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Fatores associados à incontinência urinária em idosos com critérios de fragilidade

Factores asociados con incontinencia urinaria en ancianos con criterios de fragilidad

Resumos

Este estudo teve como objetivo analisar os fatores associados à incontinência urinária entre idosos, com critérios de fragilidade (pré-frágeis e frágeis). Trata-se de um estudo transversal, de natureza quantitativa. Foram entrevistados 100 idosos no ambulatório de geriatria de um hospital universitário do município de Campinas, São Paulo. Referiram incontinência urinária 65,0% dos idosos; destes, 40 (61,4%) relataram perda de urina diversas vezes ao dia e em pequena quantidade. A análise de regressão multivariada apontou relação estatisticamente significativa entre sexo (OR=3.67), infecção do trato urinário (OR=6.16) e escore da Medida de Independência Funcional (mobilidade) (OR=0.85). Os resultados mostraram que a infecção do trato urinário, a perda de mobilidade e o sexo são fatores associado á incontinência urinária em idosos com critérios de fragilidade. Esses fatores são passiveis de intervenções, visando à prevenção, e até mesmo, a redução dos episódios de queixa de incontinência urinária.

Incontinência urinária; Idoso fragilizado; Fatores de risco


Este estudio tiene como objetivo analizar los factores asociados con la incontinencia urinaria en los adultos mayores con criterios de fragilidad (pre-frágil y frágil). Se trata de un estudio transversal y cuantitativo. Fueron entrevistados cien ancianos en el ambulatorio de geriatría de un hospital universitario del municipio de Campinas, São Paulo, Brasil. Refirieron incontinencia urinaria 65,0% de los ancianos, de estos 40 (OR=61,4%) relataron pérdidas de orina varias veces al día en pequeñas cantidades. El análisis de regresión multi-variado apuntó una relación estadísticamente significante entre los sexos (OR=3.67), e infección del tracto urinario (6,16) con índices de medida de independencia funcional (movilidad) (OR=0.85). Los resultados muestran que la infección del tracto urinario, la pérdida de movilidad y el sexo son factores de riesgo para la incontinencia urinaria en ancianos con criterios de fragilidad. Estos factores son susceptibles a la intervención visando la prevención y los episodios de incontinencia urinaria.

Incontinencia urinaria; Anciano frágil; Factores de riesgo


This study presents an analysis of factors associated with Urinary Incontinence among elderly individuals who meet frailty criteria (pre-frail and frail). It is a cross-sectional and quantitative study. One hundred elderly patients from a geriatric outpatient clinic at a university hospital in Campinas, SP, Brazil were interviewed. A total of 65.0% of the participants reported Urinary Incontinence, 40 (61.4%) of which reported loss of small quantities of urine several times a day. The multivariate regression analysis showed a statistically significant relationship among gender (OR=3.67), urinary tract infection (OR=6.16), and scores on the Functional Independence Measure (mobility), (OR=0.85). The results show that urinary tract infection, loss of mobility, and gender are factors associated with Urinary Incontinence in elderly patients who meet frailty criteria. These factors are susceptible to interventions designed to prevent and even reduce episodes of Urinary Incontinence.

Urinary incontinence; Frailty elderly; Risk factors


ARTIGO ORIGINAL

Fatores associados à incontinência urinária em idosos com critérios de fragilidade

Factors associated with urinary incontinence in elderly individuals who meet frailty criteria

Factores asociados con incontinencia urinaria en ancianos con criterios de fragilidad

Vanessa Abreu da SilvaI; Maria José D'ElbouxII

IMestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Faculdade de Ciências Medicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Enfermeira da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital das Clínicas da Unicamp. São Paulo, Brasil. E-mail: vanisabreu@hotmail.com

IILivre Docente em Enfermagem. Professora Associado do Departamento de Enfermagem da FCM/Unicamp. São Paulo, Brasil. E-mail: mariadio@uol.com.br

