Acessibilidade / Reportar erro

Infecção hospitalar no olhar de enfermeiros portugueses: representações sociais

Infecciones hospitalarias en la visión de enfermeros portugueses: representaciones sociales

Hospital infections in the eyes of portuguese nurses: social representations

Resumos

A infecção hospitalar é um fenômeno complexo e conflituoso, devendo ser consideradas as influências de natureza sociocultural. O estudo objetivou apreender as representações sociais sobre infecção hospitalar elaboradas por enfermeiros portugueses. Trata-se de um estudo exploratório desenvolvido com 35 enfermeiros em Lisboa-Portugal, que trabalhavam na área hospitalar. Os dados foram produzidos através da entrevista em profundidade, no período de novembro de 2006 a fevereiro de 2007, e submetidos à técnica de análise de conteúdo temática. Os resultados apontaram três categorias simbólicas em que os sujeitos descrevem o conceito de infecção hospitalar, falam das práticas dos enfermeiros frente à infecção hospitalar e da percepção sobre a participação dos gestores das instituições de saúde na prevenção e controle da infecção hospitalar. Observa-se uma preocupação dos enfermeiros com os aspectos relacionados à política institucional e funcional adotada na prevenção e no tratamento das infecções hospitalares.

Infecção hospitalar; Enfermagem; Psicologia social


La infección hospitalaria es un fenómeno complejo y conflictivo, en el cual deben ser consideradas las influencias de naturaleza socio-cultural. El objetivo de este estudio fue recoger las representaciones sociales acerca de la infección hospitalaria elaboradas por enfermeros portugueses. Se trata de un estudio exploratorio desarrollado con 35 enfermeros en Lisboa, Portugal, que trabajan en el área hospitalaria. Los datos fueron obtenidos a través de la encuesta en profundidad, en el período comprendido entre noviembre de 2006 a febrero de 2007, y fueron sometidos a la técnica de análisis de contenido temático. Los resultados señalaron tres categorías simbólicas en las que los sujetos describieron el concepto de infección hospitalaria, hablaron de las prácticas de los enfermeros ante las infecciones hospitalarias y su percepción acerca de la participación de los gestores de las instituciones de salud en la prevención y control de la infección hospitalaria. Se puede observar una preocupación de los enfermeros con los aspectos relacionados a la política institucional y funcional adoptada en la prevención y en el tratamiento de las infecciones hospitalarias.

Infección hospitalaria; Enfermería; Psicología social


Hospital infection is a complex and conflicting phenomenon in which influences of the socio-cultural nature must be considered. The objective of this study is to better understand the social representations about hospital infections as elaborated by Portuguese nurses. This is an exploratory study developed by 35 nurses in Lisboa, Portugal, who worked in the hospital area. The data was produced through in-depth interviews administered from November, 2006, to February, 2007, and submitted to the thematic content analysis technique. The results point out three different symbolic categories in which the subjects describe the concept of hospital infection, talk about nursing practices facing hospital infections, and the perception of hospital administrators in hospital infection prevention and control. Among the nurses, one observes a concern for the aspects related to institutional and functional policies adopted in the prevention and treatment of hospital infections.

Cross infection; Nursing; Psychology, social


ARTIGO ORIGINAL

PESQUISA

Infecção hospitalar no olhar de enfermeiros portugueses: representações sociais

Hospital infections in the eyes of portuguese nurses: social representations

Infecciones hospitalarias en la visión de enfermeros portugueses: representaciones sociales

Maria Eliete Batista MouraI; Maria Natália RamosII; Cristina Maria Miranda de SousaIII; Antonia Oliveira SilvaIV; Maria do Socorro da Costa Feitosa AlvesV

IDoutora em Enfermagem. Professor Adjunto da Graduação e do Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal do Piauí. Coordenadora de Pesquisa e Pós-Graduação da Faculdade NOVAFAPI. Piauí, Brasil

IIDoutora em Psicologia. Professora da Universidade Aberta de Lisboa. Lisboa, Portugal

IIIDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Docente da Faculdade NOVAFAPI. Piauí, Brasil

IVDoutora em Enfermagem. Professor Associado da Universidade Federal da Paraíba. Paraíba, Brasil

VDoutora em Odontologia Preventiva e Social. Professora do Programa de Doutorado em Ciências da Saúde da UFRN. Rio Grande do Norte, Brasil

Endereço Endereço: Maria Eliete Batista Moura Rua Orquídea, 450, ap. 700 64048-150- Teresina, PI, Brasil E-mail: posgraduacao@novafapi.com.br

