Acessibilidade / Reportar erro

Desenvolvimento de recursos humanos para atuar nos serviços de saúde mental

Desarrollo de recursos humanos para actuar en los servicios de salud mental

Resumos

O objetivo deste estudo foi compreender os aspectos relacionados à formação e capacitação dos profissionais que atuam nos serviços de saúde mental no interior do Estado de Goiás, Brasil, sob o ponto de vista dos coordenadores destes serviços. Trata-se de pesquisa qualitativa, com a participação de 19 coordenadores. Os dados foram submetidos à análise temática de conteúdo com o auxílio do software ATLAS-ti. As categorias temáticas que emergiram da análise de conteúdo foram: características dos profissionais para atuar em saúde mental; o trabalho em equipe e interdisciplinaridade como modelo de gestão em serviço; a formação acadêmica dos profissionais; a prática profissional e a educação permanente; e a inserção no mercado de trabalho. Consideramos emergente a necessidade de desenvolver pessoas, segundo o modelo psicossocial, para atuar nos serviços de saúde mental e garantir vínculos de trabalhos favoreçam a qualificação e a assistência.

Serviços de saúde mental; Gestão em saúde; Recursos humanos; Educação continuada; Saúde mental


El objetivo de este estudio fue comprender los aspectos relacionados con la formación y capacitación de los profesionales que trabajan en los servicios de salud mental en el Estado de Goiás, Brasil, desde el punto de vista de los coordinadores de estos servicios. Esta es una investigación cualitativa, con la participación de 19 coordinadores. Los datos fueron sometidos al análisis de contenido temático, con la ayuda del software Atlas-ti. Los temas que surgieron del análisis de contenido fueron: características de los profesionales que trabajan en salud mental; trabajo en equipo e interdisciplinario como un modelo de gestión en el servicio; los profesionales académicos; la práctica profesional y la educación continua; y la inserción en el mercado laboral. Consideramos reciente la necesidad de capacitar personas, de acuerdo con el modelo psicosocial, para trabajar en los servicios de salud mental y garantizar la vinculación trabajos que promuevan la calificación y asistencia.

Servicios de salud mental; Gestión en salud; Recursos humanos; Educación continua; Salud mental


The aim of this study was to understand aspects related to training and capacity-building of professionals working in mental health services within the State of Goiás, Brazil, from the point of view of the coordinators of these services. This is qualitative research, with the participation of 19 coordinators. The data was subjected to thematic content analysis with the help of Atlas-ti software. The themes that emerged from the content analysis were: characteristics of professionals to work in mental health; teamwork and interdisciplinarity as a care management model; academic training of professionals; professional practice and continuing education; and insertion into the work market. The study considers the emerging need to develop people, according to the psychosocial model, to work in mental health services and ensure work contracts that favor qualification and assistance.

Mental health services; Health management; Human resources; Continuing education; Mental health


ARTIGO ORIGINAL

Desenvolvimento de recursos humanos para atuar nos serviços de saúde mental

Desarrollo de recursos humanos para actuar en los servicios de salud mental

Nathália dos Santos SilvaI; Elizabeth EsperidiãoII; Ana Caroline Gonçalves CavalcanteIII; Adrielle Cristina Silva SouzaIV; Kelly Kan Carvalho da SilvaV

IMestre em Enfermagem. Enfermeira Analista em Saúde da Gerência de Saúde Mental da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás. Goiás, Brasil. E-mail: silvans09@gmail.com

IIDoutora em Enfermagem Psiquiátrica. Professora Adjunto da Faculdade de Enfermagem (FEN) da Universidade Federal de Goiás (UFG). Goiás, Brasil. E-mail:betesper@ufg.br

IIIEnfermeira. Goiás, Brasil. E-mail: anagcavalcante@gmail.com

IVMestranda do Programa de Pós-graduação em Enfermagem/FEN/UFG. Goiânia, Goiás, Brasil. E-mail: drica_140@hotmail.com

VEnfermeira. Goiás, Brasil. E-mail: kkellynhaa@yahoo.com.br

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Elizabeth Esperidião Rua 3, 921, ap. 1400, Edifício Solar Vila Rica 74115-050 - Setor Oeste, Goiânia, GO, Brasil E-mail: betesper@ufg.br

RESUMO

O objetivo deste estudo foi compreender os aspectos relacionados à formação e capacitação dos profissionais que atuam nos serviços de saúde mental no interior do Estado de Goiás, Brasil, sob o ponto de vista dos coordenadores destes serviços. Trata-se de pesquisa qualitativa, com a participação de 19 coordenadores. Os dados foram submetidos à análise temática de conteúdo com o auxílio do software ATLAS-ti. As categorias temáticas que emergiram da análise de conteúdo foram: características dos profissionais para atuar em saúde mental; o trabalho em equipe e interdisciplinaridade como modelo de gestão em serviço; a formação acadêmica dos profissionais; a prática profissional e a educação permanente; e a inserção no mercado de trabalho. Consideramos emergente a necessidade de desenvolver pessoas, segundo o modelo psicossocial, para atuar nos serviços de saúde mental e garantir vínculos de trabalhos favoreçam a qualificação e a assistência.

Descritores: Serviços de saúde mental. Gestão em saúde. Recursos humanos. Educação continuada. Saúde mental.