Correspondência Correspondência: Vanessa Abreu da Silva Rua Deoclésio Camara Mattos, 570. 13045-425 - Vila Carminha, Campinas, SP, Brasil E-mail: vanisabreu@hotmail.com

RESUMO

Este estudo teve como objetivo analisar os fatores associados à incontinência urinária entre idosos, com critérios de fragilidade (pré-frágeis e frágeis). Trata-se de um estudo transversal, de natureza quantitativa. Foram entrevistados 100 idosos no ambulatório de geriatria de um hospital universitário do município de Campinas, São Paulo. Referiram incontinência urinária 65,0% dos idosos; destes, 40 (61,4%) relataram perda de urina diversas vezes ao dia e em pequena quantidade. A análise de regressão multivariada apontou relação estatisticamente significativa entre sexo (OR=3.67), infecção do trato urinário (OR=6.16) e escore da Medida de Independência Funcional (mobilidade) (OR=0.85). Os resultados mostraram que a infecção do trato urinário, a perda de mobilidade e o sexo são fatores associado á incontinência urinária em idosos com critérios de fragilidade. Esses fatores são passiveis de intervenções, visando à prevenção, e até mesmo, a redução dos episódios de queixa de incontinência urinária.

Descritores: Incontinência urinária. Idoso fragilizado. Fatores de risco.

ABSTRACT

This study presents an analysis of factors associated with Urinary Incontinence among elderly individuals who meet frailty criteria (pre-frail and frail). It is a cross-sectional and quantitative study. One hundred elderly patients from a geriatric outpatient clinic at a university hospital in Campinas, SP, Brazil were interviewed. A total of 65.0% of the participants reported Urinary Incontinence, 40 (61.4%) of which reported loss of small quantities of urine several times a day. The multivariate regression analysis showed a statistically significant relationship among gender (OR=3.67), urinary tract infection (OR=6.16), and scores on the Functional Independence Measure (mobility), (OR=0.85). The results show that urinary tract infection, loss of mobility, and gender are factors associated with Urinary Incontinence in elderly patients who meet frailty criteria. These factors are susceptible to interventions designed to prevent and even reduce episodes of Urinary Incontinence.

Descriptors: Urinary incontinence. Frailty elderly. Risk factors.

RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo analizar los factores asociados con la incontinencia urinaria en los adultos mayores con criterios de fragilidad (pre-frágil y frágil). Se trata de un estudio transversal y cuantitativo. Fueron entrevistados cien ancianos en el ambulatorio de geriatría de un hospital universitario del municipio de Campinas, São Paulo, Brasil. Refirieron incontinencia urinaria 65,0% de los ancianos, de estos 40 (OR=61,4%) relataron pérdidas de orina varias veces al día en pequeñas cantidades. El análisis de regresión multi-variado apuntó una relación estadísticamente significante entre los sexos (OR=3.67), e infección del tracto urinario (6,16) con índices de medida de independencia funcional (movilidad) (OR=0.85). Los resultados muestran que la infección del tracto urinario, la pérdida de movilidad y el sexo son factores de riesgo para la incontinencia urinaria en ancianos con criterios de fragilidad. Estos factores son susceptibles a la intervención visando la prevención y los episodios de incontinencia urinaria.

Descriptores: Incontinencia urinaria. Anciano frágil. Factores de riesgo.

INTRODUÇÃO

A Incontinência Urinária (IU) é um problema comum, que pode afetar pessoas de todas as faixas etárias. Porém, sua ocorrência é maior na população feminina e na velhice,1 especialmente após os 70 anos, conforme estudos em diversas regiões do mundo.2

Nota-se, nos últimos anos, o acelerado crescimento da população idosa, particularmente do segmento com idade superior a 80 anos. Neste segmento, a prevalência de fragilidade, além da IU, é cerca de 20,0 a 26,0% maior, quando comparada com a faixa etária de 65 anos ou mais, onde é em torno de 3,0 a 7,0%.3

