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Condutas de enfermagem adotadas diante dos eventos adversos à doação de sangue1 1 Artigo extraído da dissertação - Análise dos eventos adversos à doação de sangue e condutas de enfermagem adotadas, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Atenção à Saúde da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFMT), em 2012

Resumos

Esta investigação objetivou identificar os tipos de eventos adversos, as manifestações clínicas e condutas de enfermagem adotadas, e verificar a associação entre essas condutas e os eventos adversos ocorridos. Estudo epidemiológico, retrospectivo, realizado após a análise de 1369 fichas de atendimento de reações adversas à doação, no período compreendido entre janeiro de 2009 a dezembro de 2011. Utilizou-se estatística descritiva e tabelas de contingência para analisar a associação, empregando-se o coeficiente de Cramér. Foram 92,6% eventos adversos classificados como leves e as principais manifestações clínicas foram mal-estar, tontura, palidez e sudorese. O posicionamento em Trendelemburg, aferição dos dados vitais, hidratação oral e as orientações quanto aos cuidados após a doação, foram as principais condutas adotadas. Observou-se significância estatística entre a maioria das condutas de enfermagem e os tipos de eventos adversos. Os resultados apontam para o decisivo papel da enfermagem perante a ocorrência dos eventos adversos à doação de sangue.

Doadores de sangue; Cuidados de enfermagem; Segurança do sangue


The aim of this study was to identify types of adverse events, clinical manifestations and nursing care procedures adopted in response to adverse events to blood donation, and to verify the association between these procedures and the adverse events. This was an epidemiological, retrospective study conducted through analysis of 1369 records of treatment of adverse events to blood donation, during the period between January 2009 and December 2011. Descriptive statistics and contingency tables were used to analyze associations through the use of Cramér's V. A total of 92.6% of adverse events were classified as mild, and clinical manifestations were malaise, dizziness, pallor and sweating. The Trendelenburg position, vital signs monitoring, oral hydration and directions for care after blood donation were the main procedures adopted. A statistical significance was observed between the nursing procedures and the types of adverse events. The results point to the critical role of nursing in treating adverse events to blood donation.

Blood donors; Nursing care; Blood safety


Esta investigación tuvo como objetivo identificar los tipos de eventos adversos, las manifestaciones clínicas y las conductas de enfermería adoptadas, así como verificar una asociación entre estas conductas y los eventos adversos. Estudio epidemiológico, retrospectivo realizado después del análisis de 1369 historias clínicas de las reacciones adversas a la donación, durante el período comprendido entre enero 2009 a diciembre 2011. Se utilizó estadística descriptiva y tablas de contingencia para analizar la asociación, así como el coeficiente de Cramer. Fueron clasificados como leves 92,6% eventos adversos y las manifestaciones clínicas fueron malestar general, mareos, palidez y sudoración. La posición de Trendelenburg, la medición de los signos vitales, la hidratación oral y las directrices para el cuidado después de la donación fueron las principales conductas aprobadas. La significación estadística se observó entre la mayoría de los procedimientos de enfermería adoptados y los tipos de eventos adversos. Los resultados evidencian el papel fundamental de la enfermería antes de la ocurrencia de eventos adversos con la donación de sangre.

Donantes de sangre; Cuidados de la enfermería; Seguridad de la sangre


INTRODUÇÃO

Na doação de sangue, apesar do avanço tecnológico e dos cuidados dispensados para a proteção ao doador, reações adversas ou efeitos desagradáveis à coleta de sangue podem ocorrer. Essas reações são classificadas, pelos serviços hemoterápicos, como leves, moderadas e graves, dependendo do quadro clínico de sinais e sintomas apresentado pelo doador.1Lopes MI. A doação de sangue. In: Textos de apoio em hemoterapia, organização pela Escola Politécnica da Saúde Joaquim Venâncio. Rio de Janeiro (RJ): Fiocruz; 2000. V. 1, p. 49-68.

Fundação Hemominas. Manual da assistência de enfermagem. Belo Horizonte (MG): Fundação Hemominas; 2012.
- 3Fundação Hemominas. Manual de normas e procedimentos de atendimento ao doador. Belo Horizonte (MG): Fundação Hemominas; 2012.

Em grande parte dos serviços de hemoterapia, a coleta de sangue dos doadores, a orientação pós-doação e o atendimento imediato frente à ocorrência das reações adversas são responsabilidades da equipe de enfermagem, composta por enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem, sob supervisão e orientação do profissional enfermeiro.