RESUMEN

El objetivo de este estudio fue comprender los aspectos relacionados con la formación y capacitación de los profesionales que trabajan en los servicios de salud mental en el Estado de Goiás, Brasil, desde el punto de vista de los coordinadores de estos servicios. Esta es una investigación cualitativa, con la participación de 19 coordinadores. Los datos fueron sometidos al análisis de contenido temático, con la ayuda del software Atlas-ti. Los temas que surgieron del análisis de contenido fueron: características de los profesionales que trabajan en salud mental; trabajo en equipo e interdisciplinario como un modelo de gestión en el servicio; los profesionales académicos; la práctica profesional y la educación continua; y la inserción en el mercado laboral. Consideramos reciente la necesidad de capacitar personas, de acuerdo con el modelo psicosocial, para trabajar en los servicios de salud mental y garantizar la vinculación trabajos que promuevan la calificación y asistencia.

Descriptores: Servicios de salud mental. Gestión en salud. Recursos humanos. Educación continua. Salud mental.

INTRODUÇÃO

A atenção em saúde mental no Brasil, nas últimas três décadas, tem passado por mudança de paradigma assistencial iniciada com a Reforma Psiquiátrica. A desinstitucionalização, um dos seus pilares principais desse movimento, é compreendida para além das medidas relativas à desospitalização e que inclui a reinserção social e a quebra de estigmas.1

Após mais de 20 anos de reivindicações iniciadas pelo Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental, que foram impulsionados pelo Movimento pela Reforma Sanitária, na década de 1980,1 o Brasil conquistou mudança significativa na legislação de saúde mental, com a promulgação da Lei n. 10.216/2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais.2

A Política Nacional de Saúde Mental (PNSM), no Brasil, sustentada por esta lei, segue a tendência mundial de organização de práticas comunitárias de cuidado em substituição aos procedimentos institucionalizados para tratamento. A PNSM propõe diversos dispositivos para a atenção em saúde mental que devem ser articulados em rede, cujos atendimentos deverão ser realizados em Centros de Atenção Psicossocial (CAPSs), Residências Terapêuticas, Ambulatórios, Hospitais Gerais, Centros de Convivência e Núcleos de Atenção Psicossocial.2

A propositura da PNSM busca garantir a livre circulação das pessoas com transtornos mentais pelos serviços, comunidade e cidade, além de prever cuidados com base nos recursos que a comunidade tem de acordo com modelo psicossocial.2

É importante reconhecer a complexidade do modelo de atenção psicossocial, cujas ações dos profissionais dos serviços de saúde mental são norteadas pelo estabelecimento de vínculos afetivos e profissionais entre as pessoas, com vistas ao resgate da cidadania, além de enfatizar a importância da inclusão da família no tratamento e na reabilitação. Tais pressupostos tiram a ênfase das práticas de intervenção sobre a doença, da fragmentação do cuidado e da hegemonia do saber psiquiátrico, passando a considerar o sujeito em sofrimento psíquico no seu contexto cultural, familiar e social.2-3

A Reforma Psiquiátrica, ao questionar as práticas de exclusão social e cronificação da doença, reorienta a assistência para a comunidade e direciona as ações para a promoção de reinserção social e exercício da cidadania.4

Assim, a organização dos serviços foi alterada e possibilitou a inserção de outros atores e categorias profissionais na assistência em saúde mental, emergindo a necessidade da equipe de saúde atuar na perspectiva interdisciplinar,4-6 pautada na responsabilidade e no vínculo terapêutico para atender a integralidade do sujeito e promover reabilitação psicossocial.7 A despeito disto, não se pode afirmar que as práticas em saúde mental acompanharam esta mudança paradigmática, porque ainda é possível encontrar, nos serviços, práticas focalizadas na dimensão orgânica, de delimitação individual e médico-centrada.8

Muitas vezes, a atuação dos profissionais nos CAPS ainda é voltada para a doença como objeto de trabalho, embora esse serviço seja, essencialmente, um dispositivo pautado no paradigma psicossocial.9

A mudança de paradigma e das práticas em saúde mental gera nos profissionais sentimentos de angústia relacionado ao novo. O modelo de atenção psicossocial rompe com a prática tradicionalmente instituída que, via de regra, é reproduzida nos cursos de formação, colocando em questão a própria identidade do profissional.10

Tais transformações, na esfera da atenção em saúde mental, no país, despertaram a necessidade de discutir os rumos da formação dos profissionais na área; fato considerado como um grande desafio aos profissionais da prática e da academia, na medida em que depende de esforço coletivo para a implementação de políticas públicas que favoreçam avanços significativos na área.11

Apesar de, no Brasil, vários segmentos terem se mobilizado e construído novas experiências de assistência à saúde mental, isso não se deu de forma única no tempo e no espaço. Houve uma expansão de serviços públicos especializados sem, no entanto, ter sido acompanhada pela oferta de capacitação compatível para os profissionais, gerando uma carência de profissionais qualificados na área.12

Ante o exposto, o objetivo deste estudo foi compreender os aspectos relacionados à formação e capacitação dos profissionais que atuam nos serviços de saúde mental no interior do Estado de Goiás, Brasil, sob o ponto de vista dos coordenadores destes serviços.

METODOLOGIA

Estudo de natureza descritiva e abordagem qualitativa, desenvolvido em todos os CAPSs no interior do Estado de Goiás habilitados até dezembro de 2010.

Para possibilitar a entrada em campo, todos os Secretários de Saúde dos municípios envolvidos foram comunicados pela Gerência de Saúde Mental da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás sobre a presente investigação. Posteriormente, as pesquisadoras contataram os coordenadores dos respectivos serviços, oficializando o convite de participação para posteriormente agendar as datas da coleta de dados.

Os dados foram obtidos no período de fevereiro a maio de 2011, junto aos coordenadores técnicos dos CAPSs, totalizando 19 municípios e 22 serviços. Um dos CAPSs não possuía coordenador técnico e dois coordenadores não estavam presentes nos serviços no momento da coleta. Sendo assim, 19 coordenadores participaram da pesquisa.

