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ALEITAMENTO MATERNO DO PREMATURO EM DOMICÍLIO1 1 Pesquisa com auxílio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, processo 2012/00499-2.

Resumos

O presente estudo teve por objetivo analisar a experiência da mãe acerca do aleitamento materno do recém-nascido prematuro ao longo do primeiro mês após a alta da unidade de cuidados intensivos neonatal. Adotou como referencial teórico o Interacionismo Simbólico e como referencial metodológico a análise de conteúdo qualitativa. Nove mães foram entrevistadas. Os resultados foram descritos a partir de três categorias: 'relações profissionais e aleitamento materno', 'particularidades do aleitamento materno em prematuro' e 'responsabilidade pela alimentação do(s) filho(s)'. Revela ser o aleitamento misto a forma como as mães alimentam o filho prematuro em domicílio, dada a insegurança e incerteza da suficiência do leite materno. Os profissionais de saúde contribuem para tal entendimento com necessidade de transformar as práticas em saúde.

Aleitamento materno; Prematuro; Alta do paciente


The aim of this study was to analyze the experience of mothers regarding the breastfeeding of preterm newborns during the first month after discharge from the neonatal intensive care unit. Its theoretical framework was the symbolic interactionism and its methodological framework was qualitative content analysis. Nine mothers were interviewed. Results were described using three categories: 'professional relationships and breastfeeding', 'unique traits of breastfeeding preterm infants' and 'responsibilities for nourishing infants'. Results show that mixed feeding is how mothers feed their preterm infants at home, given the fact that they are insecure and uncertain that their milk is enough. Health workers contribute to that understanding, and health practices must be transformed.

Breast feeding infantile; Premature infant; Patient discharge


El presente estudio tuvo como objetivo analizar la experiencia de la madre que amamanta el bebé prematuro durante el primer mes después del alta de la unidad de cuidados intensivos neonatales. Fue adaptado como el marco teórico el Interaccionismo Simbólico y como el marco metodológico la análisis de contenido cualitativo. La entrevista tuvo lugar con nueve madres. Los resultados se muestran a partir de tres categorias: 'Las relaciones profesionales y la lactancia materna', 'particularidades de la lactancia materna en prematuros' y 'La responsabilidad por alimentación de lo hijos'. Demostrar que la lactancia materna mixto es la forma como las madres alimentan al niño prematuro en el hogar, dada la inseguridad y la duda de la suficiencia de la leche materna. Profesionales de la salud contribuyen a esa comprensión con la necesidad de transformar las prácticas de salud.

Lactancia materna; Prematuro; Alta del paciente


INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde (OMS),11. World Health Organization. The optimal duration of exclusive breastfeeding. Geneva: WHO; 2001. a United Nations Children's Fund (UNICEF)22. United Nations Children's Fund. Promovendo o aleitamento materno, 2008. [acesso 2013 Dez 28]. Disponível em: http://www.unicef.org.brazil/pt/aleitamento.pdf
http://www.unicef.org.brazil/pt/aleitame...
e o Ministério da Saúde (MS) do Brasil preconizam a amamentação exclusiva com leite materno (LM) desde o nascimento até seis meses de idade, e, após este período (até dois anos ou mais), ser amamentada ao seio materno em associação com alimentos complementares. Entendem isto como uma estratégia natural de vínculo, afeto, proteção e nutrição para a criança, com contribuição para redução da morbimortalidade infantil e desenvolvimento saudável.33. Ministério da Saúde (BR). Saúde da criança. Nutrição infantil: aleitamento materno e alimentação complementar. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2009.

O aleitamento materno (AM) de prematuros detém particularidades, sendo o desmame precoce comum,44. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010 Dez; 15(4):572-7.-55. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9. sobretudo pelo retardo da sucção direta do seio materno, hospitalização da criança; estresse materno e familiar e lacunas no incentivo e apoio ao AM neste contexto.55. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9.

Apesar disto, é consenso ser o LM alimento ideal para o recém-nascido prematuro (RNP).44. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010 Dez; 15(4):572-7.-55. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9. Neste sentido, manter a lactação da mãe e a amamentação exclusiva são ações estratégicas.55. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9. O apoio e o incentivo à amamentação de RNP assegura melhor qualidade de vida,44. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010 Dez; 15(4):572-7.,66. Boucher CA, Brazal PM, Graham-Certosini C, Carnaghansherrard K, Feeley N. Mothers' breastfeeding expiriences en the NICU. Neonatal Netw. 2011 Jan-Fev; 30(1):21-8. crescimento e desenvolvimento,44. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010 Dez; 15(4):572-7.

5. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9.
-66. Boucher CA, Brazal PM, Graham-Certosini C, Carnaghansherrard K, Feeley N. Mothers' breastfeeding expiriences en the NICU. Neonatal Netw. 2011 Jan-Fev; 30(1):21-8. pois promove o vínculo mãe/filho,44. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010 Dez; 15(4):572-7. diminui a perda de peso,44. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010 Dez; 15(4):572-7.-55. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9. estimula e matura o sistema imune e intestinal da criança,44. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010 Dez; 15(4):572-7. dentre outros benefícios.

Assim, a prática do AM, na situação de prematuridade da criança, tem peculiaridades que, se não administradas adequadamente, acabam por desfavorecer sua realização e/ou promover o desmame precoce.44. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010 Dez; 15(4):572-7.-55. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9.