A IU pode ser sinal de alarme para fragilidade e, na velhice, está associada com risco aumentado de declínio funcional.4 É definida como "queixa de qualquer perda involuntária de urina".5:5 Estima-se que cerca de 15,0% dos idosos que vivem na comunidade e 50,0% dos que residem em instituições de longa permanência a apresentam.6 O envelhecimento é um importante fator de risco para a IU, contudo, como fenômeno isolado, não é causa deste transtorno, apesar de induzir as modificações funcionais e estruturais no sistema urinário as quais predispõem ao problema.7

Outros fatores associados à IU entre os idosos merecem destaque, tais como: pertencer ao sexo feminino, número de gestações, parto vaginal, multiparidade, tabagismo, obesidade, menopausa, restrição de mobilidade que dificulte o acesso ao banheiro, alterações cognitivas, além de cirurgias e medicações que podem provocar redução do tônus da musculatura pélvica, ou gerar danos nervosos.8-10

A fragilidade é uma "síndrome caracterizada pela diminuição da reserva energética e pela resistência reduzida aos estressores".11:147 Ocorrem três mudanças fisiológicas relacionadas à idade, que estão subjacentes à síndrome da fragilidade, conhecidas como tripé da fragilidade: alterações neuromusculares, desregulação do sistema endócrino e disfunção imunológica.2,11

Pesquisadores elaboraram um fenótipo de fragilidade, baseado no tripé da fragilidade, composto por cinco critérios: perda de peso não intencional no último ano, exaustão, lentidão, fraqueza muscular e baixo nível de atividade física. De acordo com esse fenótipo, para ser considerado frágil, o idoso deve apresentar três ou mais destes critérios, e aquele que apresenta um ou dois é denominado pré-frágil, tendo grande risco de desenvolver a síndrome da fragilidade.11

É importante a identificação precoce dos idosos pré-frágeis e frágeis para prevenção de eventos adversos, como descompensação de doenças crônicas, quedas, institucionalização, incapacidade e morte.11 Além disso, há evidências de pesquisas em que, na fase pré-frágil a fragilidade ainda possa ser revertida.3

Considerando a escassez de estudos abordando o tema na literatura, sobre a presença de IU em idosos frágeis, esta pesquisa tem como objetivo analisar os fatores associados à IU entre os idosos com critérios de fragilidade (pré-frágil e frágil).

MATERIAIS E MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal, de natureza quantitativa. A coleta de dados foi realizada no Ambulatório de Geriatria do Hospital de Clínicas (HC) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em Campinas-SP, onde é feito atendimento a idosos com idade > 80 anos, ou acima de 60 anos, e com dependência física ou cognitiva. A amostra utilizada foi de conveniência, não-probabilística, composta de 100 idosos atendidos no Ambulatório, no período de fevereiro a agosto de 2009.

Para coleta de dados os entrevistadores fizeram contato com os idosos individualmente, no período de atendimento, enquanto aguardavam na fila de espera, garantindo-lhes a preservação do número na espera do atendimento.

Como critérios de inclusão foram considerados: idade maior ou igual a 60 anos; condições de estabelecer comunicação oral para responder à entrevista; pontuação no Mini-Exame do Estado Mental (MEEM) >13 (para analfabetos), >18 (um a sete anos de escolaridade), >26 (igual ou superior a oito anos);12 e apresentar pelo menos um critério de fragilidade, conforme o modelo adaptado.11

Para a avaliação da fragilidade, foram utilizados os critérios, conforme descritos a seguir, elaborados a partir do fenótipo de fragilidade:11

Perda de peso involuntária no último ano: superior a 4,5 quilos, ou acima de 10% do peso corporal no último ano (no modelo de fragilidade11 é considerada perda de peso superior a 5%).