As competências e atribuições da enfermagem nos serviços de hemoterapia são estabelecidas e respaldadas pelo Conselho Federal de Enfermagem, através da Resolução n. 306/2006.4Conselho Federal de Enfermagem. Resolução n. 306, de 25 de abril de 2006 [online]. Normatiza a atuação do enfermeiro em hemoterapia. Rio de Janeiro (RJ): COFEN; 2012 [acesso 2012 Ago 10]. Disponível em: http://novo.portalcofen.gov.br/resoluo-cofen-3062006_4341.html
http://novo.portalcofen.gov.br/resoluo-c...

Entre as recomendações previstas à equipe de enfermagem, destacam-se o estabelecimento de contato cordial e profissional com o doador; informações sobre o procedimento e suas possíveis intercorrências; e o esclarecimento de dúvidas com foco na captação, no retorno e na fidelização desse candidato. Essas ações contribuem para a satisfação do doador e garantem qualidade e segurança do processo transfusional, o qual inicia desde o processo de doação. O acolhimento, pode ser traduzido como humanização no cuidado ao doador e, certamente propicia um clima de segurança e conforto, contribuindo assim para minimizar as intercorrências ou eventos adversos que podem advir com o procedimento de doação.5Borges TS, Vidigal DC, Chaves JM. Cadernos Hemominas: assistência de enfermagem na coleta de sangue do doador e na hemotransfusão. Belo Horizonte (MG): Fundação Hemominas; 2004. - 6Rodrigues RSM, Reibnitz KS. Estratégias de captação de doadores de sangue: uma revisão integrativa da literatura. Texto Contexto Enferm. 2011 Jun; 20(2):384-91.

Esta investigação foi proposta, considerando-se a escassez de estudos na área de enfermagem e a necessidade de se conhecer e padronizar as suas condutas diante dos eventos adversos. Além disso, com o propósito de fornecer subsídios para a adoção de medidas que visem a minimizar o impacto desses eventos para o doador e para o serviço.

Este estudo teve como objetivos identificar os tipos de eventos adversos apresentados pelo doador de sangue total e suas manifestações clínicas; identificar as condutas de enfermagem adotadas frente a essas reações e verificar se existe associação entre as condutas de enfermagem adotadas e os tipos de eventos adversos ocorridos.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo epidemiológico e retrospectivo realizado em um Hemocentro Regional do Triângulo Mineiro (Minas Gerais), pertencente à Fundação Hemominas. Essa unidade atende as especialidades de hemoterapia e hematologia, com média de atendimentos por mês, de 1500 candidatos à doação, 1300 bolsas de sangue coletadas, 400 pacientes atendidos e 1900 transfusões distribuídas.

Os dados foram obtidos a partir das fichas de atendimento de reações adversas à doação e das fichas de doação, provenientes da sala de coleta, notificadas e preenchidas pela equipe de enfermagem, no período de janeiro de 2009 a dezembro de 2011, no total de 1369 fichas.

Com o propósito de orientar a obtenção dos dados, utilizou-se de um instrumento de coleta de dados específico, confeccionado a partir das fichas de doação e de atendimento de reações adversas à doação, padronizadas pela instituição. Esse instrumento aborda os seguintes aspectos: dados de identificação do doador (sexo, data de nascimento e estado civil), tipos de reações apresentadas (leve, moderada ou grave), manifestações clínicas apresentadas e/ou relatadas pelo doador e a assistência de enfermagem prestada e registrada na ficha de atendimento de reações.

Os tipos de reações adversas à doação de sangue total foram considerados segundo a classificação da Fundação Hemominas,2Fundação Hemominas. Manual da assistência de enfermagem. Belo Horizonte (MG): Fundação Hemominas; 2012. - 3Fundação Hemominas. Manual de normas e procedimentos de atendimento ao doador. Belo Horizonte (MG): Fundação Hemominas; 2012. a partir das manifestações clínicas apresentada pelo doador em: intercorrências clínicas leves (doador apresenta-se ansioso, queixa calor, apresenta lipotimia, sudorese, palidez, tonteira, cefaléia, náusea, mal-estar geral, pulso aumentado ou rápido e filiforme, taquipnéia levando à hiperventilação, suspiros ou bocejos, ausência de perda de consciência, pressão arterial reduzida e hematomas no braço); intercorrências clínicas moderadas (incluem os sintomas leves, acrescidos de náusea seguida de vômitos, períodos rápidos de inconsciência, bradicardia, respiração rápida e superficial, além de hiperventilação e diminuição continuada na pressão arterial - PA sistólica 60 mmHg ou menor); e as intercorrências clínicas graves (incluem os sintomas leves e moderados, acrescidos de convulsões e tetania ocasionada pela hiperventilação acentuada).