Diante da problemática do AM de RNP, o presente estudo teve como perguntas de pesquisa: "como as mães vivenciam a alimentação do RNP em domicílio?" e "qual o lugar do AM neste contexto?". Estabeleceu-se como objetivo analisar a experiência da mãe acerca do AM do RNP ao longo do primeiro mês após a alta da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN).

MÉTODO

Este estudo direciona-se para a experiência materna de alimentação do RNP após a alta hospitalar, o que determina apreender crenças, valores, significados e tomadas de decisão na alimentação do filho. Assim, optou-se pelo referencial teórico do Interacionismo Simbólico (IS), que foca o comportamento humano a partir de significados estabelecidos na interação social.77. Charon JM. Symbolic interacionism: an introduction, an interpretacion, an integration. Englewood Cliffs: Prentice Hall; 1989. Afirma ser na e por meio da interação social que as interpretações simbólicas e significados são construídos e reconstruídos continuamente.77. Charon JM. Symbolic interacionism: an introduction, an interpretacion, an integration. Englewood Cliffs: Prentice Hall; 1989.

Em consonância com o referencial teórico selecionado, a análise de conteúdo (AC) qualitativa configurou-se como referencial metodológico pertinente, uma vez que se volta à compreensão de produtos da comunicação e visa a descrição conceitual de um fenômeno.88. Vaismoradi M, Turunen H, Bondas T. Content analysis and thematic analysis: implications for conducting a qualitative descriptive study. Nurs Health Sci. 2013 Sept; 15(3):398-405.-99. Elo S, Kynga SH. The qualitative content analysis process. J Adv Nurs. 2008 Apr; 62(1):107-15.

Para a coleta de dados adotou-se a entrevista semiestruturada, guiada pelas seguintes colocações: 'conte-me como você está alimentando seu filho aqui em casa', 'como se deu esta decisão?', e 'o que pensa do AM para RNP?'.

As entrevistas ocorreram nas residências das mulheres ou em serviço de acompanhamento do bebê de risco de um município do interior paulista, local onde os sujeitos em potencial foram captados. Todas as recomendações para pesquisa com seres humanos foram tomadas e o estudo foi aprovado por um Comitê de Ética em Pesquisa, sob o número 115/2012. Todas as entrevistas foram gravadas em dispositivo de áudio digital, tanto para facilitar a obtenção da narrativa como para evitar a perda de dados significativos.

A análise do material seguiu os direcionamentos da AC indutiva,99. Elo S, Kynga SH. The qualitative content analysis process. J Adv Nurs. 2008 Apr; 62(1):107-15. na qual se percorre as seguintes etapas: 1) transcrição da entrevista seguida de leituras reiterativas do material para apreender o sentido do todo e o conteúdo manifesto e latente, que permitem a identificação de unidades de análise; 2) organização do material por meio da codificação e criação de categorias; e 3) reportagem do processo analítico e resultados,99. Elo S, Kynga SH. The qualitative content analysis process. J Adv Nurs. 2008 Apr; 62(1):107-15. quando optou-se por conduzi-lo por meio de um desencadeamento temporal.88. Vaismoradi M, Turunen H, Bondas T. Content analysis and thematic analysis: implications for conducting a qualitative descriptive study. Nurs Health Sci. 2013 Sept; 15(3):398-405.

A coleta de dados ocorreu no período de junho a dezembro de 2013. Não houve predeterminação do número dos sujeitos participantes, e sim, uma preocupação com o fenômeno investigado e a potencialidade que os sujeitos tiveram em contribuir com o objeto empiricamente.1010. Deslauriers JP, Keriset M. O delineamento de pesquisa qualitativa. In: Poupart J, organizador. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Rio de janeiro (RJ): Vozes; 2008. p.127-53. Dessa forma, os resultados derivaram de entrevistas com nove mulheres que atenderam aos critérios de inclusão postos ao estudo: ser mãe de criança(s) que permaneceu(ram) internadas na UTIN; ter a criança ao, nascimento, idade gestacional entre 24 a 32 semanas; não ser a criança portadora de nenhuma morbidade congênita ou síndrome genética; ter iniciado a amamentação do filho na UTIN; e ser maior de 18 anos.

Para preservar o anonimato das participantes, sua identificação no estudo faz uso da letra 'M', seguida do número tradutor da ordem em que foi entrevistada. Por exemplo, a última mãe entrevistada foi identificada como 'M9'.

RESULTADOS

A faixa etária das entrevistadas abrange 27-40 anos. Duas eram mães de gemelares, três já tinham filhos mais velhos e quatro eram mães pela primeira vez. Além disso, sete eram casadas. Todas vivenciavam a prematuridade pela primeira vez. O tempo de hospitalização da criança variou de 1-4 meses e a idade gestacional ao nascimento ficou entre 27-31 semanas. Todas elas estavam em aleitamento misto, com predomínio da fórmula.

O AM em domicílio é vivenciado pela mãe com insegurança e incerteza da suficiência do LM para alimentação, estabilidade clínica e recuperação do filho. Esses elementos são apreciados a partir do ganho de peso da criança, parâmetro aprendido na UTIN, reforçado nas consultas de seguimento e limitador do AM do RNP em domicílio. As categorias 'relações profissionais e AM', 'particularidades do AM em prematuro' e 'responsabilidade diante da alimentação do(s) filho(s)' compõem a descrição do fenômeno de aleitar RNP em domicílio.

