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AÇÕES/INTERAÇÕES MOTIVADORAS PARA LIDERANÇA DO ENFERMEIRO NO CONTEXTO DA ATENÇÃO BÁSICA À SAÚDE1 1 Extraído da tese - Revelando a liderança no complexo contexto da Atenção Básica à Saúde, Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em 2013.

Resumos

Estudo qualitativo com o objetivo de compreender as ações/interações identificadas como motivadoras de liderança para enfermeiros da Atenção Básica à Saúde de um município localizado ao sul do Brasil. Utilizou-se a Teoria Fundamentada nos Dados como referencial metodológico. A coleta dos dados ocorreu mediante entrevistas semiestruturadas com vinte e três enfermeiros atuantes na rede municipal de saúde e sete professores universitários do Curso de Enfermagem com expertise no tema, distribuídos em quatro grupos amostrais. Da análise emergiu a categoria Compondo o perfil do enfermeiro para liderança e sua importância nas organizações de saúde sustentado por 3 subcategorias. O enfermeiro exerce liderança motivada pela personalidade, estímulo na formação profissional, características próprias da profissão e influência do ambiente. Os enfermeiros são influenciados e influenciam o serviço de saúde. Atuam em consonância com as políticas de saúde e contribuem para incentivar a integração dos demais trabalhadores nos serviços de saúde.

Liderança; Enfermagem; Administração pública; Atenção primária à saúde


The aim of this qualitative study is to understand the actions/interactions identified as motivating leadership for nurses working at Primary Health Care services in a city in the South of Brazil. The Grounded Theory was used as the methodological framework. Data collection occurred through semi-structured interviews with twenty-three nurses working in the municipal health network and seven Nursing professors with expertise on the theme, distributed in four sample groups. The analysis revealed the category Composing the profile of nurses for leadership and its importance in health organizations, supported by three subcategories. The nurse exercises leadership driven by personality, vocational training stimulus, characteristics of the profession and influence of the environment. Nurses are influenced and influence the health service, acting in compliance with health policies, helping to foster the participation and integration of other workers in the health services.

Leadership; Nursing; Public administration; Primary health care


Estudio cualitativo con objeto de comprender las acciones/interacciones identificadas como motivadoras del liderazgo para los enfermeros vinculados a los servicios de Atención Primaria en municipio ubicado al sur de Brasil. Se utilizó la Teoría Fundamentada como método. La recolección de datos ocurrió a través de entrevistas semiestructuradas con 23 enfermeros que trabajan en la red de salud municipal y siete profesores de enfermería con experiencia en el tema, distribuidos en cuatro grupos de muestreo. Del análisis surgió la categoría componiendo el perfil del o enfermero para el liderazgo y su importancia en las organizaciones. El enfermero ejerce liderazgo motivado por su personalidad, estímulo de la formación profesional, características de la profesión y influencias del ambiente. Los enfermeros son influidos e influyen el servicio de salud, actúan en conformidad con las políticas de salud y ayudan a fomentar la participación y la integración de los demás trabajadores de los servicios de salud.

Liderazgo; Enfermería; Administración pública; Atención primaria de salud


INTRODUÇÃO

Para o bom funcionamento da Atenção Básica à Saúde (ABS) entende-se que seja necessário, além da infra-estrutura adequada e equipe de saúde multiprofissional integrada, a presença de líderes capazes de articular questões internas e externas ao serviço e favorecer a articulação de saberes para lidar com uma variedade de processos, concentrando em si a responsabilidade de atuar com o mais elevado grau de descentralização e capilaridade, bem como ser resolutiva, coordenando o cuidado e as redes de atenção à saúde.11. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.

O enfermeiro desempenha, junto à equipe de saúde, uma atuação diferenciada. Faz a mediação dos conflitos interpessoais e das ações no trabalho coletivo. É considerado um líder na rede de relações dos agentes comunitários de saúde.22. Lanzoni GMM, Meirelles BHS. Leadership of the nurse: an integrative literature review. Rev latino-Am Enfermagem. 2011; 19(3):651-8. Ainda, ressalta-se a dimensão gerencial do seu trabalho, na qual o enfermeiro ocupa a função de gerente em mais de 80% das Unidades Básicas de Saúde (UBS) dos municípios de pequeno porte ao sul do Brasil.3

Destaca-se que nem todo gerente está preparado para ser um líder de direito e de fato, mas certamente é na gerência que reside o ponto mais crítico da liderança. No contexto da ABS, esta assertiva remete a considerar as implicações e repercussões do cargo, dentre outras questões, ressalta-se o estresse dos gerentes sobrecarregados pela interferência dos níveis mais centrais de gestão, influência da mudança do grupo gestor, burocracia da administração pública, o excesso de demandas da população local e dificuldades de gerenciamento de equipes, visando a eficiência técnica e política na promoção, prevenção e recuperação da saúde do usuário e sua família.22. Lanzoni GMM, Meirelles BHS. Leadership of the nurse: an integrative literature review. Rev latino-Am Enfermagem. 2011; 19(3):651-8.,44. Kian KO, Matsuda LM, Waidmann MAP. Compreendendo o cotidiano profissional do enfermeiro-líder. Rev RENE. 2012; 12(4):724-31.