Os dados foram coletados pela pesquisadora, após a validação do instrumento (validação aparente de conteúdo), por três doutores especialistas na temática, considerando que foi construído a partir da ficha de doação preconizada e adotada pelo Hemominas, utilizada em todo o estado de Minas Gerais.

Após a coleta, os dados foram inseridos em uma planilha eletrônica do programa Excel(r) para Windows XP(r), validados por dupla entrada e, posteriormente, transportados para o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 17.0, para processamento e análise.

Para a caracterização dos tipos de eventos adversos, das manifestações clínicas e das condutas de enfermagem adotadas, utilizou-se a estatística descritiva com frequência simples e absoluta. A estatística descritiva bivariada e as tabelas de contingência também foram utilizadas para analisar a associação entre os tipos de eventos adversos ocorridos e as condutas de enfermagem.

Essa associação foi medida empregando-se o coeficiente de associação de Cramér (r), considerando, para interpretação da associação entre as variáveis, o intervalo apresentado pela Tabela de Rugg: r<0,15 indicador de associação desprezível; r entre 0,15 e 0,29, associação baixa; r entre 0,30 e 0,49, indicador de associação apreciável e, r>0,50, indicador de associação acentuada.7Rodrigues PC. Bioestatística. Niterói (RJ): EdUFF; 2002. Os resultados foram considerados significativos em um nível de significância de 5% (p<0,05%) e apresentados em forma de figuras e tabelas.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação Hemominas, sob o parecer n. 322. Por se tratar de um estudo retrospectivo por meio do levantamento e análise de dados nas fichas de doação e de atendimento de reações adversas sem identificação do sujeito, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido não foi aplicado. Ressalta-se que se garantiu o sigilo quanto à identificação dos sujeitos da pesquisa, por meio da numeração dos instrumentos de coleta de dados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No período retrospectivo, compreendido por este estudo (janeiro de 2009 a dezembro de 2011), foram efetuadas 45.584 doações de sangue, sendo 1369 eventos adversos notificados, o que representa 3%. Do total de eventos adversos, 51,1% ocorreram em doadores do sexo masculino. A faixa etária desses doadores variou entre 18 a 61 anos, com prevalência de 18 a 30 anos (68,5%). Em relação ao estado civil, 62,0% eram solteiros e 28,2% casados. A frequência dos tipos de eventos adversos ocorridos está apresentada na figura 1.

Figura 1
Distribuição percentual da frequência dos tipos de eventos adversos à doação notificados pela equipe de enfermagem (2009-2011). Uberaba- MG, 2012

Observou-se predomínio de reações leves ou vasovagais em 1367 doadores (92,6%), dados que corroboram com outros estudos já realizados. No entanto, com relação à ocorrência de reações graves, os dados foram divergentes de pesquisas de metodologia similar, por apresentarem frequências menores.8Ogata H, Iinuma N, Nagashima K, Akabane T. Vasovagal reactions in blood donors. Transfusion. 1980 Nov-Dec; 20(6):679-83.

Múnera MI, Ramírez BS, Zapata CM, Marín DS. Reacciones adversas inmediatas a la donácion: frecuencia y caracterización, banco de sangre de la clínica cardiovascular Santa María, Medellín, 1999. Biomédica. 2001; 21(3):224-7.

10 Pathak C, Pujani M, Pahuja S, Jain M. Adverse reactions in whole blood donors: an Indian scenario. Blood Transfus. 2011 Jan; 9(1):46-9.

11 Chaves JM, Moura OA. Avaliação dos Registros das Intercorrências e Reações adversas no processo de doação de sangue no Hemocentro de Belo Horizonte, no período de 20 de novembro a 19 de dezembro de 2004 [trabalho de conclusão de curso]. Belo Horizonte (MG): Escola de Saúde Pública; 2005.
- 1212 Gonçalez TT, Sabino EC, Schlumpf KS, Wright DJ, Leao S, Sampaio D, et al. Vasovagal reactions in whole blood donors at three REDS-II blood centers in Brazil. Transfusion. 2012 Mai; 52(5):1070-8.