Relações profissionais e aleitamento materno

Ao longo da estada na UTIN, o contexto relacional com os profissionais determina à mãe o entendimento de ser sua criança frágil e de risco, com necessidade de um cuidado vígil e minucioso. Determina também o entendimento de que profissionais ocultam informações relativas ao quadro da criança, sobretudo quando se agrava. Diante disto, a mãe adota uma postura de desconfiança e de busca de informações por outros meios que não as interações com os profissionais, para compreender a situação clínica do(s) filho(s), e, como reflexo, sentem a necessidade de 'ver para crer'.

[...] os profissionais te falam tudo pela metade, né, se você não está lá na troca de plantão, você não fica sabendo o que de verdade aconteceu com seu filho. [...] eu chegava cedo, tudo que eles falavam dos meus filhos eu já escutava, e quando eles [os profissionais] vinham passar pra mim, eles não passavam tudo, passavam o que convinha a gente saber. Aquilo que não convinha, não passavam. Outras mães perguntavam como estavam seus filhos e eles respondiam que estavam bem, mas eu tinha escutado que a criança tinha chorado a noite inteira, que estava agitada, e eles falavam que ficou bonzinho a noite toda (M1).

Soma-se a este cenário o predomínio de profissionais que, ao dialogarem com as mães, o fazem de forma ríspida e direta, o que as traumatiza. Com o tempo, torna-se quase insustentável a relação, levando algumas mães a evitá-los, não comparecendo à UTIN ou ao serviço de seguimento.

Tinha uma médica muita direta, ela chega em você e fala, assim, que o estado do seu filho é muito delicado. [...] você, você já está traumatizada, já está mal, só de ficar na UTI, [...] você já está tensa de estar ali e o médico chega e fica: 'oh, você sabe que é difícil, né, você sabe que ele pode viver ou morrer. Oh, então está muito difícil, a situação é muito grave', essas palavras machucam, porque assim tem outros meios de você conversar com a pessoa. [...] quando sei que é ela que vai estar lá já nem vou. Ela também atende no [nome do serviço de seguimento] e falto quando vai ser ela que vai estar lá (M2).

Com relação à AM, especificamente, tal contexto relacional impacta na confiança e segurança materna e familiar na informação profissional, especialmente em relação às perdas de peso da criança após a alta hospitalar. Aprenderam na UTIN que peso traduz recuperação da criança, e a perda dele, involução. A somatória destes dois parâmetros gera na mãe e na família questionamentos sobre a suficiência do LM para a criança. Além disto, nas primeiras consultas do serviço de seguimento, a questão do peso é fortemente reforçada como parâmetro tradutor da boa evolução da criança e do adequado cuidado materno a ela, com explícitas ameaças de reinternação da criança caso ele não se estabilize.

Meu filho não podia perder peso, e eles [profissionais do serviço de seguimento] falavam: 'ele não pode perder peso, porque se ele perder ele pode ter alguma doença pior e ter que voltar a ficar internado'. Meu medo era esse. Pensei: voltar pro hospital de jeito nenhum. Esse era meu maior medo quando cheguei em casa e ele já perdeu peso na primeira semana. Pensei logo: será que meu leite é fraco?(M4).

Ressalta-se também que no período inicial de internação na UTIN, o qual coincide com o estabelecimento da produção de leite e adaptações maternas ao manejo do AM, a mulher convive com duais falas dos profissionais. Por vezes elas reforçam os aspectos restritores do AM na situação de prematuridade, quando enfatizam limitações da criança para o processo de pega do mamilo e sustentação da mamada. Em outros momentos, falam do valor nutricional e da especificidade digestória do LM para a criança prematura, com incentivo à prática. Neste contexto, ficam marcadas as falas relativas aos aspectos restritores, que são retomados pelas mães nas dificuldades com a prática do AM. Contudo, usualmente a decisão de amamentar prevalece, e a mulher procura administrar em seus pensamentos o impacto dos aspectos restritores veiculados na interação com o profissional.

Há falas e atitudes profissionais que trazem o credo na capacidade materna e da criança em praticar o AM exclusivo. Estas têm efeito encorajador e ampliam o desejo e a luta da mulher em amamentar exclusivamente o filho prematuro, apesar das dificuldades que possam enfrentar.

Eu sempre quis amamentar, mas todo mundo falava: 'ele não vai pegar, ele é pequenininho', e eu falava: 'ele vai pegar sim'. Elas [técnicas de enfermagem] falavam assim 'aí doutor vou nem iludir a mãe', eu tinha vontade de socar a cara delas. Em vez de falar: 'não ele vai pegar sim', [...] eu queria era chorar. Aí, a hora que o doutor falou: 'não ele vai pegar sim, pode colocar que ele vai pegar, vai preparar ela', foi uma felicidade, foi um alívio, ele mamou até escorrer leite no cantinho da boca dele. [...] só que eu vou falar para você sempre vem na minha cabeça o que elas falavam, e, às vezes, aqui em casa, quando vejo ele cansado, não conseguindo pegar direito, lembro tudo (M1).

