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RODÍZIO DE PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM ENTRE SETORES DE UM HOSPITAL: FERRAMENTA GERENCIAL NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS

RESUMO

Objetivo:

desvelar sentimentos e percepções de profissionais de enfermagem submetidos ao processo de rodízio entre setores de um hospital como ferramenta gerencial na resolução de conflitos.

Método:

estudo qualitativo, realizado com 22 profissionais enfermeiros e técnicos de enfermagem, utilizando-se grupo focal e análise de conteúdo, com base no referencial teórico do Interacionismo Simbólico.

Resultados:

o rodízio foi positivo para fatores que auxiliam a resolução de conflitos: aumento de conhecimentos e habilidades, reconhecimento das atividades desempenhadas pelos pares, melhora no relacionamento interpessoal, além de reduzir a resistência ao se atuar em outros setores. Contudo, suscitou sentimentos de ansiedade, medo, frustração, tristeza, angústia e insegurança atribuídos à comunicação ineficaz e à falta de participação da equipe na elaboração da proposta.

Conclusão:

o rodízio é uma estratégia importante para a redução de conflitos, todavia é fundamental que os gestores compartilhem essa proposta com a equipe antes de implementá-la.

DESCRITORES:
Administração de recursos humanos; Conflito (Psicologia); Equipe de enfermagem; Processos grupais; Reorganização de recursos humanos.

ABSTRACT

Objective:

to reveal the feelings and perceptions of nursing professionals who underwent the process of job rotation among sectors of a hospital as a management tool in conflict resolution.

Method:

a qualitative study carried out with 22 professionals, nurses and nursing technicians, using the focus group technique and content analysis based on the theoretical reference of Symbolic Interaction.

Results:

the job rotation process was positive regarding factors that help in resolving conflicts such as: increased knowledge and skills, recognition of the activities performed by peers, and improved interpersonal relationships, in addition to reducing resistance when working in other sectors. However, this process elicited anxiety, fear, frustration, sadness, distress, and insecure feelings attributed to ineffective communication and to the lack of the team's participation in developing the proposal.

Conclusion:

job rotation is an important strategy for reducing conflict; however, it is essential that managers share this proposal with the team before implementing it.

DESCRIPTORS:
Human resource management; Conflict (Psychology); Nursing staff; Group processes; Reorganization of human resources.

RESUMEN

Objetivo:

desvelar los sentimientos y percepciones de profesionales de enfermería sometidos al proceso de rotación entre sectores de un hospital como instrumento de gestión en la resolución de conflictos.

Metodo:

estudio cualitativo se ellevó a cabo con 22 profesionales, enfermeros y técnicos de enfermería, utilizando la técnica de grupo focal y análisis de contenido, con base en el referencial teórico del interaccionismo simbólico.

Resultados:

el proceso de rotación fue positivo para factores que auxilian en la resolución de conflictos como: aumento de conocimientos y habilidades, reconocimiento de las actividades desarrolladas por sus pares, mejora en el relacionamiento interpersonal, además de reducir resistencia al actuar en otros sectores. No obstante, suscitó sentimientos de ansiedad, miedo, frustración, tristeza, angustia e inseguridad, atribuidos a la comunicación ineficaz y a la falta de participación del equipo en la elaboración de la propuesta.

Conclusión:

la rotación es una estrategia importante para la reducción de conflictos, sin embargo, es fundamental que los gestores compartan esa propuesta con el grupo antes de implementarla.

DESCRIPTORES:
Administración de recursos humanos; Conflicto (psicología); Equipo de enfermería; Procesos grupales; Reorganización de recursos humanos.

INTRODUÇÃO

As atividades em grupo fazem parte do cotidiano de várias profissões, embora realizadas, muitas vezes, de forma mecânica. Os grupos podem contribuir para o êxito ou fracasso profissional de acordo com o contexto vivenciado nas organizações, relacionado aos aspectos estruturais, dinâmica de funcionamento e relações interpessoais.11 Munari DB, Padilha GC, Motta KAMB, Medeiros M. Contribuições para a abordagem da dimensão psicológica dos grupos. Rev Enferm UERJ [Internet]. 2007 [cited 2015 Oct 10]; 15(1): 107-12. Available from: http://www.facenf.uerj.br/v15n1/v15n1a17.pdf
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As diversidades existentes nos grupos são inevitáveis, e da incapacidade de lidar com essas diferenças surgem os conflitos os quais podem influenciar diretamente o resultado do trabalho.22 Cardoso ASF, Dall'Agnol CM. Group process: reflections of a nursing team. Rev Esc Enferm USP. 2011; 45(6):1406-12. Situações conflituosas geram sentimentos de frustração devido à impossibilidade de compreensão dos interesses e necessidades dos sujeitos envolvidos, interpretando os fatos a partir de um prisma individual.33 Cianmpone MHT, Kurcgant P. Gerenciamento de conflitos e negociação. In: Kurcgant P, coordenadora. Gerenciamento em enfermagem. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan; 2012. As fontes mais comuns de conflitos, nas instituições, são problemas na comunicação, na estrutura organizacional e no comportamento individual.44 Spagnol CA, Santiago GR, Campos BMO, Badaró MTM, Vieira JS, Silveira APO. Conflict situations experienced at hospital: the view of nursing technicians and auxiliaries. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2010 [cited 2015 Jan 05]; 44(3): 803-11. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v44n3/en_36.pdf
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A enfermagem é uma profissão que se caracteriza pelo trabalho em grupo, portanto, o modo com que as relações sociais se estabelecem no ambiente organizacional pode influenciar a dinâmica das interações e contribuir tanto para o prazer quanto para o sofrimento dos membros do grupo. A coesão grupal favorece o funcionamento da equipe de trabalho, gera maior satisfação profissional e menores índices de síndromes de Burnout.55 Kalisch BJ, Lee H, Rochman M. Nursing staff teamwork and job sastifaction. J Nurs Manag [Internet]. 2010 [cited 2014 Dec 12]; 18(8):938-47. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2994317/
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Nas equipes de enfermagem as situações geradoras de conflitos, quando bem conduzidas, contribuem para o desenvolvimento profissional e pessoal dos envolvidos, gera maior satisfação ao trabalhador, repercutindo na qualidade do processo de cuidar. Nesse contexto, a literatura66 Chiavenato I. Gestão de pessoas. 3ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Elsevier; 2010. relata que equipes bem-sucedidas apresentam comunicação clara e franca, reconhecem o conflito e buscam resolve-los positivamente.