Exaustão: avaliada por duas questões da escala de rastreamento de depressão The Center for Epidemiologic Studies - Depression (CES-D) ("sentiu que teve que fazer esforço para dar conta das tarefas habituais" e que "não conseguiu levar adiante suas coisas"), validada no Brasil para a população idosa.13 Essas questões permitem identificar se por três ou mais dias da semana anterior o entrevistado apresentou esses sintomas.

Lentidão: avaliada pela velocidade da marcha diminuída, utilizando-se o tempo cronometrado para percorrer uma distância de 4,0 metros, em velocidade normal, um percurso de ida e outro de volta, sendo considerado o menor tempo. No modelo original é utilizada uma distância de 4,6 metros. Devido a isso. foram realizados os devidos ajustes para sexo e altura. Pontuou-se para este critério se o tempo foi maior ou igual a sete e seis segundos, para homens e mulheres, considerando a altura de 1,73m para os homens e 1,59m para as mulheres, respectivamente. Estas alterações foram efetuadas devido à escassez de espaço físico no ambiente de coleta de dados.

Fraqueza muscular: avaliada por meio da força de preensão palmar, medida com dinamômetro manual portátil, na mão dominante, com o idoso na posição ortostática e os braços estendidos ao longo do corpo. Foram realizadas três medidas em intervalo aproximado de cinco minutos, sendo considerado o maior valor. Os resultados foram estratificados por sexo e Índice de Massa Corpórea (IMC), sendo pontuados para este critério: homens - valores de <29kgf para IMC <24,0kg m2, <30kgf para IMC de 24,1 a 26,0 e <32kgf para IMC >28,0; mulheres - valores de <17.0kgf para IMC <23,0, <17,3kgf para IMC de 23,1 a 26,0, <18,0 kgf para IMC de 26,2 a 29,0 e < 21kgf para IMC >29,0.

Baixo nível de atividade: frequência < duas vezes por semana ou não realização de atividades físicas foram considerados como critério. No modelo original11 é realizada avaliação do dispêndio energético semanal, baseado no autorrelato de atividades e exercícios físicos analisados pelo Minnesota Leisure Time Activities Questionnaire, ajustado de acordo com o sexo.

Os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram: 1) caracterização sociodemográfica, composto pelas variáveis sexo, idade, cor da pele, situação conjugal, escolaridade, com quem mora, se trabalha atualmente ou é aposentado, todas autorreferidas e fatores associados à IU, composto pelas variáveis tipo de medicamento que faz uso, comorbidades, cirurgias anteriores, variáveis essas consultadas no prontuário e as variáveis consumo de café, ITU no ultimo mês, funcionamento intestinal e esforço para evacuar, que, por sua vez, foram autorreferidas. Vale ressaltar que o instrumento foi submetido à validade de conteúdo e avaliado por um comitê de juízes experts da área de incontinência urinária, bem como das áreas de geriatria e gerontologia; 2) Medida de Independência Funcional (MIF)14-15, foi utilizada apenas a subescala mobilidade do seu domínio motor, composta por cinco itens. Cada item recebe uma pontuação que varia de um, quando a dependência é total para realizar a tarefa em questão, a sete, quando o indivíduo é completamente independente para executar determinada atividade, realizando-a com segurança, em tempo normal, e sem ajuda, portanto, com o escore da subescala mobilidade variando de cinco a 35 pontos; 3) O International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form (ICIQ-SF)16, utilizado para avaliar IU, é composto por seis questões que avaliam a frequência, a gravidade da perda urinária e o impacto da IU na vida diária, inclui ainda uma sequência de oito itens autodiagnósticos, relacionados às causas ou situações de IU, que não são pontuados. A soma dos escores (ICIQ Escore) das questões três, quatro e cinco varia de zero a 21. Para ser considerado incontinente o idoso deve apresentar escore maior ou igual a três, sendo que, quanto mais elevado o escore total, maior é a gravidade da IU. Já o impacto na vida diária é definido de acordo com o escore da questão cinco: (0) nada, (1-3) leve, (4-6) moderado, (7-9) grave, e (10) muito grave.