RESUMO

A infecção hospitalar é um fenômeno complexo e conflituoso, devendo ser consideradas as influências de natureza sociocultural. O estudo objetivou apreender as representações sociais sobre infecção hospitalar elaboradas por enfermeiros portugueses. Trata-se de um estudo exploratório desenvolvido com 35 enfermeiros em Lisboa-Portugal, que trabalhavam na área hospitalar. Os dados foram produzidos através da entrevista em profundidade, no período de novembro de 2006 a fevereiro de 2007, e submetidos à técnica de análise de conteúdo temática. Os resultados apontaram três categorias simbólicas em que os sujeitos descrevem o conceito de infecção hospitalar, falam das práticas dos enfermeiros frente à infecção hospitalar e da percepção sobre a participação dos gestores das instituições de saúde na prevenção e controle da infecção hospitalar. Observa-se uma preocupação dos enfermeiros com os aspectos relacionados à política institucional e funcional adotada na prevenção e no tratamento das infecções hospitalares.

Palavras-chave: Infecção hospitalar. Enfermagem. Psicologia social.

ABSTRACT

Hospital infection is a complex and conflicting phenomenon in which influences of the socio-cultural nature must be considered. The objective of this study is to better understand the social representations about hospital infections as elaborated by Portuguese nurses. This is an exploratory study developed by 35 nurses in Lisboa, Portugal, who worked in the hospital area. The data was produced through in-depth interviews administered from November, 2006, to February, 2007, and submitted to the thematic content analysis technique. The results point out three different symbolic categories in which the subjects describe the concept of hospital infection, talk about nursing practices facing hospital infections, and the perception of hospital administrators in hospital infection prevention and control. Among the nurses, one observes a concern for the aspects related to institutional and functional policies adopted in the prevention and treatment of hospital infections.

Keywords: Cross infection. Nursing. Psychology, social.

RESUMEN

La infección hospitalaria es un fenómeno complejo y conflictivo, en el cual deben ser consideradas las influencias de naturaleza socio-cultural. El objetivo de este estudio fue recoger las representaciones sociales acerca de la infección hospitalaria elaboradas por enfermeros portugueses. Se trata de un estudio exploratorio desarrollado con 35 enfermeros en Lisboa, Portugal, que trabajan en el área hospitalaria. Los datos fueron obtenidos a través de la encuesta en profundidad, en el período comprendido entre noviembre de 2006 a febrero de 2007, y fueron sometidos a la técnica de análisis de contenido temático. Los resultados señalaron tres categorías simbólicas en las que los sujetos describieron el concepto de infección hospitalaria, hablaron de las prácticas de los enfermeros ante las infecciones hospitalarias y su percepción acerca de la participación de los gestores de las instituciones de salud en la prevención y control de la infección hospitalaria. Se puede observar una preocupación de los enfermeros con los aspectos relacionados a la política institucional y funcional adoptada en la prevención y en el tratamiento de las infecciones hospitalarias.

Palabras clave: Infección hospitalaria. Enfermería. Psicología social.

INTRODUÇÃO

As Infecções Hospitalares (IH) existem desde que surgiram os hospitais no século XIX. A elevada incidência de doenças epidêmicas, que acometiam as comunidades pobres e, também, as precárias condições de higiene e de saneamento em que vivia a população, foram fatores decisivos no irromper de tais infecções.1

Nas últimas décadas, foram enfatizadas diferentes temáticas no campo da saúde, em particular, as relacionadas com a atuação dos profissionais dessa área, por ser a infecção hospitalar um fenômeno conflituoso de domínio público. Por um lado, a preocupação com essa temática é justificada por envolver aspectos jurídicos concernentes ao direito da cidadania; por outro, configura-se um problema de saúde pública associado à prática profissional.

Explorar a temática da infecção hospitalar na perspectiva das representações sociais compreende conhecer o que pensam os enfermeiros portugueses sobre a infecção hospitalar e suas implicações nas políticas de prevenção e de controle adotadas.

A infecção hospitalar constitui um fenômeno importante para ser investigado no aporte teórico das representações sociais, na verificação dos sentidos atribuídos a infecção hospitalar por enfermeiros de outro país e, em outro momento, comparar estas representações do ponto de vista cultural a medida do interesse de trocas no campo prático com informações em contextos sócio-culturais distintos, pontuadas pelas vivências pessoais e no campo hospitalar.

