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RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL COMO ESPAÇO INTERCESSOR PARA A EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE

RESIDENCIA MULTIPROFESIONAL COMO ESPACIO INTERCESOR PARA LA EDUCACIÓN PERMANENTE EN SALUD

Resumos

Objetiva-se compreender como a Educação Permanente em Saúde é desenvolvida no cotidiano dos profissionais de uma residência multiprofissional em saúde, de um hospital de ensino no Sul do Brasil. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, do tipo estudo de caso, com 16 profissionais. Os resultados mostram a residência multiprofissional como instituidora de espaços coletivos, uma vez que possibilita encontros entre sujeitos que desenvolvem suas ações fundamentadas em uma formação pedagógica e pautadas na educação permanente. Conclui-se que os integrantes da residência têm a possibilidade de pensar outros modos de produzir saúde, incentivando a busca pelas transformações das práticas profissionais para produzir novas ações em saúde.

Educação continuada; Internato e residência; Prática profissional; Enfermagem; Estudos de casos


El objetivo fue comprender como la Educación Permanente en Salud es desarrollada en el cotidiano de los profesionales de una residencia multiprofesional en salud, en un hospital de enseñanza en el sur de Brasil. Investigación cualitativa, del tipo estudio de caso, con 16 profesionales. Los resultados muestran la residencia multiprofesional como instituidora de espacios colectivos posibilitando encuentros entre sujetos que desarrollan sus acciones fundamentadas en una formación pedagógica pautadas en la educación permanente. Se concluye que a partir de eso los integrantes de la residencia tienen la posibilidad de pensar otros modos de producir salud, incentivando la búsqueda por las transformaciones de las prácticas de actuación para pensar en nuevas posibilidades de acciones en salud.

Educación continua; Internado y residencia; Práctica profesional; Enfermería; Estudios de casos


The objective in this study is to understand how Continuing Education in Health is developed in the everyday life of professionals in a multi-professional residency program in health at a teaching hospital in the South of Brazil. Qualitative research with a case study design, involving 16 professionals. The results show that the multi-professional residency program establishes collective spaces, as it permits encounters among subject who develop their actions based on pedagogical training and guided by continuing education. It is concluded that the participants in the residency program can think about other ways of producing health, encouraging the search for transformations of the operating practices to produce new actions in health.

Education, continuing; Internship and residency; Professional practice; Nursing; Case studies


INTRODUÇÃO

A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) propõe uma nova configuração para os profissionais de saúde produzirem conhecimento e pensar a educação e o trabalho.11. Lobato CP. Formação dos trabalhadores de saúde na residência multiprofissional em saúde da família: uma cartografia da dimensão política [tese]. Londrina (PR): Universidade Estadual de Londrina. Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva; 2010. Tal política permite que a formação e o desenvolvimento de profissionais de saúde ocorram de modo descentralizado, ascendente e transdisciplinar, englobando todos os locais e saberes a fim de proporcionar a democratização dos espaços de trabalho.22. Ministério da Saúde (BR). Política de educação e desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente e pólos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004[acesso 2014 Mar 15]. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/educacao_permanente_tripartite.pdf.
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Como política pública, baseia-se na aprendizagem significativa e na reflexividade das práticas em ação na rede de serviços e, por conseguinte, na problematização da realidade. Ela busca a construção e reconstrução do conhecimento. Este, por sua vez, constitui-se, neste caso, pelas experiências cotidianas dos profissionais de saúde, os quais, através de tal problematização, são estimulados a refletir, agir e, assim novamente, questionar as práticas de saúde.22. Ministério da Saúde (BR). Política de educação e desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente e pólos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004[acesso 2014 Mar 15]. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/educacao_permanente_tripartite.pdf.
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Desse modo, com a operacionalização da PNEPS, torna-se imperativa a premissa de que as práticas dos profissionais de saúde respondam às demandas do Sistema Único de Saúde (SUS). Para tanto, a Residência Multiprofissional em Saúde (RMS) tem como objetivo formar profissionais para uma atuação diferenciada no SUS, uma vez que pressupõe construção interdisciplinar dos profissionais em saúde, trabalho em equipe, dispositivo de educação permanente e reorientação das lógicas tecnoassistenciais.11. Lobato CP. Formação dos trabalhadores de saúde na residência multiprofissional em saúde da família: uma cartografia da dimensão política [tese]. Londrina (PR): Universidade Estadual de Londrina. Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva; 2010.-22. Ministério da Saúde (BR). Política de educação e desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente e pólos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004[acesso 2014 Mar 15]. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/educacao_permanente_tripartite.pdf.
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O que se agrega a essa modalidade de formação resulta em ações educativas centradas nas necessidades de saúde da população, na equipe multiprofissional e na institucionalização da Reforma Sanitária brasileira, o que vem ao encontro do que preconiza a PNEPS e os princípios do SUS.11. Lobato CP. Formação dos trabalhadores de saúde na residência multiprofissional em saúde da família: uma cartografia da dimensão política [tese]. Londrina (PR): Universidade Estadual de Londrina. Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva; 2010.