Após a aquiescência dos participantes, devidamente registrada no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, procederam-se às entrevistas individuais, que foram orientadas por roteiro semiestruturado, com questões norteadoras que visavam identificar, dentre outros aspectos, o entendimento dos coordenadores sobre políticas da saúde mental no Brasil e suas repercussões sobre os serviços e categorias profissionais que atuam nos serviços. Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra, tendo sido submetidas à análise temática de conteúdo,13 com o auxílio do software ATLAS-ti, versão 6.2.

Tal procedimento teve como foco encontrar núcleos de sentido na comunicação apresentada pelo material estudado, verificando sua frequência relacionada ao objetivo do estudo. Assim, a organização da análise girou em torno de três momentos: 1) a pré-análise, fase em que ocorreu a organização e leitura das transcrições, o que corresponde ao plano de análise; 2) a exploração do material, fase em que se procurou identificar e codificar todas as citações pertinentes ao objetivo da pesquisa e agrupá-las por semelhanças de sentido, utilizando-se o ATLAS-ti; e 3) tratamento dos resultados obtidos e interpretação, em que os resultados brutos foram categorizados e tratados de maneira a serem significativamente validados.13

As categorias temáticas que emergiram do processo de análise foram discutidas com base nos documentos oficiais e na literatura sobre o tema.

Os relatos dos participantes foram codificados no software ATLAS-ti e a referência da citação é formada pelo número do sujeito, seguido do número de ordem do núcleo temático no documento transcrito.

Todos os procedimentos éticos foram obedecidos de acordo com a Resolução CONEP 196/96, que normatiza pesquisa com seres humanos, e o trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Goiás, com protocolo n. 303/10.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Características dos profissionais para atuar em saúde mental

Os coordenadores dos CAPSs destacam a importância do conhecimento teórico sobre saúde mental, embora não seja suficiente para direcionar as práticas de estabelecimento de vínculo e responsabilização no território, segundo preconiza o modelo de atenção psicossocial. Os temas mencionados pelos entrevistados relacionam-se à Reforma Psiquiátrica, à PNSM, tecnologias de cuidado e/ou psicopatologia, considerando fundamental o desenvolvimento de habilidades e atitudes para atuar em saúde mental, como capacidade de formação de vínculo, afinidade com a área, saber trabalhar em equipe, e ter consciência coletiva e de participação social.

[...] nem todo mundo que entra tem habilidades ou preparo emocional para trabalhar com transtorno mental. Não basta você ter só conheciment, tem que ter visão, [...] tem que gostar, tem que adquirir um vínculo para ficar nessa área (3:6).

O profissional que atua pensando em fazer somente o seu trabalho, aquilo que ele aprendeu na faculdade, se for só isso, ele não está dando a contribuição para as futuras gerações também. A gente, enquanto ator social, tem que pensar em construções coletivas [...]. Uma coisa é você não ter noção, não ter curso, e uma coisa é você conviver e adquirir experiência, mas para isso acontecer, o profissional tem que querer [...]. Trabalhar no CAPS, na saúde mental, é um exercício de luta (8:6:36).

[...] uma das coisas que atrapalha o serviço é essa política da indicação. Eu acho que não deveria acontecer, tinha que ser proibido. A pessoa da saúde mental tem que ter perfil. A maioria das pessoas que trabalham não tem formação, mas tem dom, tem perfil (5:21).

Segundo o modelo psicossocial, a responsabilidade no trabalho exige do profissional atitude de crítica ao modelo asilar, já que ele também é sujeito do processo de mudança paradigmática e, portanto, demanda maior envolvimento e comprometimento com as práticas substitutivas.3

Os usuários e familiares também são protagonistas das mudanças no campo da saúde mental, embora sejam os profissionais de saúde os responsáveis por direcionar este processo. Com este sentido, a relevância da consciência da coletividade e cidadania6 foi mencionada por um dos coordenadores.

Atrelado à formação profissional, os coordenadores enfatizaram que para atuar em saúde mental é fundamental ter afinidade com a área. Do ponto de vista dos coordenadores seria interessante que o profissional tivesse um perfil para trabalhar na saúde mental, considerando a sua especificidade.

[...] não sei se nós da saúde mental somos muito felizes ou muito infelizes. Felizes porque nós da saúde mental somos peças raras no mercado e somos infelizes porque ninguém olha pra gente, para o nosso trabalho, para o nosso serviço [...] (5:15).

[...] agora vai depender muito dele... então é envolvimento da pessoa com o serviço, sabe, então acho que não é a categoria [profissional] da pessoa. Então se nós pudéssemos ter uma seleção curricular ou um perfil do profissional para trabalhar nesses serviços, a gente ganharia muito (10:27).

O perfil referido pela maioria dos coordenadores se relaciona ao uso de ferramentas relacionais e desenvolvimento de habilidades e atitudes terapêuticas, voltados aos atos de escuta, acolhimento, disponibilidade e compromisso para com o outro.14

O trabalho no CAPS exige dos profissionais disponibilidade para ouvir, dialogar e compartilhar saberes e práticas com os usuários, familiares e equipe multiprofissional.3

O trabalho em equipe e interdisciplinaridade como modelo de gestão em serviço

O trabalho em saúde mental, necessariamente, deve ocorrer em equipe, embora esta nem sempre seja uma tarefa fácil. Os coordenadores entendem o trabalho dos profissionais como multiprofissional, mas não há uma definição de papeis e destacam a importância da interdisciplinaridade.

Em princípio, a equipe deixa de ser um conjunto de categorias específicas para formar um novo coletivo, de forma interdisciplinar e responsável por atender as diferentes demandas e dimensões dos sujeitos em sofrimento mental.15 A interdisciplinaridade não propõe abolir as especificidades, busca a interação entre as categorias profissionais sem perder a especificidade.3

Apesar de cada um ter atribuições inerentes, as propostas que têm alguma interface são decididas em reuniões de equipe, de maneira muito democrática (4:17).