Sabe-se que as características pessoais e a hierarquia institucional são fatores importantes que promoveram e influenciaram a prática de liderança do enfermeiro no contexto hospitalar.55. Amestoy SC, Cestari ME, Thofehrn MB, Milbrath VM, Porto AR. Características institucionais que interferem na liderança do enfermeiro. Rev Gaucha Enferm. 2009; 30(2):214-20. Considerando que a ABS, preconiza uma prática profissional coletiva visando a tomada de decisão compartilhada e com maior participação da sociedade na determinação das ações em saúde, adotou-se como pressuposto que a liderança na ABS é compreendida como uma ação grupal complexa, na qual o líder emerge naturalmente das múltiplas interações estabelecidas entre os envolvidos, com uma habilidade diferenciada de perceber o local no qual atua, enquanto sente, intui, vivencia, relaciona-se com e influencia os outros.

Considerando que os dois grandes desafios impostos aos líderes na ABS são o gerenciamento de equipes multidisciplinares e heterogêneas e a articulação de culturas diferentes, tanto dentro de equipe quanto em relação às culturas locais, questiona-se: quais ações/interações estimulam a prática de liderança pelo enfermeiro e como se manifestam em seu cotidiano de trabalho? Diante do exposto, este estudo teve por objetivo compreender as ações/interações identificadas como motivadoras de liderança para enfermeiros da ABS de um município localizado ao sul do Brasil.

MÉTODO

Trata-se de um recorte de uma pesquisa intitulada "Liderança do enfermeiro na Atenção Básica à saúde sob a perspectiva da complexidade", na qual se utilizou Teoria Fundamentada nos Dados (TFD) como referencial metodológico. A TFD tem o potencial de oferecer maior compreensão sobre o fenômeno e fornecer subsídios para elaboração de um modelo teórico.66. Strauss A, Corbin J. Pesquisa Qualitativa: técnicas e procedimentos para o desenvolvimento de teoria fundamentada. 2. ed. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008.

O cenário do estudo foi a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de uma cidade de aproximadamente 400 mil habitantes, localizada ao Sul do Brasil. A coleta de dados ocorreu durante o período de setembro de 2011 a junho de 2012 em 50 UBS. A seleção dos participantes na TFD foi por amostragem teórica, ou seja, não é possível determinar a priori a delimitação do número de sujeitos, e a busca pelos informantes é processual permitindo a inclusão de diferentes grupos de pessoas considerando sua relevância para o estudo. Para compor o primeiro grupo amostral considerou-se como critérios de inclusão: ser enfermeiro da SMS por no mínimo dois anos e ter atuado em pelo menos uma das seguintes atividades: equipe saúde da família, coordenação da UBS e cargo administrativo junto ao nível gerencial.

O convite aos participantes ocorreu por contato telefônico para o local de trabalho com apresentação dos pesquisadores envolvidos e da metodologia da pesquisa. Caso obtivesse retorno positivo, era agendado um segundo encontro para realização da entrevista.

O primeiro grupo amostral foi composto de, no mínimo, um enfermeiro de equipe saúde da família de cada um dos cinco Distritos Sanitários, totalizando seis enfermeiros, tendo como técnica de coleta de dados a entrevista semiestruturada, cuja questão inicial foi: Como você compreende e exerce liderança na ABS? Ao atribuir significados às ações/interações vivenciadas na sua prática de liderança, quais delas (ações/interações) foram consideradas motivadoras ou causadoras? O encaminhamento das demais questões foi direcionado pelas pesquisadoras a partir das respostas dos participantes.

No decorrer do processo de coleta e análise dos dados, percebeu-se a necessidade de incluir outros três grupos. O segundo grupo foi formado por sete enfermeiros coordenadores de UBS e o terceiro incluiu dez enfermeiros que atuavam em gerências ou diretorias na esfera administrativa, visando discutir a atuação em atividades vinculadas ao processo gerencial. O quarto grupo foi composto por sete enfermeiros, docentes do curso de graduação em enfermagem de duas universidades da região, por apresentarem expertise no tema ABS e/ou liderança em enfermagem e a necessidade aprofundar o aspecto da liderança como uma competência a ser desenvolvida na formação profissional. No total, foram entrevistados trinta enfermeiros. Todas as entrevistas foram áudio-gravadas e posteriormente transcritas na íntegra.

Concomitante à coleta dos dados, realizou-se a análise dos mesmos como preconizado pela TFD, através da codificação aberta, axial e seletiva.66. Strauss A, Corbin J. Pesquisa Qualitativa: técnicas e procedimentos para o desenvolvimento de teoria fundamentada. 2. ed. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. Desta forma, procedeu-se a leitura atenta da entrevista transcrita, as quais foram analisadas manualmente linha a linha, visando verificar cada incidente e nomeá-lo com códigos preliminares iniciados por verbos no gerúndio. Estes foram agrupados e reorganizados por semelhanças e diferenças, visando elaborar os códigos conceituais com maior nível de abstração. Durante a codificação axial, os códigos conceituais foram novamente reagrupados, com base em analise comparativa com os demais dados coletados em subcategorias e categorias. Na última etapa foi realizada a codificação seletiva, na qual os dados foram relacionados e as categorias foram refinadas para ganhar a forma de um modelo teórico e desvelar o fenômeno central. O modelo paradigmático, estrutura proposta pelos autores da TFD para orientar a construção do modelo teórico é formado por cinco componentes: contexto, condição causal, condições intervenientes, estratégias e consequências,66. Strauss A, Corbin J. Pesquisa Qualitativa: técnicas e procedimentos para o desenvolvimento de teoria fundamentada. 2. ed. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. subsidiou a organização dos dados e apresentação do modelo teórico do presente estudo.

