar e organizar o trabalho, perdem a riqueza da percepção dos diversos grupos profissionais, não fazem a integração interdisciplinar necessária ao salto qualitativo e a reflexão sobre a globalidade do processo assistencial. Assim, a especialização do conhecimento, ao invés de possibilitar avanço, gera fragmentação e alienação.5

Positivamente, esta realidade tem produzido nas últimas décadas o resgate da discussão da interdiscipli-naridade como condição para a superação da prática fragmentada e seus efeitos sobre a atenção à saúde.

Diversos autores6, 7, 8, 9 nos alertam sobre a forma caótica em que se encontra o saber científico, sobre a necessidade de se instaurar um diálogo entre as várias disciplinas.

Aponta-se o perigo do processo da especialização galopante como tendência hermética e dogmática, que torna o saber isolado das condições sócio-históricas de sua produção. Sob a perspectiva do conhecimento como uma procura e não uma posse da verdade e do interdisciplinar como algo que se vive e não que se ensine ou que se aprenda, incorpora-se ao entendimento da interdisciplinaridade a atitude feita de curiosidade e aventura; de abertura, de busca permanente e de valorização da intuição sobre as relações existentes entre as coisas, sobre os elementos que fogem à observação comum.6

A interdisciplinaridade também pode ser tomada como o princípio da máxima exploração das potencialidades de cada ciência, da compreensão de seus limites, mas acima de tudo, como princípio da diversidade e da criatividade. 9

Em oposição a uma condição já dada e assegurada, a interdisciplinaridade evolui no exercício da própria prática e necessita do desenvolvimento de um espírito crítico flexível, de uma visão mais global do processo saúde-doença, pulverizando a hegemonia de alguns saberes sobre outros. Desenvolver a interdisciplinaridade é, antes de tudo, aprender a conviver e aceitar as diferenças, percebendo na heterogeneidade de olhares a riqueza do objeto de estudo e da criação de estratégias frente às problematizações colocadas. 10

Na discussão acerca da interdisciplinaridade indica-se a existência de um intercâmbio por parte de uma ou mais disciplinas, não importando o modo como ocorre esta inter-relação.11 Tal intercâmbio ou interação ocorre desde a simples comunicação de idéias até a integração.8 A interdisciplinaridade sempre se mostrará como contraposição ao crescente processo de fragmentação do saber; enfim, contra o divórcio crescente entre a universidade com seus saberes compartimentalizados e a sociedade concreta.6

Em saúde, a perspectiva interdisciplinar emerge a partir da necessidade de retomar a unidade dos fenômenos, reagrupar o conhecimento separado progressivamente pelo intenso processo de especialização, no qual o saber não cessa de fragmentar-se e cada disciplina tende a isolar-se em suas próprias verdades e metodologias. Citando Gusdorf diz que o "conhecimento interdisciplinar deve ser uma lógica de descoberta, uma abertura recíproca, uma comunicação entre os domínios do saber, uma fecundação mútua, e não apenas um formalismo que neutraliza todas as significações".12: 101

Em sua abordagem acerca da necessidade interdisciplinar, Fleck partia do pressuposto de que a teoria do conhecimento individualista nos leva mais que nunca a concepção fictícia e inadequada do conhecimento científico. A influência recebida da Escola Polonesa de Medicina, com características claramente interdisciplinares, marcou sua epistemologia, sendo que muitas de suas elaborações foram formuladas a partir da colaboração da escola e de médicos poloneses2.