Pesquisa realizada com trabalhadores de enfermagem revelou que o desgaste psíquico decorrente da própria natureza do trabalho cuidar de vidas adoecidas é menos impactante sobre a qualidade de vida deles do que o desgaste originado pelas situações e relações interpessoais presentes no ambiente de trabalho.77 Mininel VA, Baptista PCP, Felli VEA. Cargas psíquicas e processos de desgaste em trabalhadores de enfermagem de hospitais universitários brasileiros. Rev Latino-am Enferm. 2011 Mar-Abr; 19(2):340-7.

Nesse sentido, considerando-se que as relações interpessoais podem gerar desgaste para os profissionais, algumas instituições têm utilizado a rotatividade, em diferentes setores do trabalho, como meio para aumentar o nível de conhecimento de seus colaboradores, promovendo a qualificação no trabalho, e essa estratégia pode melhorar as habilidades sociais e o relacionamento entre os grupos de trabalho.8-11 O processo de rotatividade ou rodízio de funcionários é uma ferramenta gerencial advinda do Sistema Toyota de Produção, na década de 1950, com o objetivo de habilitar o trabalhador para atuar em diferentes postos de trabalho.99 Shingo S. Study of Toyota production system from industrial engineering viewpoint. Tokyo, Japan Management Association; 1981.

A partir desse sistema de produção foi criada a expressão "job rotation", e como a própria tradução indica job (trabalho) rotation (rotação/variação), surge como ferramenta para alternar temporariamente as atividades do trabalhador, a fim de flexibilizar e qualificar a força de trabalho.88 Jarvi M, Uusitalo T. Job rotation in nursing: a study of job rotation among nursing personnel from the literature and via a questionnaire. J Nurs Manag. 2004; 12:337-47.

Essa prática consiste em um rodízio sistematizado, com objetivo e tempo previamente definidos entre os envolvidos no processo. Na enfermagem, essa ferramenta deve ser utilizada como parte de um programa de desenvolvimento de carreira e orientação profissional, visando elevar o nível de qualidade no trabalho.88 Jarvi M, Uusitalo T. Job rotation in nursing: a study of job rotation among nursing personnel from the literature and via a questionnaire. J Nurs Manag. 2004; 12:337-47.

Conhecer, portanto, as percepções dos trabalhadores de enfermagem em relação ao uso da estratégia de rodízio entre setores permite aos gestores avaliarem a efetividade da ação como ferramenta gerencial no desenvolvimento de equipes, na resolução de conflitos e no aumento da satisfação profissional, aspectos estes que podem repercutir na qualidade do processo de cuidar.

Para compreender as experiências advindas do processo de rodízio utilizou-se o referencial teórico do Interacionismo Simbólico. Essa teoria tem como foco a natureza da interação e a dinâmica social entre as pessoas, valorizando, sobretudo, o significado que o ser humano atribui às suas experiências.1212 Dupas G, Oliveira I, Costa TNA. A importância do interacionismo simbólico na prática de enfermagem. Rev Esc Enferm USP. 1997 ago; 31(2): 219-26.-1313 Lopes CHAF, Jorge MSB. Symbolic interacionism and the possibility to the interactive care in nursing. Rev Esc Enferm USP. 2005 Mar; 39(1):103-8.

No Interacionismo Simbólico, ao se interagir com outros sujeitos, compartilham-se perspectivas, tomam-se decisões, mudam-se direções, define-se a realidade e assume-se o papel do outro. Sob essa ótica, reconhece-se o indivíduo como ser atuante, que lida com as situações e estabelece suas ações em conformidade com sua interpretação. Assim, a partir da interação as experiências são empregadas como subsídio para futuras ações, levando a uma ressignificação da situação vivenciada.1212 Dupas G, Oliveira I, Costa TNA. A importância do interacionismo simbólico na prática de enfermagem. Rev Esc Enferm USP. 1997 ago; 31(2): 219-26.-1313 Lopes CHAF, Jorge MSB. Symbolic interacionism and the possibility to the interactive care in nursing. Rev Esc Enferm USP. 2005 Mar; 39(1):103-8.

Nesse contexto, o objetivo deste estudo foi o de desvelar os sentimentos e percepções dos profissionais quanto ao processo de rodízio de enfermagem entre setores hospitalares como ferramenta gerencial para resolução de conflitos.

MÉTODO

O estudo consistiu em uma investigação exploratório-descritiva, qualitativa, pois houve a pretensão de relacionar o significado que os participantes atribuíam às suas experiências em seus processos de trabalho. O campo de estudo foi um hospital estadual de média complexidade de uma cidade do sul do Brasil. Essa instituição possui 117 leitos, distribuídos nos setores de clínica médica, clínica cirúrgica, pronto-socorro e pediatria, além de um centro cirúrgico.