Esta reflexão se deve ao fato das representações sociais serem a forma como a pessoa pensa o seu universo, resultante de um conhecimento socialmente construído a partir da comunicação nos grupos.2 As representações sociais, parecem ser particularmente úteis para se analisar e compreender a intervenção sobre os grandes problemas sociais atuais, como: saúde e a doença e, em particular, a disseminação da Aids, decorrente das constantes infecções cruzadas, nos ambientes dos serviços de saúde.3

Assim sendo, as representações sociais se configuram um tipo de conhecimento do senso comum que se constrói a partir da influência social e individual (subjetividade) do sujeito. Estudar o senso comum, o conhecimento popular, é afirmar que se está estudando algo que liga a sociedade ou indivíduos à sua cultura, sua linguagem, seu mundo familiar. Esse aspecto é justificado pela polifasia cognitiva na transformação das noções do senso comum em noções científicas e vice-versa, os limites e os problemas de tais transformações por serem as representações sociais vivas tomando forma nesta tensão e conflito inerente ao pensamento e a cultura.4

A Teoria das Representações Sociais procura esclarecer qual é o caminho percorrido pelas abstrações científicas, por ser uma teoria da crença e do conhecimento de seus respectivos conteúdos, aproximando os problemas da teoria do pensamento social àqueles da epistemologia. O senso comum é o pensamento social por excelência por isso é o mais compartilhado e o mais utilizado no cotidiano em qualquer sociedade.4

Estudar a problemática da infecção hospitalar, tanto no contexto brasileiro quanto no português, por ser uma temática conflituosa nos dois países, é instigante uma vez que as representações sociais não implicam sempre uma perspectiva de intervenção, mas toda intervenção supõe, necessariamente, se considerar as representações sociais,5 uma vez que estas regem as relações com o mundo e com os outros e organiza as comunicações e condutas. Assim, o seu estudo pode contribuir para que se faça uma reflexão maior capaz de contemplar mais amplamente a complexidade das práticas profissionais e/ou sociais.6

A problemática da infecção hospitalar vem sendo discutida por autoridades e profissionais de saúde de diferentes países motivada pelas condições de atendimento hospitalar precário, especialmente, de urgência e emergência, em que os clientes são recebidos em macas contaminadas por secreções, e até mesmo por sangue, sem uma desinfecção prévia no ato da admissão, encontrando-se expostos às infecções, principalmente, através das feridas abertas. Conhecer o aspecto subjetivo que permeia toda essa problemática configura-se um importante investimento acadêmico a ser explorado tanto do ponto de vista psicossocial quanto jurídico.

A vivência profissional revelava, de alguma forma, diferentes tipos de práticas profissionais adotadas no contexto hospitalar em que alguns profissionais se apresentavam conformados frente à problemática do atendimento hospitalar, enquanto outros lutavam por uma prática eficaz e segura, que fosse capaz de transformar esta situação, adotando assim, mudanças de comportamentos e atitudes. Para tanto, era necessário um investimento nas condições materiais de trabalho, no treinamento de pessoal, na promoção de sessões de estudo, entre outras; e, posteriormente, em questões mais qualitativas, com a adoção de novas posturas profissionais para melhoria da qualidade do atendimento, prevenção e controle das IH.

Em Portugal, a Política de Prevenção e Controle da Infecção Hospitalar está passando por reformas, pois ainda predomina a assistência curativa, prestada nos grandes hospitais, em que a medicina preventiva é pouco desenvolvida. Mesmo os hospitais possuindo Comissões de Controle de Infecção Hospitalar (CCIHs), não existe um diagnóstico geral de IH no País. As CCIHs trabalham com uma política de Vigilância Epidemiológica de IH definida, ligadas a saúde do trabalhador e a prevenção de risco ocupacional.

No Brasil, verifica-se que a maioria dos programas do Governo Federal, não determina mudanças de atitudes frente à problemática da IH quanto ao comportamento dos profissionais, pois supõe que os indivíduos que participam desses, sejam passivos e não detenham saberes e valores prévios que conduzam suas ações. Este aspecto é semelhante à problemática portuguesa. É necessária a adoção de novos referenciais e novas metodologias que superem as tradições positivistas, pois estas fragmentam a realidade em variáveis, desenhando dimensões restritas e isoladas das relações psicossociais e culturais mais amplas.7

Acredita-se que o esforço, a energia e o entusiasmo de alguns profissionais, especialmente dos membros que integram as CCIHs, não são suficientes para a implantação efetiva, mesmo que parcial, do programa de prevenção e controle da IH na maioria dos hospitais. Registra-se, mesmo que parcial, porque se entende que a implantação e a operacionalização de um programa de IH, implicaria no mínimo em um processo que requer a determinação de ações multisetoriais e trans-disciplinares.