Os médicos poloneses do século XIX, embora reconhecessem a importância da medicina científica, recusavam-se a admitir que a medicina pudesse ser reduzida a ciência da patologia, da busca do diagnóstico sem preocupação com o tratamento e com o bem estar do paciente.3

Em sua obra, diversas são as referências de reflexões de autores que demonstravam a preocupação interdisciplinar e a preocupação com a percepção da pessoa humana como um todo, as quais se refletiram em todo seu trabalho: Chalubinski referia que nunca se podia esquecer que não são as doenças que são tratadas, mas pacientes; Biernacki afirmava que não há regularidade no fenômeno doença, mas cada pessoa é diferente; Wladislaw Bieganski dizia que se a doença desencadeia uma série de eventos e se cada sintoma pode significar ou ter associação com diversos tipos de doença, a especialização, baseada na segmentação anatômica do corpo ou na etiologia, mais prejudica do que ajuda os pacientes. Afirma que se o paciente tem sintomas, o que ele deseja é terapêutica; Kramstyk entendia que toda a ação humana depende do conhecimento, e o conhecer dependia do fazer. Conhecimento, ciência são ponto de partida, não objetivo. Já se anunciava a exigência de trabalhos interdisciplinares, pela simples razão de que não existe profissão isolada uma da outra e que o desenvolvimento de uma modifica/contribui com a outra.3

Em suas reflexões Fleck salientava, além da necessidade de interação entre os diversos saberes, que não faz sentido o conhecimento ao qual não corresponde uma prática determinada. Ao observarmos a prática em saúde nos dias atuais percebemos que a mesma acontece, predominantemente, de forma coletiva, reunindo diferentes profissionais em torno da assistência. Esta realidade poderia favorecer a prática interdisciplinar, mas para tal é necessário pensar o que aproxima os profissionais de saúde, qual o objeto comum entre os diversos profissionais, para a partir daí pensar possibilidades de atuação.2

Profissionais de saúde partilham, sobretudo, o modelo biomédico hegemônico. É ele que dá hoje um consenso mínimo em torno da atenção à saúde, seja no plano coletivo ou individual. Na prática profissional, além de não compartilhar outros valores que poderiam resultar em novos modelos, é pequeno o investimento na construção conjunta de outro projeto assistencial que contemple a complexidade e a multidimensionalidade das necessidades de saúde.13

Para a recuperação do compromisso profissional de cada ator, na saúde, a prática clínica baseada no vínculo profissional-cliente, a assistência integral, com divisão de responsabilidades entre profissionais de modo a incentivar uma maior autonomia para a invenção de mecanismos necessários ao cuidado em cada caso, pode possibilitar uma efetiva troca/interação entre profissionais de diferentes áreas.14

Profissionais de saúde compartilham também e especialmente a preocupação com o bem-estar, a saúde e a qualidade de vida das pessoas sob seus cuidados. Embora cada disciplina desenvolva, em seu estilo de pensamento, concepções próprias sobre a saúde, o bem-estar, a qualidade de vida, é possível encontrar nestes estilos o que Fleck chamou de "zonas de fronteiras", nas quais se pode estabelecer trocas, construir novos modos de perceber e atuar sobre determinados fenômenos.

Nas zonas de fronteiras entre os coletivos/estilos de pensamento, podemos pensar em possibilidades interdisciplinares. Quais estilos estão presentes na interpretação que as disciplinas fazem de seu objeto de estudo o ser humano? Como cada profissional percebe o ser humano, a saúde, a doença, a sociedade? Quais espaços de interação e trocas estão colocados nas fronteiras destas disciplinas?

A experiência tem nos apontado que é a partir de entendimentos compartilhados no cotidiano do exercício profissional, pelos profissionais de saúde, que podemos pensar a construção de uma prática interdisciplinar. As teorizações de Fleck nos fornecem subsídios importantes para iniciar este debate: o desenvolvimento do conhecimento científico, o processo de produção de conhecimento, as comunidades de cientistas, a formação e existência de um modo próprio de pensar destas comunidades, e especialmente a maneira como o conhecimento circula entre as diferentes comunidades de cientistas.