[...] até no dia que fui dar mamá pra ela [filha], a menina do banco de leite veio. [...] aí ela [técnica de enfermagem do banco de leite] falou: 'vai com o pensamento que ela vai pegar sim, que vai dar tudo certo'. Eu já estava chorando, porque eu achei que ela não ia pegar, aí a hora que eu encostei ela no bico, ela pegou e mamou, mamou, mamou, até ficar cansada. Daquele dia em diante decidi que eu ia amamentar minha filha só com leite de peito (M6).

Na alta hospitalar, vivenciam a seguinte dualidade: receber orientações para se esforçarem em manter a amamentação e, simultaneamente, uma prescrição de fórmula com orientações de como ofertar. O uso da fórmula é recomendado apenas quando se mostra necessário, pois o RNP tem dificuldades no AM e não pode perder peso. Quando gemelares o AM é ainda mais complexo.

Engraçado é que fala, fala do aleitamento e, na alta, dá receita de fórmula. Eu peguei, lógico, até comprei, e o medo dele perder peso (M9).

Eu dou leite do peito e na mamadeira, porque a fórmula eu tenho que dar pra elas de três em três horas, foi o que a médica me orientou. Então, durante esse intervalo, posso dar o peito à vontade. Ás vezes, quando uma está acordada e mamou na mamadeira, eu dou o peito. Quando eu vejo que elas estão mais bravas, eu pego e dou a mamadeira [...]. Na alta, todo mundo sai com a receita da fórmula, todo mundo. É mais seguro, pois prematuro, sabe como é (M5).

As relações com os profissionais ficam latentes na memória materna e são acionadas nas tomadas de decisões acerca da alimentação do filho ao longo de todo o período, especialmente quando estão diante de dificuldades com o AM em domicílio.

Particularidades do aleitamento materno em prematuro

Ao longo da hospitalização da criança o LM tende a ser entendido como insuficiente para prematuros, pois a mãe testemunha a escassa opção do AM como primeiro alimento à criança na UTIN e o predomínio do uso de fórmulas neste ambiente, especialmente nas intercorrências de ganho de peso. Isto conduz ao entendimento de que a fórmula é a solução para a nutrição do RNP.

Na UTI davam a fórmula infantil na seringa, e lá mesmo eles tentaram me ajudar amamentar, mas ela puxava muito forte e acabava ficando cansada e perdia peso [...] aí me orientaram a parar de amamentar e nunca mais tentamos o peito, davam a fórmula mesmo, não davam o meu leite. [...] e ela começou a ganhar peso, e hoje está aqui em casa (M3).

Além disto, presenciam a oferta do LM do banco de leite para recém-nascidos de menor idade gestacional e o uso da fórmula para os de maior idade gestacional ou estáveis. Assim, entendem ser indiferente o uso de fórmula ou LM nas crianças que estão mais estáveis.

[...] na UTI eles tiraram o leite materno dele bem cedo. Eles davam para os menoresporque precisavam mais, para o meu filho eles davam uma fórmula que é mais parecido com o leite materno [...]. A fórmula ajudou ele e o meu leite também. Os dois são bons, né ?(M4).

Apesar deste contexto, há mães que valorizam o LM na alimentação do prematuro e verificam existir diferenças em relação ao uso da fórmula. Reconhecem na prática do AM benefícios para a criança no âmbito da nutrição e comportamental e, assim, esforçam-se para realizá-la.

[...] e eles [crianças prematuras] ficam tão bonzinhos quando mamam o leite do peito [...] para prematuro é melhor, é melhor, deixa ele calmo e a gente fica pertinho (M7).

Reconhecer o valor do LM conduz a mulher à tentativa de produzi-lo e enxergar a si mesma como responsável pela sua produção e com o dever de esforçar-se ao máximo para atingir o volume necessário. Com isto, buscam seguir as orientações profissionais para a promoção da produção de leite com disposição para tolerar os desconfortos, especialmente aqueles relativos à necessidade de ingestão de líquidos e ordenha.

Aí eu fazia ordenha, eu cuidava bem do peito, de lavar, de hidratar, comia bem, tomava bastante água, suco, ela [técnica de enfermagem] falou que quanto mais líquido eu tomasse, melhor. Então, eu procuro tomar bastante água, que nem lá no berçário eu aprendi tomar água. De hora em hora tinha que tomar dois copos de água. Eu falei: 'você quer que eu dou leite ou faço xixi' [risos] (M1).

[...] ordenhar leite não é fácil, dói, demora, só que quando você vê que conseguiu tirar e está dando muito leite, nossa, é demais, você faz (M6).

Na estabilidade clínica da criança, as mães são estimuladas pelos profissionais a amamentar quando são enfatizados cuidados especiais com a justificativa de ter o prematuro dificuldade para sugar, cansar-se e engasgar-se facilmente. Isso gera tensão na prática do AM.

Na UTI, o Dr. X deixou eu amamentar, porque eles já estavam bem de saúde pra dar de mamá no peito, aí as enfermeiras falavam assim: 'aí doutor ele não vai pegar porque ele é muito pequenininho e pode engasgar'.Você ouve isto e vai dar de mamá. Que tensão (M8).