Na ficha de atendimento de reação adversa, a equipe de enfermagem registrou as principais manifestações clínicas apresentadas pelos doadores, conforme a tabela 1, a seguir.

Tabela 1
Distribuição das manifestações clínicas identificadas nos doadores que apresentaram eventos adversos à doação (n=1367), 2009-2011. Uberaba-MG, 2012

Verificou-se que dos 1369 eventos adversos notificados, em 1367 fichas (99,8%) havia o registro completo e fidedigno das manifestações clínicas apresentadas pelos doadores. Foram 3285 manifestações clínicas identificadas, com média de 2.4 intercorrências clínicas por cada evento adverso notificado. As principais manifestações clínicas apresentadas e/ou relatadas pelos doadores caracterizam os eventos adversos como leves e, reforçam sua prevalência, corroborando com dados já apresentados pela literatura.1010 Pathak C, Pujani M, Pahuja S, Jain M. Adverse reactions in whole blood donors: an Indian scenario. Blood Transfus. 2011 Jan; 9(1):46-9. , 1212 Gonçalez TT, Sabino EC, Schlumpf KS, Wright DJ, Leao S, Sampaio D, et al. Vasovagal reactions in whole blood donors at three REDS-II blood centers in Brazil. Transfusion. 2012 Mai; 52(5):1070-8.

Com relação às manifestações clínicas, observou-se que as frequências de tontura e náusea foram superiores às apresentadas por um estudo prospectivo realizado na Grécia, o qual também analisou a sintomatologia e as alterações dos dados vitais em 107 doadores que apresentaram reação adversa durante ou após a doação.1313 Zervou EK, Ziciadis K, Karabini F, Xanthi E, Chrisostomou E, Tzolou A. Vasovagal reactions in blood donors during or immediately after blood donation. Transfus Medicine. 2005 Out; 15(5):389-94.

Uma investigação realizada no Paquistão, apresentou, com maior prevalência nos participantes, a fraqueza e tontura como sinais e sintomas característicos de reações adversas. Outro estudo realizado na Itália apresentou além da fraqueza e tontura, a sudorese e a palidez cutânea. Esses resultados foram ao encontro dos achados da presente pesquisa, a qual também revelou prevalência da tontura, palidez e sudorese, como principais sintomas.1414 Rohra DK, Juriasinghani V, Rai K, Azam SI. Prevalence of immediate vasovagal reaction in blood donors visiting two blood banks of Karachi. Transfusion Med. 2010 Jun; 20(3):129-33. - 1515 Crocco A, D'elia D. Adverse reactions during voluntary donation of blood and/or blood components. A statistical-epidemiological study. Blood Transfusion. 2007 Jul; 5(3):143-52.

Neste estudo houve o registro de 24 (1,8%) hematomas. Provavelmente essa frequência deve-se ao fato de que este tipo de evento adverso não foi analisado isoladamente, mas sim, associado às outras manifestações clínicas relatadas e registradas. Contudo, o dado obtido neste estudo é corroborado por estudo realizado no American Red Cross Blood Services, em 2003, que apresentou ocorrência de 1,7% de hematomas.1616 Newman BH, Pichette S, Pichette D, Dzaka E. Adverse effects in blood donors after whole-blood donation: a study of 1000 blood donors interviewed 3 weeks after whole-blood donation. Transfusion. 2003 Mai; 43(5):598-603.

Outras pesquisas também demonstraram a baixa incidência de hematomas, aos quais denominam de complicações locais, apresentando incidência menor que 2%. Essas pesquisas chamam a atenção para a necessidade de quantificar esse tipo de evento adverso.1010 Pathak C, Pujani M, Pahuja S, Jain M. Adverse reactions in whole blood donors: an Indian scenario. Blood Transfus. 2011 Jan; 9(1):46-9. , 1717 Newman BH, Newman DT, Ahmad R, Roth AJ. The effects of whole-blood donor adverse events on blood donor return rates. Transfusion. 2006 Ago; 46(8):1374-9.

Com relação à contratura muscular e perda transitória do nível de consciência, a baixa frequência desses sintomas também pode ser observada em outra investigação, realizada no Hemocentro de Belo Horizonte, unidade pertencente à rede.1111 Chaves JM, Moura OA. Avaliação dos Registros das Intercorrências e Reações adversas no processo de doação de sangue no Hemocentro de Belo Horizonte, no período de 20 de novembro a 19 de dezembro de 2004 [trabalho de conclusão de curso]. Belo Horizonte (MG): Escola de Saúde Pública; 2005.