A partir das relações estabelecidas entre as subcategorias e categorias, distribuídas em cinco componentes, emergiu o modelo teórico, cujo fenômeno intitula-se: "Revelando as práticas de liderança do enfermeiro no complexo contexto da Atenção Básica à Saúde".

Visando atender ao rigor metodológico, realizou-se a validação do modelo teórico desenvolvido, visando determinar como a abstração se ajusta aos dados coletados e identificar omissões em relação aos conceitos gerados no esquema teórico.66. Strauss A, Corbin J. Pesquisa Qualitativa: técnicas e procedimentos para o desenvolvimento de teoria fundamentada. 2. ed. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. Esta etapa foi realizada com três enfermeiros: dois enfermeiros vinculados à instituição de coleta de dados não participantes do estudo e um pesquisador com expertise no método e no tema que compôs o quadro de participantes. Neste processo, foram verificadas a coerência metodológica, a aderência temática e as possibilidades de abstração do modelo teórico.

O componente condições causais refere-se aos elementos que despertaram ou foram potencialmente motivadores para que o fenômeno fosse vislumbrado. Considerando a relevância dos achados identificados neste componente, os quais são representados pela categoria Compondo o perfil do enfermeiro para liderança em saúde e sua importância nas organizações, optou-se por explorar separadamente seus conceitos e discuti-los com a literatura científica.

Destaca-se que as informações que identificavam os participantes na entrevista foram modificadas para preservar suas identidades. Empregou-se também o uso de pseudônimos formados pela letra P e um número ordinal correspondente à sequência das entrevistas realizadas (P1, P2 a P30).

Este estudo foi aprovado no Comitê de Ética e Pesquisa com Seres Humanos sob o número 130/2011.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O fenômeno "Revelando as práticas de liderança do enfermeiro no complexo contexto da Atenção Básica à Saúde" foi gerado pela condição causal do modelo paradigmático. Este componente foi formado pela categoria "Compondo o perfil do enfermeiro para liderança em saúde e sua importância nas organizações", o qual emergiu das seguintes subcategorias: Enfermeiros exercendo liderança mesmo sem cargo formal; Percebendo a liderança da graduação à centralidade nas organizações e; Enfatizando características do enfermeiro líder.

Enfermeiros exercendo liderança mesmo sem cargo formal

Os participantes ressaltam que nasceram com essa habilidade e desde criança possuíam carisma ou exerciam alguma influência sobre as outras pessoas. Por conseguinte, assumir cargos de representação ou de destaque nas instituições foi algo natural e quase que imediato na carreira profissional. Nesse processo, alguns participantes percebiam-se na condição de ser genuinamente um líder do que apenas chefe por desenvolverem uma função legitimada, e não somente legalizada, como apresenta a fala: têm pessoas que já nascem com esse perfil de liderança e vão aperfeiçoando, são grandes lideres. E outros não têm o perfil e são estimulados a desenvolverem essa atividade, podendo, algumas vezes, não evoluir com sucesso (P10).

Relatam, ainda, que por ser um traço na sua personalidade, puderam se envolver na luta pelo reconhecimento e valorização da categoria profissional. Buscaram melhores condições de trabalho, salário, formação em serviço e qualidade na assistência. Isso, porque acreditam que a Enfermagem não é filantropia e sim uma profissão essencial para o gerenciamento dos serviços de saúde e para o cuidado humano. Assim, a influência da liderança nas características pessoais do enfermeiro é considerada importante, pois o comportamento e a postura do líder servirão de exemplo a sua equipe.44. Kian KO, Matsuda LM, Waidmann MAP. Compreendendo o cotidiano profissional do enfermeiro-líder. Rev RENE. 2012; 12(4):724-31. Entende-se também que a verdadeira liderança emerge quando a equipe de trabalho resolve seguir o líder pela confiança em sua visão.

Em especial, com relação às UBS, algumas atividades foram citadas como relevantes por oportunizarem o exercício de liderança pelo enfermeiro, tais como: previsão e controle de materiais e medicamentos, gestão de pessoas, acolhimento de novos profissionais, preenchimento de formulários dos programas de saúde; e também coordenar a equipe de saúde da família e o serviço de saúde. Embora esta última não seja imposta aos enfermeiros do estudo, os participantes percebem que se posicionam à frente dos serviços de saúde, por possuírem maior mobilidade e não se restringirem a desenvolver atividades nos consultórios. Assim, são convidados a organizar o serviço, como se observa no depoimento: quando está faltando alguém do administrativo, [...] aí acaba que a gente, o enfermeiro, assume muita coisa, que talvez a gente poderia delegar para outra pessoa. Mas, assumimos porque não tem para onde correr, você assume ou você assume! (P3). Convém assinalar que as principais dificuldades encontradas pelos enfermeiros na Estratégia de Saúde da Família relacionam-se à estrutura física e à falta de mais profissionais de saúde, pois, na ausência de alguns membros da equipe, o enfermeiro deixa de cumprir seu papel para realizar outras atividades.77. Rangel RF, Fugali MM, Backes DS, Gehlen MH, Souza MHT. Avanços e perspectivas da atuação do enfermeiro em estratégia saúde da família. Cogitare enferm. 2011; 16(3):498-504.

