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Instrumentos gerenciais utilizados na tomada de decisão do enfermeiro no contexto hospitalar

Management tools used by nurses in decision-making within the hospital context

Herramientas de gestión empleadas en la toma de decisiones del enfermero en el contexto hospitalario

Resumos

Pesquisa descritiva de abordagem qualitativa realizada em um hospital de ensino público de Curitiba-PR, em outubro de 2009, com seis enfermeiros que atuam na área assistencial e gerencial. Teve como objetivo reconhecer os instrumentos gerenciais utilizados na prática profissional de enfermeiros, como apoio para a tomada de decisão. Os dados foram coletados mediante a técnica do grupo focal e utilizou-se análise de conteúdo. Desta, emergiu a categoria empírica Instrumentos gerenciais de apoio à tomada de decisão, que permitiu a apreensão de seis subcategorias: planejamento, Procedimentos Operacionais Padrão, administração do tempo, liderança, autonomia, mediação de conflitos e negociação. Propõe-se que a instituição e o Serviço de Enfermagem disponibilizem aos enfermeiros atualização sobre os saberes gerenciais para o desenvolvimento de competências, com vistas a uma atuação mais efetiva e segura, assistência mais qualificada e maior satisfação profissional

Enfermagem; Pesquisa em administração de enfermagem; Gerenciamento da prática profissional; Tomada de decisões; Gerência


This descriptive, qualitative study was conducted in a university hospital in Curitiba, Parana, Brazil in October of 2009 involving a focus group of six nurses who work in its healthcare and management sectors. The objective of this study was to recognize the managerial instruments used in nursing practice as support for decision-making. The data was collected through the focus group technique and context analysis provided the appearance of the empirical category called "management tools that aid decision-making." Six sub categories were also found, namely: planning, standard operational procedures, time management, leadership, autonomy, conflict mediation and negotiation. We propose that the institution and Nursing Services give nurses the opportunity to take refresher courses about managerial knowledge in order to develop such competences, seeking more effective and guaranteed performance, resulting in higher quality care and higher professional satisfaction

Nursing; Study of nursing management; Management for nursing practice; Decision-making; Management


Estudio descriptivo cualitativo realizado en un hospital universitario en Curitiba, Paraná, en octubre de 2009, con seis enfermeros que actúan en el área asistencial y de gestión, con el objetivo de reconocer las herramientas de gestión utilizadas en la práctica profesional de enfermería como un apoyo para la toma de decisiones. Los datos fueron recolectados mediante la técnica de grupo focal, y se utilizó el análisis de contenido. La categoría empírica denominada: herramientas de gestión para apoyo a la toma de decisiones, condujo a seis subcategorías: planificación, procedimientos operativos estándar, gestión del tiempo, liderazgo, autonomía, mediación de conflictos y negociación. Se propone que la institución y el Servicio de Enfermería proporcionen a los enfermeros actualización sobre la gestión del conocimiento para el desarrollo de competencias que produzcan una labor más eficaz y segura, una asistencia más calificada y una mayor satisfacción profesional

Enfermería; Estudios en gerenciamiento de enfermería; Gerenciamiento de la práctica profesional; Toma de decisiones; Gerencia


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ARTIGO ORIGINAL

Instrumentos gerenciais utilizados na tomada de decisão do enfermeiro no contexto hospitalar

Management tools used by nurses in decision-making within the hospital context

Herramientas de gestión empleadas en la toma de decisiones del enfermero en el contexto hospitalario

Maria de Lourdes de AlmeidaI; Maria Luíza Hexsel SeguiII; Mariluci Alves MaftumIII; Liliana Maria LabroniciIV; Aida Maris PeresV

IMestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Professora do Curso de Enfermagem da Universidade do Oeste do Paraná. Paraná, Brasil. E-mail: m_lourdesdealmeida@yahoo.com.br

IIMestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem UFPR. Coordenadora de Enfermagem do Hospital de Clínicas da UFPR. Paraná, Brasil. E-mail: segui@ufpr.br

IIIDoutora em Enfermagem. Professora do Programa de Pós-Graduação de Enfermagem da UFPR. Paraná, Brasil. E-mail: maftum@ufpr.br

