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Conhecimento, atitude e prática sobre o exame papanicolaou de prostitutas

Conocimiento, actitud y prática sobre el papanicolau de prostitutas

Resumos

Relações com múltiplos parceiros e não utilização do preservativo pelas prostitutas comprometem sua saúde sexual e reprodutiva. Objetivou-se no estudo identificar fatores de risco comportamentais associados ao câncer de colo uterino entre as prostitutas de Picos-PI e avaliar o conhecimento, a atitude e a prática dessas mulheres em relação ao exame Papanicolaou. Estudo exploratório e descritivo, realizado com 77 mulheres nos seus locais de trabalho, em setembro-outubro de 2010. Observou-se que existem riscos ligados à saúde sexual e reprodutiva que podem propiciar o câncer de colo uterino. Há inadequação no conhecimento, porém a atitude é apropriada, pois a quase totalidade (97,4%) afirmou que faria o exame Papanicolaou com maior frequência. Portanto, é necessário engajamento dos enfermeiros na formulação de estratégias educativas que minimizem o déficit de conhecimento da população estudada sobre Papanicolaou.

Prostituição; Conhecimentos; atitudes e prática em saúde; Neoplasias do colo do útero


Al mantener relaciones con múltiples parejas y no usar preservativo, las prostitutas ponen en peligro su salud sexual y reproductiva. El objetivo del estudio fue identificar los factores de riesgo de comportamiento asociados con el cáncer de cuello uterino entre prostitutas de Picos-PI y evaluar los conocimientos, actitudes y prácticas en relación de estas mujeres con relación al Papanicolaou. Estudio exploratorio y descriptivo, realizado con 77 mujeres en sus lugares de trabajo, en septiembre/octubre de 2010. Se observó que existen riesgos directamente relacionados con la salud sexual y reproductiva de prostitutas que pueden promover la aparición del cáncer del cuello uterino. Hay una falta de conocimiento, pero la actitud es apropiada, porque casi todos dijeron que harían el examen de Papanicolaou con más frecuencia, 75 (97,4%). Por lo tanto, es necesaria la participación de las enfermeras en formulación de estrategias educativas que reduzcan al mínimo el déficit de conocimiento de la población estudiada sobre el Papanicolaou.

Prostitución; Conocimientos; actitudes y práctica en salud; Neoplasias del cuello uterino


Prostitutes' sexual relations with multiple partners and failure to use condoms compromise their sexual and reproductive health. This study aimed to identify behavioral risk factors associated with cervical cancer among prostitutes in Picos in the state of Piauí (PI) and to evaluate these women's knowledge, attitude and practice in relation to the Papanicolaou test. This study is exploratory and descriptive and was undertaken with 77 women in their workplaces in September - October 2010. Risks were observed linked to sexual and reproductive health which can lead to cervical cancer. Their knowledge is inadequate, but the attitude is appropriate, as nearly all (97.4%) asserted that they would undertake the Papanicolaou test with greater frequency. It is therefore necessary for the nurses to engage in the formulation of educational strategies which may minimize the knowledge deficit of the population studied in relation to the Papanicolaou test.

Prostitution; Health knowledge; attitudes; practice; Uterine cervical neoplasms


ARTIGO ORIGINAL

Conhecimento, atitude e prática sobre o exame papanicolaou de prostitutas

Conocimiento, actitud y prática sobre el papanicolau de prostitutas

Érica de Alencar Rodrigues NeriI; Maria Sauanna Sany de MouraII; Jardeliny Corrêa da PenhaIII; Thaís Gomes Oliveira dos ReisIV; Priscila de Souza AquinoV; Ana Karina Bezerra PinheiroVI

IEnfermeira da Estratégia Saúde da Família da Fundação Municipal de Saúde de Teresina. Teresina, Piauí, Brasil. E-mail: ericaaneri@hotmail.com

IIAcadêmica do 9º semestre de Enfermagem da Universidade Federal do Piauí. Teresina, Piauí, Brasil. E-mail: sany-sany@hotmail.com

IIIMestranda do Programa de Pós-Graduação Cuidados Clínicos em Enfermagem e Saúde da Universidade Estadual do Ceará. Bolsista CAPES. Fortaleza, Ceará, Brasil. E-mail: deinhapenha@gmail.com