Alguns estudiosos asseveram que a liderança do enfermeiro não ocorre de forma natural na ABS. Ela é entendida como produto da dinâmica do processo de trabalho, tendo em vista que ocupa o cargo de gerente em muitas UBS. Desta forma, o enfermeiro torna-se líder devido às funções que realiza.88. Vicenzi RB, Girardi MW, Lucas ACS. Liderança em Saúde da Família: um olhar sob a perspectiva das relações de poder. Saude Transf Soc. 2010; 1(1):82-7. Em síntese, ao mesmo tempo em que o enfermeiro influencia o serviço de saúde com suas características e exemplos, permite-se ser modificado pelo movimento e dinâmica desenvolvido na UBS. É um ciclo em que se evidencia a experiência da autonomia e liberdade no exercício da dependência da sociedade e da natureza.99. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Sulina; 2011.

Quando os enfermeiros não ocupam cargos ou funções formais de coordenação, estabelecem parcerias. Assumem-se demandas gerenciais e são resolvidos muitos problemas e conflitos que surgem no dia-a-dia. Os participantes relacionam esta atitude à dinâmica de trabalho do enfermeiro, que realiza atividades assistenciais concomitantes às ações gerenciais. Enfatiza-se que as duas dimensões são complementares e interdependentes, pois quando o enfermeiro se afasta de alguma delas, apresenta fragilidades, considerando que o saber gerencial potencializa o saber clínico e vice-versa, como ilustra a fala: eu não era a figura de coordenador, porque tinha um coordenador formal, mas quem respondia por aquela equipe era eu. As pessoas se reportavam a mim (P1). Não vejo o trabalho gerencial exclusivo como uma coisa negativa. Só que o ruim é quando uma pessoa vai só para um lado ou para o outro, entendeu? [...] Eu acho que uma coisa é o complemento da outra. Ajuda a ter o preparo de uma gestão; dá amplitude à tua visão para trabalhar a tua assistência (P9).

O processo de trabalho do enfermeiro compreende diferentes dimensões, consideradas complementares, dentre as quais se destacam a dimensão assistencial e a gerencial. Na primeira, o enfermeiro adota como objeto de intervenção as necessidades de cuidado de enfermagem e tem por finalidade o cuidado integral. No segundo, são adotadas como objetos a organização do trabalho e a coordenação dos recursos humanos em enfermagem, com a finalidade de criar condições adequadas de cuidado aos pacientes e de desempenho para os trabalhadores.1010. Costa VT, Meirelles BHS, Erdmann AL. Best practice of nurse managers in risk management. Rev Latino-am Enfermagem [online]. 2013 [acesso 2014 Ago 01]; 21(5). Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692013000500021
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Nesse sentido, o exercício de liderança do enfermeiro é mais um componente do complexo conjunto do ser e fazer Enfermagem, sendo a articulação de todas as dimensões mais do que a soma das partes.99. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Sulina; 2011. Ao contrário de uma atividade assistencialista, reducionista e simplificadora, as práticas de liderança compreendem em si a interdependência com os demais quesitos do ser enfermeiro, influenciam-nas e são influenciadas; geram novas associações e interações.

Os participantes concebem que o enfermeiro é reconhecido pela equipe e comunidade como uma referência, seja por um perfil diferenciado de liderança, sensível aos problemas sociais da comunidade ou por assumir muitas responsabilidades junto aos serviços de saúde, conforme ilustra a fala: embora muitos problemas sejam identificados no consultório médico, mas acabam sendo encaminhados para gente. Inclusive, muitos usuários pedem para falar diretamente conosco quando aparece esse tipo de situação (P4). Assim, diferentemente de outros profissionais da equipe de saúde que encontram dificuldade para se inserir em problemas sociais da comunidade possivelmente em razão de uma atuação mais tecnicista, a Enfermagem tem um potencial de envolvimento maior,88. Vicenzi RB, Girardi MW, Lucas ACS. Liderança em Saúde da Família: um olhar sob a perspectiva das relações de poder. Saude Transf Soc. 2010; 1(1):82-7. por entender que sua prática ganha mais efetividade quando integrada às demais áreas do conhecimento e serviços de suporte ao usuário do Sistema Unico de Saúde (SUS).

Percebendo a liderança da graduação à centralidade nas organizações

Nesta subcategoria, os participantes compreendem a liderança como a chave das organizações, em especial nos serviços de saúde, sendo necessários maiores investimentos na formação. Uma vez que a gestão em saúde tem sido considerada um processo em construção, os participantes afirmam que a liderança deve ser entendida e utilizada de forma mais eficiente, com investimento em pessoal qualificado e desenvolvimento de pessoas.

Cabe ressaltar que a liderança é percebida pelos enfermeiros como uma habilidade que pode ser desenvolvida na formação superior em enfermagem. O primeiro motivo citado em relação à formação foi o fato do tema liderança estar inserido na disciplina curricular obrigatória para a Enfermagem. Esse propicia, inclusive, estágios com exercício práticos sobre gestão e gerenciamento de serviços hospitalares e na saúde pública. Os participantes percebem que existe uma preocupação dos professores em relação ao aprendizado e à vivência dos conteúdos lecionados em sala de aula nos campos de ensino, como ilustra o depoimento a seguir: claro que eu ainda percebo que os enfermeiros têm um papel de destaque, porque nós temos essa cadeira de liderança e de administração na academia, na formação [...]. Além disso, sou de uma época em que a Enfermagem estava conquistando espaços, se inserindo na Atenção Básica com maior vigor. Por esse motivo, nossos professores eram grandes inspiradores para uma prática séria e preocupada com a qualidade do atendimento (P10).