IVDoutora em Enfermagem. Professora do Programa de Pós-Graduação de Enfermagem da UFPR. Paraná, Brasil E-mail: lililabronici@yahoo.com.br

VDoutora em Enfermagem. Professora do Programa de Pós-Graduação de Enfermagem da UFPR. Paraná, Brasil E-mail: amaris@ufpr.br

Correspondência Correspondência: Maria de Lourdes de Almeida Rua Jorge Sanwais n.1000, ap. 801, - Centro 85.851.150, Foz do Iguaçu, PR, Brasil E-mail: m_lourdesdealmeida@yahoo.com.br

RESUMO

Pesquisa descritiva de abordagem qualitativa realizada em um hospital de ensino público de Curitiba-PR, em outubro de 2009, com seis enfermeiros que atuam na área assistencial e gerencial. Teve como objetivo reconhecer os instrumentos gerenciais utilizados na prática profissional de enfermeiros, como apoio para a tomada de decisão. Os dados foram coletados mediante a técnica do grupo focal e utilizou-se análise de conteúdo. Desta, emergiu a categoria empírica Instrumentos gerenciais de apoio à tomada de decisão, que permitiu a apreensão de seis subcategorias: planejamento, Procedimentos Operacionais Padrão, administração do tempo, liderança, autonomia, mediação de conflitos e negociação. Propõe-se que a instituição e o Serviço de Enfermagem disponibilizem aos enfermeiros atualização sobre os saberes gerenciais para o desenvolvimento de competências, com vistas a uma atuação mais efetiva e segura, assistência mais qualificada e maior satisfação profissional.

Descritores: Enfermagem. Pesquisa em administração de enfermagem. Gerenciamento da prática profissional. Tomada de decisões. Gerência.

ABSTRACT

This descriptive, qualitative study was conducted in a university hospital in Curitiba, Parana, Brazil in October of 2009 involving a focus group of six nurses who work in its healthcare and management sectors. The objective of this study was to recognize the managerial instruments used in nursing practice as support for decision-making. The data was collected through the focus group technique and context analysis provided the appearance of the empirical category called "management tools that aid decision-making." Six sub categories were also found, namely: planning, standard operational procedures, time management, leadership, autonomy, conflict mediation and negotiation. We propose that the institution and Nursing Services give nurses the opportunity to take refresher courses about managerial knowledge in order to develop such competences, seeking more effective and guaranteed performance, resulting in higher quality care and higher professional satisfaction.

Descriptors: Nursing. Study of nursing management. Management for nursing practice. Decision-making. Management.

RESUMEN

Estudio descriptivo cualitativo realizado en un hospital universitario en Curitiba, Paraná, en octubre de 2009, con seis enfermeros que actúan en el área asistencial y de gestión, con el objetivo de reconocer las herramientas de gestión utilizadas en la práctica profesional de enfermería como un apoyo para la toma de decisiones. Los datos fueron recolectados mediante la técnica de grupo focal, y se utilizó el análisis de contenido. La categoría empírica denominada: herramientas de gestión para apoyo a la toma de decisiones, condujo a seis subcategorías: planificación, procedimientos operativos estándar, gestión del tiempo, liderazgo, autonomía, mediación de conflictos y negociación. Se propone que la institución y el Servicio de Enfermería proporcionen a los enfermeros actualización sobre la gestión del conocimiento para el desarrollo de competencias que produzcan una labor más eficaz y segura, una asistencia más calificada y una mayor satisfacción profesional.

Descriptores: Enfermería. Estudios en gerenciamiento de enfermería. Gerenciamiento de la práctica profesional. Toma de decisiones. Gerencia.

INTRODUÇÃO

O hospital moderno é uma organização complexa que incorpora o avanço constante de conhecimentos e tecnologia, na qual exercem suas atividades, diferentes profissionais ligados à área da saúde. Entre eles, o enfermeiro é um dos responsáveis pela assistência prestada ao cliente e desempenha funções administrativas e assistenciais com vistas à realização do cuidado. Para a articulação destas funções o enfermeiro adapta constantemente seu processo de trabalho, ao mesmo tempo que tem o usuário como eixo central de suas ações. A tomada de decisão permeia o processo de trabalho do enfermeiro, e é considerada, nesta pesquisa, uma competência.