[...] para definir responsabilidades com relação à equipe do CAPS é muito complicado. Porque ela tem que ter uma cumplicidade da interdisciplinaridade. Nós já tivemos alguns profissionais que não se identificaram com essa ideia e não conseguiram executar nenhum trabalho. A responsabilidade de cada um aqui é com todos os serviços, caso contrário a equipe não funciona (14:19).

O que se observa na prática assistencial é que nem sempre os profissionais conseguem trabalhar na perspectiva da interdisciplinaridade, em que o trabalho em equipe tem o sentido de complementação e não de sobreposição ou hierarquia de disciplinas. A despeito dos coordenadores visualizarem as atividades conjuntas do campo da saúde mental, não identificam as atividades específicas de cada categoria profissional.

[...] eu falei que todo mundo faz o serviço de todo mundo, mas na área específica cada um tem a sua área [...] a gente não tem uma linha assim 'essa aqui é a função do psicólogo, essa é função do assistente social' (7:11:15).

As práticas de saúde deveriam ser pautadas na integralidade do cuidado. A equipe multiprofissional que procura trabalhar de forma interdisciplinar em locais de tratamento diversificados deve estar focada não mais na doença, mas no sofrimento existencial do sujeito e na sua relação com a sociedade. O meio social do indivíduo e a visão da família devem ser considerados na reabilitação psicossocial e a reintegração sociocultural dos sujeitos em sofrimento psíquico.15

Com relação à equipe multidisciplinar, os coordenadores referem a dificuldade em inserir os médicos nas reuniões de equipe. A observação advinda de experiência profissional permite constatar que esta é uma realidade em vários serviços de saúde, em que o médico desenvolve seu trabalho sem compartilhar suas experiências com a equipe e, consequentemente, deixa de tomar conhecimento e acompanhar as práticas terapêuticas por ela empreendidas.

A formação profissional, especialmente em nível de graduação, deveria enaltecer o trabalho em equipe entre tais categorias, compreendendo a importância da integralidade do cuidado em saúde mental. No entanto, a formação ainda vem ocorrendo de maneira isolada, sem preparar os profissionais para o trabalho interdisciplinar e intersetorial.8,12

[...] a gente sabe que deveria interagir mais [...], mas infelizmente a gente não consegue colocar o médico diante de todas as funções que a equipe tem (3:11).

Além disto, os coordenadores destacam algumas diferenças no regime de trabalho e condições salariais entre os médicos e as demais categorias, as quais dificultam a realização do trabalho em equipe.

Há insatisfação dos profissionais com o salário, especificamente daqueles que se dedicam à área de Saúde Mental, quando comparados com outros núcleo de atuação, particularmente, o da medicina, em que os profissionais são mais bem remunerados.5

A formação acadêmica dos profissionais

Existem vários entraves para a efetivação da PNSM no estado de Goiás e, dentre eles, destaca-se a formação dos profissionais em desalinho com as propostas desta política. Os profissionais de saúde recebem, geralmente, formação fragmentada que não possibilita a visão integralizada do indivíduo e na maioria das vezes desarticulada com a prática profissional desenvolvida nos serviços de saúde.

[...] uma coisa que eu acho fundamental nesse aprimoramento é a própria formação desses profissionais, de como trabalhar na saúde mental. Hoje existe uma deficiência muito grande de arsenal terapêutico, de constituição de um modelo que seria individual, mas que seja no coletivo. Que consiga atender as necessidades individuais para se fazer em conjunto (4:23).

Um dos motivos da carência do conhecimento das novas práticas instituídas no campo da Saúde Mental se relaciona ao fato de os cursos de graduação estarem voltados para o modelo biológico e medicamentoso, e não atualizarem as formas de atenção à saúde.12 Neste tocante, é frequente encontrar nos serviços, a despeito de terem surgido em função da reforma psiquiátrica, práticas como a fragmentação do cuidado, a centralidade do médico na tomada de decisões e a hegemonia do saber psiquiátrico sobre as práticas de promoção de cidadania, saúde e reinserção.8

A academia tem se esforçado para contemplar a discussão das questões da saúde mental, seja nas disciplinas de graduação, nos cursos de pós-graduação e nas pesquisas. Entretanto, historicamente, elas não deram conta da grande demanda por qualificação específica para trabalhar na perspectiva da Reforma Psiquiátrica.12

A articulação do diálogo entre as diferentes categorias poderia ser refletida durante a graduação. A formação profissional, ainda vem ocorrendo de maneira isolada sem preparar os profissionais para o trabalho interdisciplinar.8 A real interdisciplinaridade ocorreria de forma mais natural se o seu conceito e importância fossem vivenciados desde a graduação, integrando os alunos de diferentes áreas de saúde na prática clínica, incentivando o raciocínio clínico conjunto e a discussão dos saberes em benefício da assistência.

Os coordenadores destacam a necessidade de adequação dos currículos e disciplinas oferecidas nos cursos de graduação em saúde para nortear as ações do futuro profissional, destacando a premência deste cuidado também para a área da saúde mental.

[...] uma disciplina para formação de profissionais para a saúde mental. Precisaria disso nas universidades, nos cursos de graduação. Os profissionais precisam já sair com um pouquinho de teoria para essa área [...] porque senão fica muito inseguro - 'o que eu posso ver? O que eu não posso? Até onde eu vou? Até onde não?' - entendeu? [...] (6:10:11).