Embora, encontrem obstáculos no exercício da liderança e fragilidades na formação, aponta-se que essa pode ser aprendida, especialmente, a partir de experiências vivenciadas no cotidiano.1111. Santos I, Castro CB. Personal and professional nuances of nurses who perform administration functions in the university hospital. Rev Esc Enferm USP. 2010;44(1):154-60. No que tange ao processo de ensino aprendizagem da liderança durante a graduação, identifica-se a existência de lacunas evidenciadas pelo pouco tempo demandado ao ensino de tal competência e distanciamento dos docentes da prática assistencial.1212. Amestoy SC, Backes VMS, Thofehrn MB, Martini JG, Meirelles BHS, Trindade LL. Nurses' perception of the teaching-learning process of leadership. Texto Contexto Enferm [online]. 2013 [acesso 2014 Ago 01]; 22(2). Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072013000200024
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A formação com a conotação de modelagem tende a ignorar a autonomia e independência para buscar e articular o conhecimento, a fim de se evitar a acumulação estéril.99. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Sulina; 2011. Entretanto, estudantes de enfermagem apontam como uma experiência valiosa a realização de estágios práticos em gestão e gerenciamento em enfermagem, na qual conseguem experimentar a implementação de mudanças, articulação com a equipe de trabalho e avaliação dos resultados, apesar de reconhecerem a necessidade de aprimoramento constante.1313. Cechinel C, Caminha MEP, Becker D, Erdmann AL, Lanzoni GMM. Vivência gerencial de acadêmicos de enfermagem: em pauta a sistematização da assistência de enfermagem. Rev Enferm UFSM. 2012; 2(1):190-7.

Outro aspecto relatado pelos participantes foi o aumento de interesse progressivo em dominar essa ferramenta de gestão tendo em vista a necessidade de exercer liderança durante a supervisão da equipe de enfermagem, coordenação das unidades de saúde e coordenação dos cuidados de enfermagem. Para alguns, o exercício de liderança durante o curso de graduação foi uma prática frequente, com reflexo direto em seu exercício profissional atualmente.

Nesse sentido, verifica-se que o exercício da supervisão, a qualificação da equipe de enfermagem e os agentes comunitários de saúde são intrínsecos à atuação do enfermeiro bem como realizar o cogerenciamento da unidade de saúde.77. Rangel RF, Fugali MM, Backes DS, Gehlen MH, Souza MHT. Avanços e perspectivas da atuação do enfermeiro em estratégia saúde da família. Cogitare enferm. 2011; 16(3):498-504. Potencializa-se, assim, o desenvolvimento de iniciativa, responsabilidade e liderança durante a formação do graduando o reconhecimento de suas atribuições como profissional junto à equipe e ao serviço de saúde.1313. Cechinel C, Caminha MEP, Becker D, Erdmann AL, Lanzoni GMM. Vivência gerencial de acadêmicos de enfermagem: em pauta a sistematização da assistência de enfermagem. Rev Enferm UFSM. 2012; 2(1):190-7. Entretanto, existe a clareza de que o desenvolvimento de liderança é uma constante na vida profissional dos enfermeiros. Portanto, o curso de graduação é somente o primeiro espaço formal para desenvolvê-la.

Quanto à vivência da liderança na prática profissional, os participantes afirmam que a mesma não está atrelada a um cargo, ou seja, a diferença está na forma de agir e de como articular elementos para se alcançar as metas. Nesse sentido, a associação de cargo e a liderança de gestor demonstram ser a articulação perfeita para condução do grupo e têm autonomia para prover mudanças significativas no processo de trabalho e estrutura física, como se observa na fala: as pessoas olham primeiro pelo poder ou quem é que vai ter o cargo, como se a liderança fosse ter cargo, entende? E pra mim, liderança não é o ter cargo, é você saber como fazer (P27).

As grandes mudanças que vêm ocorrendo no mundo dos negócios impactam diretamente a economia mundial e reestruturam tanto o ambiente empresarial como a esfera pública. Verifica-se que as organizações públicas foram conduzidas no decorrer dos anos a rever suas estruturas e processos de trabalho visando assegurar o melhor desempenho e resultados em cada setor. Para instituições públicas de saúde é indicado o desenvolvimento de líderes em seu grupo de técnicos, bem como uma cultura de colaboração como resposta aos entraves organizacionais.1414. Czabanowska K, Smith T, Stankunas M, Avery M, Otok R. Transforming public health specialists into public health leaders. . 2013. Lancet; 381(9865):449-50. Especificamente na área da saúde, constatou-se que enfermeiros gerentes ou coordenadores com estilos de liderança vinculados às abordagens relacionais foram associados à redução dos eventos adversos, complicações e mortalidade e ao aumento da satisfação do paciente.1515. Wong CA, Cummings GG, Duchame L. The relationship between nursing leadership and patient outcomes: a systematic review update. J Nurs Manag. 2013; 21(5):709-24.