A tomada de decisão ou o processo decisório pode ser definido como a escolha entre duas ou mais alternativas que possibilitem atingir um determinado resultado. Deve ser feita com conhecimento, racionalidade, competência e consciência, para que resulte no alcance do objetivo esperado, ou mais próximo dele.1 Suas etapas são: identificação do problema, reunião de dados para análise das causas e das consequências do problema, investigação de soluções alternativas, avaliação das alternativas, seleção da solução mais adequada, implementação da solução escolhida e avaliação dos resultados.1

O processo decisório inicia a partir da percepção de que algo fora da normalidade está acontecendo, mas nem sempre o problema está bem delimitado. A análise do problema é constituída de uma série de processos que podem ser aprendidos e utilizados como instrumentos do processo de trabalho gerencial, e ajudam a qualificar as decisões.2

O conhecimento das etapas ou fases do processo decisório permite a tomada de consciência das suas certezas e debilidades, inclusive das possíveis omissões no próprio processo, incitando a aquisição de habilidades necessárias ao reforço dos pontos fracos e das correções necessárias, que ajudam a evitar decisões errôneas.3

No processo de trabalho da enfermagem, o enfermeiro tem atuado prioritariamente nas dimensões assistencial e gerencial do cuidado. Na primeira, tem como objeto de intervenção as necessidades de cuidado de enfermagem, e por finalidade, o cuidado integral. Na dimensão gerencial, articula as atividades de organização do trabalho e de recursos humanos em enfermagem, com a finalidade de criar e implementar condições adequadas de cuidado dos pacientes e de desempenho para os trabalhadores.4

Há que se salientar que as dimensões assistencial e gerencial do cuidado são complementares, razão pela qual o enfermeiro gerente do cuidado, ao administrar recursos de ordem organizacional ou relacionados diretamente com o usuário, desenvolve um conjunto de atividades voltadas ao processo de trabalho assistencial.

Nesta pesquisa foi enfatizada a dimensão gerencial do trabalho do enfermeiro. Porquanto, gerenciar pode ser considerado uma dimensão do processo de trabalho, quando utiliza organização e recursos humanos com finalidade geral de atenção à saúde na forma de assistência como promoção, prevenção, proteção e reabilitação.4

Historicamente, a gerência de serviços de saúde é uma prática realizada por enfermeiros, que adotam os princípios da escola científica e clássica da Administração para administrar o seu trabalho e os serviços sob sua responsabilidade. Algumas características desse estilo de gerência, como a fragmentação das atividades, a impessoalidade nas relações, a centralização do poder e a rígida hierarquia ainda são marcantes no cotidiano do trabalho da enfermagem.5

O trabalho gerencial que o enfermeiro desempenha nos serviços de saúde deveria contemplar os aspectos assistenciais, pedagógicos, técnico-científicos e políticos, bem como aqueles que dizem respeito às relações interpessoais, a fim de almejar o planejamento para uma assistência integral, prestada de forma segura e livre de riscos, ao indivíduo, à família e à população.6

Neste estudo, os conceitos de administração e gerência estão fortemente entrelaçados com o processo gerencial do enfermeiro. A Administração é tida como a ciência que embasa a gerência de enfermagem que, por sua vez, compreende-se como prática coletiva entre cliente e trabalhador de saúde, sujeitos sociais em ação.6 Assim, no que se refere à administração, o enfermeiro, em sua prática, faz uso de instrumentos que o auxiliam no gerenciamento do seu trabalho, a fim de atender as necessidades dos clientes, de modo a melhorar a qualidade da assistência.7

Para tal, desenvolve competências gerenciais que abarcam um conjunto de conhecimentos identificados para planejar, tomar decisões, interagir e fazer a gestão de pessoal. Além da utilização destas, deve manter atualizados os conhecimentos da área social/econômica, para mobilizar dados e informações do contexto organizacional, a fim de analisá-los para auxiliar na gestão de recursos humanos, recursos materiais, físicos e financeiros.8

O enfermeiro pode, também, a partir do desenvolvimento de competências gerenciais,5 lançar mão de outros meios ou instrumentos gerenciais, como o gerenciamento de conflitos e negociação, a comunicação, o gerenciamento do trabalho em equipe, a liderança, a motivação da equipe e a administração do tempo, a força de trabalho, os materiais, equipamentos e instalações e os diferentes saberes administrativos, como meios ou instrumentos gerenciais.4

Em função da necessidade de ampliação das discussões com os enfermeiros, sobre a utilização de instrumentos gerenciais, indicadores e outros artefatos que podem auxiliá-lo na tarefa de gerenciar o cuidado, a equipe e a assistência prestada, propiciando a tomada de decisões assertivas e contextualizadas, esta pesquisa se justifica e tem como objetivo: analisar os instrumentos gerenciais utilizados na prática profissional de enfermeiros de um hospital de ensino, como apoio para a tomada de decisão.