Assim, considera-se a RMS como um espaço para o desenvolvimento das ações de Educação Permanente em Saúde (EPS), o qual pode se constituir como um dispositivo potencial para promover as mudanças pretendidas pelos profissionais de saúde a fim de consolidar os princípios do SUS.22. Ministério da Saúde (BR). Política de educação e desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente e pólos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004[acesso 2014 Mar 15]. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/educacao_permanente_tripartite.pdf.
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Posto isso, justifica-se estudar o espaço formativo das residências multiprofissionais, porque além de serem importantes no contexto da formação em saúde, tem, nitidamente, crescido em pesquisas realizadas nos programas de pós-graduação stricto sensu no Brasil.33. Dallegrave D, Ceccim RB. Healthcare residency: what has been produced in theses and dissertations? Interface (Botucatu) [online]. 2013 [acesso 2014 Mar 10]; 17(47):759-76. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832013005000030
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Nesse sentido, este estudo teve seu desenvolvimento baseado na seguinte questão de pesquisa: Como a educação permanente em saúde é desenvolvida no cotidiano de atuação dos profissionais de um programa de Residência Multiprofissional em Saúde? Cujo objetivo consiste em compreender como a educação permanente em saúde é operacionalizada na Residência Multiprofissional em Saúde.

MÉTODO

Este estudo se trata de uma pesquisa de campo, descritiva, exploratória, de abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso. A opção por este tipo de estudo justifica-se pela possibilidade de analisar o fenômeno diante de seu contexto, abordando, dessa maneira, a realidade em profundidade, o que permite seu amplo e detalhado conhecimento.44. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Bookman; 2010. Além disso, a metodologia em questão proporciona a sua adoção em vários tipos de pesquisa, contanto que o caso a ser abordado seja específico,55. Margarete S. ''Casing'' the Research Case Study. Research in Nursing & Health [online]. 2011 [acesso em 2015 Fev 15]; 34(2):153-9. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21381044
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o qual, neste caso, diz respeito à RMS.

Nessa perspectiva, a relevância de adotar o estudo de caso como método de investigação propicia generalizações naturalísticas e a manifestação de diferentes pontos de vista sobre o objeto de estudo. Ademais, orienta que, para responder ao objetivo da pesquisa, muitas variáveis devem ser implicadas e interessar na análise, que permite vários posicionamentos sobre o mesmo fenômeno. Tais variáveis podem ser dimensionadas através da triangulação de fontes de dados (análise documental, observação e entrevista).44. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Bookman; 2010.

5. Margarete S. ''Casing'' the Research Case Study. Research in Nursing & Health [online]. 2011 [acesso em 2015 Fev 15]; 34(2):153-9. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21381044
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-66. Baxter P, Jack S. Qualitative Case Study Methodology: Study Design and Implementation for Novice Researchers. The Qualitative Report [online]. 2008 [acesso 2015 Fev 15]; 13(4):544-59. Disponível em: http://nsuworks.nova.edu/tqr/vol13/iss4/2
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Este estudo foi desenvolvido no Programa de Residência Multiprofissional em Saúde, em um hospital de ensino no Sul do Brasil. Os participantes envolvidos na pesquisa foram os profissionais integrantes da RMS da área hospitalar, contemplando as seguintes profissões: Enfermagem, Psicologia, Nutrição, Serviço Social, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Farmácia, Terapia Ocupacional, Odontologia e Educação Física e preceptores de núcleo e campo, contabilizando ao todo 16 profissionais. Eles atenderam ao seguinte critério de inclusão: ser profissional vinculado à RMS, atuante na atenção hospitalar no período da coleta de dados, que foi realizada no período de janeiro a maio de 2012.

Os participantes da pesquisa foram, informalmente, abordados, por ocasião do processo de observação de campo, e, formalmente, questionados por meio de entrevista semiestruturada. Inicialmente, foi realizada pesquisa documental no projeto pedagógico da RMS, procurando registros que revelassem evidências sobre os princípios de EPS. Também foi realizada observação do campo, no que consta à dinâmica de desenvolvimento dos seminários de campo e núcleo, destinados à discussão e planejamento das atividades dos residentes. Finalmente, foram realizadas as entrevistas individuais com os sujeitos de pesquisa, com a intenção de aprofundar a busca de dados sobre o objeto de estudo. Para tanto, iniciou-se a entrevista apresentando aos informantes um fragmento da PNEPS, que possibilita discorrer o tema proposto e na sequência foi lançada aos sujeitos de pesquisa a seguinte questão norteadora: "Como você percebe o desenvolvimento de suas práticas em termos de orientação dos princípios de EPS?"

Posteriormente à produção dos dados, foi realizada a análise deles de forma integrada contemplando a triangulação dos dados que o estudo de caso preconiza. A triangulação dos dados proporciona ao estudo uma melhor acurácia das análises, disponibilizando ao pesquisador, a construção de um encadeamento de evidências, a fim de aumentar a confiabilidade das interpretações dos dados da pesquisa.44. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Bookman; 2010. Inicialmente, realizou-se a observação dos seminários de campo e núcleo, descrevendo os princípios de EPS que orientavam as ações dos preceptores e residentes. Concomitantemente, analisou-se o projeto pedagógico da RMS, buscando evidências dos princípios da EPS e, finalmente, as entrevistas foram analisadas por meio da análise de conteúdo temática, a qual está sistematizada em três etapas cronológicas,77. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12ª ed. São Paulo (SP): Hucitec; 2010. quais sejam: pré-análise, momento em que se realizaram as transcrições das entrevistas e organização do material empírico; exploração do material, em que foi efetivada a categorização do material empírico; e tratamento dos resultados obtidos e interpretação, que se constituiu da articulação entre o conteúdo empírico e os preceitos teóricos que fundamentam o estudo. Destaca-se que nas etapas de pré-analise e exploração do material, foi utilizado o softwareAtlas Ti 6.2 (Qualitative Research and Solutions), versãoFree Trial, disponibilizada gratuitamente para auxiliar na codificação das entrevistas. A análise dos resultados ocorreu a partir da triangulação dos dados da leitura do conteúdo das entrevistas, das observações realizadas e da análise documental, buscando-se linhas de convergência entre os mesmos. Os temas que convergiam ao objetivo da pesquisa foram os escolhidos para ser abordados neste artigo, corroborando o argumento central de que a RMS constitui-se um espaço intercessor para o desenvolvimento das ações de EPS.