IVEnfermeira. Teresina, Piauí, Brasil. E-mail: talaisamsn@hotmail.com

VDoutora em Enfermagem. Professora colaborador da Universidade Federal do Ceará (UFC). Fortaleza, Ceará, Brasil. E-mail: priscilapetenf@gmail.com

VIDoutora em Enfermagem. Professora Adjunto IV da UFC. Fortaleza, Ceará, Brasil. E-mail: anakarinaufc@hotmail.com

Correspondência Correspondência: Priscila de Souza Aquino Rua André Chaves, 568 A - Jardim América 60416-135, Fortaleza, CE, Brasil E-mail: priscilapetenf@gmail.com

RESUMO

Relações com múltiplos parceiros e não utilização do preservativo pelas prostitutas comprometem sua saúde sexual e reprodutiva. Objetivou-se no estudo identificar fatores de risco comportamentais associados ao câncer de colo uterino entre as prostitutas de Picos-PI e avaliar o conhecimento, a atitude e a prática dessas mulheres em relação ao exame Papanicolaou. Estudo exploratório e descritivo, realizado com 77 mulheres nos seus locais de trabalho, em setembro-outubro de 2010. Observou-se que existem riscos ligados à saúde sexual e reprodutiva que podem propiciar o câncer de colo uterino. Há inadequação no conhecimento, porém a atitude é apropriada, pois a quase totalidade (97,4%) afirmou que faria o exame Papanicolaou com maior frequência. Portanto, é necessário engajamento dos enfermeiros na formulação de estratégias educativas que minimizem o déficit de conhecimento da população estudada sobre Papanicolaou.

Descritores: Prostituição. Conhecimentos, atitudes e prática em saúde. Neoplasias do colo do útero.

RESUMEN

Al mantener relaciones con múltiples parejas y no usar preservativo, las prostitutas ponen en peligro su salud sexual y reproductiva. El objetivo del estudio fue identificar los factores de riesgo de comportamiento asociados con el cáncer de cuello uterino entre prostitutas de Picos-PI y evaluar los conocimientos, actitudes y prácticas en relación de estas mujeres con relación al Papanicolaou. Estudio exploratorio y descriptivo, realizado con 77 mujeres en sus lugares de trabajo, en septiembre/octubre de 2010. Se observó que existen riesgos directamente relacionados con la salud sexual y reproductiva de prostitutas que pueden promover la aparición del cáncer del cuello uterino. Hay una falta de conocimiento, pero la actitud es apropiada, porque casi todos dijeron que harían el examen de Papanicolaou con más frecuencia, 75 (97,4%). Por lo tanto, es necesaria la participación de las enfermeras en formulación de estrategias educativas que reduzcan al mínimo el déficit de conocimiento de la población estudiada sobre el Papanicolaou.

Descriptores: Prostitución. Conocimientos, actitudes y práctica en salud. Neoplasias del cuello uterino.

INTRODUÇÃO

O Câncer de Colo do Útero (CCU) é o segundo tipo de câncer mais frequente entre as mulheres, com aproximadamente 500 mil casos novos por ano no mundo, responsável pelo óbito de, aproximadamente, 230 mil mulheres por ano.1 Para o Brasil, são esperados 17.540 casos novos no ano de 2012, com um risco estimado de 17 casos a cada 100 mil mulheres. No Piauí a taxa estimada para 2012 é de 22,58 para cada 100.000 mulheres, estando acima da média nacional.2

A citologia de Papanicolaou é essencial para o reconhecimento das alterações inflamatórias e infecciosas do trato genital feminino. Configura-se como um dos principais aliados de médicos, enfermeiros e usuárias da atenção básica na detecção de lesões precursoras do câncer de colo uterino, o que aumenta a possibilidade de sucesso no tratamento imediato e minimiza o aparecimento de possíveis complicações. O Ministério da Saúde recomenda que o exame citopatológico seja realizado em mulheres de 25 a 60 anos de idade, uma vez por ano e, após dois exames anuais consecutivos negativos, a cada três anos.3

Entre os determinantes do aparecimento de lesão intraepitelial de alto grau e o câncer invasivo do colo do útero, encontra-se a infecção por Papilomavírus Humano (HPV) em associação com outros fatores de risco como tabagismo, multiplicidade de parceiros sexuais, uso de contraceptivos orais, multiparidade, baixa ingestão de vitaminas, iniciação sexual precoce e coinfecção por agentes infecciosos como o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e Chlamydia trachomatis.1

A prostituição é uma profissão antiga que sempre expôs as mulheres a diversos tipos de riscos, preconceitos e discriminação. Essa marginalização, muitas vezes, advém da baixa condição socioeconômica destas mulheres, vulnerabilidade à violência sexual, dependência química de drogas ilícitas e receio ou dificuldade na busca por informações nos serviços de saúde.