À época deste estudo, a equipe de enfermagem era composta por 40 enfermeiros e 130 profissionais entre técnicos e auxiliares de enfermagem, escalados em jornadas de trabalho de 12 horas diurnas ou noturnas por 36 horas de descanso. Os participantes da pesquisa corresponderam a 15 enfermeiros, 61 técnicos e auxiliares de enfermagem do período diurno que participaram da estratégia de rodízio proposta pela direção de enfermagem da instituição, entre as unidades de pronto-socorro e enfermarias de clínica médica, pediátrica e cirúrgica, durante um mês, no ano de 2013.

O critério de inclusão adotado ateve-se aos participantes que vivenciaram o processo de rodízio de profissionais de enfermagem entre os setores hospitalares, realizado em 2013. E foram excluídos os que estavam em férias ou em licença. Para compor a amostra optou-se por sorteio para os técnicos e auxiliares de enfermagem, por formarem um quantitativo maior, atentando-se para que os grupos fossem compostos por trabalhadores das enfermarias e pronto-socorro. Ressalta-se que nenhum auxiliar de enfermagem foi contemplado no sorteio devido ao quantitativo reduzido dessa categoria profissional na instituição estudada. Quanto aos enfermeiros, participaram todos os que estavam trabalhando no dia proposto para a coleta de dados e que aceitaram formalmente participar da pesquisa.

Os dados foram coletados em setembro de 2014, utilizando-se a técnica de grupo focal, pois se trata de uma entrevista com o objetivo de captar dados através da comunicação interativa, possibilitando explorar crenças, valores, conceitos, conflitos, confrontos e pontos de vista por meio da interação grupal.1414 Ressel LB, Beck CLC, Gualda DMR, Hoffmann IC, Silva RM, Sehnem GD. O uso do grupo focal em pesquisa qualitativa. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2008 [cited 2014 Jun 06]; 17(4): 779-86. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v17n4/21.pdf
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Para iniciar os diálogos aplicou-se a seguinte questão norteadora: "como foi para vocês participarem do rodízio de profissionais entre a unidade de pronto-socorro e a unidades de internação?" Em situações oportunas, foram aplicadas questões auxiliares que contribuíssem para a qualidade dos depoimentos.

Foram realizados quatro grupos focais, sendo dois grupos compostos por seis técnicos de enfermagem, subdivididos em plantão A e B, e dois grupos compostos por cinco enfermeiros, subdivididos igualmente em plantão A e B. A divisão objetivou a liberdade dos participantes para exporem suas percepções em relação à outra categoria. Os encontros foram desenvolvidos no período de trabalho e tiveram duração média de uma hora. Quanto ao número de participantes em cada grupo buscou-se seguir a orientação do quantitativo mínimo proposto pela literatura14 acerca do grupo focal, no intuito de não ocasionar prejuízos para as atividades dos setores.

As falas foram gravadas em áudio e, posteriormente, foi realizada a transcrição literal dos diálogos do grupo focal e dos respectivos registros da comunicação não verbal, advindos das anotações do observador, cujas informações subsidiaram a compreensão do discurso do grupo. Os dados foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo, obedecendo às seguintes etapas: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados realizados por meio da inferência e interpretação.15 Nas fases de pré-análise e exploração do material fez-se a transcrição, seguida de leitura flutuante dos dados, com identificação de aspectos relevantes a partir do objetivo do estudo, buscando-se produzir unidades de registro e de contexto e identificando as possibilidades de construção dos eixos temáticos/categorias. Por fim, no tratamento dos resultados ocorreu o aprofundamento das categorias, articulando os dados empíricos com o material teórico pertinente.

Com o intuito de preservar a identidade dos entrevistados e diferenciá-los, todos foram identificados por códigos alfanuméricos, em que a sigla E significa enfermeiro e a sigla TE, técnico de enfermagem, seguidas de números indicativos da ordem das falas.

O estudo foi realizado de forma a garantir o cumprimento dos preceitos da Resolução 466/2012 sobre pesquisa envolvendo seres humanos.1616 Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde, Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Resolução nº 466 de 12 de dezembro de 2012: diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos. Brasília (DF): MS; 2012. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, obtendo parecer favorável e Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) n. 34232214.1.0000.5231.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dos 22 participantes do estudo, 19 profissionais eram do sexo feminino, com idade entre 26 e 54 anos. Destes, 14 possuíam menos de dez anos de experiência profissional e todos trabalhavam na instituição há quatro anos, devido ao último contrato público estatutário.

Os resultados obtidos no diálogo do grupo focal foram agrupados em categorias temáticas sobre o processo de rodízio de profissionais de enfermagem entre setores de internação e pronto-socorro, emergindo quatro categorias: sentimentos vivenciados com o comunicado do processo de rodízio; acolhimento dos profissionais; percepções acerca do processo de trabalho; e avaliação do processo de rodízio. Da categoria percepções acerca do processo de trabalho emergiram duas vertentes que constituíram as subcategorias aqui denominadas facilidades e dificuldades.

Sentimentos vivenciados com o comunicado do processo de rodízio

Habitualmente, o que se desconhece gera incertezas que podem afetar psicologicamente os indivíduos, considerado uma resistência natural. As pessoas menos receptivas às mudanças podem experimentar reações emocionais negativas, entre as quais frustração, ansiedade, insegurança, raiva e medo. Os depoimentos revelaram as dificuldades em lidar com o processo de rodízio entre setores, como se constata nas verbalizações a seguir:

[...] foi frustrante sair do meu local de trabalho e ir pro outro, mexeu com o emocional, com a forma de trabalho, com tudo, desestabilizou todo mundo (TE1).