Após a avaliação dos critérios de fragilidade, foram obtidos dois grupos: o primeiro, com 41 idosos pré-frágeis (< dois critérios), e o outro, com 59 idosos frágeis (> três critérios).

Foram realizadas as seguintes análises estatísticas: descritiva - para as variáveis sociodemográficas (sexo, idade, cor da pele, situação conjugal, escolaridade, com quem mora trabalha atualmente e se está aposentado), para os escores do ICIQ-SF, critérios de fragilidade, MIF mobilidade e fatores associado à IU; o Teste Qui-Quadrado ou Exato de Fisher e Mann Whitney - para comparar os idosos com e sem IU e as variáveis consideradas fatores associados à IU: sexo, idade, medicamentos, comorbidades, consumo de café, ITU no último mês, funcionamento intestinal, esforço para evacuar, cirurgias anteriores e escore da MIF (mobilidade); e Análise de Regressão Logística Univariada e Multivariada (com critério Stepwise de seleção de variáveis), para estudar a relação entre as variáveis referentes aos fatores associados à IU, MIF mobilidade e a IU entre os idosos frágeis e pré-frágeis. O nível de significância adotado para os testes estatísticos foi 5%, ou seja, p<0,05.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas da FCM-UNICAMP, sob o parecer número 240/2003.

RESULTADOS

Os sujeitos deste estudo apresentaram como características predominantes: sexo feminino (74,0%), idade superior a 70 anos (78,0%), com média de 76,6(±7,8); pele branca (65,0%); ausência de companheiro (59,0%); baixa escolaridade (49,0%); e moradia com familiares (75,0%) e aposentados (71,0%), conforme apresentado na tabela 1.

No que diz respeito à perda urinária, 65,0% dos idosos apresentaram escore maior ou igual a três no ICIQ-SF, ou seja, queixa de perda involuntária de urina. Dentre aqueles com IU, 61,4% referiram perda urinária, diversas vezes ao dia, e em pequena quantidade. O impacto da IU na vida diária desses sujeitos foi avaliado pela questão número cinco do ICIQ-SF, sendo que seu escore variou de zero a dez (média 4,85), embora a maioria dos idosos (49,2%) o tenha considerado muito grave. Com relação às causas ou situações de perdas urinárias apontadas por eles, destaca-se a perda urinária antes de chegar ao banheiro (50,0%) e a perda aos esforços, ao tossir ou espirrar (37,0%). Nesta questão, os idosos poderiam assinalar mais de uma alternativa, uma vez que a perda urinária pode ocorrer em diferentes circunstâncias. O escore da subescala mobilidade da MIF variou de sete a 35, com média de 31,2 (desvio-padrão de 6,3).

Ao comparar a presença dos fatores associados à IU selecionados para este estudo, entre os idosos com e sem IU, houve diferença estatisticamente significativa apenas para o fator associado à IU infecção do trato urinário (ITU) e mobilidade (Tabela 2).

As tabelas 3 e 4 mostram a relação dos fatores associados à IU entre os idosos frágeis e pré-frágeis.

Pelos resultados da Análise Multivariada verificou-se que as variáveis ITU e escore da MIF (mobilidade) foram selecionadas e significativamente associadas à IU. Considerando-se o risco de IU, os idosos com ITU têm chance 6,2 vezes maior de IU dos que aqueles idosos sem ITU. Com relação à mobilidade, os idosos com menor escore na MIF, têm maior chance de IU, ou seja, a cada redução de um ponto no escore da MIF a chance de IU aumenta em 1,18 vez, ou 18%.

Considerando que o sexo foi uma variável estatisticamente significativa na análise comparativa e na Análise Univariada, optou-se por realizar a Análise Multivariada e analisar a relação dos fatores associados à IU, ajustado para sexo e idade (Tabela 5), tendo em vista que a literatura evidencia que é uma variável relevante para a ocorrência de IU, ou seja, com o avanço da idade aumenta a ocorrência de IU.