Lá na UTI eu amamentei, é claro que deu uma engasgadinha, ele parou de respirar, ele esquecia de respirar, o medo maior era esse, ele começava a sugar e engasgava, mas os profissionais falavam que era normal por ele ser prematuro. Eu ficava de olho o tempo inteiro, mais olhava para ele respirar que qualquer coisa. Dá um medo (M2).

Quando em domicílio as mães relatam que tentam oferecer o seio, mas julgam que produzem ao longo da mamada um volume insuficiente para saciar a criança e sentem a necessidade de ofertar a fórmula como complemento.

Meu filho está mamando o peito e a mamadeira. Tenho pouco leite, então, não satisfaz meu filho, então eu intercalo com as mamadeiras (M9).

No decorrer dos dias em domicílio, a fórmula infantil prevalece como recurso de alimentação da criança. Todas as mães deste estudo amamentava poucas vezes ao dia e preferiam dar o LM por saberem sua importância, mas acreditavam que suas crianças ficariam mais saciadas com a oferta da fórmula. Adotavam como parâmetros balizadores da prática do AM em domicílio o ganho de peso da criança, o conforto respiratório na mamada e o volume de LM.

Tenho muito medo do meu filho perder peso e precisar voltar para o hospital, porisso que eu acabo dando o peito e a mamadeira, não deixo ele chorar de fome e, também, dou de mamá de duas em duas horas, pra ele nunca perder peso (M4).

Responsabilidade diante alimentação do(s) filho(s)

Com a chegada da criança em domicílio a mãe sente a cobrança (dos profissionais, do meio social e de si própria) socialmente imposta a ela de nutrir bem o filho. Neste sentido, pondera, por meio de reflexões comparativas, as ações e orientações profissionais e os aprendizados em sua comunidade. Surgem inseguranças sobre o que de fato é melhor para a alimentação do filho, de forma a vigorar suas reflexões continuamente. Contudo, tende a seguir as recomendações dos profissionais por entenderem que eles detêm conhecimentos sobre prematuros.

Ah, eu fico com medo de fazer alguma coisa errada e prejudicar minhas filhas, entendeu? Que nem de, na hora, eles cobrarem de mim, tipo, 'mãe, você sabia que não podia fazer isso e você fez isso', entendeu? Que nem essa semana que eu levei elas na nutricionista, ela disse que danone só pode dá depois de dois anos, porque eu tenho uma vizinha que ganhou peso tomando danone, daí eu fiquei pensando que qual a criança que vai tomar danone depois de dois anos. Tem coisa que eles querem que você não vai seguir, se vê que não vai fazer tanto mal pra criança, mas tem coisa que eu sigo, porque eu fico com aquele pensamento, e se eu faço e acontece alguma coisa, e elas ficarem internada, como eu vou olhar pra médica e falar o que aconteceu? A médica disse que elas são prematurinhas, tem que ir devagar com elas, então eu prefiro não abusar, pra não prejudicar elas e pra depois eu também não ser cobrada, aí eu prefiro assim, seguir o que ela está falando, eles são médicos, experientes, não vão querer o mal dela, assim como eu também não quero (M5).

As orientações sobre a alimentação da criança recebidas durante a hospitalização e alta trazem segurança para a mãe nos tempos iniciais em domicílio. Atuam como um porto seguro, mas tendem a ser adaptadas ao longo do tempo, pois sentem lacunas nas justificativas que a sustentam, com intensificação de questionamento acerca de sua pertinência para a criança. Apesar disto, a obediência às orientações recebidas se mantém, dado o temor de gerar algum mal ao(s) filho(s).

Na UTI, de três em três horas ele tinha que ser amamentado e ele tinha que tomar o complemento, aí a gente trouxe essa disciplina de lá pra cá, tanto que eu e meu marido colocávamos relógio pra despertar de três em três horas. Isso foi até quatro meses (M4).

Eu iniciei fazendo tudo como na UTI, tudo, tudo. Deixava eu mais tranquila fazer igual de lá. Mas eu percebia que não era assim, parecia ter algo que não se encaixava, sabe ? [...] Hoje procuro dar de mamá conforme como acho que deve ser, conforme minha filha gosta (M6).

Neste contexto de responsabilidade e inseguranças, as particularidades da criança clamam por flexibilidade no cuidado e rompimento com as orientações dos profissionais. São evidências para tanto o choro da criança antes de dar as três horas de intervalo entre as mamadas, o tempo para eructação, a existência de gemelares com comportamentos distintos. Com isto, ao longo do período em domicílio, entendem ser inviável transportar a rigidez das rotinas de cuidados da UTIN e intensificam as reflexões no sentido de romper com as mesmas.

[...] mas o mamar à noite era desesperador, porque eu não podia deitar e eu estava cansada e tinha que dá mamá naquela hora, porque lá no berçário ele mamava de três em três horas da noite, três horas da manhã, seis horas da manhã, e assim o outro ficava louco, sabe, porque que eu tinha que acordar naquele horário e eu pra mim eu não ia dar conta porque eu ficava muito cansada, muito cansada mesmo. Eu tinha que sentar, às vezes eu ficava em pé pra não dormir, porque eu tinha medo de dormir e matar eles afogado com o leite na boca (M8).

A atenção ao conforto da criança durante e após as mamadas, seja no seio ou na mamadeira é fortemente presente e atrela-se ao conceito de ser o prematuro frágil e de risco e de ser a mãe responsável por ele. Isto restringe transformações de práticas alimentares, como, por exemplo, persistir na oferta do LM.