Portanto, é necessário que os Serviços de Controle de Infecção Hospitalar (SCIHs) estudem e determinem, de forma coletiva e institucional, as ações de vigilância, de treinamento e de medidas burocráticas (controle e encaminhamento) que contemplem os profissionais da saúde e todos aqueles que fazem a assistência hospitalar.

Dessa forma, este estudo pode contribuir no sentido de despertar um novo olhar à problemática, pois existem, em Portugal, além de ritos, tramas e articulações profissionais, condições precárias de trabalho, ausência de cumprimento das normas, protocolos e de diagnósticos. Uma pesquisa desta natureza identifica aspectos relevantes que podem servir de base para uma revisão e/ou adoção de modelos de prevenção e controle da IH, adequando a realidade da prática profissional, bem como a realidade institucional às determinações legais do governo de Portugal.

Em suma, este estudo tem o objetivo de apreender as representações sociais da IH elaboradas por enfermeiros portugueses no contexto hospitalar.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo exploratório, desenvolvido em Lisboa-Portugal, com 35 enfermeiros portugueses, que atuam na área hospitalar. A seleção dos sujeitos foi intencional, tendo em vista que é indispensável a inclusão de profissionais que tivessem maior tempo de trabalho, por terem convivido com pacientes internados e, assim, serem capazes de produzir representações sociais, a partir de experiências com a problemática da infecção hospitalar.

Na seleção dos sujeitos para o estudo foi garantido o sigilo das informações recebidas, após aceitação verbal, a partir da autorização das instituições de saúde portuguesas, para a coleta dos dados. O critério para inclusão dos sujeitos na pesquisa foi que o enfermeiro já trabalhasse na área hospitalar há mais de dois anos.

A pesquisa atendeu aos requisitos éticos vigentes em Portugal, em que os participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, aceitando participar da pesquisa.

Os dados foram coletados no período de novembro de 2006 a fevereiro de 2007 utilizando-se a entrevista em profundidade. Depois de colhidos, foram submetidos à técnica da análise de conteúdo temática,8 seguindo as etapas: leitura flutuante; constituição do corpus, definido por 35 entrevistas; seleção das unidades de contexto (consideradas parágrafos); seleção das unidades de registro (consideradas frases); recorte; codificação e processo de categorização empírica, definidas em três categorias temáticas; inferência e interpretação subsidiada na teoria das representações sociais.

Os resultados foram apresentados em unidades de análise temáticas e comentados a luz da Teoria das Representações Sociais, segundo as categorias simbólicas apreendidas.

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA INFECÇÃO HOSPITALAR

Os resultados obtidos com a análise de conteúdo temática estão apresentados nas três categorias simbólicas empíricas: definição da infecção hospitalar; práticas dos enfermeiros frente a IH e percepção dos enfermeiros sobre os gestores na IH.

A Categoria 1 - Definições da infecção hospitalar agrupa unidades de análise temática em que os enfermeiros procuram definir a IH, exemplificadas nas falas: [...] uma infecção que se manifesta 24 a 48 horas no paciente após infectado no hospital [...] situação muito séria e que põe em risco as pessoas [...] causada pela resistência dos microorganismos [...] microorganismos que se proliferam no hospital [...] uso indiscriminado de [...] uso incorreto dos materiais [...] falta da lavagem correta das [...] problema nem sempre tratado como deveria [...] isolamento [...] as pessoas não percebem bem o problema.

Percebe-se, em Portugal, que os enfermeiros representaram a infecção hospitalar como um risco a que os pacientes e profissionais estão expostos no ambiente hospitalar, pela resistência dos microorganismos e uso indiscriminado dos antibióticos. Essa situação requer procedimentos de isolamento de pacientes e a lavagem das mãos.

Esta preocupação deve considerar a importância do longo período de incubação de algumas doenças infecciosas em que se corre o risco de notificar a ocorrência de mais um caso de infecção hospitalar quando o cliente é admitido com o processo infeccioso já instalado, podendo exacerbar-se em poucos dias e aparecerem os primeiros sinais e sintomas da infecção durante a internação.