[...] deu um pouco de raiva também, de não querer, e ter que fazer (TE4).

[...] fiquei triste. A princípio eu não queria ir, não aceitava de jeito nenhum, meu sentimento era de indignação, revolta (TE3).

[...] insegurança por ser um setor novo [...]. Mas eu não tenho problema em aprender (TE7).

[...] medo [...]. Você não esta acostumada com mudanças, esta acostumada com aquela rotina, com o seu setor (TE9).

[...] receio. Receio, receio do que é novo [...]. No começo a gente fica resistente, tira a gente da zona de conforto, daquela rotina que a gente já está habituada (E1).

As falas destacam sentimentos diversos dos entrevistados ao lidarem com a nova situação, indo ao encontro da concepção de que a resistência à mudança é configurada por duas ansiedades básicas: o medo da perda da estabilidade e o medo do ataque da nova situação.22 Cardoso ASF, Dall'Agnol CM. Group process: reflections of a nursing team. Rev Esc Enferm USP. 2011; 45(6):1406-12. Contudo, destaca-se que os motivos pelos quais os indivíduos reagem às mudanças organizacionais podem ser multifatoriais, advindos tanto das percepções individuais quanto do contexto organizacional. Dentre as causas de resistência individuais sobressaem os componentes de aspecto cognitivo, afetivo e comportamental. Já, nas causas de resistência do contexto estão ligadas à informação, participação, motivação, segurança no trabalho, confiança na gerência, dentre outros.1717 Freires DAN, Gouveia VV, Bortolotti SLV, Ribas FTT. Resistência à mudança organizacional: perspectiva valorativa e organizacional. Psico (Porto Alegre). 2014 Out-Dez; 45(4):513-23.

Nesse sentido, estudos revelam que o clima organizacional agradável é mais relevante do que as variáveis individuais ou psicológicas quando se avalia a abertura para experimentar mudanças.1717 Freires DAN, Gouveia VV, Bortolotti SLV, Ribas FTT. Resistência à mudança organizacional: perspectiva valorativa e organizacional. Psico (Porto Alegre). 2014 Out-Dez; 45(4):513-23. No entanto, considerando-se a individualidade, compreende-se que a resistência à mudança organizacional pode envolver sentimentos ambivalentes não necessariamente coincidentes, como mostram as falas a seguir: pra mim foi positivo, porque eu gosto da enfermaria, por ser um setor que tem mais rotina, você consegue organizar melhor as coisas (E7); talvez seja um pouco diferente das outras pessoas, porque como já trabalhei em muitos lugares, eu encaro as coisas com mais naturalidade (E3).

As experiências anteriores podem contribuir de forma positiva ou não para a nova situação. Estudos também demonstram que os valores dos indivíduos são fundamentais no sistema cognitivo. Assim, as pessoas mais idealistas configuram-se como mentes mais abertas e, consequentemente, são menos resistentes às mudanças, o que favorece a introdução de novas ideias e tecnologias para o desenvolvimento da instituição.1717 Freires DAN, Gouveia VV, Bortolotti SLV, Ribas FTT. Resistência à mudança organizacional: perspectiva valorativa e organizacional. Psico (Porto Alegre). 2014 Out-Dez; 45(4):513-23. Outro fator apontado por parte dos trabalhadores em relação ao processo de rodízio foi a inadequada instrução, como expressam os seguintes depoentes: essa comunicação de você vai rodar pra quê? Pra aprender rotina? Pra conhecer a equipe? Não teve nada disso [...] Aquela coisa, olha fulano você vai pra enfermaria, daí você vai avaliar isso e aquilo, tudo bem? A gente já vai com outra visão (E6); nem avisa o porquê que estão fazendo aquilo ou não, isso acaba gerando insegurança, desconforto, resistência [...] Foi uma coisa que não foi bem esclarecida (E10); a chefia tinha que conversar, expor para equipe as decisões, as mudanças, para tranqüilizar (T11).

