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ADAPTAÇÃO CULTURAL DO INSTRUMENTO ADOLESCENT PEDIATRIC PAIN TOOL PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES BRASILEIROS COM CÂNCER

RESUMO

Objetivo:

descrever as etapas realizadas no processo de adaptação cultural do instrumento de avaliação da dor Adolescent Pediatric Pain Tool, para crianças e adolescentes brasileiros com câncer.

Método:

trata-se de um estudo metodológico e transversal. As etapas percorridas do processo de adaptação cultural do instrumento até a validação semântica seguiram um método adaptado que compreendeu: tradução inicial, síntese das traduções, avaliação pelo Comitê de Especialistas, retrotradução, comparação com o instrumento original e validação semântica propriamente dita.

Resultados:

o processo de tradução inicial do instrumento até a obtenção do consenso final levou, aproximadamente, quatro meses. Na etapa de avaliação pelo Comitê de Especialistas, participaram do estudo três profissionais da área da saúde, com conhecimento na temática e domínio da língua inglesa. Para a etapa de validação semântica, participaram 35 crianças e adolescentes de oito a 18 anos incompletos, atendidos na instituição onde eram realizados o tratamento e o seguimento de crianças e adolescentes com câncer. Após a conclusão de todas as etapas, os pesquisadores se reuniram para discutir as mudanças propostas. Ao final do processo de adaptação cultural do Adolescent Pediatric Pain Tool, todos os 67 descritores da dor, propostos inicialmente, foram mantidos em sua versão em português.

Conclusão:

as etapas do processo de adaptação cultural do Adolescent Pediatric Pain Tool foram alcançadas e sua descrição detalhada de forma a evidenciar o rigor na condução do estudo.

DESCRITORES:
Adolescente; Criança; Neoplasias; Dor; Estudos de validação

ABSTRACT

Objective:

to describe the steps in the cross-cultural adaptation process of the Adolescent Pediatric Pain Tool, a pain assessment measure, for use with Brazilian children and adolescents with cancer.

Method:

a methodological and cross-sectional study was undertaken. The steps in the cross-cultural adaptation process of the tool that resulted in the semantic validation followed an adapted method, including: initial translation, consensus version of translations, evaluation by Expert Committee, back-translation, comparison with original tool and actual semantic validation.

Results:

the initial translation process of the tool until the final consensus was reached took approximately four months. In the evaluation by the Expert Committee, three health professionals participated in the study, who were knowledgeable on the theme and mastered the English language. In the semantic validation, 35 children and adolescents aged between eight and 18 unfinished years participated, who were patients at the institution where children and adolescents with cancer were treated and monitored. After concluding all steps, the researchers met to discuss the proposed changes. At the end of the cross-cultural adaptation process of the Adolescent Pediatric Pain Tool, all initially proposed 67 pain descriptors were maintained in their Portuguese version.

Conclusion:

the steps in the cross-cultural adaptation process of the Adolescent Pediatric Pain Tool were executed and described in detail, evidencing the rigorous development of the study.

DESCRIPTORS:
Adolescent; Child; Neoplasms; Pain; Validation studies

RESUMEN

Objetivo:

describir las etapas realizadas en el proceso de adaptación cultural del instrumento de evaluación del dolor Adolescent Pediatric Pain Tool, para niños y adolescentes brasileños con cáncer.

Método:

se trata de un estudio metodológico y transversal. Las etapas recorridas del proceso de adaptación cultural del instrumento hasta la validación semántica siguieron un método adaptado que comprendió: traducción inicial, síntesis de las traducciones, evaluación por el Comité de Especialistas, retrotraducción, comparación con el instrumento original y validación semántica propiamente dicha.

Resultados:

el proceso de traducción inicial del instrumento hasta la obtención del consenso final tardó, aproximadamente, cuatro meses. En la etapa de evaluación por el Comité de Especialistas, participaron del estudio tres profesionales del área de la salud, con conocimiento en la temática y dominio de la lengua inglesa. Para la etapa de validación semántica, participaron 35 niños y adolescentes de ocho a 18 años incompletos, atendidos en la institución donde se realizaban el tratamiento y el seguimiento de niños y adolescentes con cáncer. Después de la conclusión de todas las etapas, los investigadores se reunieron para discutir los cambios propuestos. Al final de la adaptación cultural del instrumento Adolescent Pediatric Pain Tool, los 67 descriptores del dolor, propuesto inicialmente se mantuvieron en su versión portuguesa.

Conclusión:

las etapas del proceso de adaptación cultural del Adolescent Pediatric Pain Tool se alcanzaron y su descripción detallada, para evidenciar el rigor en la conducción del estudio.