[...] no serviço, no dia-a-dia que eu estou aprendendo mais sobre o serviço de saúde mental. Na faculdade foi muito por cima, eu fiquei lá no hospital [psiquiátrico] uma semana só de estágio, então foi muito rápido. Passei pelo CAPS também... um dia! Então, o estágio foi muito rápido (2:2).

Os coordenadores apontam para a superficialidade com que a saúde mental é abordada durante e graduação e a pouca aproximação com os serviços substitutivos durante os estágios e ou aulas práticas. A exposição a conteúdos curriculares pertinentes sobre esta área torna mais provável que os estudantes desenvolvam atitudes positivas às pessoas com transtornos mentais.

Entretanto, a formação deve estar associada à prática clínica supervisionada em serviços públicos da rede substitutiva e na lógica transdisciplinar, procurando evitar os hospitais psiquiátricos como cenário de prática.7,12 Vale destacar também que a aproximação do aluno com os serviços sensibiliza o futuro profissional para a abrangência da rede social em que o sujeito está inserido.

Tais resultados também remetem à reflexão do panorama educacional brasileiro que, nos últimos anos, evidencia-se grande expansão de vários cursos de graduação. Sabe-se, entretanto, que nem todos eles oferecem minimamente os conteúdos engajados ao cenário assistencial e o mais preocupante, deixam de oportunizar experiências no processo ensino aprendizagem in loco. Restringem o contato dos alunos a visitas técnicas e deveriam priorizar momentos de vivências práticas importantes para que o futuro profissional as incorpore no seu repertório de aprendizado.

Outro aspecto que não pode ser desconsiderado é a formação e preparo dos formadores. Muitos deles têm poucas experiências com atual modelo de assistência, deixam de se atualizar e se limitam ao repasse de ideias estigmatizadas sem estimular a busca de novos conhecimentos por parte dos alunos, instigando-os a saírem do lugar comum no contexto da assistência em pleno momento de transição.

A prática profissional e a educação permanente

A questão da educação permanente para os profissionais que atuam nos CAPSs foi uma questão referenciada por todos os sujeitos desta pesquisa e está relacionada à qualidade das atividades oferecidas nesses serviços. Na medida em que ocasiões de educação permanente deixam de existir, considerou-se que a efetivação de PNSM fica prejudicada, pois estas oportunizam discussões e medidas inerentes ao exercício profissional.

A adequação dos conteúdos curriculares nos cursos de graduação da área da saúde foi mencionada pelos coordenadores diante da necessidade de capacitação e atualização dos profissionais.

A educação permanente tem como princípio promover a aprendizagem significativa na capacidade de transformar a prática dos trabalhadores de saúde mental e que acontece nos serviços, a partir dos problemas do cotiditano.16

A grande necessidade de educação permanente em saúde mental decorre, primeiramente, da especificidade desta área do conhecimento no setor da saúde; também, porque muitos profissionais de saúde inseridos nos serviços tiveram sua formação acadêmica anterior ao processo da Reforma Psiquiátrica; por último, porque a academia não conseguiu, ao longo do tempo, trabalhar a temática em consonância à PNSM.

O Ministério da Saúde enfoca que a qualificação dos profissionais de saúde deve favorecer a formação segundo a lógica psicossocial. Sendo assim, as residências em psiquiatria e a criação de residências multiprofissionais em saúde mental devem ser concebidas dentro de um modelo comunitário de atenção.12

Os coordenadores destacaram que é muito comum receberem nos serviços profissionais sem formação especializada para atuar em saúde mental e, ainda assim, não são oportunizados momentos de capacitação a fim de minimizar suas dificuldades.

[...] nós precisamos muito de capacitação. Eu falo até por mim, eu vim trabalhar na saúde mental [...], e não foi promovida pela política da saúde mental uma capacitação [...] (9:8).

A mudança de modelo de atenção em Saúde Mental gerou insegurança nos profissionais, de forma até inconsciente, porque houve mudanças de significados e sentidos do adoecimento mental e de assistência na área. É importante, portanto, entrar em contato com o paciente, trabalhar a interdisciplinaridade e "ressignificar o seu próprio saber".10: 1456

Estudo realizado no município de Goiânia indicou a demanda de trabalhadores recém-chegados ao serviço por capacitações, relacionada à falta de preparo durante a formação.17 De igual forma, os coordenadores destacam que é fundamental capacitar os profissionais da Atenção Básica. São eles que, na maioria das vezes, entram primeiramente em contato com as pessoas e necessitam de atenção especializada, além de que, fazem parte da rede de assistência em saúde mental.

Cada um começa a atuar com seu conhecimento da parte clínica, mas acaba que o que é fundamental da Reforma Psiquiátrica, da política, às vezes muitos profissionais não tem. Então eu acho que primeiramente a gente tem que capacitar os profissionais que vão atuar em cada área, seja CAPS, seja ESF, seja NASF... acho que para todos (12:5).

Um dos principais limitantes das ações de saúde mental na Estratégia de Saúde da Família é o despreparo dos profissionais para lidar com questões referentes ao sofrimento psíquico e às necessidades subjetivas no cotidiano da assistência. As atividades desenvolvidas pelas equipes de saúde da família não possibilitam a identificação e descrição da demanda e o envolvimento com a área da saúde mental. Desta forma, a assistência é realizada de modo improvisado e tudo é feito informalmente ao se estabelecer um contato com a pessoa em sofrimento psíquico que se apresenta no serviço.18

Não é novidade que os Agentes Comunitários de Saúde (ACSs) são os que mais identificam casos de pessoas que podem ser inseridas na rede, razão pela qual merecem destaque nas iniciativas de educação permanente.

Foi também enfatizada pelos participantes do estudo, a necessidade de cursos de especialização como estratégia importante dos processos de educação permanente em saúde mental e destacam a dificuldade de encontrar cursos para poder se especializar.