A comunicação é inerente à vida grupal. O modo como ela é compartilhada e compreendida pode influenciar e modificar a realidade em que os indivíduos estão inseridos. Nesse sentido, salienta-se que a comunicação embasada em diálogo e interação pode gerar mudanças e novos comportamentos, pois permite o sentimento de estar integrado ao grupo, de identificar-se com ele, atribuindo sentido às ações desenvolvidas no cotidiano do trabalho.22 Cardoso ASF, Dall'Agnol CM. Group process: reflections of a nursing team. Rev Esc Enferm USP. 2011; 45(6):1406-12.,1818 Santos JLG, Prochnow AG, Lima SBS, Leite JL, Erdmann AL. Communication conceptions in hospital nursing management between head nurses in a university hospital. Rev Esc Enferm. USP [Internet]. 2011 [cited 2015 Jan 14]; 45(4):959-65. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n4/en_v45n4a24.pdf
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Nas instituições de saúde nem sempre a comunicação é bem-sucedida, podendo haver distorções nas informações, prejudicando a operacionalização do processo de trabalho. Pesquisas1818 Santos JLG, Prochnow AG, Lima SBS, Leite JL, Erdmann AL. Communication conceptions in hospital nursing management between head nurses in a university hospital. Rev Esc Enferm. USP [Internet]. 2011 [cited 2015 Jan 14]; 45(4):959-65. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n4/en_v45n4a24.pdf
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-1919 Azambuja EP, Pires DEP, Vaz MRC, Marziale MH. É possível produzir saúde no trabalho da enfermagem? Texto Contexto Enferm. [Internet]. 2010 [cited 2015 Abr 03]; 19(4):658-66. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v19n4/08.pdf
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revelam que a centralização do processo decisório, aliado ao processo comunicativo de forma verticalizada, também pode prejudicar o bom desempenho do trabalho. Do mesmo modo, o modelo de comunicação hierarquizado pode ocasionar distorções da mensagem inicial, dada a complexidade do processo de comunicação e da subjetividade de quem a interpreta, pois sofre influências de valores e concepções individuais.1818 Santos JLG, Prochnow AG, Lima SBS, Leite JL, Erdmann AL. Communication conceptions in hospital nursing management between head nurses in a university hospital. Rev Esc Enferm. USP [Internet]. 2011 [cited 2015 Jan 14]; 45(4):959-65. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n4/en_v45n4a24.pdf
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Salienta-se, por fim, que nas relações de trabalho a comunicação eficaz é imprescindível para o repasse de informações, possibilitando a realização de ações coordenadas, minimizando as diferenças e possibilitando o alcance de objetivos comuns.1818 Santos JLG, Prochnow AG, Lima SBS, Leite JL, Erdmann AL. Communication conceptions in hospital nursing management between head nurses in a university hospital. Rev Esc Enferm. USP [Internet]. 2011 [cited 2015 Jan 14]; 45(4):959-65. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n4/en_v45n4a24.pdf
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Acolhimento dos profissionais

Embora a convivência grupal faça parte da vida do ser humano desde os primórdios, seja na família, na escola, igreja, entre outros meios, nem sempre o processo de inserção de um novo membro no grupo é percebido claramente.

[...] eu encontrei dificuldade, porque eles tinham o grupo deles, a chefia também tinha mais afinidade com eles, e não estava nem aí para você, cobrava até um pouco mais do que o próprio grupo que estava lá. Às vezes escalava a gente no quarto mais pesado (TE5).

[...] eu particularmente com uma enfermeira, me senti excluída, uma questão que eu vi, é que ela deu preferência pelo pessoal que estava lá (TE1).

[...] às vezes, eu ficava assim meio receoso em pedir ajuda [...]. Não que a pessoa não quisesse ajudar, mas de expor o que eu estava precisando (TE4).

As falas revelaram as dificuldades encontradas referentes ao relacionamento interpessoal, considerando-se que os participantes relataram falta de afinidade, receio e sentimento de exclusão. Até mesmo o enfermeiro, que é a liderança formal da unidade, foi destacado por não realizar acolhimento adequado ao profissional em processo de rodízio e propiciar benefícios para sua equipe de trabalho. Isto posto, pode-se considerar que na dimensão do trabalho do enfermeiro, o qual tem a responsabilidade de coordenar equipes de trabalho na enfermagem, frequentemente se depara com dificuldades frente à liderança, comunicação e relacionamento interpessoal. Portanto, é relevante considerar a importância do conhecimento sobre a dinâmica grupal para esse profissional.2

Destaca-se que, nos grupos, as pessoas estão em constante interação, as muitas relações vivenciadas impactarão, de alguma forma, a singularidade de cada um, fato que confirma a teoria do Interacionismo Simbólico.1212 Dupas G, Oliveira I, Costa TNA. A importância do interacionismo simbólico na prática de enfermagem. Rev Esc Enferm USP. 1997 ago; 31(2): 219-26.-1313 Lopes CHAF, Jorge MSB. Symbolic interacionism and the possibility to the interactive care in nursing. Rev Esc Enferm USP. 2005 Mar; 39(1):103-8. Desse modo, é preciso considerar que as várias redes se cruzam, cada qual com seus valores, crenças, medos, afinidades e mecanismos de defesa.22 Cardoso ASF, Dall'Agnol CM. Group process: reflections of a nursing team. Rev Esc Enferm USP. 2011; 45(6):1406-12. Contudo, observa-se que as opiniões diferem em relação ao acolhimento no grupo, e isso pode ter ocorrido tanto pelo traço de personalidade pessoal mais propensa a incorporar mudanças, quanto pelas características singulares do líder e do grupo que a recebe.

A recepção foi boa, me trataram bem, me respeitaram [...]. Foi bom pra conhecer a equipe, porque até então eu não tinha trabalhado com nenhum deles, foi bem empolgativo (E8).

Eu fui bem recebida, inclusive isso que me chamou mais atenção [...]. A gente deixa de lidar com outras pessoas no dia-a-dia e eu me dei super bem, me senti bem acolhida (E3).

A percepção de acolhimento, aproximação ou distanciamento a que se referem as falas, pode ser explicada pelo conceito da dinâmica de grupos, conhecido como tele, que consiste na disposição que se tem para trabalhar com outras pessoas. Se, por um lado, a tele negativa é considerada dificuldade ou rejeição em trabalhar com o outro, por outro, a tele positiva compreende a possibilidade e a aceitação de trabalhar com esse outro. Nesse sentido, o rodízio entre setores propiciou a manifestação da tele positiva, seja por parte do indivíduo ou dos membros do grupo, tornando mais favorável o desenvolvimento do trabalho.2

Percepções acerca do processo de trabalho: facilidades e dificuldades

Em relação às facilidades, os depoentes expressaram o aumento nos níveis de conhecimento e das habilidades oriundos da nova experiência.