Eu não tenho muito leite, então, assim, como eu oferecia o peito e ele não queria, eu não podia deixar ele com fome, então dou mamadeira, e dá dó, porque, assim, ele tem o pulmãozinho cansado e você vai deixar chorar. Quando é um bebezinho normal, você deixa, mas não é, dá dó ele chorar, porque eu não quero dar a mamadeira, eu quero dar só o peito e, infelizmente, tem que estar dando os dois, senão ele chora muito apenas com meu leite (M9).

Isto é reforçado nas consultas de seguimento quando são questionadas a respeito de como estão alimentando o filho de forma articulada com o ganho de peso da criança. Nas perdas de peso, os profissionais enfatizam a importância da alimentação e a fórmula como recurso resolutivo.

[...] a médica sempre me dizia que o meu filho não pode perder peso, 'porque se ele perder, ele pode ter alguma doença pior e voltar pra cá'. Meu medo é esse, voltar pro hospital, por isso eu alimento ele de três em três horas e cuido direitinho. O [nome da fórmula] tem ajudado ele a ganhar peso, como a médica disse (M8).

DISCUSSÃO

O apoio e suporte dos profissionais às mães pode contribuir com a amamentação após a alta hospitalar.1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20. Neste sentido, as informações ofertadas pelos profissionais da UTIN, o tempo de estada no hospital1212. Cabral IE, Groleau D. Breastfeeding practices after kangaroo mother method In Rio de Janeiro: the necessity for health education and nursing intervention at home. Esc Anna Nery. 2009 Oct-Dec; 13(4):763-71. e o acolhimento profissional recebido pela mãe favorece a aquisição dos conhecimentos dos procedimentos, das estratégias e das técnicas acerca do AM. Quanto mais as mães sabem sobre estratégias, técnicas e procedimentos relacionados ao AM, mais confiantes e fortalecidas ficam na adoção dele como único recurso na nutrição do filho.55. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9.-66. Boucher CA, Brazal PM, Graham-Certosini C, Carnaghansherrard K, Feeley N. Mothers' breastfeeding expiriences en the NICU. Neonatal Netw. 2011 Jan-Fev; 30(1):21-8.,1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20.-1212. Cabral IE, Groleau D. Breastfeeding practices after kangaroo mother method In Rio de Janeiro: the necessity for health education and nursing intervention at home. Esc Anna Nery. 2009 Oct-Dec; 13(4):763-71. Contudo, quando as mães não recebem as informações sobre ordenha e manutenção da produção do LM, sentem falta de apoio para o AM.1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20. Ressalva-se que as mulheres deste estudo não tiveram oportunidades de explorar as informações a elas ofertadas, com desdobramentos para a manutenção do AM em domicílio. Adentrar-se no universo social, psicológico e na realidade de cada mulher deve integrar a promoção, proteção e apoio ao AM.1313. Moreira MA, Nascimento ER, Paiva MS. Representações sociais de mulheres de três gerações sobre práticas de amamentação. Texto Contexto Enferm [online]. 2013 Abr-Jun; 22(2):432-41. [acesso 2013 Dez 08]. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072013000200020&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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Além disto, a aliança entre profissionais e mães faz-se mais presente no ambiente hospitalar, em comparação com o domiciliar,1212. Cabral IE, Groleau D. Breastfeeding practices after kangaroo mother method In Rio de Janeiro: the necessity for health education and nursing intervention at home. Esc Anna Nery. 2009 Oct-Dec; 13(4):763-71.,1414. Silva RV, Silva IA. A vivência de mães de recém-nascidos prematuros no processo de lactação e amamentação. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2009 Jan-Mar; 13(1):108-15. de forma que a mulher fica desamparada ao enfrentar dificuldades no manejo do AM em domicílio. Tal fato implica na interrupção da oferta do LM e introdução da fórmula,55. Paiva CVA, Saburido KAL, Vasconcelos MN, Silva MAM. Aleitamento materno de recém-nascidos internados: dificuldades de mães com filhos em unidade de cuidados intensivos e intermediários neonatais. Rev Min Enferm. 2013 Out-Dez; 17(4):932-9.,1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20.-1212. Cabral IE, Groleau D. Breastfeeding practices after kangaroo mother method In Rio de Janeiro: the necessity for health education and nursing intervention at home. Esc Anna Nery. 2009 Oct-Dec; 13(4):763-71.,1515. Souza NL, Fernandes ACP, Costa ICC, Enders BC, Carvalho JBL, Silva MLC. Domestic maternal experience with preterm newborn children. Rev Salud Publica. 2010; 12(3):356-67.-1616. Pacheco STA, Cabral IE. Alimentação do bebê de baixo peso no domicílio: enfrentamentos da família e desafios para a enfermagem. Esc Anna Nery. 2011 Abr-Jun; 15(2):314-22. o que ocorreu com as mulheres ouvidas neste estudo e foi intensificado pelas dualidades de condutas profissionais no manejo da alimentação da criança.