Com os ajustes realizados, obteve-se relação significativa entre IU e sexo e escore da MIF (mobilidade), ou seja, idosos do sexo feminino e com menores escores da MIF (mobilidade) apresentaram maior chance para IU, OR=3,67 e OR=0,85, respectivamente.

DISCUSSÃO

A ocorrência de IU na amostra deste estudo foi superior (65,0%) a de outros estudos realizados com idosos da comunidade. No Brasil, um estudo desenvolvido no município de São Paulo encontrou ocorrência de IU em 11,8% dos homens e 26,2% das mulheres,17 enquanto em outro trabalho, realizado no Japão, os autores notaram presença de IU em 25,0% dos idosos estudados.18 Sabe-se que em idosos institucionalizados a IU é superior devido ao perfil de maior vulnerabilidade. A esse respeito, nos EUA, em uma pesquisa com idosos institucionalizados verificou-se ocorrência de IU em 58,6 deles.19 Em âmbito nacional, verificou-se que 57,3% dos idosos institucionalizados referiam IU nos municípios de Blumenau e Itajaí.20

A escassez de estudos sobre IU em idosos com critérios de fragilidade dificulta a comparação com a população abordada no presente estudo. As pesquisas relacionadas à ocorrência de IU em idosos, disponíveis na literatura, são variáveis, e não existe um consenso quanto à definição, população e o tipo de IU estudada.

Os idosos incluídos neste estudo apresentam perfil de grande vulnerabilidade aos eventos adversos de saúde, considerados frágeis e pré-frágeis, o que talvez justifique a elevada ocorrência de IU nessa amostra.

Com relação às características da IU, houve predomínio (61,5%) do relato de perda urinária diversas vezes ao dia e em pequena quantidade. Em idosos da comunidade, a frequência de perda é inferior a uma vez por semana ou menos (26,4 %) e em pequena quantidade.21 Ressalta-se que a frequência e quantidade de perda urinária são decorrentes de diversos fatores tais como tipo de IU, estado de saúde do sujeito, comorbidades e grau de dependência funcional, entre outros.

Outra característica da IU relaciona-se às causas ou situações de perda urinária, apontadas por 50,0% dos idosos, como antes de chegar ao banheiro, e 37,0%, aos esforços ao tossir ou espirrar, o que sugere urge-incontinência e IU ao esforço, que são os tipos mais comuns na velhice.22

Entre os fatores de associado à IU estudados houve, em um primeiro momento, significância estatística somente para ITU e escore da MIF (mobilidade). Muitas afecções são apontadas pela literatura como importantes fatores associados à IU,23-24 entretanto, destaca-se a ITU, na medida em que piora o comportamento da bexiga já instável, causando sintomas vesicais irritativos, urgência e frequência.25 Os idosos frágeis e pré-frágeis apresentam maior risco de IU, se no último mês referirem ITU. Esse fato também foi confirmado por pesquisadores que encontraram associação entre IU e ITU em idosos frágeis, na razão de chance de 2,05.25-26

Esses autores sugeriram que os possíveis mecanismos que explicam a ligação entre ITU e IU são as alterações de imunidade e redução do estrogênio, relacionados ao envelhecimento e à fragilidade, visto que a UTI é tida como um indicador de fragilidade de saúde para idosos hospitalizados.25 Além disso, ela é relativamente comum nos idosos, devido a alterações de mobilidade, má nutrição e alterações imunológicas,27 e na mulher idosa, a atrofia das mucosas, vaginal e uretral favorece a colonização por organismos patogênicos, o que leva ao aumento da ocorrência de bacteriúria e UTI.28

Alterações de mobilidade dificultam o acesso do idoso ao banheiro e contribuem para perda involuntária de urina, sobretudo em situações de urgência urinária, sendo um importante preditor de IU.29-31