Com isso, é necessário avaliar se alguma infecção estava em período de incubação no momento da admissão, e registrá-la como infecção não hospitalar, isto é, comunitária, adquirida na comunidade. Do mesmo modo, quando um cliente é re-admitido no hospital com um processo infeccioso já estabelecido e que foi causado pela hospitalização anterior, fica registrado como infecção hospitalar, e não como infecção comunitária.

Desta forma, a infecção comunitária é aquela constatada ou em incubação no ato da admissão do cliente, desde que não relacionada com a internação anterior no mesmo hospital. São também consideradas comunitárias as infecções já presentes na admissão, a menos que haja troca de microorganismos ou quando o paciente apresentar sinais e sintomas característicos e sugestivos da aquisição de nova infecção.9

Em Portugal, os enfermeiros representaram a IH, demonstrando preocupações com o dia-a-dia do trabalho, associando-a com a lavagem das mãos, uso indiscriminado de antibióticos e a resistência dos microrganismos.

Assim sendo, a higienização das mãos no ambiente hospitalar, configura-se uma prática prioritária, considerando ser o isoladamente mais importante para reduzir as taxas dessas infecções no ambiente hospitalar, por reduzir a transmissão de microorganismos pelas mãos.10 A diminuição dos microorganismos da pele e mucosa pode se processar em diferentes níveis, dependendo do tipo de limpeza ou anti-sepsia empregada, assim, o procedimento de limpeza remove a microbiota transitória humana através da técnica de lavagem simples das mãos.11

Para os enfermeiros, o uso indiscriminado dos antibióticos nos hospitais tem levado ao aumento da resistência dos microorganismos. Dessa forma, os antibióticos representam um item de alto consumo em hospitais, em particular em unidades de pacientes mais graves, como as Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs). A inadequação, o uso abusivo de antibióticos e a falta de critérios na escolha do tratamento empírico, configuram-se como fatores determinantes para o surgimento de diversos microorganismos resistentes em uma UTI.12

O aparecimento dos microorganismos multirresistentes aos antibióticos, os avanços tecnológicos relacionados aos procedimentos invasivos, os diagnósticos e as terapêuticas, constituem riscos à saúde dos usuários. Mesmo com a adoção de políticas para esta área, os dados sobre IH são pouco divulgados pelo fato de não serem consolidados por muitos hospitais, o que tem dificultado a aquisição de um diagnóstico que retrate a dimensão do problema no país.13

Nesta categoria verificam-se representações consensuais dos enfermeiros que denotam uma preocupação com o seu ambiente de trabalho e os problemas institucionais.

A Categoria 2 - Práticas dos enfermeiros frente a infecção hospitalar, é definida pelas unidades de análise em que os enfermeiros falam das práticas adotadas frente a IH, presente nas falas, como: [...] os profissionais são cuidadosos [...] alguns tem responsabilidade com si e com os outros [...] o profissional de serviço público tem dificuldade com o material [...] os profissionais mais antigos têm mais dificuldades [...] os profissionais só estão alertados mesmo, quando já tem a infecção, quando já se instalou o calor, rubor e a dor [...] há uso de medidas farmacológicas abusivamente [...] há aumento do custo [...] tem sempre outras prioridades [...] desprezo pela questão da infecção hospitalar [...] falta da lavagem das mãos.

Em Portugal, percebe-se que os enfermeiros são vistos como cuidadosos e responsáveis mesmo com a falta de material no serviço público. Eles demonstraram que na área hospitalar, a infecção tem crescido proporcionalmente ao desenvolvimento da tecnologia invasiva, no entanto, parece que o conhecimento dos profissionais da saúde sobre as ações de prevenção e controle das infecções não acompanha este desenvolvimento.

O uso inadequado e generalizado dos procedimentos invasivos, diagnósticos e terapêuticos associados aos altos custos que decorrem do diagnóstico e tratamento, juntamente com os problemas do índice de tolerância e alto índice de mortalidade por infecção, têm agravado a problemática das infecções hospitalares. Daí a necessidade de prevenção e tratamento das infecções precocemente, possibilitando alternativas sobre o conhecimento da problemática e a adoção de medidas de prevenção e controle pelos profissionais da saúde.