Na tradução de teorias e conceitos de outras áreas do conhecimento, seja a antropologia, a sociologia, a psicologia, entre outras, as disciplinas constroem um novo conhecimento; esta tradução resulta em uma nova percepção do ser humano multidimensional, na rejeição dos aspectos meramente biológicos que predominam na interpretação da saúde/doença.15

Na relação interdisciplinar os grupos de profissionais envolvidos tentam achar um ponto intermediário que lhes permita "codificar padrões de comportamento profissional". É nas zonas de fronteiras que se estabelecem trocas, interações que possibilitam a construção de novos conhecimentos e novas práticas. A tradução de um estilo de pensamento está sujeita a imperfeições, uma vez que um estilo é incomensurável para outro estilo de pensamento; porém, estes erros não se constituem necessariamente em fatos negativos. A modificação de um estilo de pensamento para outro modifica e enriquece este segundo, resultando em inovações nas ciências e na sociedade. Neste aspecto, tais mudanças podem ser extremamente produtivas para a prática interdisciplinar, contribuindo para a superação dos estilos de pensamento tradicionais das disciplinas, fortemente arraigados e sujeitos a rigidez e inflexibilidade, que terminam por obstruir os avanços de uma ciência que possa emergir da prática e de uma prática que possa se nutrir das concepções da ciência.15

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Um pensar interdisciplinar que permita ações transformadoras parece, indubitavelmente, ligado a questões da formação do profissional de saúde. Além do reconhecimento da realidade sóciocultural e institucional que permeia as relações humanas; das diferentes orientações e formações presentes no cotidiano do exercício e das relações de trabalho; do desenvolvimento da capacidade de identificar os pressupostos que "suavemente", orientam e determinam nossas práticas e discursos, como nos aponta Fleck, parecem necessárias algumas condições, a serem encaradas pelas diversas disciplinas, de forma a possibilitar um pensar crítico, ético e comprometido com o coletivo.

Estas condições passam pela concepção, planejamento, acompanhamento e execução de ações integradas entre as diversas disciplinas; a definição e clareza dos objetivos e papéis desempenhados por cada grupo de profissionais; o reconhecimento dos limites e da delimitação do trabalho de cada disciplina; a interlocução, mediação, informação e socialização do conhecimento necessário à instrumentalização dos diversos profissionais da saúde; a contribuição de cada grupo profissional nos processos mediadores de mudanças; a manutenção de posturas éticas e comprometidas com os objetivos comuns que orientam o trabalho de saúde; a superação de pautas corporativas, privilégios e monopólios historicamente legitimados; a criação de alternativas teórico-metodológicas a partir de demanda construída coletivamente; entre tantas outras.

Falando da produção de conhecimento, da contribuição da pedagogia para o trabalho educativo, o entendimento da ciência como um instrumento de compreensão da vida é apontado como um dos pressupostos para fazer ciência. Nesse processo, também há a necessidade de compreendermos a memória - herança cultural humana - que vai constituindo esse saber e o uso democrático desta herança, que é pública. Portanto, o uso coletivo do conhecimento não pode se destinar apenas ao usofruto individual de cada ser humano ou de seu grupo profissional, mas sim alimentar a capacidade humana de interagir socialmente constituindo-se ativamente em instrumento humanizador. Com isto possibilita-se a transformação permanente de indivíduos em sujeitos.16

Do diálogo com Paulo Freire, retoma-se a idéia da Pedagogia como a arte que lida com o conhecimento de forma a não esquecer e nem sufocar a indagação permanente. Pedagogicamente, o homem conhece através das ciências e se reconhece como sendo capaz de aprimorar permanentemente a curiosidade. As ciências não dão conta, por si só, de manter ativa e saudável a curiosidade humana. Isolada cada ciência tenderia apenas à formação de seres humanos especialistas. Se apenas interligadas, as ciências tenderiam a formar seres humanos com um único canal de interações - o canal da cientificidade. Assim, é fundamental essa possibilidade pedagógica, para qualquer conhecimento científico, de sustentar a curiosidade humana nunca satisfeita. Em sua inteireza, a curiosidade remete a múltiplas dimensões humanas... como a ética, a estética e a técnica. O Ser Humano curioso vai constituindo, em sua inteireza transdisciplinar, de modo inseparável, o conhecimento e a imprescindível crítica.16

Recebido em: 15 de fevereiro de 2005

Aprovação final: 15 de abril de 2005

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2005

    Histórico

    • Aceito
      15 Abr 2005
    • Recebido
      15 Fev 2005
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