Dessa maneira, a fim de garantir o sigilo e confidencialidade, a identidade dos participantes foi preservada por meio da codificação pela letra E, por ser a letra inicial da palavra Educação Permanente em Saúde, seguida de um número que não corresponde à sequência de participação na pesquisa. Além disso, os participantes foram identificados pela forma de vinculação à RMS: se residente ou preceptor.

Convém notar, ainda, que o estudo em questão atendeu aos preceitos éticos presentes na Resolução CNS n. 466/2012, tendo aprovação concedida pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Maria, sob n. 0147012.4.0000.5346.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise dos dados foi desenvolvida a partir da leitura do conteúdo das entrevistas, das observações realizadas e da análise documental. A análise dos dados foi fundamentada em concepções de diversos autores, entre estes Ceccim, Franco, Merhy, os quais participam ativamente na produção de conhecimento sobre a EPS, entrelaçados com outros autores que apresentam consonância com esta produção de conhecimento.

A Residência Multiprofissional em Saúde como instituidora de espaços coletivos de Educação Permanente em Saúde

A EPS foi adotada pelo Ministério da Saúde como um dos pilares para a construção de práticas de saúde inovadoras no sistema democrático, as quais são capazes de promover assistência integral e de qualidade para saúde dos cidadãos que fazem uso do SUS.22. Ministério da Saúde (BR). Política de educação e desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente e pólos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004[acesso 2014 Mar 15]. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/educacao_permanente_tripartite.pdf.
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Buscando atender o que lhe é incumbido, a EPS ganha configuração de uma tessitura de nós, em que pontos desiguais se atrelam e são ligados em ação em saúde. Para isso, na EPS não satisfaz somente desenvolver cursos, mas, sobretudo, ofertar encontros entre os profissionais de saúde, usuários, com abertura para o diálogo, compartilhamento de textos e de conceitos.88. Ceccim RB. A educação permanente em saúde e as questões permanentes à formação em saúde mental. Caderno Saúde Mental [online]. 2010 [acesso 2014 Mar 15]; 3(1):67-90. Disponível em: http://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/sus-23975
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A partir dessa compreensão de EPS, sinaliza-se a RMS como uma "possibilidade de espaço de transformação para profissionais da saúde articulado como dispositivo da educação permanente".9:378 Essa questão pode ser evidenciada nos depoimentos: [...] a gente vive a residência permeada pela educação permanente, com os princípios do SUS, é o nosso dia a dia. Eu não consigo pensar em uma ação exatamente porque para nós é o que a gente vive ali! (residente E4).

a residência em si já é uma proposta de educação permanente(preceptor E11).

acredito que muito do que a Residência propõe vem ao encontro do que a EPS propõe também (preceptor E13).

Esses depoimentos convergem no sentido da RMS se constituir como um espaço intercessor, pois este se conceitua como um ambiente de relações que se produz no encontro entre os sujeitos, em que o produto que existe é mais do que a somatória daqueles que fazem parte deste encontro, e se traduz no trabalho vivo de uma realidade em constante movimento, desencadeando novas possibilidades do agir em saúde.1010. Merhy EE. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. 3ªed. São Paulo (SP): Hucitec; 2002. A RMS se apropria deste espaço intercessor porque designa a formação de profissionais como atores de produção de saúde, que não possuem apenas a preocupação com o somatório das ações, mas, sobretudo com o que existe entre elas, como o resultado de um processo singular, que proporciona processos de mudança.1010. Merhy EE. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. 3ªed. São Paulo (SP): Hucitec; 2002.

Observa-se que alguns dos entrevistados, enquanto liam os fragmentos selecionados da PNEPS, salientavam que esta convergia com a proposta pedagógica da RMS. Da mesma forma, o projeto pedagógico foi sinalizado pelos sujeitos de pesquisa por conter conceitos consoantes com a PNEPS. Todavia, pelas observações realizadas, sublinha-se que esta política apresenta entraves na sua disseminação, pois há necessidade de difundir a socialização que envolve a PNEPS e suas deliberações para a área da saúde, além da urgência na divulgação e discussão aos profissionais de saúde a respeito dela.1111. Ferraz F, Backes VMS, Martínez FJM, Prado ML. Políticas e programas de educação permanente em saúde no Brasil: revisão integrativa de literatura. Saude Transf. Soc. [online]. 2012 [acesso 2014 Abr 13]; 3(2):113-28. Disponível em: www.redalyc.org/pdf/2653/265323670016.pdf
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[...] depois de ler os fragmentos, percebo que a gente está no caminho certo. É isso que a gente está desenvolvendo (residente E7).