Os procedimentos invasivos, realizados na grande maioria dos pacientes internados, por abrirem vias de acesso aos tecidos estéreis do organismo, tornam-se causas de infecção hospitalar, dependendo dos cuidados de assepsia e anti-sepsia tomados para os procedimentos e do estado geral do paciente.14

Alguns autores acreditam que os critérios da qualidade da limpeza são subjetivos. Inicialmente a limpeza é avaliada visualmente através da presença de resíduos sólidos no chão ou mancha de líquidos seco. Além disso, muitas vezes uma limpeza terminal é substituída por uma limpeza simples devido à falta de material e equipamento, prejudicando assim a qualidade do trabalho dos profissionais responsáveis pela higienização do hospital.15

O termo limpeza hospitalar vem sendo com freqüência considerada como sinônimo de higiene hospitalar ou zeladoria hospitalar. Tratando-se de uma definição específica de limpeza, podemos entendê-la como o processo de remoção de sujidades. Consideramos então como limpeza hospitalar a limpeza das superfícies fixas e equipamentos permanentes das diversas áreas hospitalar, o que inclui pisos, paredes, janelas, mobiliários, equipamentos e instalações sanitárias.16

Na Categoria 3 - Percepção dos enfermeiros sobre os gestores na infecção hospitalar, encontram-se agrupadas as unidades de análise em que os enfermeiros afirmam que os gestores são responsáveis pelo controle das infecções hospitalares, conforme atestam as falas: [...] há falta de apoio da gestão [...] os gestores não serem técnicos [...] não haver programa para a saúde em nível da prevenção comunitária [...] a assistência ser mais curativa do que preventiva.

Observa-se, a partir das representações sociais dos enfermeiros, uma preocupação dos mesmos quanto às condições oferecidas aos profissionais, pelos gestores dos hospitais, para a realização dos procedimentos de enfermagem, apontando como necessárias a adoção de medidas preventivas. Estas medidas retratam as dificuldades dos profissionais de saúde à realização de um bom trabalho, no ambiente hospitalar, prevenindo e controlando a IH.

Nesse sentido, a formação dos profissionais de saúde, direcionada a estimular a percepção do risco e a eficácia de medidas de prevenção ainda constitui um desafio a ser implementado, enquanto filosofia de trabalho. Tal ênfase deve ser transmitida por um corpo docente comprometido com essas questões e preparado para ampliar os conteúdos programáticos que atendam aos princípios científicos fundamentados na prevenção e controle da IH. As atividades práticas devem atender às necessidades do exercício profissional, em uma estrutura organizacional e funcional que favoreçam a prática de condutas corretas.17

Tais preocupações são abordadas pelos sujeitos da pesquisa, ao destacarem a falta de uma política de educação permanente para os profissionais. A ausência de tal procedimento tem contribuído para dificultar sensivelmente a conquista da realização integral, igualitária e universal dos direitos sociais na saúde, tornando inquestionável a necessidade de uma política pública de saúde. Nessa política seria importante enfatizar os valores da saúde enquanto direito de cidadania e parte dos direitos universais do ser humano, independente de país, em que o desenvolvimento de recursos humanos, de relações de trabalho, de educação permanente, com base nas necessidades e direito da população, são aspectos a serem considerados.

As inquietações apreendidas nas representações sociais sobre a IH são pontuadas a partir das condições que se encontram os hospitais públicos em Portugal, exemplificadas nas falas dos enfermeiros em que apontam a falta de apoio da gestão para o desenvolvimento de um trabalho adequado dos profissionais da saúde, em que possam adotar medidas de prevenção de infecção.

Neste sentido, é importante observar a aplicação da teoria de risco, em que são analisadas as condições disponíveis do serviço ao profissional de saúde, avaliando o grau de incidência. Logo, estabelece-se a seguinte aritmética: quanto maior o risco, menor a responsabilidade do profissional para apurar e quantificar a sanção. No âmbito jurídico, encontra-se a figura do responsável solidário, ou seja, em que responderá pelo ato, não só o seu causador direto, mas também todos os profissionais responsáveis que se envolveram, de alguma forma, para causar o dano. As CCIHs das instituições têm um papel importantíssimo, para analisar e apurar o causador ou culpado em casos de IH.18

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da apreensão das representações sociais da infecção hospitalar construídas por enfermeiros portugueses, procurou-se explorar alguns aspectos salientados por estes, enquanto determinantes das infecções cruzadas no ambiente hospitalar.

O posicionamento dos sujeitos da pesquisa frente à IH é evidenciado com o reconhecimento da importância da paramentação dos que desenvolvem os procedimentos no ambiente hospitalar para proteger, tanto os pacientes quanto os profissionais de uma infecção, especialmente durante os procedimentos invasivos, ressaltando a importância do cuidado com as mãos.