Também é destacado pelos participantes que os enfermeiros têm oferecido um suporte gerencial e de liderança importante para a condução dos projetos da Atenção Básica à Saúde. Desta forma, conseguem agregar valores fundamentais para coordenação das equipes no nível central. Isto é, eles demonstram conhecimento teórico-prático, liderança e ocupam cargos que lhes conferem certa autonomia para realizar as adaptações quando necessário, como ilustra a fala: [...] quem carrega o piano na Secretaria são os enfermeiros... Tem muito cargo de gerência dentro do nível central como enfermeiros, e grandes cargos, cargos importantes também (P14). Salienta-se assim a liderança do enfermeiro como central no desenvolvimento dos serviços de saúde nos quais está inserido.

Enfatizando características do enfermeiro líder

Nesta subcategoria, apresentam-se as principais características do enfermeiro líder descritas pelos participantes. O domínio teórico e prático do cuidado de enfermagem e a administração em saúde foram citados pelos participantes como principais aspectos para atuar com segurança na dimensão clínica e conduzir o grupo de trabalho.

O fato de ter na sua formação disciplinas relacionadas à gestão e administração em saúde coloca o enfermeiro em destaque na equipe por atuar de forma mais sistêmica. Os interesses em conhecer os fluxos de informações e a articulação dos saberes gerenciais ao cuidado direto ao paciente tornam sua prática a combinação ideal para fazer com que o enfermeiro se mantenha atualizado em relação às melhores estratégias para aperfeiçoar os processos e trazer qualidade à assistência, como ilustra a fala: talvez pelo fato do enfermeiro ser formado para ter uma visão sistêmica, para poder olhar e enxergar todos os detalhes de um processo. Eu acho que isso, é um ponto que ajuda muito o enfermeiro na hora de assumir uma gerência, uma diretoria (P16).

Dentre as qualidades essenciais para o exercício da liderança, o conhecimento foi citado por enfermeiros, os quais reforçam que esse não deve se limitar ao conhecimento do saber fazer técnicas e procedimentos. Demonstrar conhecimento teórico-prático sobre temas relacionados à profissão e demais questões sociais foi entendido como fundamental, aliado à coordenação e organização e equipes, para o reconhecimento de um líder no contexto dos serviços de saúde.1616. Araújo AC, Porto AR, Thofehrn MB, Lunardi VL, Silveira RS, Amestoy SC. Percepções de enfermeiros recém-formados sobre a prática de liderança no ambiente hospitalar. J Nurs Health. 2012; 2(2):398-409.

Com relação à atuação sistêmica, a Enfermagem é uma profissão central no sistema de saúde, na qual o enfermeiro se destaca por ser eminentemente social. Compreende o ser humano não como um ser doente, mas como um ser complexo, capaz de se auto-organizar, devendo conduzir sua terapêutica e história de vida.1717. Backes DS, Backes MS, Erdmann AL. A prática social sistêmica do enfermeiro na perspectiva luhmanniana. Rev Esc Enferm USP. 2011; 45(1):116-21.

Os participantes acreditam que o líder é uma referência de organização, de solução de problemas e de responsabilidade. Esses três aspectos sempre se apresentavam interrelacionados, uma vez que o enfermeiro é compreendido como indutor da organização do trabalho em equipe. O enfermeiro possui um olhar diferenciado mais humano e social sobre a prática. Nesse sentido, consegue agir sobre algumas necessidades dos usuários para além da dimensão biomédica, como ilustra a fala: não está escrito que o enfermeiro é o coordenador da equipe em nenhum documento, mas a partir do momento que ele coordena os agentes, ele acaba coordenando toda a equipe. [...] Para outras questões, o enfermeiro também tem um papel indutor de organização do processo de trabalho, o que exige responsabilidade e resolutividade (P14).

Os enfermeiros percebem-se com uma grande responsabilidade para manter o serviço funcionando com condições adequadas, tanto para os usuários quanto para os profissionais, haja vista a rotatividade dos demais profissionais, em especial os médicos e por atuarem, muitas vezes, como coordenadores das unidades de saúde.

Os participantes compreendem que o exercício da liderança pelo enfermeiro tem como foco a qualidade da assistência, a resolutividade e ampliação do acesso à saúde. Assim, mesmo quando o enfermeiro não é coordenador da unidade de saúde, assume algumas demandas organizacionais a fim de concretizar o alcance das metas. Como exemplo, os participantes citam o desafio de serem acionados pelos demais profissionais quando algo imprevisto acontece. Assim, percebe-se que, no final do dia, sua agenda esteve repleta de atividades inesperadas e elaboração de estratégias coletivas e individuais.

Atuar com responsabilidade, respeito, maleabilidade/flexibilidade pode minimizar os conflitos existentes entre o enfermeiro e a equipe assistencial.1818. Guerra ST, Prochnow AG, Trevisan MA, Guido LA. Conflict in Nursing Management in the Hospital Contex. Rev Latino-am Enfermagem. 2011; 19(2):362-9. O reconhecimento dos processos que geram conflitos, desordem, irregularidade, desvios e acaso oportunizam o exercício da criatividade, da inovação e da evolução.99. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Sulina; 2011.