A RMS, a partir de seus princípios norteadores, propicia condições para que seus integrantes definam a EPS como eixo pedagógico estruturante para ações em saúde. Logo, a EPS pode ser entendida como dispositivo potencial para promover mudança dos modelos de gestão e atenção do SUS.1212. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Residência multiprofissional em saúde: experiências, avanços e desafios. Brasília (DF): MS; 2006.Os depoimentos abaixo sinalizam essa compreensão:

[...] a EPS trabalha na questão da transformação dos processos, no sentido de organizar os serviços de acordo com o que a residência se propõe (residente E5).

a proposta pedagógica converge com o que a Residência propõe! Ela reconfigura novas possibilidades, porque desta visão estruturalista(preceptor E16).

A proposta pedagógica da RMS, segundo os depoimentos acima, converge com a estratégia da EPS. Esta é evidenciada como sustentáculo de propostas pedagógicas que permeiam o processo formativo profissional e as mudanças das práticas dos serviços de saúde. Além das evidências dos depoimentos, as observações realizadas mostram que a EPS atua para além de uma ação, atua, sobretudo no cotidiano da produção de saúde por todos que integram a RMS. Entretanto, sinaliza-se que a percepção dos profissionais a respeito da RMS como um espaço para o desenvolvimento da EPS foi percebida logo após a leitura do fragmento que trazia breves citações acerca da PNEPS. Dessa forma, nota-se que essa política é nova no contexto das políticas de saúde, e que é necessário discutir acerca da operacionalidade da EPS para, dessa maneira, viabilizá-la de forma efetiva em todas as áreas de formação da saúde.

Nos processos formativos, também se vivenciam desafios para a consolidação do SUS.1313. Feuerwerker LM. Educação permanente em saúde: uma mudança de paradigmas. Olho Mágico, Londrina. 2005; 12(3):13-20. Nota-se que pode haver um descompasso entre aquilo que é ensinado e a compreensão dos estudantes sobre os princípios e diretrizes do SUS. Isso pode ser evidenciado nos depoimentos a seguir:

a minha formação acadêmica é para se formar e cair no mercado de trabalho, não tem nada disso que a residência trabalha (residente E4).

fui ouvir falar deste conceito aqui na universidade[residência]. Eu nunca tinha ouvido falar na educação permanente antes (preceptor E11).

O desafio atrelado à discussão do SUS na formação de profissionais da saúde perpassa pelos obstáculos que a EPS enfrenta para a sua disseminação e operacionalização. Assim, a formação que a PNEPS defende tem comprometimento com a geração de trabalhadores de saúde implicados com os princípios do SUS e não apenas com profissionais que tem monopólio de conhecimento técnico.1414. Ceccim RB. Educação permanente em saúde: desafio ambicioso e necessário. Interface-Comunic. Saúde Educ [online]. 2005 [acess 2014 Mar 13]; 9(16):161-77. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v9n16/v9n16a13.pdf.
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Tampouco, isso não significa rejeição à técnica, pois sabe-se que na saúde o conhecimento técnico não pode ser desconsiderado, contudo, reitera-se a necessidade que as práticas em saúde têm em receber acompanhamento de modalidades educativas de outra natureza, como a EPS.1515. Silva LAA, Franco GP, Leite MT, Pinno C, Lima VML, Saraiva N. Concepções educativas que permeiam os planos regionais de Educação Permanente em Saúde. Texto Contexto Enferm [online]. 2011 [acesso 2014 Mar 20]; 20(2):340-8. Disponível em: www.scielo.br/pdf/tce/v20n2/a18v20n2
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Assim, a RMS pode ser considerada um dispositivo capaz de provocar melhorias na formação dos residentes, pois apesar das dificuldades que eles apresentaram ao longo da sua formação acadêmica, salientaram que ao ingressar na residência, tiveram a oportunidade de trabalhar engajados em um conceito de saúde ampliado e não apenas voltado para aspectos biológicos que determinam o processo saúde-doença, como se pode observar nos depoimentos que seguem:

a EPS é realmente uma proposta estratégica para transformar processos formativos. Isso está acontecendo muito aqui (preceptor E8).

o que deu para perceber desta residência é que é EPS pura! A residência é muito focada em cima da lógica da EPS! Traz o residente para essa nova realidade, e nova concepção de EPS, de trabalho em equipe, de trabalho multiprofissional, interdisciplinar (preceptor E14).

A partir destes depoimentos, nota-se que a RMS, a partir de uma formação pautada na EPS, procura mudar a lógica biologicista, que ainda reflete na formação em saúde, em que a "supremacia do conhecimento fragmentado" impede a articulação das partes com a totalidade e necessita ser substituída por um novo modo de pensar e conhecer "capaz de apreender os objetos em seu contexto, sua complexidade".16:14 Nesse sentido, a complexidade aponta para a reflexão do cotidiano, do ato que pode ser questionado e para uma transformação do social.1616. Morin E. Educação e complexidade: os sete saberes e outros ensaios. 4ª ed. São Paulo (SP): Cortez; 2002.