As representações sociais, enquanto teorias práticas sobre determinado objeto ou problemas sociais específicos, são importantes na vida dos grupos, pois alimentam e são produzidas numa interdependência do sujeito/objeto/interação/social. Os fenômenos perceptivos, imagens, as opiniões, crenças ou atitudes que formam o tecido atômico das representações sociais somente adquirem estruturação lógica no entrelaçamento dos vínculos entre esses elementos, o que possibilita a atribuição de significação aos processos psicossociais dos fenômenos representados.6

Assim, é possível apreender os aspectos psicossociais como componentes sociais determinantes da mudança na formação do enfermeiro, por contribuirem para a orientação de comportamentos e construções do conhecimento em relação ao fenômeno da infecção hospitalar, independente de país.

REFERÊNCIAS

1. Starling, CEF. Vigilância Epidemiológica das Infecções Hospitalares na Prática Diária. Belo Horizonte (MG): Editora Cuatiara; 1993.

2. Wagner W. Sócio-gênese e características das Representações Sociais. In: Antonia SPM, Denize CO. Estudos interdisciplinares de Representações Sociais. Goiânia (GO): AB; 2000.

3. Abric JC. Editor. Exclusion sociale, insertion et prévention. Saint-Agne (FR): Editions Erès, 1996.

4. Moscovici, S. A relatividade tem 100 anos. In: Moreira ASP, Camargo BV. Contribuições para a teoria e o método de estudos das Representações Sociais. João Pessoa (PB): Ed. Universitária, 2007.

5. Jodelet D. Imbricações entre Representações Sociais e Intervenção. In: Moreira ASPM, Camargo BV. Contribuições para a teoria e o método de estudo das Representações Sociais. João Pessoa (PB): Ed. Universitária. 2007.

6. Jodelet D. Representações Sociais: um domínio em expansão. In: Jodelet D. organizador. As Representações Sociais. Rio de Janeiro (RJ): Ed. UERJ. 2001.

7. Madeira MC, Tura LFR, Gaze R. Diversidade cultural e práticas educativas de prevenção: representações sociais das hepatites. João Pessoa (PB): Ed. UFPB. 2003.

8. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa (PT): Edições 70; 1977.

9. Ministério da Saúde (BR), Portaria Nº 2.616, de 12 de maio de 1998. Expede na forma de anexos diretrizes e normas para a prevenção e controle das infecções hospitalares. Diário Oficial da União, República Federativa do Brasil. Brasília (DF); 1998.

10. Lira MC, Hinrichsen SL, Anjos AB, Borges MGA, Pereira MGB, Danda GJN. Higienização das mãos. In: Hinrichsen SL. Biosseguranca e Controle de Infecções - risco sanitário hospitalar. Rio de Janeiro (RJ): MDSI; 2004.

11. Graziano KU, Silvia A, Bianchi ERF. Limpeza, desinfecção, esterilização de artigos e anti-sepsia. In: Fernandes AT, Fernandes MOV, Ribeiro Filho N. Infecção Hospitalar e suas interfaces na área da saúde. São Paulo (SP); 2000.

12. Couto RC, Pedrosa TMG, Nogueira JM. Infecção hospitalar - Epidemiologia, controle e tratamento. 3ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Editora Médica e Científica, 2003.

13. Turrini RNT, Santo Augusto H. Infecção hospitalar e causas múltiplas de morte [periódico online]. J Pediatr. 2002 Dez [acesso em 2007 Abr 28]; 78(6):485-90. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021.

14. Zanon VNJ. Infecção hospitalar. Rio de Janeiro (RJ): Editora Médica Científica; 1987.

15. Sznelwar LI, Lancman S, WU MJ. Alvarinho E, Santos M. Análise do trabalho e serviço de limpeza hospitalar: contribuição da ergonomia e da psicodinâmica do trabalho. Rev. Prod. [periódico online]. 2004 Set-Dez [acesso em 2007 Abr 04], 14(3):45-57. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex&pid.

16. Yamaushi NI, Lacerda RA, Gabrielloni MC. Limpeza Hospitalar. In: Fernandes AT, Fernandes MOV, Ribeiro Filho N. Infecção Hospitalar e suas Interfaces na área da Saúde. São Paulo (SP); 2000.

17. Tipple AFV, Pereira MS, Hayashida M, Moriya TM, Souza ACS. O ensino do controle de infecção: um ensaio teórico prático. Revi Latino-am Enferm. 2003 Mar-Abr; 11(2):245-50.