Em outro estudo, enfermeiros associaram a responsabilidade à necessidade de dar o exemplo. Desta forma, o respeito entre os trabalhadores poderá ser fortalecido; pode também influenciar o comportamento dos demais em desenvolver esta mesma característica.1313. Cechinel C, Caminha MEP, Becker D, Erdmann AL, Lanzoni GMM. Vivência gerencial de acadêmicos de enfermagem: em pauta a sistematização da assistência de enfermagem. Rev Enferm UFSM. 2012; 2(1):190-7. No que tange à resolutividade, todo o conjunto de ações desempenhadas pelo enfermeiro que atua na saúde pública tem por fim trazer uma resposta ou solução ou encaminhamento para as queixas do usuário de saúde, superando fragmentações a fim de assegurar a continuidade do cuidado.1919. Sawyer MG, Barnes J, Frost L, Jeffs D, Bowering K, Lynch J. Nurse perceptions of family home visiting programmes in Australia and England. J Paediatric Child Health. 2013; 49(5):369-74.

Ter senso de justiça foi citado como fundamental para o enfermeiro líder, pois esse precisa saber o momento adequado de solicitar mudanças no comportamento dos funcionários ou mesmo encaminhar o processo para instâncias superiores, ao identificar problemas na conduta ética dos profissionais da equipe, como esclarece o entrevistado: ser justa é muito delicado, porque você tem que trabalhar com muitos elementos. Tem que ser neutra, tem que às vezes impor, voltar atrás, ser legal; às vezes tu não consegues ser muito legal (P9).

O aprendizado formal, durante o curso de graduação, não é suficiente para o desenvolvimento desses atributos; é formada ao longo da vida e pode resultar em compreensões diferentes à sua aplicabilidade. Entretanto, trabalhar com senso de justiça é atuar com ética e respeito quanto às competências profissionais e necessidades da população.2020. Berti HW. Da percepção de impotência à luta por justiça na assistência à saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2011; 16(4):2271-8.

Outro aspecto facilitador para exercício de liderança do enfermeiro e aplicação efetiva do senso de justiça é a compreensão de que os profissionais possuem uma autonomia relativa e a interdependência é essencial para articulação do grupo. Ou seja, o espírito de equipe é uma característica que promove a minimização das relações de poder e de dominação.

Segundo os participantes, esta noção beneficia o trabalho em equipe, pois o enfermeiro se propõe a integrar os profissionais de saúde e compartilhar a tomada de decisão. Precisa tornar as relações mais horizontais e permitir a troca de informações. Estudos indicam que na ausência ou distanciamento do espírito de equipe pelo enfermeiro, podem desencadear conflitos e a resistência dos funcionários às novas práticas e falta de respeito entre profissionais. Nesse sentido, o processo de mediar conflitos deve ser permeado pelo diálogo e respeito.2121. Spagnol CA, L´Abbate S. Conflito organizacional: considerações teóricas para subsidiar o gerenciamento em enfermagem. Ciênc Cuid Saúde. 2011; 9(4):822-7.

Consequentemente, as relações se tornam mais harmoniosas e o respeito passa a se tornar uma relevante característica nas relações e interações do enfermeiro.

Tendo em vista o contexto de relações e movimentos de disputa de poder, os participantes afirmam ainda que, por meio de um tratamento respeitoso se alcança uma liderança autêntica, ou seja, sem imposições e autoritarismo. O interesse da equipe em fazer determinada ação com satisfação é resultado de um trabalho conjunto pautado na confiança e no respeito, conforme foi dito: para mim, liderança é a capacidade que uma pessoa tem de comandar um grupo sem necessitar mandar. Um líder, ele faz junto; ele é capaz; ele tem um poder de conquistar as pessoas que estão ao seu redor em prol da realização de alguma coisa (P16).

Ser flexível foi apontado como requisito importante para o líder. A flexibilidade é concebida no sentido de oportunizar relações mais horizontalizadas, uma relação mais democrática e compreensiva. Os participantes entendem que, preservando a segurança do paciente, ao permitir mudanças na dinâmica de trabalho, consegue-se motivar o funcionário individualmente e permitir impactos na equipe de enfermagem, ou seja, o exercício de colaboração e solidariedade. Identifica-se este achado no seguinte relato: eu considero muito positiva minha atuação na organização do serviço, porque eu procuro ver se está tudo funcionando, se não, vamos experimentar outra opção, outro caminho. [...] A gente tenta ver alternativas, se elas começam a não funcionar, a gente descarta e vamos para outra (P2).

Relações nas quais se busque a formação de vínculo construtivo têm como base o respeito e tendem a ser duradouras. Assim, torna-se uma condição para relações saudáveis entre trabalhadores da enfermagem o foco no ser humano e suas necessidades, a flexibilidade, a motivação, o comprometimento e a realização pessoal.2222. Dall'Agnol CM, Magalhães AMM, Mano GCM, Olschowsky A, Silva FP. A noção de tarefa nos grupos focais. Rev Gaúcha Enferm. 2012; 33(1):186-90.

Os participantes da pesquisa enfatizam que liderar também é um processo que exige tempo, tanto para conseguir executá-la, quanto para ver seus resultados. Assim, o enfermeiro líder deve ter paciência e criatividade para superar os atritos nas relações interpessoais, falta de recursos materiais e de pessoal. Ainda, visando ao alcance de maior qualidade e eficiência no processo de liderança, o amadurecimento pessoal e profissional foram citados como essenciais.