O pensamento complexo permite compreender o desenvolvimento da EPS como um trabalho em constante atuação, uma vez que visualiza os espaços intercessores (das relações) como ambiente para encontro entre os sujeitos que se permitem duvidar, questionar e problematizar as práticas em saúde.1010. Merhy EE. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. 3ªed. São Paulo (SP): Hucitec; 2002. A partir disso, compreende-se que na RMS o desenvolvimento da EPS ocorre quando há encontro dos residentes com os usuários, com a equipe de saúde e com os preceptores. Convém notar que a noção de encontro, neste caso, é da ordem micropolítica, em que os participantes do encontro estão sempre dispostos a contribuir sob alteridades intercessoras.1717. Ceccim RB. "Ligar gente, lançar sentido: onda branda de guerra" a propósito da invenção da residência multiprofissional em saúde. Interface: comunic, saúde, educ [online]. 2009 [acesso 2014 Abr 15]; 13(28):233-5. Disponível em: www.redalyc.org/articulo.oa?id=180114106022
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Os encontros são pedagógicos e operam contra práticas homogeneizadoras, com trocas entre domínios de saberes e fazeres dos participantes, construindo, desse modo, um universo de processos educativos em ato, em um fluxo contínuo e intenso de convocações, desterritorializações e invenções.1818. Ceccim RB, Merhy EE. Um agir micropolítico e pedagógico intenso: a humanização entre laços e perspectivas. Interface: Comunic, Saúde, Educ [online]. 2009 [acesso 2014 Mar 18]; 13(supl.1):531-42. Disponível em: www.scielo.br/pdf/icse/v13s1/a06v13s1.pdf
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A partir desse encontro, há interdependência e interação entre os atores para a produção da saúde a fim de formar um novo sujeito coletivo, uma vez que ocorre a criação de um espaço de "inter" relações, em que os residentes podem inventar, diariamente, sua autonomia e produção dos atos de saúde em uma relação intersubjetiva. Destaca-se que este encontro com o outro se constrói e reconstrói com liberdade para produzir significados que tenham sentido para eles enquanto profissionais de saúde, para os usuários e para a equipe de saúde.1919. Merhy EE, Feuerweker LCM, Ceccim RB. Educación permanente en salud uma estrategia para intervenir en la micropolítica del trabajo en salud. Salud Colectiva [online]. 2006 [acesso 2014 Abr 22]; 2(2):147-60. Disponível em: www.redalyc.org/articulo.oa?id=73120204
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Nesse sentido, observa-se que a EPS, desenvolvida na RMS, constitui-se como um trabalho em constante atuação, pois ela está fundamentada nas relações entre os profissionais de saúde no espaço intercessor. Nele, o residente tem a possibilidade de, como profissional, agir na produção de saúde com liberdade e autonomia, podendo utilizar a EPS como uma ferramenta de auxílio para atuar no cotidiano dos sujeitos.1919. Merhy EE, Feuerweker LCM, Ceccim RB. Educación permanente en salud uma estrategia para intervenir en la micropolítica del trabajo en salud. Salud Colectiva [online]. 2006 [acesso 2014 Abr 22]; 2(2):147-60. Disponível em: www.redalyc.org/articulo.oa?id=73120204
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Ações de Educação Permanente em Saúde que permeiam a atuação na Residência Multiprofissional: um encontro entre sujeitos

A PNEPS é definida como ação estratégica que visa a qualificação e transformação da atenção à saúde, da organização das ações e serviços, dos processos formativos e das práticas em saúde.22. Ministério da Saúde (BR). Política de educação e desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente e pólos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004[acesso 2014 Mar 15]. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/educacao_permanente_tripartite.pdf.
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A EPS também estabelece ações que podem ser desenvolvidas na atenção à saúde, no entanto, os integrantes da RMS compreendem a EPS para além de uma ação estratégica desenvolvida no seu cotidiano, pois acreditam que ela se apresenta em uma perspectiva maior, no cotidiano de atuação com o outro. Diante disso, verifica-se que as atividades de EPS desenvolvidas pelos profissionais de saúde foram evidenciadas nos encontros com os usuários de saúde e com os profissionais em questão por meio de grupos de educação em saúde e de educação em serviço como expõem, respectivamente, os seguintes depoimentos:

várias ações são desenvolvidas, mas posso citar um grupo que nós fazíamos! [...] falávamos muito de educação em saúde! Isso nos faz pensar também nas nossas práticas (residente E1).

temos a proposta de começar a desenvolver com os profissionais do serviço, pois por enquanto só desenvolvemos com os pacientes, que seriam grupos de [...] não é capacitar, digamos de aprimorar [...] (residente E4).

[...] era um grupo de educação permanente porque nós discutíamos com a equipe, várias temáticas relacionadas ao nosso agir profissional, discutíamos algumas coisas pensando em clínica ampliada, em profissional de referência (preceptor E11).

É possível observar, a partir de tais depoimentos, que os residentes sinalizam o desenvolvimento de uma EPS por meio de grupos de educação em saúde e educação em serviço voltados para a preocupação em responder às necessidades do usuário em saúde e de trabalhar objetivos com os profissionais do programa da RMS, tais como a clínica ampliada e a equipe de referência. Assim, ressalta-se que a EPS, aliada à concepção de clínica ampliada e à proposta de humanização e acolhimento, constitui estratégias efetivas para as transformações no trabalho em saúde.22. Ministério da Saúde (BR). Política de educação e desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente e pólos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004[acesso 2014 Mar 15]. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/educacao_permanente_tripartite.pdf.
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3. Dallegrave D, Ceccim RB. Healthcare residency: what has been produced in theses and dissertations? Interface (Botucatu) [online]. 2013 [acesso 2014 Mar 10]; 17(47):759-76. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832013005000030
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4. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Bookman; 2010.