O determinante na relação sexual, no âmbito da prostituição, não é o afeto ou o desejo recíproco dos praticantes; o que está em jogo é o comércio do prazer, seja por dinheiro ou outro tipo qualquer de benefício.4

Ao manter relações com uma multiplicidade de parceiros e não tomando os devidos cuidados, a população aqui descrita compromete sua saúde sexual e reprodutiva podendo desenvolver, entre outras doenças, o CCU. Ademais, a necessidade de levantar dados sobre o conhecimento, a atitude e a prática de prostitutas sobre o câncer de colo do útero e o exame de prevenção justificam este estudo, na medida em que os achados poderão detectar vulnerabilidades e direcionar atividades de educação em saúde com esses profissionais.

Dessa forma, a pesquisa objetivou identificar fatores de risco comportamentais associados ao CCU entre as prostitutas de Picos-PI e avaliar o conhecimento, a atitude e a prática dessas mulheres em relação ao exame Papanicolaou.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo, exploratório, realizado em bares, pontos de encontro e prostíbulos, com apoio da Associação das Profissionais do Sexo do município de Picos-PI (APROSEP), responsável por palestras sobre Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e Aids, uso de preservativos e importância da realização de exame preventivo; acompanhamento da frequência de realização desse exame e distribuição de material educativo e preservativos.

A população em estudo foi constituída de 450 prostitutas cadastradas na APROSEP, e foi realizado cálculo amostral para populações finitas. Estabeleceu-se um intervalo de confiança de 95% e um erro amostral de 5%.

Fizeram parte do estudo 77 mulheres que contemplavam os critérios de inclusão estabelecidos: ser prostituta associada à APROSEP e maior de 18 anos de idade. Foram excluídas da pesquisa mulheres que apresentavam distúrbios mentais ou estavam sob efeito de drogas, bem como em exercício de suas atividades no momento da entrevista. Para participação na pesquisa, as prostitutas eram abordadas nas zonas de prostituição identificadas pela APROSEP, no período matutino, de segunda a quinta-feira, consistindo em uma amostragem não-probabilística por conveniência.

Os dados foram coletados entre os meses de setembro a outubro, utilizando-se a técnica de entrevista e o inquérito Conhecimento, Atitude e Prática (CAP) sobre o Papanicolaou. O inquérito CAP permite medir o que a população sabe, pensa e como atua em relação a determinado problema, através de um conjunto de questões elaboradas a partir das principais variáveis (causas ou efeitos), que uma dada teoria compreende enquanto determinante de um comportamento.5 O inquérito foi construído mediante leitura de outros trabalhos com populações distintas, e a partir do conhecimento dos autores.

Ao inquérito CAP foram acrescidas variáveis relacionadas às prostitutas (idade, estado civil, escolaridade, renda), bem como aos fatores de risco comportamentais (sexarca, história de DST, alcoolismo, tabagismo, uso de drogas). O instrumento foi validado por dois juízes da área de saúde sexual e reprodutiva e, após alterações, o instrumento foi testado com dez prostitutas que não participaram da pesquisa.

Foi considerado conhecimento adequado quando a prostituta já ouviu falar do exame, soube que serve para detectar câncer de colo do útero e soube citar dois cuidados a serem tomados antes do exame; conhecimento inadequado quando nunca ouviu falar do exame, ou já ouviu, mas não sabe para que serve; ou quando não soube citar dois cuidados necessários antes do exame.

Com relação à atitude, foi adequada quando a prostituta respondeu que realizaria o exame mais vezes e, pelo menos, de três em três anos; inadequada quando respondeu que não o faria com maior frequência. No que se refere à prática, foi adequada quando respondeu que se submete ao exame pelo menos de três em três anos e o realizou até esse período; inadequada quando tinha realizado o exame há mais de três anos, nunca realizou ou não lembrou a data da última consulta.