Eu acho que hoje eu domino melhor algumas coisas que lá na enfermaria a gente quase não via. Você até sabe fazer, mas não tem habilidade. Então, nesse ponto de vista eu cresci profissionalmente, em questão de conhecimento (TE6).

[...] mais experiência, mais segurança, eu cresci sabe? Mas foi difícil, eu não queria ir, sofri, chorei, queria sumir de lá no primeiro momento, mas depois foi bom, porque eu cresci em relação aos procedimentos (TE3).

[...] foi uma experiência nova, porque eu nunca tinha trabalhado em pronto-socorro, foi tudo novo, então foi agregar isso, novas experiências (TE2).

É evidente, nas falas, a comprovação de que a ferramenta rodízio propiciou vantagens e agregou conhecimento a partir da vivência de uma realidade até então desconhecida, além de permitir compreender melhor a funcionalidade do outro setor e, consequentemente, da instituição. Portanto, os achados deste estudo vão ao encontro da literatura, ao evidenciar que a prática de rodízio gera oportunidades para aprender novas habilidades e expande os conhecimentos profissionais ao criar variedade no conteúdo do trabalho, podendo aliviar a monotonia resultante das tarefas repetitivas do cotidiano.88 Jarvi M, Uusitalo T. Job rotation in nursing: a study of job rotation among nursing personnel from the literature and via a questionnaire. J Nurs Manag. 2004; 12:337-47.,1010 Ho WH, Chang CS, Shih YL, Liang RD. Effects of job rotation and role stress among nurses on job satisfaction and organizational commitment. BMC Health Serv Res. 2009; 9:8-15.-1111 Chen SY, Wu WC, Chang CS, Lin CT. Job rotation and internal marketing for increased job satisfaction and organizational commitment in hospital nursing staff. J Nurs Manag. 2015 Apr; 23(3):297-306.

Alguns autores sinalizam ainda que a estratégia é uma aliada na redução do Burnout, pois além de alterar as atribuições, os novos desafios podem incentivar o entusiasmo, estimulando o espírito de trabalho e o cultivo das relações interpessoais.88 Jarvi M, Uusitalo T. Job rotation in nursing: a study of job rotation among nursing personnel from the literature and via a questionnaire. J Nurs Manag. 2004; 12:337-47.,1010 Ho WH, Chang CS, Shih YL, Liang RD. Effects of job rotation and role stress among nurses on job satisfaction and organizational commitment. BMC Health Serv Res. 2009; 9:8-15.-1111 Chen SY, Wu WC, Chang CS, Lin CT. Job rotation and internal marketing for increased job satisfaction and organizational commitment in hospital nursing staff. J Nurs Manag. 2015 Apr; 23(3):297-306. O alívio das situações inerentes ao setor de origem e as percepções positivas do setor de rodízio ficam evidentes nas falas.

Eu acho que a gente tem que rodar, porque por mais que você goste do setor, vai tendo o cansaço do dia a dia (T7).

Lá na enfermaria eu conseguia saber o nome de todos os pacientes, do diagnóstico, foi muito bom (T10).

Eu já achei pontos positivos, que até queria levar alguma coisa para enfermaria (E1).

O rodízio foi positivo, pra sair da zona de conforto, de conhecer outros lugares, de mudar um pouquinho o olhar viciado, porque quando você volta, também percebe no seu setor: 'nossa, aquela rachadura, essa luz que não acende que eu tinha esquecido' (E3).

É possível constatar, nas falas, a satisfação de estar em outro setor com processos de trabalho diferentes. Essa vivência do trabalhador, além de ser percebida como alívio das atribuições diárias, pode propiciar novos olhares e levar ao implemento de novas atitudes e melhorias tanto no setor de rodízio quanto no retorno ao setor de origem. Além disso, os profissionais manifestaram percepções relevantes após a vivência do processo de rodízio.

Entre eles [equipe/enfermaria] tem muito companheirismo [...]. Você precisa, eu também preciso, eu te ajudo, você me ajuda, uma união mesmo no grupo (E2).

O fato de a pessoa passar pela experiência de ser você, fazer o que você faz [...]. Ela consegue compreender melhor as suas dificuldades (E2).

O conhecimento mesmo do setor, da rotina, porque a gente tem uma visão, e quando você participa, você está ali vivenciando a rotina, você muda a sua percepção das coisas (E8).

De acordo com as falas foi possível constatar que o rodízio no trabalho, além de propiciar desenvolvimento profissional, é capaz de promover o desempenho pessoal, melhorando a confiança para executar novas tarefas, otimizando a flexibilidade na comunidade de trabalho. Ainda na esfera pessoal, os participantes podem se sentir motivados a cultivar os relacionamentos interpessoais, podendo, sobretudo, ser uma importante forma de melhorar a resiliência pessoal, tornando a vida no trabalho mais dinâmica e flexível.88 Jarvi M, Uusitalo T. Job rotation in nursing: a study of job rotation among nursing personnel from the literature and via a questionnaire. J Nurs Manag. 2004; 12:337-47.,1010 Ho WH, Chang CS, Shih YL, Liang RD. Effects of job rotation and role stress among nurses on job satisfaction and organizational commitment. BMC Health Serv Res. 2009; 9:8-15. Essa constatação reafirma a proposta do referencial teórico do interacionismo simbólico utilizado neste estudo, no sentido de que as interações e experiências vivenciadas podem levar a uma ressignificação das ações futuras.