A capacitação não é tudo, mas é muito importante, porque você tendo uma especialização, você está buscando maiores conhecimentos e trazendo outras práticas através do conhecimento teórico para o município [...] (8:14).

[...] prioridade na saúde mental é incentivar profissionais de saúde a se especializar no serviço de saúde mental, porque a gente também não tem incentivo pra poder fazer isso. Nem todos gostam do serviço [...]. Não é fácil você encontrar um que tenha especialização em saúde mental. Também não é fácil você encontrar esse serviço de especialização [...] (5:6).

Os coordenadores referiram ainda falta de incentivo, principalmente por parte dos gestores municipais, para frequentarem cursos de especialização. Estes incentivos estão relacionados a custeio de cursos, deslocamento dos profissionais para locais onde eles são oferecidos, flexibilidade de carga horária no trabalho e consentimento dos gestores.

Outra estratégia de educação permanente muito referida pelos coordenadores foi a necessidade de supervisões clínico-institucionais, sendo esta uma ferramenta estratégica proposta pelo Ministério da Saúde19 e deliberada pelo Conselho Nacional de Saúde.12

As supervisões clínico-institucionais são entendidas como atividade que qualifica e integra as equipes nos serviços de saúde mental considerando casos clínicos e o contexto institucional, que sejam, os recursos do território onde o serviço está inserido possui, a política pública e a gestão. Ainda, o supervisor possibilita à equipe um espaço de reflexão e a construção de um projeto terapêutico que articule sujeito, rede e território.19

Nesta lógica, os apontamentos ou diagnósticos feitos pelos supervisores junto com a equipe são fundamentais para a tomada de decisões e direcionamento das práticas.

[...] eu acho que o principal movimento feito aqui no CAPS foi a solicitação dessa supervisão. Realmente isso trouxe um diferencial muito grande, porque nós passamos a ter informações de que realmente seria trabalhar no CAPS [...]. Extremamente enriquecedora no sentido de nos dar um norte de como trabalhar (17:11).

A supervisão clínica é vista como suporte para orientar os processos de trabalho nos CAPSs além de qualificar as relações interpessoais entre a equipe. Entretanto, recomenda-se que o supervisor seja externo à equipe de trabalho e necessita ser comprometido e qualificado de acordo com os princípios da PNSM,12 ter conhecimento sobre o modo de funcionamento dos CAPSs, da organização do trabalho, além de uma atitude de acolhimento para com a equipe.17

Os coordenadores também citaram as supervisões realizadas pelos profissionais da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES/GO), como uma supervisão programada. Nesta perspectiva, SES/GO tem parcela fundamental na responsabilidade pela capacitação dos profissionais que estão atuando nos serviços. Para organizar a rede, o Estado também tem a responsabilidade de funcionar como um órgão modulador de assistência em saúde mental e capacitar os profissionais que atuam nos serviços. Foi evidente entre os relatos dos coordenadores que os profissionais apoiam as supervisões realizadas pela SES/GO. Compreendem, entretanto que as iniciativas devem ir além do caráter burocrático e de fiscalização.

[...] é preciso aprimorar as supervisões clínicas, tem muito de burocrático ainda, [...] tem quantos funcionários, qual a carga horária. Não quer saber quais são as necessidades daquela clientela, não quer saber o quê aquele território precisa [...] muito burocrático! (4:24:25).

[...] que se tivesse mais essas visitas, não auditorias, mas visitas, orientação. Seria condição da supervisão. Não temos tanto acesso porque você tem entrar num projeto e a verba é muito pequena e no nosso Estado, infelizmente, as dificuldades financeiras são muito grandes, e eles estão ausentes na saúde mental [...] (10:4).

Os municípios devem assumir a responsabilidade pela execução das ações de saúde, devendo a Secretaria Estadual trabalhar para que os pontos cegos localizados nos municípios sejam resolvidos. Desta forma, mais do que simplesmente implantar unidades de atendimento, cabe ao Estado constituir e desenvolver o sistema como um todo.20 Tal lógica obedece a descentralização, um dos princípios do Sistema Único de Saúde, em que cada esfera de governo assume responsabilidades específicas. Os coordenadores dos CAPSs questionam a maneira insipiente pela qual a SES/GO se configura, em muitos serviços, acarretando a falta de visibilidade das suas ações.

Outra questão enfatizada foi a necessidade de incluir os gestores municipais de saúde nos processos de capacitação profissional. Muitos deles, embora profissionais de saúde, não compreendem a PNSM.

[...] é uma dificuldade [...]. A gente não consegue um desconto, nem uma condução, um combustível, alguma coisa... algo que facilite a sua vida pra o que você tá fazendo [...]. Mas aí tem também outra parte, eu vou buscar inovações, chega aqui no meu município eu não consigo aplicar. Eu vou ficar frustrada (13:13).

Vale destacar que a educação permanente dos gestores também deve incluir a capacitação em elaborar projetos para captar recursos e buscar a ampliação de parcerias interinstitucionais além de recursos junto a instituições de pesquisa.12 É inegável que gestores bem preparados facilita e viabiliza a realização de programa de saúde em territórios sob sua responsabilidade.

A inserção no mercado de trabalho

Os vínculos empregatícios são entendidos como parte estrutura que os profissionais possuem para atuar nos serviços de forma qualificada. Esta condição está relacionada à busca por qualificação por parte dos profissionais e com o vínculo que eles estabelecem com os usuários dos serviços.