5. Margarete S. ''Casing'' the Research Case Study. Research in Nursing & Health [online]. 2011 [acesso em 2015 Fev 15]; 34(2):153-9. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21381044
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21381...

6. Baxter P, Jack S. Qualitative Case Study Methodology: Study Design and Implementation for Novice Researchers. The Qualitative Report [online]. 2008 [acesso 2015 Fev 15]; 13(4):544-59. Disponível em: http://nsuworks.nova.edu/tqr/vol13/iss4/2
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7. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12ª ed. São Paulo (SP): Hucitec; 2010.

8. Ceccim RB. A educação permanente em saúde e as questões permanentes à formação em saúde mental. Caderno Saúde Mental [online]. 2010 [acesso 2014 Mar 15]; 3(1):67-90. Disponível em: http://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/sus-23975
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9. Ministério da saúde (BR). Introdução: a trajetória da residência multiprofissional em Saúde no Brasil. In: Ministério da saúde (BR). Residência multiprofissional em saúde: experiências, avanços e desafios. Brasília (DF): MS; 2006 [acesso 2014 Apr 10]; Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/residencia_multiprofissional.pdf
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-1616. Morin E. Educação e complexidade: os sete saberes e outros ensaios. 4ª ed. São Paulo (SP): Cortez; 2002.

Além dos grupos de educação em saúde e educação em serviço, as preceptorias de núcleo e campo foram apontadas como importantes atividades permeadas pela EPS, o que está evidenciado nos próximos depoimentos:

é uma preceptoria de núcleo onde vai acontecer um ensaio de projeto terapêutico singular. Nós vamos começar a trabalhar isso aqui para que no próximo ano os R1 [residentes do primeiro ano] já consigam fazer isso na prática lá na rede (preceptor E8).

[...] a preceptoria está ligada á estas questões de educação permanente em saúde, que envolve tanto as questões de ensino, quanto de profissionais, nós em formação. [...] Têm outros vários, estes são espaços informais que também se dá a educação permanente, não só em espaços formais (residente E9).

EPS está sempre presente nos seminários, nas preceptorias onde se discutem sobre a atuação profissional, de uma forma ou de outra está sempre presente nas ações dos residentes e dos preceptores (preceptor E13).

Dentre os espaços informais expostos nos depoimentos, as preceptorias são evidenciadas como momento propício para o desenvolvimento da EPS, uma vez que preceptores e residentes realizam diálogos, trocam experiências e definem como as atividades de atuação dos profissionais de saúde serão planejadas. Nas observações das preceptorias em questão, foi possível ressaltar algumas atividades discutidas, sejam elas: oficinas de atividades em saúde, leituras de artigos científicos para debates e fundamentação teórica em outros estudos ou, até mesmo, estudos desenvolvidos a partir do tema em questão ou outros afins, discussão de projetos de extensão e de pesquisa, participação em eventos, discussão sobre a inserção da graduação no campo com integração dos residentes, participação no programa Pró-Saúde, realização de atividades diferenciadas para suprir necessidades dos usuários; discussão sobre: Política Nacional de Humanização, clínica ampliada, equipe multidisciplinar, dentre outras. Ressalta-se, ainda, que as atividades planejadas nas preceptorias são baseadas nas atividades de campo, em trabalho em grupo, priorizando o usuário, enfatizando a sua singularidade.

Assim, as preceptorias constituem-se como espaços intercessores para o desenvolvimento da EPS, pois possibilitam pensar no coletivo, desconstruir a rotina mecanizada e propor atividades que ampliem a visão do mundo da saúde, com produção de conhecimento que apresente uma reflexão crítica, considere as experiências vividas por todos os participantes da EPS: usuários, integrantes da RMS e equipe de saúde dos serviços.

Nesse sentido, o encontro entre profissionais-usuários, profissionais-profissionais e profissionais-residentes, em que se desenvolve a produção do cuidado, configura-se como cenário para a produção pedagógica, permitindo a troca de saberes cognitivos, afetivos e subjetivos.1111. Ferraz F, Backes VMS, Martínez FJM, Prado ML. Políticas e programas de educação permanente em saúde no Brasil: revisão integrativa de literatura. Saude Transf. Soc. [online]. 2012 [acesso 2014 Abr 13]; 3(2):113-28. Disponível em: www.redalyc.org/pdf/2653/265323670016.pdf
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Tais cenários de produção do cuidado e produção pedagógica ressignificam a educação na saúde, propondo-a como relação além do ensino-aprendizagem, com sentido de cognição e subjetivação, com o objetivo de criar grupos com pessoas que tenham capacidade de assumir o protagonismo, com a intencionalidade de desenvolver o SUS.2020. Franco TB. Healthcare production and pedagogical output: integration of healthcare system settings. Interface: Comunic, Saúde, Educ [online]. 2007 [acesso 2014 Abr 23]; 11(23). Disponível em: www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414-32832007000300003&script
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Educação Permanente em Saúde permeando a formação dos residentes por meio de encontros pedagógicos

Nesta categoria, os depoentes apontam que a EPS baliza sua formação, o que ocorre nos espaços intercessores dos encontros e não apenas nas disciplinas teóricas em sala de aula:

existem estes espaços formais, por exemplo, as preceptorias com horário marcado, mas acredito que o que mais acontece é essa aproximação natural, essa necessidade de querer discutir um caso e que a gente consiga trazer a política para aquele caso e tentar refletir tanto as ações profissionais tanto quanto um ato crítico do nosso fazer, saber (residente E10).