No que se refere às dificuldades encontradas no setor de rodízio, os profissionais destacaram aspectos em relação ao processo de trabalho, como mostram as falas a seguir: no pronto socorro você tem que dar conta de todo paciente que chega na porta. Às vezes tem mil macas, tem mil camas, e você tem que atender todo mundo (TE6); [...] e pra passar plantão? Quem que é esse aqui? Cadê o que estava aqui? [...] parece que eu não tenho o controle da situação e eu não consigo trabalhar assim (E8); eu gosto de enfermaria, porque eu tenho o contato com o paciente, a gente vê a evolução do paciente. No pronto-socorro não, hoje eu estou com o paciente, amanhã ele não esta mais, eu não sei se ele melhorou (TE9).

As unidades de pronto-socorro são conhecidas pelo seu dinamismo no processo de trabalho. Os profissionais que ali atuam são desafiados pela demanda que frequentemente excede a capacidade de atendimento do serviço. Além disso, essa demanda deve ser respondida com velocidade, exigindo dos trabalhadores capacidade de agir com tensão, alta habilidade psicomotora e aptidão, pois lidam constantemente com excessivo número de pacientes que necessitam de atendimento em uma diversidade de condições clínicas. 2020 Seleghim MR, Mombelli MA, Oliveira MLF, Waidman MAP, Marcon SS. Sintomas de estresse em trabalhadoras de enfermagem de uma unidade de pronto-socorro. Rev. Gaúcha Enferm [Internet]. 2012 [cited 2015 Jan 10]; 33(3):165-73. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1983-14472012000300022&script=sci_arttext
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S198...
-2121 Gehlen GC, Lima MADS. Nursing work in care practice at emergency care units in Porto Alegre/RS. Invest Educ Enferm. 2013; 31(1): 26-35.

A imprevisibilidade, característica das unidades de urgência e emergência, gera a necessidade de estar sempre alerta, o que pode acarretar uma carga de estresse devido ao desgaste emocional, pois é um ambiente instável e agitado, requerendo rápidas tomadas de decisão e constante reorganização do processo de trabalho.2222 Garcia AB, Dellaroza MSG, Haddad MCL, Pachemshy LR. Prazer no trabalho de técnicos de enfermagem do pronto-socorro de um hospital universitário público. Rev Gaúcha Enferm. 2012 Jun; 33(2):153-9. Entretanto, foi possível identificar, nas falas, a afinidade de alguns profissionais alocados nesse setor.

No pronto-socorro é diferente, sua cabeça não para, a gente é mais alerta, você está com um paciente aqui, mas observando o outro que está do lado, e na enfermaria é tudo muito programado, muito certinho, e eu não consigo trabalhar dessa forma (T11).

Eu particularmente não gosto muito de enfermaria, pela característica de ser pessoas idosas, com doença crônica, paciente acamado, coisa de geriatria [...], coisa que eu particularmente não gosto, fico deprimida (E3).

O dinamismo e o inesperado, como parte do processo de trabalho no pronto-socorro, não limita o profissional a realizar-se com as atividades desempenhadas. Outro aspecto que surge desse processo é a dificuldade do enfermeiro em desempenhar suas atividades de gerenciamento da equipe e tomada de decisões.

Você vai assumir, delegar uma coisa que os técnicos sabem muito mais do que você (E7).

Você acaba também não assumindo muito a equipe, porque você vai ficar lá um mês [...], e você não pode interferir muito na rotina, se não você acaba não sendo bem aceito (E9).

Você começa do zero, com o processo de inserção, está chegando numa equipe (E2).

Nesse contexto, pode-se retomar o processo de inserção grupal, o qual exige do indivíduo a disposição para socializar.22 Cardoso ASF, Dall'Agnol CM. Group process: reflections of a nursing team. Rev Esc Enferm USP. 2011; 45(6):1406-12. Entretanto, a ferramenta de rodízio permitiu que o profissional atuasse por curto período nas unidades, tempo insuficiente para que tivesse se disponibilizado a integrar e a incorporar sua identidade social no grupo, assumindo o papel de liderança formal que lhe é legalmente instituído.

Avaliação do processo de rodízio

Várias são as percepções acerca da estratégia de rodízio, as quais derivam de questões subjetivas do próprio indivíduo ou do meio no qual foi recebido. Em sua essência destaca-se a ampliação de conhecimento, o ato de reconhecer a atividade desempenhada por seus pares, a redução da resistência em atuar em outro setor, e a melhora no relacionamento interpessoal.

O que foi bom no rodízio foi que cada um conheceu o lugar do outro, se colocou no lugar do outro, e além de adquirir conhecimento. O importante é que não foi uma coisa abrupta, foi gradual, tirando uma peça aqui e colocando ali (E3).

Eu acho que melhorou minha visão, de não imaginar que era tão pesado [enfermaria], achava que ia pedir ajuda à toa (TE4).

Você julga as coisas por não conhecer. O mal nosso é fazer um pré-conceito, achar que é aquilo, mas não é. Você vivendo a rotina no PS, você entende porque não mandava o paciente puncionado, porque que não colheu swab (TE5).

Nesse sentido, considerando-se as falas dos participantes, percebe-se que a vivência em outro setor suscitou o conhecimento do processo de trabalho da unidade do semelhante, permitindo-lhes perpassarem os objetivos individuais e se concentrarem em objetivos coletivos, impulsionado-os a melhorar o desempenho organizacional.