METODOLOGIA

Estudo de abordagem qualitativa, do tipo descritivo, realizado em um hospital de ensino público, em outubro de 2009, com enfermeiros que atuam na área assistencial ou gerencial, com mais de dois anos de experiência na instituição.

O grupo estudado foi composto por seis enfermeiras com idade entre 27 e 51 anos, com tempo de formação entre três anos e meio e 25 anos. Destas, quatro cursaram pós- graduação lato sensu, uma é mestre e uma não realizou curso de pós-graduação; cinco são enfermeiras administrativas e uma é assistencial.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, pelo Protocolo nº 0232.0.208.000-09. O início da pesquisa ocorreu após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, pelas participantes. Estas tiveram seus nomes substituídos por uma letra do alfabeto, para garantir o anonimato. Foram levados em consideração todos os aspectos éticos recomendados na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.9

Para a coleta dos dados foi utilizada a técnica de grupo focal, porque esta oferece informações qualitativas, com o objetivo de revelar experiências, sentimentos, percepções e preferências. O grupo é formado por participantes com características em comum, incentivados pelo moderador a conversarem entre si, trocando experiências e interagindo sobre suas ideias, sentimentos, valores e dificuldades.10

Foram realizados quatro encontros, com intervalos semanais e duração média de uma hora. As reuniões, coordenadas por duas pesquisadoras, contaram com a ajuda de um observador externo, e foram gravadas com autorização dos sujeitos da pesquisa.

As questões de discussão foram elaboradas de acordo com o objetivo do estudo e seguiram um roteiro de temas-chave a serem investigados: instrumentos gerenciais, tomada de decisão, utilização de instrumentos gerenciais no cotidiano, utilização dos instrumentos gerenciais de apoio à tomada de decisão. Os instrumentos gerenciais trabalhados nas reuniões partiram da demanda do grupo no encontro inicial.

Os dados obtidos foram transcritos após cada encontro e analisados com a utilização da técnica de análise de conteúdo,11 a qual foi constituída por três fases: a pré-análise, que consistiu na leitura flutuante e organização do material das transcrições, após a validação pelos sujeitos; a exploração do material, que propiciou a classificação, agregação dos dados e identificação da categoria denominada instrumentos gerenciais de apoio à tomada de decisão, que direcionou para a identificação das subcategorias temáticas planejamento, Procedimentos Operacionais Padrão (POP), administração do tempo, liderança, autonomia, mediação de conflitos e negociação; e o tratamento dos dados obtidos e interpretação, que permitiu a apresentação da síntese destas seis subcategorias, interpretadas junto ao referencial teórico sobre a dimensão gerencial do trabalho do enfermeiro.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Instrumentos gerenciais de apoio à tomada de decisão

As enfermeiras apontaram os instrumentos gerenciais de apoio à tomada de decisão como suporte para estratégias e ações que visam alcançar um objetivo definido. Entretanto, foi evidenciado que as mesmas fazem uso de vários instrumentos gerenciais, de forma empírica, sem reflexão sobre o seu uso, ao tomar decisões.

[...] a gente não percebe quando usa os instrumentos na tomada de decisão, na resolução dos conflitos, e assim por diante [...] não fica pensando naquele momento que a gente está usando aquele instrumento gerencial (L).

[...] muita coisa a gente faz até intuitivamente, ou faz porque já deu certo, vai tateando, mas acho que toda fundamentação é importante, porque, às vezes, toma uma atitude e você sofre por tomar aquela atitude, você não tem embasamento, não tem fundamentação, não tem respaldo, não diz que é assim, então você se fragiliza muito, fica lutando, pela tua intuição, pela tua percepção, só que você sofre [...] e agora, se tiver alguma coisa te respaldando, orientando, você se sente mais segura e vai sofrer menos (M).