Os dados foram apresentados em tabelas ilustrativas contendo frequências absolutas e relativas e analisados sob a forma de estatística descritiva, realizada no programa Microsoft Excel for Windows®, versão 2007.

A fim de respeitar os direitos das participantes da pesquisa, o estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Piauí e aprovado sob protocolo n. 0177.0.045.000-10.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

De acordo com os dados encontrados na tabela 1, as entrevistadas apresentaram idade entre 18 e 50 anos, com uma média de 28,1 anos e predomínio de intervalo de idade entre 21 e 30 anos (51,9%), mostrando a prevalência de mulheres jovens na prostituição. Este fato é compreensível, pois a beleza e a juventude são requisitos para a comercialização do prazer sexual.6

A idade da prostituta é considerada, por elas, como uma característica que cumpre grande influência na disputa pelo cliente, principalmente durante a negociação das condições do programa. As mulheres mais velhas, por terem mais tempo de profissão, são vistas com maior experiência sexual, porém muitos clientes não exigem esta característica, desprezando-as e recorrendo às mulheres mais jovens.7

Quando questionadas sobre o estado civil, estar solteira foi a resposta que mais prevaleceu. Manter um relacionamento amoroso fixo é difícil quando se prostitui, pois o homem pode ser incapaz de tolerar esse meio de vida ou, mesmo, manter um relacionamento estável pode não ser prioridade na vida das prostitutas.

Com relação à escolaridade, foi observado que 51 delas (66,2%) tinham poucos anos de estudo, pois possuíam no máximo ensino fundamental incompleto. Além disso, 45 (58,4%) possuíam renda de até um salário mínimo, características que constantemente são associadas à carência de informações e comprometimento da manutenção de uma vida saudável. Resultado semelhante foi encontrado em estudo, no qual foi observado que 42 (51,9%) prostitutas entrevistadas apresentavam a renda mensal de 1 a 3 salários mínimos.8

Quanto aos fatores de risco comportamentais associados ao CCU, as informações foram dispostas na tabela 2, que descreve os dados relativos ao início da vida sexual, método contraceptivo, história anterior de DST, alcoolismo, tabagismo e realização do teste de HIV.

O início sexual precoce foi observado na população investigada, com média de idade de 14,8 anos. Ressalta-se que esse constitui um fator de risco comum em outros estudos com populações distintas.9 Podemos considerar como fatores de vulnerabilidade para o câncer do colo do útero o início precoce da vida sexual, a multiplicidade de parceiros, história de DST, uso prolongado de anticoncepcional oral, infecção pelo HPV, tabagismo e imunossupressão.3

A investigação do método contraceptivo utilizado é de grande importância, pois se sabe que a utilização de contracepção hormonal oral também representa um fator de risco conhecido para a ocorrência do CCU. Ressalta-se a baixa prevalência de uso do preservativo com o parceiro fixo, o que pode elevar a ocorrência de DST.

Ademais, estudo realizado em Fortaleza mostrou que a utilização de preservativo em mulheres laqueadas é extremamente baixa, 20 (7,2%) relatos.10 Assim, observa-se que as mulheres entrevistadas estão em risco de aquisição do CCU. Outro estudo também sugere uma baixa prevalência de uso do preservativo, principalmente com o parceiro fixo, em mulheres prostitutas.11

Apesar dos poucos relatos de uso do preservativo, ao serem questionadas sobre a história anterior de DST, apenas 9 (11,7%) afirmaram ter apresentado esse tipo de patologia. A baixa prevalência pode estar associada ao não conhecimento dos sintomas característicos. O diagnóstico de uma DST, muitas vezes, não é realizado, pois nem sempre as mulheres associam os sintomas a uma doença de transmissão sexual, o que aumenta os casos de subdiagnóstico.