Com relação às condutas de enfermagem adotadas, observou-se que dos 1369 eventos adversos à doação notificados, 1368 (99,9%) fichas de atendimento apresentavam o registro completo e adequado da assistência de enfermagem prestada. Foram 6252 condutas de enfermagem evidenciadas, com média de 4,6 condutas para cada evento adversos notificado nas fichas de atendimento de reação. Observou-se que o posicionamento do doador em Trendelemburg, a aferição dos dados vitais e a oferta da hidratação oral foram as principais condutas adotadas pela equipe de enfermagem. A tabela 2 exibe as condutas de enfermagem adotadas.

Tabela 2
Distribuição das condutas de enfermagem adotadas frente aos eventos adversos à doação notificados (n=1368), 2009- 2011. Uberaba-MG, 2012

No que se refere à assistência de enfermagem, as condutas adotadas corroboram com outras pesquisas que descrevem um conjunto de ações a serem tomadas frente à presença dos eventos adversos.1010 Pathak C, Pujani M, Pahuja S, Jain M. Adverse reactions in whole blood donors: an Indian scenario. Blood Transfus. 2011 Jan; 9(1):46-9. , 1515 Crocco A, D'elia D. Adverse reactions during voluntary donation of blood and/or blood components. A statistical-epidemiological study. Blood Transfusion. 2007 Jul; 5(3):143-52. , 1818 Newman BH. Donor reactions and injuries from whole blood donation. Transfus Med Rev. 1997 Jan; 11(1):64-75.

A assistência imediata, o posicionamento do doador em Trendelemburg(posição anti-choque) ou a elevação dos membros inferiores, a interrupção do procedimento e a oferta de líquidos ainda dentro da sala de coleta foram medidas corretivas tomadas frente aos eventos adversos observados na Índia.1010 Pathak C, Pujani M, Pahuja S, Jain M. Adverse reactions in whole blood donors: an Indian scenario. Blood Transfus. 2011 Jan; 9(1):46-9. Outra pesquisa também revelou, como tipo de intervenção terapêutica, a adoção do posicionamento anti-choque, juntamente com a baixa frequência de hidratação intravenosa e medicações.1515 Crocco A, D'elia D. Adverse reactions during voluntary donation of blood and/or blood components. A statistical-epidemiological study. Blood Transfusion. 2007 Jul; 5(3):143-52.

Uma revisão sobre as reações e injúrias relacionadas à doação apresentou como modalidade de tratamento, além do posicionamento em Trendelemburg, a orientação quanto à alteração do padrão respiratório. Esse estudo também comenta sobre a necessidade de monitoramento da pressão arterial, pulso e estado mental, principalmente nas reações severas.1818 Newman BH. Donor reactions and injuries from whole blood donation. Transfus Med Rev. 1997 Jan; 11(1):64-75.

A aferição e registro dos sinais vitais são considerados cuidados de enfermagem imediatos, pois permitem a avaliação inicial do doador e possibilitam o planejamento das ações a serem adotadas pela equipe de enfermagem e, em determinados casos, também pela equipe médica.

Geralmente, o primeiro atendimento ao doador é realizado pela equipe de enfermagem que, após avaliação e dependendo da necessidade, solicita a intervenção da equipe médica.3Fundação Hemominas. Manual de normas e procedimentos de atendimento ao doador. Belo Horizonte (MG): Fundação Hemominas; 2012. Em um estudo francês, dos 196 eventos adversos notificados, 2/3 houve a necessidade da consulta médica e 1/3, a necessidade da hospitalização.1919 Rebibo D, Danic B. Haemovigilance donors: methods and results. Transfus Clin Biol. 2007 Mai; 14(1):142-6.

Percebe-se a importância da atuação da enfermagem no monitoramento dos parâmetros vitais e avaliação constante do doador no enfrentamento das intercorrências clínicas. Ressalta-se que o trabalho em equipe multidisciplinar é fundamental e faz-se necessário para rápida estabilização do cliente, bem como para garantia de uma assistência segura e de qualidade.