O processo decisório envolve a resolução de problemas, com etapas que seguem uma sequência, que inicia com a identificação do problema, coleta de dados para análise das causas e das consequências do problema, busca de soluções alternativas, avaliação destas alternativas, escolha da solução mais adequada, implementação da solução e avaliação dos resultados.6

Percebe-se que mesmo com a existência de dados do próprio serviço e de estudos disponíveis para a tomada de decisão de forma sistemática, o enfermeiro não tem se apropriado deles para embasar as suas decisões. As subcategorias apresentadas a seguir visam o detalhamento dos achados acerca do tema.

Planejamento

O planejamento foi citado em vários momentos no grupo focal, com enfoques diferentes. Reconhecido como necessário, mas de difícil viabilização, na visão das enfermeiras a rotina diária impõe a resolução dos problemas na medida em que vão ocorrendo. A falta de tempo foi uma justificativa para a não realização de planejamento formal, e isto pode ser percebido nas falas a seguir:

[...] a enfermeira vai apagando fogo [...] (J).

[...] o planejamento diário, a gente, sem se conscientizar está fazendo [...] (L).

[...] se você não está planejada, vai apagando fogo, fogo, fogo e vai ver, tem uma lista de coisas a fazer e não consegue fazer (M).

O planejamento é um instrumento que auxilia nas escolhas e na elaboração de planos futuros, formado por um conjunto de conhecimentos teóricos e práticos ordenados de forma a possibilitar a interação com a realidade, programar as estratégias e as ações necessárias, para alcançar os objetivos e as metas pré-estabelecidas, e se caracteriza por ser um processo contínuo.12

De acordo com a literatura, o enfermeiro sente-se improdutivo enquanto planeja seu dia, ao invés de trabalhar em uma tarefa específica. Mas o planejamento diário é essencial, pois sem ele o enfermeiro terá dificuldade de iniciar o trabalho, e terá que começar administrando crises.8

A ambiguidade do discurso pode ser notada na fala do sujeito M, pois ao escrever uma lista de "coisas a fazer", a enfermeira elabora um planejamento, embora de curto prazo. Portanto, os depoimentos confirmam um processo de trabalho com ênfase no enfoque operacional do planejamento. Assim, estes discursos são corroborados pelos achados de um estudo13 que entrevistou enfermeiros gerentes, no qual a instituição e os próprios profissionais aceitam que os administradores de enfermagem continuem a buscar soluções imediatistas para problemas essenciais, que atendem somente o aqui e agora, gerados pelas demandas assistenciais e administrativas, enquanto o planejamento a médio e a longo prazos deixam de ser observados.

Procedimentos Operacionais Padrão (POP)

A padronização dos procedimentos, apontada no grupo focal como instrumento gerencial que apoia a tomada de decisão do enfermeiro, indica como acontece a organização do serviço de enfermagem. Para os sujeitos, o POP permite que todos os trabalhadores prestem cuidado padronizado para o paciente dentro dos princípios técnicos e científicos e ainda contribui para dirimir distorções adquiridas na prática, Assim, ele também tem a finalidade educativa.

[...] tenho procurado fazer com que a equipe utilize o POP [...] ( I ).

[...] o POP é uma forma de fazer com que todos falem a mesma língua na hora de atender os pacientes (M).

[...] é uma maneira de padronizar a assistência, de diminuir os vícios de quem trabalha há muito tempo. (J)

A fala do sujeito J é também ressaltada em um estudo com 261 profissionais de enfermagem, que enfatizou a relevância dos POP como definidores de conduta profissional e sua utilização para o esclarecimento de dúvidas.14 Estes resultados indicam que a utilização dos POP mostra a organização do serviço de enfermagem através de diretrizes detalhadas que apresentam o atendimento indicado para situações específicas, que resultarão em melhoria de seus processos e resultados.

Deste modo, é possível afirmar que a racionalização, devido a padronização das rotinas, propicia maior segurança na realização dos procedimentos. Entretanto, compete ao enfermeiro, ao elaborar os POPs junto à sua equipe, implementar e controlar as ações assistenciais de enfermagem permeado pela visão de integralidade do paciente.