Embora seja reconhecido que o jovem enfermeiro possa exercer significativa liderança no seu grupo de trabalho, a pouca experiência clínica e gerencial pode limitar sua atuação, repercutindo em insucesso. O tempo de experiência pode promover o amadurecimento e aprimorar o exercício de liderança.2323. Paula GF, Figueiredo ML, Camargo FC, Iwamoto HH, Caixeta CRCB. Concepções de liderança entre enfermeiras assistenciais de um hospital do norte de Minas Gerais. Rev Eletr Enferm [online]. 2012 [acesso 2014 Ago 01]; 14(4). Disponível em http://www.revistas.ufg.br/index.php/fen/article/view/15102/13346
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Não obstante, a experiência profissional isoladamente pode não ser a receita para uma liderança de sucesso. Habilidades como liberdade criativa, coragem e disposição são destacadas na literatura para envolver a equipe nas diversas etapas de planejamento e gestão.2323. Paula GF, Figueiredo ML, Camargo FC, Iwamoto HH, Caixeta CRCB. Concepções de liderança entre enfermeiras assistenciais de um hospital do norte de Minas Gerais. Rev Eletr Enferm [online]. 2012 [acesso 2014 Ago 01]; 14(4). Disponível em http://www.revistas.ufg.br/index.php/fen/article/view/15102/13346
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Segundo os participantes, quando se inicia um novo projeto ou uma nova equipe, é sempre um processo difícil, pois envolve o desconhecido e incertezas. Entretanto, depois de ter vivenciado algumas vezes essa mesma situação, passa-se a ter conhecimentos para além do teórico, ou seja, ampliam-se as noções de relacionamento interprofissional, interdepartamental, interinstitucional e assim por diante. Conforme informado, os participantes passam a dominar outros saberes e atuam com mais confiança, segurança e determinação: a primeira coisa, que vejo por nós aqui, é paciência. É uma coisa que tem que ter. Até em atendimento à comunidade. Paciência que gera equilíbrio, inclusive no processo de liderar grupos. [...] Na verdade, é um processo de muito amadurecimento ao longo do tempo. Hoje eu me sinto preparada, mas eu tive uma época em que me sentia insegura (P3).

O fato de potencializar a liderança nos demais membros da equipe faz com que se sintam motivados a sempre buscarem outras possibilidades de ação, melhores condições de trabalho e de atendimento para a comunidade. Segundo o participante: quando as coisas não mudam, sinto-me vencida pela resistência das pessoas. Gosto de mudança; gosto de desafios (P8). O líder de uma equipe deve ter consciência que a resistência à mudança é uma manifestação esperada frente a uma situação nova, que é motivada, na visão pichoniana, por duas ansiedades inerentes ao ser humano, que são coexistentes e cooperantes, isto é, medo da perda e medo do ataque.2222. Dall'Agnol CM, Magalhães AMM, Mano GCM, Olschowsky A, Silva FP. A noção de tarefa nos grupos focais. Rev Gaúcha Enferm. 2012; 33(1):186-90. Desta forma, faz-se necessário investir na liderança dialógica, pois está fundamentada no estabelecimento de um processo comunicacional eficiente, é capaz de estimular a autonomia, a corresponsabilização e a valorização de cada membro da equipe e usuários de saúde.1212. Amestoy SC, Backes VMS, Thofehrn MB, Martini JG, Meirelles BHS, Trindade LL. Nurses' perception of the teaching-learning process of leadership. Texto Contexto Enferm [online]. 2013 [acesso 2014 Ago 01]; 22(2). Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072013000200024
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Assim, as práticas de liderança do enfermeiro estão relacionadas à construção de novos líderes, em conformidade com as políticas públicas de incentivo à cogestão e ao protagonismo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As condições causais geradoras do fenômeno Revelando as práticas de liderança do enfermeiro no complexo contexto da Atenção Básica à Saúde são compostas por conjunto de ações/interações vinculados à sua personalidade, ao estímulo na formação profissional, às características próprias da profissão e por influência do ambiente, no qual a liderança é central para o seu desenvolvimento. A possibilidade de apresentar com detalhamento este componente do modelo paradigmático evidenciou que estimular à liderança nos demais membros da equipe de saúde é uma conduta desenvolvida por alguns enfermeiros, que está intensamente relacionada com as políticas de saúde e contribui para incentivar a atuação e integrada dos trabalhadores da área do setor público.

Evidencia-se que há o distanciamento do enfermeiro de atividades relacionadas ao cuidado direto à população, devido ao seu envolvimento às questões gerenciais ou à falta de profissionais nas UBS. Esta situação oportuniza uma mobilidade ao enfermeiro, que assim potencializa sua capacidade de liderança e consolidação na gestão dos serviços de saúde com uma atuação mais sistêmica. Entretanto, a atuação como cuidador deve ser resgatada, visando à manutenção de suas contribuições na equipe de saúde e para fortelecer a complementariedade do binômio líder-cuidador.

Embora se justifique, neste estudo, a coleta de dados restrita aos enfermeiros da ABS e docentes de enfermagem, pois o foco foi sob a perspectiva de quem realiza a liderança, sugere-se para futuras pesquisas que sejam investigadas as contribuições do enfermeiro para o exercício de cogestão e liderança a partir da perspectiva dos membros da equipe multiprofissional de saúde na ABS.

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    Extraído da tese - Revelando a liderança no complexo contexto da Atenção Básica à Saúde, Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em 2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Nov 2015
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    12 Set 2014
  • Aceito
    28 Ago 2015
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