As mães compartilharam da escolha profissional da fórmula enquanto substitutivo do LM na UTIN e, por vezes, no serviço de seguimento, verificaram o sucesso da mesma no ganho de peso da criança. Assim, neste estudo, como em outros,1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20.-1212. Cabral IE, Groleau D. Breastfeeding practices after kangaroo mother method In Rio de Janeiro: the necessity for health education and nursing intervention at home. Esc Anna Nery. 2009 Oct-Dec; 13(4):763-71.,1515. Souza NL, Fernandes ACP, Costa ICC, Enders BC, Carvalho JBL, Silva MLC. Domestic maternal experience with preterm newborn children. Rev Salud Publica. 2010; 12(3):356-67.-1616. Pacheco STA, Cabral IE. Alimentação do bebê de baixo peso no domicílio: enfrentamentos da família e desafios para a enfermagem. Esc Anna Nery. 2011 Abr-Jun; 15(2):314-22. a fórmula significou uma solução na alimentação do filho em domicílio, e saber oferecê-la integra as necessidades maternas.1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20.

Ressalta-se que a percepção da fórmula como resolutiva para a nutrição de prematuros traduz o posicionamento da mulher/mãe sobre os benefícios do AM e os aprendizados ocorridos na UTIN e em domicílio com relação à alimentação do RNP. Ao ponderar a segurança para a criança as mulheres deste estudo entenderam o aleitamento misto, com predomínio da fórmula, como o caminho mais seguro, e tiveram nos profissionais de saúde as interações que conduziram a tanto. Diferentemente de outras mães, as deste estudo não relataram ponderar mudanças na forma como manejavam o AM em domicílio para conseguir ampliá-lo.1717. Morais AC, Quirino MD, Almeida MS. O cuidado da criança prematura no domicílio. Acta Paul Enferm. 2009 Jan-Fev; 22(1):24-30.

A participação dos profissionais na promoção do AM, para além de processos educativos1212. Cabral IE, Groleau D. Breastfeeding practices after kangaroo mother method In Rio de Janeiro: the necessity for health education and nursing intervention at home. Esc Anna Nery. 2009 Oct-Dec; 13(4):763-71. e de encorajamento,1515. Souza NL, Fernandes ACP, Costa ICC, Enders BC, Carvalho JBL, Silva MLC. Domestic maternal experience with preterm newborn children. Rev Salud Publica. 2010; 12(3):356-67. é premente, com atenção à congruência entre o discurso e a prática. Eles influem o AM e sua manutenção em domicílio1212. Cabral IE, Groleau D. Breastfeeding practices after kangaroo mother method In Rio de Janeiro: the necessity for health education and nursing intervention at home. Esc Anna Nery. 2009 Oct-Dec; 13(4):763-71.,1515. Souza NL, Fernandes ACP, Costa ICC, Enders BC, Carvalho JBL, Silva MLC. Domestic maternal experience with preterm newborn children. Rev Salud Publica. 2010; 12(3):356-67. e podem ser amparo às mães de prematuros, sobretudo na superação de seus medos e inseguranças.1414. Silva RV, Silva IA. A vivência de mães de recém-nascidos prematuros no processo de lactação e amamentação. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2009 Jan-Mar; 13(1):108-15. Ainda assim, os mesmos estão entre as interações sociais que determinam a concepção de fragilidade do prematuro1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20.,1515. Souza NL, Fernandes ACP, Costa ICC, Enders BC, Carvalho JBL, Silva MLC. Domestic maternal experience with preterm newborn children. Rev Salud Publica. 2010; 12(3):356-67. e, consequentemente, promovem ações de superproteção com o RNP1515. Souza NL, Fernandes ACP, Costa ICC, Enders BC, Carvalho JBL, Silva MLC. Domestic maternal experience with preterm newborn children. Rev Salud Publica. 2010; 12(3):356-67. que, quando em domicílio, trazem inseguranças no manejo do AM e incertezas sobre o mesmo.1616. Pacheco STA, Cabral IE. Alimentação do bebê de baixo peso no domicílio: enfrentamentos da família e desafios para a enfermagem. Esc Anna Nery. 2011 Abr-Jun; 15(2):314-22.

Infere-se nos resultados o dilema das mulheres em conceberem-se como "boas mães", dado o fato de não terem optado pelo AM exclusivo. Ficam a ponderar tal questão, encontrando no conceito de vulnerabilidade e instabilidade da criança prematura, reforçado pelos profissionais, a justificativa para a decisão de fazer uso de fórmula como recurso predominante na alimentação do filho. Isto reforça que as tomadas de decisões materna na forma como alimentarão o filho prematuro fundamentam-se no significado de ser o LM essencial,1414. Silva RV, Silva IA. A vivência de mães de recém-nascidos prematuros no processo de lactação e amamentação. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2009 Jan-Mar; 13(1):108-15. contudo, ser a amamentação ao seio arriscada, em face das particularidades de RNP.

Assim como em outros estudos, o AM exclusivo revelou-se como uma das dificuldades maternas no cuidado da RNP em domicílio,1515. Souza NL, Fernandes ACP, Costa ICC, Enders BC, Carvalho JBL, Silva MLC. Domestic maternal experience with preterm newborn children. Rev Salud Publica. 2010; 12(3):356-67.,1818. Caetano LC, Nascimento GS, Nascimento MCA. A família e a prática de amamentação em bebês de baixo peso ao nascer. Rev Eletr Enferm [online]. 2011 Jul-Set; 13(3):431-8. [acesso 2013 Dez 28]. Disponível em: http://www.revistas.ufg.br/index.php/fen/article/view/10646/10644
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com abandono da prática,1818. Caetano LC, Nascimento GS, Nascimento MCA. A família e a prática de amamentação em bebês de baixo peso ao nascer. Rev Eletr Enferm [online]. 2011 Jul-Set; 13(3):431-8. [acesso 2013 Dez 28]. Disponível em: http://www.revistas.ufg.br/index.php/fen/article/view/10646/10644
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uso de fórmulas infantis e introdução precoce de alimentos como prática alimentar do RNP.1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20.