A partir desse depoimento, percebe-se que a EPS acontece na ordem do encontro e das condições de interação entre os participantes e não somente através de uma ordem profissional e de condições de trabalho.2121. Franco TB, Chagas RC, Franco CM. Educação Permanente como prática. In: Pinto S, Franco TB, Magalhães MG, Mendonça PEX, Guidoreni AS, Cruz KT, et al. Tecendo Redes: os planos da educação, cuidado e gestão na construção do SUS; a experiência de Volta Redonda-RJ. São Paulo (SP): Hucitec; 2012. Novamente, observa-se que a atuação dos residentes no desenvolvimento da EPS ocorre pela micropolítica do trabalho vivo, pois encontra-se a resistência às capturas, a luta pela criação, a exposição de outras formas de produção de saúde em oposição ao saber hegemônico.2121. Franco TB, Chagas RC, Franco CM. Educação Permanente como prática. In: Pinto S, Franco TB, Magalhães MG, Mendonça PEX, Guidoreni AS, Cruz KT, et al. Tecendo Redes: os planos da educação, cuidado e gestão na construção do SUS; a experiência de Volta Redonda-RJ. São Paulo (SP): Hucitec; 2012. Além disso, nota-se que os residentes enfatizam nesta pesquisa, que aqueles que fazem parte dos encontros (profissionais do serviço, profissionais da RMS, usuários) estão implicados com a formação orientada pelos princípios da EPS.

A formação permeada pela EPS também carece de encontros com o outro, com o aprendizado na sala de aula e com o campo prático para desenvolver a produção de saúde, conforme aponta o depoimento:

não dá para separarmos o aluno do aprendizado em aula. Ele tem que sair e fazer o aprendizado em campo. Onde é o aprendizado em campo? É onde ele se questiona o que ele está aprendendo e, é a forma como ele vai aplicar aqueles ensinamentos que ele teve na sala de aula. E o inverso é verdadeiro, também, porque lá no local do trabalho, a gente tem que saber fazer. Nesse sentido, que eu vejo a educação permanente em saúde (preceptor E3).

Conforme foi apresentado nos depoimentos, verifica-se que os residentes entrevistados sinalizam a ideia de que o aprendizado em sala de aula, juntamente com o preceptor, não pode ser desvinculado do aprendizado do campo prático. Quanto a esta integração, destaca-se que preceptores e residentes possuem compreensão de que o residente tenha competência para atuar de forma interdisciplinar no campo do pensar-fazer das áreas profissionais.

Em consonância a isso, a formação dos residentes, desencadeada por espaços em que os profissionais de saúde dialogam acerca da EPS, deveria ser compreendida como um processo e, não somente, como algo pontual, visto que, através dessa formação, os residentes podem ter a capacidade de desenvolver competências (conhecimento, atitudes e habilidades) no sistema de saúde. Desse modo, instigar questionamentos sobre a realidade, ir ao encontro do cotidiano, é fundamental para os profissionais de saúde estabelecerem proximidade entre saberes socialmente construídos e a vivência do mundo do trabalho.2121. Franco TB, Chagas RC, Franco CM. Educação Permanente como prática. In: Pinto S, Franco TB, Magalhães MG, Mendonça PEX, Guidoreni AS, Cruz KT, et al. Tecendo Redes: os planos da educação, cuidado e gestão na construção do SUS; a experiência de Volta Redonda-RJ. São Paulo (SP): Hucitec; 2012.

Nesse sentido, o projeto pedagógico da RMS assinala que se espera do residente a internalização de uma atitude crítico reflexiva que se traduza em comprometimento com a viabilização de metodologias de atuação, pautada nos princípios do SUS, as quais visam a resolutividade das ações em saúde nos diferentes níveis de atenção do sistema. Além disso, no referido projeto pedagógico são apontadas diretrizes político pedagógicas para a formação dos residentes, as quais direcionam o residente à construção de conhecimento, de modo a torná-lo capaz de não apenas questionar seu cotidiano de atuação, como também propor alternativas de intervenção. No entanto, destaca-se que os entrevistados revelam que a EPS é trabalhada de forma incipiente nas disciplinas teóricas:

eu acho que se assemelham os conceitos com o que a gente procura fazer. O que não temos, no momento, é que não se fala especificamente de educação permanente, não se direciona, não se trabalhou esse conceito, nem essa política especificamente, mas indiretamente a proposta se assemelha aos conceitos da política (residente E4).

A partir das observações dos seminários e das preceptorias de campo e núcleo, pode-se perceber que os preceptores e professores discutiam e disponibilizavam o aporte teórico das atividades práticas que o residente desenvolveria no seu campo de atuação. Para tais atividades, os integrantes da RMS admitem relevância da fundamentação teórica para discuti-la com a equipe de saúde e, com isso, visar melhorias na qualidade da saúde da população.

Convém dar notoriedade ao projeto pedagógico da RMS, o qual assegura que cabe ao preceptor oportunizar condições de integração e trocas de vivências aos profissionais dos serviços em saúde e instigar o trabalho dos residentes por meio de atividades teóricas e teórico-práticas. Ademais, observa-se que os entrevistados apontam que os espaços, em que ocorre o encontro entre os preceptores e os residentes, são dispositivos de integração teórica e prática, todavia expõem que as disciplinas não se aproximavam da realidade vivenciada por eles, conforme nota-se no depoimento que segue:

[...] em algumas aulas a gente já discutiu sobre a EPS. Até na aula da professora [...] também a gente discutiu, e fez alguns debates trazendo a prática para dentro da teoria, tentando articular as duas. Mas foram bem poucas que eu lembro (residente E12).