Administração do tempo

A inadequada administração do tempo é uma consequência marcante na rotina diária dos enfermeiros participantes deste estudo. O grupo refere que em função da falta de planejamento, não consegue tempo hábil para desenvolver todas as tarefas propostas e racionalizar o trabalho gerencial. Por vezes, fazem um trabalho repetitivo e sem reflexão e não otimizam o tempo disponível, conforme explicitado nas falas:

[...] nós temos que administrar tanto os funcionários, os conflitos, quanto a assistência, e isto é complicado (J).

[...] as coisas vão acontecendo e a gente não tem tempo para pensar, você cai numa roda viva, as coisas vão acontecendo, você vai fazendo e nem pensa (M).

[...] se você tem um planejamento, consegue administrar melhor o tempo, senão a gente se perde, e quando vê, já passou mais um dia (O).

O tempo é um dos recursos fundamentais de uma organização e sua gestão contribui para a melhoria no desempenho tanto individual como coletivo. A priorização das atividades é um elemento básico para a administração do tempo do gerente, que é solicitado continuamente.6

As falas dos sujeitos deste estudo mostram a necessidade das enfermeiras refletirem sobre seu processo de trabalho e buscarem a racionalização do tempo. Assim, este poderá ser utilizado para a execução prioritária de atividades profissionais específicas, provocando o aumento de sua motivação e da qualidade da assistência de enfermagem.

Liderança

Nas falas das enfermeiras, observou-se a preocupação com o dinamismo do processo de liderança. Apontaram que há variações a cada situação, e que não é possível seguir um único estilo de liderança, porquanto não há um único e melhor modo para liderar. Isso foi destacado nas falas a seguir:

[...] eu acho que acabo me utilizando de todos os estilos [...] acho que não se é só um tipo de chefe, são vários [...] (N).

[...] na verdade, o ideal é você ser todos, dependendo da situação [...] você vê a descrição e fica tentando ver em qual você se encaixa [...] (M).

Ser líder e saber administrar é condição para que o trabalho do profissional de enfermagem seja eficiente.5,13 Estudos têm evidenciado que, na enfermagem, não há um único estilo de liderança. O enfermeiro necessita previamente conhecer as características pessoais de seus liderados, da situação administrativa, do ambiente de trabalho, assim como das virtudes e dificuldades enfrentadas pela sua equipe.3,5,15

A liderança está presente em todas as atividades do enfermeiro, principalmente quando o profissional tem o interesse de exercer com competência o seu trabalho, no desempenho de atividades assistenciais do cuidado direto ao paciente ou assumindo a função administrativa que envolve a interação com o pessoal de enfermagem.14 Ela pode ser compreendida e desenvolvida, desde que haja interesse e iniciativa.

Dentre as habilidades de liderança, são atributos: conhecimento, experiência, confiança, capacidade de trabalhar em equipe, de resolver problemas, autodesenvolvimento, relacionamento interpessoal, comprometimento e respeito entre a equipe, e saber ouvir.5,16 Desta maneira, na prática assistencial e gerencial, é fundamental que o enfermeiro desenvolva a competência de liderança.

Mesmo que não exista clareza quanto ao estilo gerencial, as falas das enfermeiras indicam que uma das suas grandes responsabilidades é o exercício da liderança nas atividades. A liderança é ressaltada como inerente ao trabalho do enfermeiro, já que ele é quem faz a coordenação do trabalho de enfermagem e a intermediação entre os diferentes profissionais da equipe de saúde.

Autonomia

Na fala a seguir, que se refere à autonomia, percebe-se a dificuldade que as enfermeiras ainda encontram para se situarem frente ao modelo gerencial vigente na instituição.

[...] por um lado, a autonomia é boa, mas por outro, quanto tem problemas mais sérios, aí neste ponto a gente precisaria deste apoio, do respaldo legal [...] não tem uma cobrança direta. Se tem liberdade, na verdade, não é bom; a gente precisa ter proteção, a formalização do poder junto à direção (J).