No interior de Goiás, quase todos os profissionais que atuam nos serviços públicos de saúde mental têm vínculos empregatícios por meio de contratos anuais, temporários e ou vinculados ao pleito do prefeito, sem garantias trabalhistas. Sendo assim, todo início de ano ou de governo municipal os profissionais ficam incertos com relação à renovação de seu contrato e ou com a mudança do quadro de profissionais nas unidades de saúde. Pode-se perceber, nas falas dos coordenadores, que este tipo de contratação tem impedido e ou dificultado a formação de vínculos com os usuários,7 o trabalho em equipe e até a possibilidade de qualificação dos profissionais.15 Situação muito parecida foi relatada no Estado de Mato Grosso onde poucos gestores investem em contratação efetiva.7

[...] a maioria dos profissionais que atuam no CAPS, eles trabalham através de um contrato de prestação de serviço, que é anual. Então com isso há uma rotatividade muito grande de profissionais [...]. Então eu penso que isso dificulta muito. Se fosse possível um concurso público para estabilizar essa equipe eu acho que iria facilitar muito, porque aí poderia investir mais nesse profissional, capacitar mais e, com certeza, isso teria mais respostas (12:16:17).

Estudos mostram que há insatisfação com o trabalho em saúde mental relacionado à desregulamentação e flexibilização da forma de contratação dos profissionais. Este aspecto pode gerar consequências como tensões, medo e insegurança no trabalhador.4-5 Aprende-se, portanto, que vínculos empregatícios precários, tempo de trabalho diminuído e rotatividade dos trabalhadores são situações que dificultam a formação de vínculos e a busca por qualificação.7

Sendo assim, destaca-se a necessidade de transformações relacionadas à gestão dos recursos humanos no Sistema Único de Saúde, a começar pela forma de inserção nos serviços, para que os profissionais se sintam responsáveis pela funcionalidade dos serviços e capazes de decidir a organização e execução dos cuidados.4 Além disso, segundo os coordenadores, é importante considerar o perfil profissional para contratar os profissionais que trabalharão na área, independente da forma de contratação. Mesmo que os profissionais sejam concursados, é fundamental que se tenha critérios pré-estabelecidos em edital e que esteja clara a possibilidade de o aprovado ser alocado em serviços de saúde mental.

[...] eu vejo que o concurso não é só para ganhar o conhecimento. Tem que ter o perfil também, dos profissionais que passam nesses concursos e são chamados, nem todo mundo dá conta de trabalhar na área pública, nem todo mundo tem o perfil para trabalhar na saúde mental. Ou fica um mau profissional, ou de repente acomoda e não desenvolve realmente o que deveria desenvolver [...] (3:5:6).

Entretanto, é possível perceber que a afinidade entre a realização do concurso e o perfil para atuar em saúde mental tem uma relação intrínseca com a concepção estigmatizada que os profissionais dos CAPSs possuem sobre o adoecimento mental. Muitas vezes os profissionais se recusam a trabalhar nesta área por medo, receio e até repulsa para com o usuário dos serviços de saúde mental.21

Tal relação ocorre também por falta de conhecimento por parte dos profissionais ou por suas experiências em instituições psiquiátricas com características asilares que ferem os direitos humanos, desestimulando o interesse do trabalhador se dedicar à área. Diante deste panorama, a V Conferência de Saúde Mental, no Brasil, propõe a implantação de uma política de especialização e de capacitação permanente para os profissionais com garantia de contratação imediata, via concurso, de pessoas com perfil para trabalhar em saúde mental.12

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os coordenadores dos CAPSs do interior do Estado de Goiás destacaram muitos aspectos relacionados à preparação dos profissionais para atuar em saúde mental. As universidades precisam adequar os currículos dos cursos de graduação de forma a priorizar os preceitos da PNSM e os campos de prática e estágios devem ocorrer serviços com ideais antimanicomias para que os futuros profissionais tenham contato com o território, com a articulação dos serviços e com a comunidade, de acordo com o modelo psicossocial.

A formação acadêmica também precisa promover o trabalho em equipe, ainda durante a graduação, para que as relações interpessoais e a importância da interdisciplinaridade façam sentido na profissão e no processo de trabalho em saúde mental.

Sendo assim, para os profissionais que não tiveram a formação segundo esta lógica, destaca-se a importância de educação permanente, de forma a facilitar a apreensão de conceitos e ações fundamentadas no modelo psicossocial capazes de superar o paradigma da tutela do louco e da loucura. Os processos de educação permanente devem ocorrer nos serviços, considerando o território em que eles estão inseridos, a população atendida e a rede de serviços. Neste tocante, a supervisão clínico-institucional seria a melhor estratégia porque considera estes aspectos e os processos de trabalho de toda a equipe. Entretanto, podemos perceber que faltam oportunidades para os profissionais se qualificarem e ainda há pouco incentivo por parte dos gestores municipais.

Todos os coordenadores destacaram a importância de contratar profissionais que tenham perfil para atuar em saúde mental. Este perfil está relacionado à afinidade do profissional com a área e ao domínio que ele possui das ferramentas relacionais como vínculo, acolhimento, escuta e responsabilização.

Foi possível identificar a precariedade dos contratos de trabalho dos profissionais dos CAPSs do interior do Estado de Goiás, evidenciada também em outros estudos. Neste tocante, é imprescindível rever as condições dos vínculos empregatícios dos trabalhadores, pois a estabilidade é fundamental para incentivar os profissionais à qualificação, favorecer o trabalho em equipe e o vínculo com os usuários.

Diante dos resultados encontrados, reforça-se a ideia que os investimentos em recursos humanos podem representar a possibilidade do salto de qualidade que a assistência psiquiátrica em saúde mental necessita para contemplar, de fato, a Política Nacional de Saúde Mental.