O Código de Ética dos profissionais de enfermagem destaca sua participação da no trabalho multi e interdisciplinar com responsabilidade, autonomia e liberdade.2020 Conselho Federal de Enfermagem. Resolução COFEN n. 311/2007 [online]. Aprova a reformulação do código de ética dos profissionais de enfermagem . Rio de Janeiro (RJ): COFEN; 2012. [acesso 2012 Set 12]. Disponível em: http://www.portalcofen.gov.br/sitenovo/node/4158
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Isso deve nortear as ações da enfermagem lideradas por um enfermeiro, que busque as melhores evidências científicas para as condutas aplicadas à prática do cuidado, independentemente do cenário de atuação. A enfermagem em hemoterapia ainda é um campo relativamente novo da enfermagem, mas que vem crescendo a passos largos e alcançando seu espaço e reconhecimento no meio científico acadêmico, e refletindo na qualidade da prática do cuidado nessa área.

Ao analisar a orientação da técnica correta de respiração, uma investigação orienta que o padrão respiratório do doador possa ser alterado e, para minimizar os efeitos promovidos pela hiperventilação (aumento da concentração do dióxido de carbono), o doador pode ser estimulado a tossir, a segurar a respiração por cinco segundos, ou ainda, respirar dentro de um saco de papel. Conversar com o doador e desviar sua atenção também são medidas que visam a reverter o incidente.1818 Newman BH. Donor reactions and injuries from whole blood donation. Transfus Med Rev. 1997 Jan; 11(1):64-75.

As orientações após a doação referem-se aos esclarecimentos oferecidos pelo médico ou pela equipe de enfermagem. A legislação preconiza que o doador deva ser informado quanto aos possíveis efeitos adversos da doação e quanto a orientações de como proceder em meio a elas. Por isso, devem ser fornecidas antes da sua liberação.2121 Ministério da Saúde (BR) [online]. Portaria n. 1353, de 13 de junho de 2011. Aprova o Regulamento Técnico de Procedimentos Hemoterápicos. D.O.U, Brasília (DF), 14 jun 2011 [acesso em 14 ago. 2012]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt1353_13_06_2011.html
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A incidência da infusão de fluidos intravenosos foi superior ao estudo realizado na Itália, no qual esta conduta foi utilizada em 18 (0,36%) doadores com reação vasovagal. Nessa pesquisa, os autores comentaram que o volume de sangue retirado em uma doação (em média 450 ml) representa apenas 10% da massa sanguínea total de um sujeito adulto, o que não acarreta risco de choque hipovolêmico e reduz a necessidade de hidratação intravenosa.1515 Crocco A, D'elia D. Adverse reactions during voluntary donation of blood and/or blood components. A statistical-epidemiological study. Blood Transfusion. 2007 Jul; 5(3):143-52.

Quanto à associação entre os tipos de eventos adversos e as condutas de enfermagem adotadas e registradas na ficha de atendimento de reação, a análise da tabela 3, a seguir, exibe que, das 12 (doze) condutas de enfermagem associadas aos tipos de eventos adversos, houve associação estatisticamente significativa em 9 (nove) delas. Tais como: hidratação intravenosa, solicitação da avaliação médica, oferta de hidratação oral, posicionamento em Trendelemburg e elevação dos membros inferiores (MMII), administração de medicamentos, aferição dos dados vitais, realização da glicemia capilar e contato com familiares.

Tabela 3
Associação entre os tipos de eventos adversos à doação de sangue e as condutas de enfermagem adotadas (2009-2011). Uberaba-MG, 2012

Embora o grau de associação entre hidratação intravenosa e administração de medicamentos e, cada tipo de evento adverso ter sido considerado baixo, observou-se que à medida que há aumento da gravidade das intercorrências clínicas, essas condutas foram tomadas com maior frequência.

Dentre as recorrentes condutas de enfermagem, solicitar a avaliação e/ou intervenção médica assinalou grau de associação mais forte (r=0,39), podendo ser tomada como indicador de associação considerável. Verificou-se que nas reações graves, a avaliação médica foi solicitada pela enfermagem em 69 eventos (86,3%).

É essencial ressaltar o comprometimento das equipes médicas e de enfermagem mediante o atendimento às reações adversas, principalmente nas intercorrências clínicas graves. O trabalho em equipe viabiliza a construção de um projeto assistencial comum aos diferentes membros da equipe, proporcionando um atendimento seguro, eficaz e sistematizado.