Porém, um estudo realizado com mulheres profissionais do sexo em Umuarama-PR mostrou um resultado diferente. Nele, foram coletados sangue de 75 mulheres para pesquisa de HIV, HBsAg e sífilis e 52 delas concordaram em realizar a coleta de amostras de secreção vaginal para a pesquisa de trichomoníase, candidíase e vaginose bacteriana. Assim, observou-se que 24 (32%) apresentavam alguma das DST estudadas.12

O uso de bebidas alcoólicas foi declarado por 63 (81,8%) prostitutas. Este percentual tão alto pode ser explicado por fatores como o comprometimento com donos de bares a estimular o consumo pelos clientes, ou mesmo a necessidade de utilizar o álcool como instrumento de fuga às dificuldades encontradas no trabalho.13 Ademais, o álcool pode causar dependência e afeta as funções mental, neurológica e emocional. A ingestão regular de bebidas alcoólicas induz ao esquecimento, além de riscos como a não utilização de preservativos.14

O tabagismo foi observado em 45 (58,4%) entrevistadas. Estudo verificou a prevalência de tabagismo em 56,7% das prostitutas incluídas na pesquisa.6 Observando tais resultados, percebe-se que é comum o consumo de tabaco entre essas mulheres, um fato preocupante, pois se sabe que o cigarro contém inúmeras substâncias tóxicas, podendo trazer malefícios irremediáveis como diversos tipos de câncer, dentre eles, o de colo do útero.

O tabagismo atua na oncogênese do epitélio cervical pela depressão da imunocompetência local e o risco está diretamente relacionado à quantidade de cigarros fumados.15,3 Neste estudo, das 45 mulheres que referiram tabagismo ativo, 23 (51,1%) assumiram fumar entre 20 e 40 cigarros por dia.

Verificou-se também a realização de teste anti-HIV, pois essa atitude pode revelar o risco percebido, seja pela multiplicidade de parceiros inerente à profissão, ou mesmo pela não utilização do preservativo nas práticas sexuais. Foram encontradas 64 (83,1%) mulheres que já haviam se submetido ao exame. O teste anti-HIV não pode ser confundido com prevenção, pois é apenas uma das etapas do processo diagnóstico. A prevenção pressupõe busca de informações, uma profunda reflexão sobre riscos e sua relação com a vida do sujeito, e a constante discussão sobre sexo, prazeres, responsabilidade, poder e autonomia para tomar decisões.16

Por fim, foram investigadas as variáveis relacionadas ao conhecimento, atitude e prática das prostitutas em relação ao exame Papanicolaou, informações dispostas na tabela 3.

Quando indagadas se já tinham ouvido falar no exame de prevenção, 76 (98,7%) responderam que sim. Porém, 30 (38,9%) não souberam informar para que serve o exame, 21 (27,3%) não sabiam que doença detectava e 7 (9,1%) referiram servir para prevenir o CCU.

Pesquisa encontrou resultado semelhante quando indagou a 250 mulheres se já tinham ouvido falar no exame, pois 246 (98,4%) responderam que sim. A resposta que mais se sobressaiu quanto ao objetivo do exame foi que servia para prevenir CCU, 137 (54,8%), seguida de detectar ou prevenir aids, 40 (42,1%).17 O conhecimento acerca do exame Papanicolaou também foi investigado em uma pesquisa realizada em Rio Grande do Norte, com mulheres de 15 a 69 anos, com prevalência observada de 46,1% de conhecimento adequado, bem acima dos dados obtidos no presente estudo com prostitutas.18

Preocupa o fato dessas mulheres desconhecerem a finalidade do exame, o que pode dificultar a sua busca periodicamente. A finalidade principal do exame é a detecção precoce do câncer de colo do útero, ou seja, quando ainda não se tornou invasor. Contudo, a análise microscópica e testes laboratoriais, aliados ao exame clínico durante a realização do Papanicolaou não deixam de propiciar a detecção de DST.3

Apesar do exame de prevenção não ter como intuito inicial a detecção e cura de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) é por causa dessas patologias que a maioria das mulheres procura o serviço de saúde, possibilitando assim que os profissionais atuem na investigação, prevenção, tratamento e acompanhamento de outros agravos, incluindo o CCU.19

Quanto aos cuidados que deveriam ser tomados antes do exame, a maioria das prostitutas, 43 (55,8%), não soube citar sequer um cuidado. Um episódio alarmante, pois se imagina que quem não sabe, não o pratica. A ausência dos cuidados antes do exame pode causar alteração nos resultados, tanto por dificultar o procedimento, quanto por dificultar a leitura das lâminas, gerando problemas que podem envolver frustrações por parte da cliente e o não retorno para repetição do exame.