De fato, os idosos com maior limitação de mobilidade apresentaram mais IU, conforme resultados obtidos no presente estudo, e confirmados por outros autores.17,19-20,32,33

Ao realizar a Análise de Regressão Logística Multivariada ajustada para sexo e idade, a ITU deixa de ser fator associado à IU, ficando o p-valor no limite da significância (0,051), e a variável sexo passa a ter significância estatística, juntamente com o escore MIF (mobilidade). Com isso, as mulheres idosas têm 3,7 vezes mais chance de apresentarem IU do que os homens, corroborando com estudos nacionais e internacionais.26,34 Eles confirmaram ainda os achados da literatura que relatam ocorrência de IU de 11,8% nos homens e 26,2% nas mulheres,16 e prevalência de 62% nas mulheres e 45% nos homens.20 No Japão, a IU acomete aproximadamente 34,2% das mulheres e 15,5% dos homens.18 Outro estudo realizado em Istambul, na Turquia, mostrou que a IU atinge 43,0% das mulheres e 20,9% dos homens.35

O maior risco de IU associado ao sexo feminino é explicado na literatura pelas diferenças no comprimento uretral feminino, diminuição da pressão de fechamento uretral, associados à hipermobilidade do colo vesical, e ao enfraquecimento na musculatura do assoalho pélvico, devido aos efeitos da gestação e do parto no mecanismo de continência, além das alterações hormonais decorrentes da menopausa.17,34,36

É sabido que a ocorrência de IU aumenta com o avanço da idade,28,34 entretanto, a idade não foi uma variável de significância estatística neste estudo. Não há consenso entre os autores sobre o avanço da idade, como fator associado à IU. Por um lado, essa diferença também não foi encontrada por alguns estudos,20,37 contudo, no município de São Paulo, os autores averiguaram essa associação em seu estudo.17

A associação entre envelhecimento e sintomas miccionais, particularmente sintomas irritativos, como urgência e urge-incontinência, pode ser parcialmente explicada por alterações estruturais no músculo detrusor, tais como o desenvolvimento de fibrose e hipersensibilidade à noradrenalina, levando ao desenvolvimento de hiperatividade detrusora. Além disso, os idosos tem elevado risco de IU por uma ampla variedade de fatores como alterações cognitivas, físicas, motivacional, funcional, bem como a presença de comorbidades e uso de múltiplas medicações.17,23,29

Os demais fatores associado à IU, destacados por diversos autores, não indicaram significância estatística, talvez em detrimento do perfil dos sujeitos do estudo: idosos em uso de múltiplas medicações e com elevada comorbidade; e grande ocorrência de funcionamento intestinal irregular (49,0%), demonstrando uma tendência à constipação.

CONCLUSÃO

Os resultados deste estudo mostraram que, entre os fatores associados à IU, apontados pela literatura, destacam-se a ITU entre os idosos frágeis e pré-frágeis, e alterações de mobilidade e sexo. São fatores passíveis de intervenções, visando à prevenção e, até mesmo, à redução dos episódios de queixa de IU.

Os profissionais de saúde, as famílias e os cuidadores devem otimizar o acesso do idoso ao banheiro, através de medidas que visem melhora da sua mobilidade, bem como intervenções estruturais no domicílio e em instituições. Além disso, medidas de prevenção e tratamento precoce de ITU devem ser instituídas, tendo em vista sua forte relação com IU, em idosos com critérios de fragilidade encontrados no presente estudo.

Para esse estudo, foi utilizado o fenótipo de fragilidade, com algumas adaptações. Isso limitou a avaliação da fragilidade, no que diz respeito ao dispêndio energético. Também para avaliação da IU foi utilizado o instrumento ICIQ-SF que, apesar de ser amplamente utilizado na literatura nacional e internacional, não dispensa, na prática clínica, a utilização de outros métodos, tais como anamnese com histórico detalhado, exame físico geral e específico, diário miccional e avaliação urodinâmica.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Jul 2012
    • Data do Fascículo
      Jun 2012
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