18. Antônio LAC. Aspectos legais no Controle de Infecção Hospitalar. In: Fernandes AT, Fernandes MOV, Ribeiro Filho, N. Infecção Hospitalar e suas Interfaces na área da Saúde. 1ª ed. São Paulo (SP): Atheneu; 2000.

Recebido em: 15 de abril de 2008

Aprovado em: 12 de novembro de 2008

  • 1. Starling, CEF. Vigilância Epidemiológica das Infecções Hospitalares na Prática Diária. Belo Horizonte (MG): Editora Cuatiara; 1993.
  • 2. Wagner W. Sócio-gênese e características das Representações Sociais. In: Antonia SPM, Denize CO. Estudos interdisciplinares de Representações Sociais. Goiânia (GO): AB; 2000.
  • 3. Abric JC. Editor. Exclusion sociale, insertion et prévention. Saint-Agne (FR): Editions Erès, 1996.
  • 4. Moscovici, S. A relatividade tem 100 anos. In: Moreira ASP, Camargo BV. Contribuições para a teoria e o método de estudos das Representações Sociais. João Pessoa (PB): Ed. Universitária, 2007.
  • 5. Jodelet D. Imbricações entre Representações Sociais e Intervenção. In: Moreira ASPM, Camargo BV.  Contribuições para a teoria e o método de estudo das Representações Sociais. João Pessoa (PB): Ed. Universitária. 2007.
  • 6. Jodelet D. Representações Sociais: um domínio em expansão. In: Jodelet D. organizador. As Representações Sociais. Rio de Janeiro (RJ): Ed. UERJ. 2001.
  • 7. Madeira MC, Tura LFR, Gaze R. Diversidade cultural e práticas educativas de prevenção: representações sociais das hepatites. João Pessoa (PB): Ed. UFPB. 2003.
  • 8. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa (PT): Edições 70; 1977.
  • 9. Ministério da Saúde (BR), Portaria Nş 2.616, de 12 de maio de 1998. Expede na forma de anexos diretrizes e normas para a prevenção e controle das infecções hospitalares. Diário Oficial da União, República Federativa do Brasil. Brasília (DF); 1998.
  • 10. Lira MC, Hinrichsen SL, Anjos AB, Borges MGA, Pereira MGB, Danda GJN. Higienização das mãos. In: Hinrichsen SL. Biosseguranca e Controle de Infecções - risco sanitário hospitalar. Rio de Janeiro (RJ): MDSI; 2004.
  • 11. Graziano KU, Silvia A, Bianchi ERF. Limpeza, desinfecção, esterilização de artigos e anti-sepsia. In: Fernandes AT, Fernandes MOV, Ribeiro Filho N. Infecção Hospitalar e suas interfaces na área da saúde. São Paulo (SP); 2000.
  • 12. Couto RC, Pedrosa TMG, Nogueira JM. Infecção hospitalar - Epidemiologia, controle e tratamento. 3Ş ed. Rio de Janeiro (RJ): Editora Médica e Científica, 2003.
  • 14. Zanon VNJ. Infecção hospitalar. Rio de Janeiro (RJ): Editora Médica Científica; 1987.
  • 16. Yamaushi NI, Lacerda RA, Gabrielloni MC. Limpeza Hospitalar. In: Fernandes AT, Fernandes MOV, Ribeiro Filho N. Infecção Hospitalar e suas Interfaces na área da Saúde. São Paulo (SP); 2000.
  • 17. Tipple AFV, Pereira MS, Hayashida M, Moriya TM, Souza ACS. O ensino do controle de infecção: um ensaio teórico prático. Revi Latino-am Enferm. 2003 Mar-Abr; 11(2):245-50.
  • 18. Antônio LAC. Aspectos legais no Controle de Infecção Hospitalar. In: Fernandes AT, Fernandes MOV, Ribeiro Filho, N. Infecção Hospitalar e suas Interfaces na área da Saúde. 1Ş ed. São Paulo (SP): Atheneu; 2000.
  • Endereço:
    Maria Eliete Batista Moura
    Rua Orquídea, 450, ap. 700
    64048-150- Teresina, PI, Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Jan 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008

    Histórico

    • Aceito
      12 Nov 2008
    • Recebido
      15 Abr 2008
    Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós Graduação em Enfermagem Campus Universitário Trindade, 88040-970 Florianópolis - Santa Catarina - Brasil, Tel.: (55 48) 3721-4915 / (55 48) 3721-9043 - Florianópolis - SC - Brazil
    E-mail: textoecontexto@contato.ufsc.br