Entre as que responderam sobre os cuidados, 21 (27,3%) fizeram referência apenas à abstinência sexual. Achar que há necessidade de um tempo prolongando de abstinência pode servir de desestímulo à realização regular do exame pelas prostitutas, pois implica diminuição da renda, visto que ter relações sexuais com penetração é a característica principal dos seus trabalhos. Referiram cuidados errôneos cinco (6,5%) entrevistadas.

Estudo realizado com 120 mulheres de uma unidade básica de saúde de Natal-RN evidenciou que os cuidados mais citados foram: não ter relações sexuais na véspera do exame (42%), não usar pomada ou comprimido vaginal (33%) e não estar menstruada (17%).20

Outros cuidados precisam ser de conhecimento das mulheres, como não realização de exames intravaginais ou duchas 48 horas antes da coleta, evitar relações sexuais 48 antes do exame, evitar utilizar anticoncepcionais locais ou espermicidas 48 horas antes do exame e aguardar o 5º dia após o término da menstruação.3

Dessa forma, percebe-se a necessidade de uma intervenção educativa direcionada às mulheres para os cuidados prévios à sua coleta, visto que a negligência dos mesmos interfere na realização do exame, bem como no seu resultado, sabendo-se que esses cuidados referidos devem ser do conhecimento de todas as mulheres que o realizam.20

Portanto, na avaliação proposta, apenas uma (1,3%) prostituta foi classificada com conhecimento adequado, pois somente ela respondeu adequadamente a todas as perguntas de análise do conhecimento, ou seja, mencionou que ouviu falar do exame, que serve para detectar CCU e citou dois cuidados antecedentes ao exame.

Esse percentual de adequação do conhecimento foi extremamente baixo quando comparado com outros estudos. Estudo realizado no Peru com 501 pacientes observou que 53 (10,6%) possuíam alto conhecimento sobre o Papanicolaou.21 O desconhecimento sobre a importância do exame pode predispor as mulheres a não realizá-lo periodicamente.

Com relação à atitude, foi considerada adequada em 75 (97,4%) casos, nos quais as entrevistadas afirmavam que se pudessem fariam o exame de prevenção com maior frequência, sendo que 65 (84,4%) fariam mais de uma vez por ano e 10 (13%) fariam uma vez por ano. Apesar da predominância de conhecimento deficiente sobre o exame, as prostitutas entrevistadas acreditam ser um exame importante para suas saúdes.

Foi investigado também o motivo pelo qual elas fariam o exame com maior frequência, sobressaindo-se que fariam simplesmente por cuidado, 29 (38,6%) ou por prevenção de doenças, 23 (30,6%). Citaram como motivo a prevenção de CCU apenas 6 (8%) e a profissão que exercem, 5 (6,6%). Cabe ressaltar que algumas não souberam se expressar e que também apareceram outros motivos, como: a não utilização do preservativo com o parceiro fixo, medo de adquirir doenças, de transmiti-las aos filhos e de um só exame não detectar a doença. Esses dados apenas reforçam o desconhecimento das prostitutas sobre a finalidade do Papanicolaou.

Inquérito CAP realizado mostrou que 169 (63,3%) mulheres entrevistadas apresentaram atitude adequada ao expressarem de forma consciente o reconhecimento de suas vantagens e benefícios e justificando corretamente a importância de fazê-lo periodicamente.18 Já a prevalência de atitude adequada sobre o Papanicolaou foi de 28% em estudo com mulheres de Fortaleza, o que pode estar relacionado aos critérios utilizados como parâmetro para a classificação.17 A atitude adequada pode influenciar uma prática condizente, porém, não a garante, o que justifica as divergências entre atitude e prática encontrada no estudo.

No que se refere à prática, 62 (80,5%) afirmaram que fazem o exame pelo menos de três em três anos, o que está de acordo com o que recomenda o Ministério da Saúde, em caso de dois exames anuais consecutivos negativos.3 Todavia, seis (7,8%) nunca o fizeram e cinco (6,5%) só o fazem quando apresentam algum sintoma. Das entrevistadas, 65 (84,4%) disseram que haviam realizado o último exame há menos de três anos, indicando que, diante da população entrevistada, a cobertura do Papanicolaou superou a meta de 80% estabelecida pelo Pacto pela Vida, de 2006.22