Quanto à necessidade de administração de medicamentos, observou-se que essa conduta foi empregada com maior frequência nas reações classificadas como moderadas. Provavelmente, tal achado deve-se ao fato de que nesse tipo de evento, o doador pode apresentar náuseas e vômitos, o que requer, muitas vezes, medicação para promover sua estabilização.

Entre a elevação dos membros inferiores e os tipos de eventos adversos, verificou-se pequeno grau de associação (r=0,21), com aumento significativo da sua incidência à medida que ocorre o aumento na gravidade das intercorrências clínicas.

A associação entre a aferição dos sinais vitais e os eventos adversos demonstrou ser estatisticamente significativa (p=0,003), entretanto, considerando-se a tabela de Rugg, essa associação deve ser considerada desprezível (r=0,09), mesmo diante da grande incidência dessa conduta nas reações leves. Também esse indicador foi observado na associação com a realização da glicemia capilar (r=0,13). Contudo, ressalta-se que essa foi uma ação de enfermagem adotada com maior incidência nas reações graves (6,3%).

A necessidade de contatar um familiar do doador, muitas vezes, com a finalidade de efetivar o transporte, demonstrou ser um baixo indicador de associação com os tipos de eventos adversos (r=0,24). Verificou-se, também, que na medida em que aumenta a gravidade das manifestações clínicas, há aumento na incidência dessa conduta, adotada em 10 (12,5%) atendimentos de reações do tipo grave.

A análise da associação das condutas de enfermagem e os tipos de eventos adversos possibilita avaliar os resultados e a qualidade da assistência prestada, com a possível elaboração de indicadores para a assistência de enfermagem, que impactem no aperfeiçoamento e melhoria dos processos de gestão.2222 Almeida RGS, Mazzo A, Mendes IAC, Trevisan MA, Godoy S. Caracterização do atendimento de uma unidade de hemoterapia. Rev Bras Enferm. [online]. 2011 [acesso 12 Set 2012]; 64(6):1082-6. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/reben/v64n6/v64n6a14.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reben/v64n6/v64...

Perante as intercorrências clínicas, o enfermeiro e sua equipe de enfermagem são responsáveis por prestar os primeiros cuidados. O enfermeiro, na hemoterapia, deve conhecer e ter domínio dos diferentes tipos de eventos adversos e suas manifestações clínicas para planejar e sistematizar a assistência de enfermagem, padronizando as condutas e rotinas, como também, promovendo a qualificação do serviço. Isso, certamente, assegura um cuidado de enfermagem embasado e científico.2323 Guerrero GP, Beccaria LM, Trevisan MA. Procedimento operacional padrão: utilização na assistência de enfermagem em serviços hospitalares. Rev Latino-Am Enferm. [online]. 2008 [acesso 12 Set 2012]; 16(6):966-72. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v16n6/pt_05.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rlae/v16n6/pt_0...

CONCLUSÃO

Neste estudo houve predomínio de reações adversas à doação do tipo leve (92,6%) em doadores do sexo masculino (51,1%), solteiros (62,0%) e com idade entre 18 e 30 anos (68,5%). Constatou-se que mal-estar, tontura, palidez cutânea e sudorese foram as manifestações clínicas mais recorrentes nas fichas de atendimento de reação adversa analisadas. As condutas de enfermagem prevalentes foram: posicionamento em Trendelemburg, aferição dos dados vitais, oferta da hidratação oral, orientações pós-doação e quanto à técnica correta de respiração.

Houve associação estatisticamente significativa (p<0,05) entre os tipos de eventos adversos e as condutas de enfermagem: hidratação intravenosa, solicitação da avaliação médica, oferta de hidratação oral, posicionamento em Trendelemburg, elevação dos membros inferiores, administração de medicamentos, aferição dos sinais vitais, realização da glicemia capilar e contato com familiar.

Compete aos enfermeiros dos serviços de hemoterapia conhecer essa população em potencial; incentivar sua equipe a prestar uma assistência sistematizada; a motivar e promover educação continuada de sua equipe; bem como, disseminar políticas públicas de incentivo a doação voluntária de sangue, tornando-se uma das referências na elaboração de estratégias capazes de sensibilizar à sociedade.

Espera-se que os resultados desta investigação possam subsidiar o desenvolvimento de estudos prospectivos com essa população, objetivando conhecer os fatores de risco e projetar novas estratégias para redução dos eventos adversos.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2014

Histórico

  • Recebido
    03 Maio 2013
  • Aceito
    04 Out 2013
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