No contexto hospitalar, embora pareça ser prudente deixar os funcionários desempenharem as tarefas habituais, isso não favorece a habilidade de se adaptarem a novos cenários. Desse modo, as habilidades e as competências dos profissionais serão muito restritas se eles estiverem familiarizados apenas com a enfermagem de suas unidades.88 Jarvi M, Uusitalo T. Job rotation in nursing: a study of job rotation among nursing personnel from the literature and via a questionnaire. J Nurs Manag. 2004; 12:337-47.

Considerando-se que o desempenho da organização e dos profissionais pode ser influenciado pela atitude de resistência à mudança, constatou-se que em relação ao sentimento inicial do processo de rodízio os resultados foram satisfatórios.

Dá pra se dizer que foi positivo a quebra de que eu sou desse setor e pertenço a esse setor. Pra se ajudar hoje, diminuiu um pouco a resistência em se ajudar entre setores (E10).

Eu acho que de aprender a rotina de outro setor. A gente enriquece, você vê a diferença, amadurece [...]. Hoje, se precisar cobrir o PS eu vou, não que eu goste, mas eu vou (E7).

Hoje, se precisar ir para pronto-socorro eu vou, não tem mais aquela dificuldade, porque eu já conheço, não tem aquela resistência de antes (TE7).

Observa-se, nos depoimentos, que os participantes migraram de uma visão parcial para um ponto de vista holístico da instituição e dos pares. Na literatura é observado que o rodízio de profissionais beneficia ambas as partes: ao profissional permite adquirir novas competências e expandir seu conhecimento na profissão; e na comunidade de trabalho promove a flexibilidade na gestão de recursos humanos.88 Jarvi M, Uusitalo T. Job rotation in nursing: a study of job rotation among nursing personnel from the literature and via a questionnaire. J Nurs Manag. 2004; 12:337-47.,1111 Chen SY, Wu WC, Chang CS, Lin CT. Job rotation and internal marketing for increased job satisfaction and organizational commitment in hospital nursing staff. J Nurs Manag. 2015 Apr; 23(3):297-306.

Em relação ao relacionamento interpessoal, parte do grupo percebe que houve melhora no relacionamento, e também houve redução dos conflitos.

Minimizaram os conflitos por esse olhar de conhecer, entender como funciona o outro setor (E9).

O que eu achei bom foi que tinha gente que não tinha ligação de amizade. Não conhecia bem outras pessoas, e depois do rodízio, acabou fazendo novas amizades (TE9).

Eu vejo de positivo a união entre os técnicos, porque a gente trabalhava no mesmo hospital e não se conhecia, parecia estranho, não sabia nem o nome (TE7).

Neste estudo, a aproximação entre os membros das equipes e a oportunidade de convívio no trabalho foram fatores importantes na redução dos conflitos, o que reafirma o referencial teórico adotado.

Estudo que objetivou avaliar as situações de conflito no contexto hospitalar evidenciou a necessidade de o trabalho ser realizado em equipe, subsidiado em valores: cooperação, respeito, confiança, troca de experiência e união. Do mesmo modo, ter clareza dos objetivos comuns da instituição e da equipe constituiu-se aspecto essencial para a redução dos conflitos organizacionais.44 Spagnol CA, Santiago GR, Campos BMO, Badaró MTM, Vieira JS, Silveira APO. Conflict situations experienced at hospital: the view of nursing technicians and auxiliaries. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2010 [cited 2015 Jan 05]; 44(3): 803-11. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v44n3/en_36.pdf
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A implementação da ferramenta de rodízio de funcionários entre unidades hospitalares pode auxiliar gestores e colaboradores na aquisição de tais competências.

CONCLUSÃO

Os achados deste estudo revelaram que o processo de rodízio entre setores hospitalares foi positivo no que se refere a fatores que auxiliam a resolução de conflitos, como o aumento de conhecimentos e habilidades, reconhecimento das atividades desempenhadas pelos pares, melhora no relacionamento interpessoal, além de reduzir a resistência em atuar em outro setor.

Contudo, a ferramenta suscitou sentimentos diversos, ansiedade, raiva, medo, frustração, tristeza, angústia e insegurança. Nesse sentido, deve-se considerar que a forma de os indivíduos reagirem às mudanças deriva tanto das percepções individuais quanto do contexto. Assim, destacam-se algumas fragilidades do contexto apontadas pela equipe de enfermagem que podem ter contribuído para o surgimento desses sentimentos: a comunicação ineficaz e a falta de participação da equipe na elaboração da estratégia.

Desse modo, torna-se evidente que os gestores, antes de implementarem estratégias, devem abordar alguns aspectos para a redução da resistência, visando aumentar o desempenho da equipe e reduzir os sentimentos negativos que a acompanham. Portanto, é fundamental esclarecer a finalidade e as vantagens do rodízio entre setores, assegurar que a estratégia seja transparente e que a equipe de enfermagem tenha a oportunidade de participar da administração do rodízio, oferecendo sugestões para melhoria, conferindo-lhes a corresponsabilização pelo processo.

Considerou-se como limitação deste estudo o tempo decorrido entre o rodízio e a coleta de dados, pois a coleta ocorreu no ano seguinte ao rodízio, o que pode ter interferido na percepção dos participantes. Todavia, acredita-se que os achados deste estudo poderão contribuir não somente para pesquisadores, mas também para gestores na área da saúde, pois conhecer o desempenho dessa ferramenta permite a utilização e a otimização da estratégia, considerando-se os benefícios para ambas as partes. Para o profissional, essa ferramenta permite adquirir novas competências e expandir seu conhecimento na profissão; e na comunidade de trabalho promove a flexibilidade na gestão de recursos humanos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2015
  • Aceito
    12 Dez 2015
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