Por sua vez, as diretrizes pedagógicas que orientam a RMS apontam a adoção de estratégias metodológicas que ultrapassam as disciplinas ofertadas em sala de aula, cuja justificativa se resume na grande carga horária destinada às atividades teórico-práticas. Diferentemente disso, os depoimentos sinalizam para um distanciamento entre a teoria das disciplinas e a prática vivenciada pelos residentes:

nossas aulas teóricas são muito distantes da nossa prática, do que a gente vivencia. Acredito que o maior espaço de formação tanto teórica quanto prática seja num campo prático, pois essa aproximação com a teoria que vivemos na prática acontece nas preceptorias de núcleo principalmente, e em discussões de caso que são promovidas pelos próprios residentes com os preceptores (residente E10).

Relacionando este depoimento com a análise documental do projeto pedagógico, percebe-se a presença de evidências que vão ao encontro do que o residente apresenta, pois o projeto pedagógico objetiva estimular os residentes a terem atitudes de ação-reflexão-ação, levando preceptores e residentes a discutir sobre a realidade de atuação dos profissionais em saúde, a fim de proporcionar aquisição de consciência crítica, individual e coletiva, que ultrapasse ao paradigma biologicista. Em consonância com as diretrizes pedagógicas da RMS, As diretrizes que balizam a EPS buscam a (re)organização dos programas de saúde, dos serviços e das práticas em saúde desenvolvidas a fim de viabilizar a mudança de paradigma.

Por fim, considera-se que os espaços formativos, em que as RMS contribuem para que profissionais com distintas formações, dispostos a transitar entre diferentes áreas, articulem seu saber específico na organização do trabalho, possibilitam tanto compartilhar ações como delegar atividades a outros profissionais da área da saúde, nos moldes de uma prática colaborativa.2222. Peduzzi M, Norman IJ, Germani ACCG, Silva JAM, Souza GC. Educação interprofissional: formação de profissionais de saúde para o trabalho em equipe com foco nos usuários. Rev Esc Enferm [online]. 2013 [acesso 2014 Abr 27]; 47(4):977-83. Disponível em: www.scielo.br/pdf/reeusp/v47n4/0080-6234-reeusp-47-4-0977.pdf
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É a partir dessa formação que se espera que o residente, futuro trabalhador do SUS, seja um profissional capaz de promover mudanças nas praticas de saúde, fazer transformações e inovações a fim de consolidar esse sistema e proporcionar atenção e gestão qualificada e integral para a sociedade ultrapassando o biologicismo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo assinala a RMS como um espaço intercessor para o desenvolvimento das ações de EPS, pois propicia o encontro dos integrantes da residência por meio dos seminários de núcleo e campo, preceptorias, aulas teóricas, atividades de campo, construindo relações e interações entre eles. Assim, durante esse momento de relações e interações, a EPS é discutida pelo grupo participante e incorporada ao cotidiano de atuação de cada profissional, tornando-se presente em cada planejamento de atividade, em encontros de profissionais da saúde com docentes, usuários e profissionais do serviço.

No que consta à formação dos residentes, orientada pelos princípios da EPS, destaca-se que esta excede uma perspectiva pontual, uma vez que é desencadeada por espaços em que atores dialogam sobre a educação permanente a fim de que possa contribuir para o desenvolvimento de competências para que os profissionais de saúde atuem nos cenários do SUS. Ainda, espera que os residentes adquiram atitudes críticas reflexivas e atuem como articuladores participativos na identificação de situações identificadas como nós críticos, criando alternativas estratégicas e inovadoras na atenção e gestão indispensáveis para as mudanças que visam a consolidação do SUS.

Nesse contexto, esta pesquisa ajuda a ampliar o diálogo que trata a respeito da problemática da EPS contextualizada no espaço da RMS. Assim, foi possível observar que ainda há desafios para que de fato ocorra essa contextualização e a EPS seja disseminada e consolidada como política. Entre os desafios, destacam-se os que se assemelham àqueles enfrentados pelo SUS, principalmente no que se refere à perpetuação das práticas contra-hegemônicas, ainda presentes na formação dos profissionais de saúde.

Diante disso, este estudo considera a RMS como estratégia para a disseminação da EPS entre os profissionais de saúde, englobando usuários, docentes e estudantes. Nesse sentido, nota-se que trabalhar na perspectiva da EPS, cuja ideologia propõe realizar transformações no campo da saúde, significa aceitar que as mudanças na formação e na saúde dependem de diversos fatores relacionados com os paradigmas vigentes. É de acordo com esse cenário que a RMS, imbuída da perspectiva de EPS, pode atuar na mudança de atitude dos profissionais na área de saúde, sensibilizando-os para atuar de modo diferente do tradicional. Para isso, outros estudos são necessários, dentre eles um estudo destinado a verificar como a EPS está sendo avaliada nos espaços de sua abrangência e como ela está subjetivando os profissionais de saúde, objeto de editais de pesquisas em saúde recentes do Ministérios da Saúde e da Educação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    01 Set 2014
  • Aceito
    12 Maio 2015
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