A frequência de realização mais encontrada foi de mais de uma vez por ano, 26 (33,8%), seguida de uma vez por ano, 21 (27,3%). A prática foi considerada adequada em 62 (80,5%) casos. Os estímulos e orientações dados pela presidente e educadoras sociais da APROSEP podem ter contribuído significativamente para este resultado positivo. Não obstante, o trabalho deve ser incessante no sentido de sensibilizar essas mulheres sobre a importância do exame, visto que muitas ainda possuem atitude inadequada frente ao mesmo. Em Fortaleza, 67,6% das mulheres entrevistadas apresentaram prática adequada com relação ao exame Papanicolaou.17

O Papanicolaou é um exame simples, de baixo custo, de fundamental importância para que possamos diminuir a incidência e a mortalidade por CCU. Mesmo assim, muitas mulheres ainda são resistentes à sua realização por medo, manter ou constrangimento diante da exposição de suas partes íntimas.23

Ademais, estudos têm mostrado que a falta de paciência e diálogo com as pacientes durante a consulta ginecológica tem contribuído para diminuição da procura pelo serviço de saúde para realizar a prevenção do câncer cervical. Isso é uma realidade bem comum quando o atendimento é realizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS).24

Assim, percebe-se a importância de estratégias de educação em saúde com vistas a alcançar resultados eficientes no controle do câncer ginecológico. O enfermeiro, muitas vezes, é o responsável direto pela realização do exame colpocitológico nas unidades de saúde, mas apesar de sua formação voltada à promoção da saúde, tem-se observado distanciamento das atividades educativas em detrimento das consultas, o que é alarmante para a profissão.17

CONCLUSÕES

O estudo evidenciou que as prostitutas têm conhecimento inadequado sobre o exame de Papanicolaou, pois a maioria já ouviu falar no exame, mas não sabe ao certo a sua finalidade e nem os cuidados necessários que devem ser adotados antes de realizá-lo. Contrastando com este resultado, observou-se uma atitude especialmente apropriada, pois a quase totalidade afirmou que faria o exame com mais frequência e, no máximo, uma vez por ano, demonstrando a crença na importância do mesmo para a manutenção de sua saúde, mesmo possuindo baixo conhecimento sobre ele. A prática foi considerada adequada em 76,6% das entrevistas. Este foi o percentual de prostitutas que mencionou fazer o exame em uma frequência de, no máximo, três em três anos, ao mesmo tempo em que afirmaram que o último exame foi realizado há menos de três anos.

Com isso, infere-se que o fato de grande parte das mulheres referir ter realizado o exame há menos de três anos é animador, pois indica uma boa cobertura de exames em uma população que se mostrou convivendo com fatores de riscos para o desenvolvimento do câncer de colo do útero.

Entre os fatores de riscos presentes no cotidiano das mulheres que se prostituem, além da multiplicidade de parceiros, observaram-se como mais frequentes: baixa condição socioeconômica, início sexual precoce e tabagismo. O uso de contraceptivos orais, também considerado como fator de risco para o CCU, foi referido por poucas entrevistadas. Ademais, mesmo com a intensa vulnerabilidade das prostitutas, notificou-se que os relatos de DST foram escassos.

Os dados apresentados favorecem o conhecimento das vulnerabilidades associadas às prostitutas, relacionadas principalmente ao câncer de colo uterino, o que pode contribuir para direcionar ações dos profissionais de enfermagem, na busca pela promoção da saúde sexual dessas mulheres, principalmente relacionadas ao objetivo do exame e cuidados preconizados antes da coleta. Destarte, os resultados mostram a necessidade de maior engajamento dos gestores na formulação de estratégias educativas que minimizem o déficit de conhecimento da população estudada acerca do Papanicolaou, papel primordial também do profissional de enfermagem.

Assim, espera-se que este estudo possa contribuir para mudar a realidade observada, bem como servir de precursor para a realização de mais pesquisas acerca dessa temática, a fim de prevenir o câncer de colo de útero, especialmente em grupos com mais condições de vulnerabilidade. Novos estudos precisam ser realizados, a fim de estimar a ocorrência da adequabilidade de conhecimento, atitude e prática em outras regiões do país.

Recebido: 21 de Março de 2012

Aprovação: 20 de Dezembro de 2012

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  • Correspondência:

    Priscila de Souza Aquino
    Rua André Chaves, 568 A - Jardim América
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Out 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013

    Histórico

    • Recebido
      21 Mar 2012
    • Aceito
      20 Dez 2012
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