Embora a fala da enfermeira J externe sua autonomia para a condução cotidiana da unidade, referente aos aspectos da coordenação do cuidado, também reflete a dependência de uma liderança formalizada. Esta situação é confirmada por um estudo16 realizado no mesmo cenário desta pesquisa, em que mais do que um poder legítimo alcançado pela visibilidade de seu trabalho, as lacunas de representação da liderança pela extinta Direção de Enfermagem, são sentidas pelos enfermeiros. No atual modelo gerencial, a Coordenação de Enfermagem não conseguiu assumir a liderança desejada pela categoria.

Mediação de conflitos e negociação

Neste grupo, a presença de conflitos e a dificuldade de negociar com a equipe médica e de enfermagem foi um fator declarado pela maioria das participantes. Percebe-se, que para estas enfermeiras, o conflito tem um enfoque negativo, por não ser trabalhado como uma oportunidade de crescimento das partes envolvidas.

[...] reunião de férias [...] liguei para um e para outro e negociei, ficou todo mundo satisfeito (M).

[...] o conflito. Às vezes eu chamo os dois e converso, às vezes converso com um, com outro [...] sempre estou tentando dar um jeito, mediar, nunca sou aquela pessoa ditadora, e tem dado certo neste tempo [...] (N).

A abordagem utilizada pelas enfermeiras M e N mostra a disposição para trabalhar situações de conflito, mesmo que de forma imediata. Entretanto, falta a percepção do conflito como oportunidade que conduz ao crescimento, gera ideias e soluções inovadoras. O conflito, ao ser desconsiderado ou tratado de forma inadequada, pode levar à desmoralização, desmotivação e diminuição da produtividade.6

Entre as estratégias de resolução do conflito, cita-se6 o comprometimento, em que cada uma das partes abre mão de alguma coisa desejada; a abordagem competitiva, quando uma das partes busca o que deseja sem se importar com os demais; e a cooperação, considerada como oposto da competição. Sob esta ótica, várias estratégias podem ser utilizadas, dependendo da situação, que envolve inúmeras variáveis, como a própria urgência na tomada de decisão, a importância da questão e a maturidade dos indivíduos envolvidos.

No cotidiano do trabalho, a tomada de decisão pode ser definida como a atitude, fruto de um processo sistematizado, que caracteriza o desempenho da gerência.1 Neste estudo foram evidenciados como o planejamento, os POPs, a administração do tempo, a liderança, a autonomia, a mediação de conflitos e a negociação são utilizados em um ambiente hospitalar por enfermeiros, mesmo que de forma empírica, como apoio à tomada de decisão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Todas as enfermeiras que participaram do grupo referiram que as atividades de gerenciamento e assistência estão interligadas, e que não é possível dissociá-las. Entretanto, percebe-se que existe uma lacuna entre a experiência prática, que é valorizada por elas, e a fundamentação teórica que poderia subsidiá-la. Isto foi observado desde o primeiro encontro, quando algumas demonstraram dificuldades em identificar quais seriam os instrumentos gerenciais por elas utilizados no cotidiano da prática profissional.

Os instrumentos gerenciais são utilizados por essas enfermeiras de forma empírica. Percebeu-se em suas falas a dificuldade de viabilizar o planejamento, apesar de colocarem-no como um instrumento importante, o que resulta também na ineficiência da administração do seu tempo de trabalho.

A liderança emerge como uma condição dinâmica.O estilo de liderança adotado é específico para cada contexto e o conflito é identificado como negativo. As enfermeiras desse estudo mostram-se com dificuldades de se estabelecerem no modelo gerencial vigente na instituição pesquisada.

Assim, este estudo aponta para a necessidade da instituição e do Serviço de Enfermagem proporcionarem aos enfermeiros oportunidades de atualização e qualificação com enfoque nos saberes gerenciais, para que desenvolvam as competências voltadas às necessidades assistenciais e gerenciais do cuidado.

A pesquisa foi realizada em um contexto histórico e social de uma instituição hospitalar com um grupo de enfermeiras que vivenciam um modelo gerencial específico. Suas contribuições advêm das reflexões sobre a necessidade contínua de aproximações teóricas à prática profissional do enfermeiro, em busca da utilização sistematizada e atualizada dos instrumentos gerenciais no apoio ao processo de tomada de decisão.

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  • Correspondência:

    Maria de Lourdes de Almeida
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Dez 2011
    • Data do Fascículo
      2011
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