As mulheres deste estudo pouco trouxeram acerca da prática do AM e o apego ao filho. Pode-se inferir que elas não foram despertadas suficientemente para esta questão, pois o contexto interacional que as acolhia dirigiu seu olhar para a criticidade clínica da criança, a importância do ganho de peso e a fórmula como recurso nutricional; aspectos que permearam a experiência de aleitar o RNP em domicílio. Aponta-se a possibilidade de frustração materna por não obter êxito no AM exclusivo do filho.1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20. Diante disso, as mães foram privadas de reconhecerem outras nuances que integram o ato de amamentar, dentre as quais está a veiculação de afeto e o prazer do ato em si.

Contudo, percebe-se nos dados o quanto as mães buscam garantir o melhor ao filho, o que é uma evidência de vínculo entre eles. Porém, não conseguiriam efetivar o AM exclusivo como um recurso que vai a tal encontro, o que é contrário ao ocorrido com outras mães, em contextos interacionais mais valorizadores da relação mãe/filho.1414. Silva RV, Silva IA. A vivência de mães de recém-nascidos prematuros no processo de lactação e amamentação. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2009 Jan-Mar; 13(1):108-15.,1717. Morais AC, Quirino MD, Almeida MS. O cuidado da criança prematura no domicílio. Acta Paul Enferm. 2009 Jan-Fev; 22(1):24-30.,1919. Lee TY, Lee TT, Kuo SC. The experiences of mothers in breastfeeding their very low birth weight infants. J AdvNurs. 2009 Dec; 65(12):2523-31. O AM misto foi prática dominante após a alta hospitalar neste estudo, assim como em outro.1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20.

O AM é prática social, portanto, dependente de crenças, valores e processos de socialização específicos de uma comunidade.1313. Moreira MA, Nascimento ER, Paiva MS. Representações sociais de mulheres de três gerações sobre práticas de amamentação. Texto Contexto Enferm [online]. 2013 Abr-Jun; 22(2):432-41. [acesso 2013 Dez 08]. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072013000200020&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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Explorar a percepção de coletivos (família e comunidade) em relação ao AM de prematuros contribuiria para ampliação da compreensão do fenômeno. Sendo assim, quando as mães se veem em situações inseguras no AM do filho recorrem às suas famílias e aderem às orientações ofertadas pela mesma.1111. Melo LM, Machado MMT, Leite AJM, Rolim KMC. Prematuro: experiência materna durante amamentação em unidade de terapia intensiva neonatal e pós-alta. Rev Rene. 2013 Jul-Ago; 14(3):512-20.,1313. Moreira MA, Nascimento ER, Paiva MS. Representações sociais de mulheres de três gerações sobre práticas de amamentação. Texto Contexto Enferm [online]. 2013 Abr-Jun; 22(2):432-41. [acesso 2013 Dez 08]. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072013000200020&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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É sabido existir grande importância do apoio e incentivo da família para o AM.1313. Moreira MA, Nascimento ER, Paiva MS. Representações sociais de mulheres de três gerações sobre práticas de amamentação. Texto Contexto Enferm [online]. 2013 Abr-Jun; 22(2):432-41. [acesso 2013 Dez 08]. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072013000200020&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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Este estudo ouviu mães atendidas em uma UTIN que não adota as preconizações de humanização postas pelo Ministério da Saúde, com restrições de visitas e de contato entre mãe e filho. Ouvir mães que conviveram com ambientes de UTIN credenciadas como "Amigo da Criança" pode vir a evidenciar contrapontos destes contextos interacionais e sua influência na prática do AM de prematuros em domicílio. Fica ainda a sugestão de se explorar a perspectiva dos profissionais da UTINs e serviços de seguimento acerca da intencionalidade de atos para a promoção, apoio e incentivo do AM ao RNP.

O período após a alta hospitalar da criança nascida prematura ainda pode ser explorado em estudos, com vistas a contribuir com o cuidado ofertado à criança e à família nos serviços de seguimento e nas ações de puericultura dos serviços de atenção primária em saúde.

CONCLUSÃO

Identifica-se a forte influência dos tempos vividos na UTIN no manejo do AM em domicílio, especialmente das interações com os profissionais de saúde, por promoverem o entendimento de que a amamentação ao seio materno pode trazer prejuízos às crianças nascidas prematuras. Estes sinalizam para a fórmula, como recurso efetivo na alimentação dessa criança, ancorado no ganho de peso.

Há apoio informacional, contudo, descontextualizado e incongruente com a prática profissional exercida, o que traz dualidades e repercute em inseguranças na mãe para exercer o AM em domicílio.

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    Pesquisa com auxílio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, processo 2012/00499-2.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Nov 2015
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    21 Abr 2014
  • Aceito
    11 Fev 2015
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