Recebido: 05 de Setembro 2012

Aprovado: 24 de Outubro 2013

  • 1. Amarante PDC. O homem e a serpente: outras histórias para a loucura e a psiquiatria. Rio de Janeiro (RJ): Editora Fiocruz; 1996.
  • 2. Amarante P. Saúde mental e atenção psicossocial. Rio de Janeiro (RJ): Editora Fiocruz; 2007.
  • 3. Mielke FB, Kantorski LP, Jardim VMR, Olschowsky A, Machado MS. O cuidado em saúde mental no CAPS no entendimento dos profissionais. Ciênc Saúde Coletiva. 2009 Jan-Fev; 14(1):159-64.
  • 4. Jorge MSB, Guimarães JMX, Nogueira MEF, Moreira TMM, Morais APP. Gestão de recursos humanos nos Centros de Atenção Psicossocial no contexto da política de desprecarização do trabalho no Sistema Único de Saúde. Texto Contexto Enferm. 2007 Jul-Set; 16(3):417-25.
  • 5. Guimarães JMX, Jorge MSB, Assis MMA. (In)satisfação com o trabalho em saúde mental: um estudo em Centros de Atenção Psicossocial. Cienc Saúde Coletiva. 2011 Abr; 16(4): 2145-54.
  • 6. Camatta MW, Schneider JF. A visão da família sobre o trabalho de profissionais de saúde mental de um Centro de Atenção Psicossocial. Esc Anna Nery. 2009 Jul-Set; 13(3):477-84.
  • 7. Rézio LA, Oliveira AGB. Equipes e condições de trabalho nos Centros de Atenção Psicossocial em Mato Grosso. Esc Anna Nery. 2010 Abr-Jun; 14(2):346-54.
  • 8. Schneider JF, Souza JP, Nasi C, Camatta MW, Machineski GG. Concepção de uma equipe de saúde mental sobre interdisciplinaridade. Rev Gaúcha Enferm. 2009 Set; 30(3):397-405.
  • 9. Wetzel C, Kantorski LP, Olschowsky A, Scheneider JF, Camatta MW. Dimensões do objeto de trabalho em um Centro de Atenção Psicossocial. Ciênc Saúde Coletiva. 2011 Abr; 16(4):2133-43.
  • 10. Koda MY, Fernandes MIA. A reforma psiquiátrica e a constituição de práticas substitutivas em saúde mental: uma leitura institucional sobre a experiência de um núcleo de atenção psicossocial. Cad Saúde Pública. 2007 Jun; 23(6):1455-61.
  • 11. Munari DB, Godoy MTH, Esperidião E. Ensino de enfermagem psiquiátrica/saúde mental na faculdade de enfermagem da Universidade Federal de Goiás. Esc Anna Nery. 2006 Dez; 10(4):684-93.
  • 12
    Ministério da Saúde (BR). Comissão Organizadora da IV Conferência Nacional de Saúde Mental - Intersetorial. Relatório Final da IV Conferência Nacional de Saúde Mental - Intersetorial. Brasília (DF): Conselho Nacional de Saúde/MS; 2010.
  • 13. Bardin L. Análise de conteúdo. 4 ed. Lisboa (PT): Edições 70; 2010.
  • 14. Jorge MSB, Pinto DM, Quinderé PHD, Pinto AGA, Souza FSP, Cavalcante CM. Promoção da saúde mental - tecnologias do cuidado: vínculo, acolhimento, co-responsabilização e autonomia. Ciênc Saúde Coletiva. 2011 Jul; 16(7):3051-60.
  • 15. Pinho LB, Hernández AMB, Kantorski LP. Trabalhadores de saúde mental: contradições e desafios no conexto da reforma psiquiátrica. Esc Anna Nery. 2010 Abr-Jun; 14(2):260-7.
  • 16. Ceccim EB. Educação permanente em saúde: desafio ambicioso e necessário. Interface - Comunic, Saúde, Educ. 2004 Set-Jan; 9(16):161-77.
  • 17. Silva EA, Costa II. Saúde mental dos trabalhadores em saúde mental: estudo exploratório com os profissionais dos Centros de Atenção Psicossocial de Goiânia/GO. Psicol Rev. 2008 Jun; 14(1):83-106.
  • 18. Jucá VJS, Nunes MO, Barreto SG. Programa de Saúde da Família e saúde mental: impasses e desafios na construção da rede. Ciênc Saúde Coletiva. 2009 Jan-Fev; 14(1):173-82.
  • 19
    Ministério da Saúde (BR). Portal da Saúde. O ofício da supervisão e a sua importância para a rede de saúde mental do SUS. Brasília (DF): MS; 2011 [acesso 2011 Set 23]; Disponível: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=31355
  • 20
    Secretaria Estadual da Saúde Goiás. Superintendência de Políticas de Atenção Integral à Saúde. Política Estadual de Atenção Integral à Saúde Mental. Goiânia (GO): Secretaria de Estado da Saúde; 2005.
  • 21. Nunes M, Torrenté M. Estigma e violências no trato com a loucura: narrativas de Centros de Atenção Psicossocial, Bahia e Sergipe. Rev Saúde Pública. 2009 Ago; 43(Supl. 1):101-8.
  • Endereço para correspondência:
    Elizabeth Esperidião
    Rua 3, 921, ap. 1400, Edifício Solar Vila Rica
    74115-050 - Setor Oeste, Goiânia, GO, Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Fev 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      Set 2012
    • Aceito
      Out 2013
    Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós Graduação em Enfermagem Campus Universitário Trindade, 88040-970 Florianópolis - Santa Catarina - Brasil, Tel.: (55 48) 3721-4915 / (55 48) 3721-9043 - Florianópolis - SC - Brazil
    E-mail: textoecontexto@contato.ufsc.br