DESCRIPTORES:
Adolescente; Niño; Neoplasias; Dolor; Estudios de validación

INTRODUÇÃO

As condições crônicas são problemas de saúde que requerem cuidados contínuos, por um período de vários anos ou décadas. Elas estão aumentando em todo o mundo, e nenhum país está isento do impacto causado por tais condições.11. Organização Mundial da Saúde. Cuidados inovadores para condições crônicas: componentes estruturais de ação: relatório mundial. Brasília, DF: OMS; 2003. Entre as condições crônicas está o câncer que, atualmente, constitui-se em um dos maiores problemas de saúde pública do mundo, presente em todas as culturas, etnias, gêneros e faixas etárias, incluindo as crianças e os adolescentes. Estimamos uma ocorrência de cerca de 160.000 novos casos e 90.000 mortes por câncer em menores de 15 anos por ano, em todo o mundo,22. World Health Organization. World Cancer Report 2008. Geneva: OMS; 2008. Available from: https://www.who.int/cancer/publications/world_cancer_report2008/en/
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sendo esperada para o ano de 2015/2016, no Brasil, a ocorrência de 12.600 casos novos de câncer em crianças e adolescentes até os 19 anos.33. Instituto Nacional de Câncer (BR). Estimativa 2016: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Câncer; 2015. Available from: https://www.inca.gov.br/campanhas/dia-nacional-de-combate-ao-cancer/2015/estimativa-2016-incidencia-de-cancer-no-brasil
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Considerando-se a alta incidência do câncer infantojuvenil, torna-se necessário pensar na qualidade de vida desses pacientes, pois a dor é um sintoma frequentemente associado ao câncer. Centros específicos para o tratamento da dor em países desenvolvidos indicam que todas as crianças com câncer experienciaram dor relacionada à sua doença ou ao tratamento e, mais de 70% delas, em algum momento, apresentaram dor severa.44. Instituto Nacional de Câncer (BR). Estimativa 2006: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Câncer ; 2005. Embora exista a preocupação com o alívio da dor da criança, esta frequentemente não é reconhecida, podendo ser tratada de modo inadequado, mesmo quando há recursos suficientes disponíveis.55. World Health Organization. Cancer pain relief and palliative care in children. Geneva: OMS ; 1998. Available from: https://apps.who.int/iris/handle/10665/42001
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O sucesso no tratamento da dor requer uma avaliação cuidadosa de sua natureza, entendimento dos diferentes tipos e padrões de dor e conhecimento do melhor tratamento. Uma avaliação adequada da dor, logo no início de seu aparecimento, irá atuar como uma linha de base para o julgamento de intervenções subsequentes.66. Ministério da Saúde (BR). Cuidados paliativos oncológicos: controle da dor. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Câncer ; 2001.

A fim de promover o adequado manejo da dor, o primeiro passo é a sua avaliação e mensuração, uma vez que se torna difícil manipular um problema dessa natureza sem ter uma medida sobre a qual basear o tratamento ou conduta terapêutica e, dessa forma, foram desenvolvidos vários métodos para mensurar a percepção e sensação de dor.77. Tomlinson D, Von Baeyer CL, Stinson JN, Sung L. A systematic review of faces scales for the self-report of pain intensity in children. Pediatrics [Internet]. 2010 [cited 2016 Feb 05];126(5):1168-1198. doi: 10.1542/peds.2010-1609
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Entre os métodos de avaliação da dor, os instrumentos multidimensionais são empregados para avaliar e mensurar as diferentes dimensões da dor, a partir de indicadores de respostas e suas interações. As principais dimensões avaliadas são a sensorial, a afetiva e a avaliativa.88. Sousa FAEF. Dor: o quinto sinal vital. Rev Latino-Am Enfermagem [Internet]. 2002 [cited 2016 Feb 05];10(3):446-447. doi: 10.1590/S0104-11692002000300020
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Observa-se, na literatura brasileira, a escassez de instrumentos específicos para a avaliação da dor na criança e no adolescente. Apesar de disponíveis no cenário internacional, os instrumentos não podem ser utilizados no nosso contexto, uma vez que, para que um instrumento seja válido e confiável para ser aplicado em uma diferente cultura daquela para a qual foi construído, não basta apenas a realização de uma simples tradução, mas sim o cumprimento de etapas rigorosamente fundamentadas em metodologia consolidada. Para validação de um instrumento, é essencial seguir um método que o deixe o mais fidedigno possível em relação ao instrumento original.99. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417-1432. doi: 10.1016/0895-4356(93)90142-N
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O processo de adaptação de um instrumento de medida existente, de uma cultura para outra, tem sido um procedimento amplamente utilizado nas diversas áreas do conhecimento,99. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417-1432. doi: 10.1016/0895-4356(93)90142-N
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principalmente em pesquisas multinacionais e multiculturais relacionadas à saúde, em que há a necessidade de adaptar instrumentos para outras línguas, que não a sua língua-alvo.1010. Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine. 2000;25(24):3186-3191. doi: 10.1097/00007632-200012150-00014
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Esta é uma prática que tem evidenciado economia de tempo, recursos pessoais e financeiros, além da possibilidade de permitir a realização de comparação de dados, nas diversas culturas em que foram aplicados.1111. Cummings SR, Stwart A, Hulley SB. Elaboração de questionários e instrumentos de coleta de dados. In: Hulley SB, Cummings SR, Browner WS, Grady D, Hearst N, Newman TB, eds. Delineando a pesquisa clínica: uma abordagem epidemiológica. Porto Alegre, RS: Artmed; 2003:265-281.

O objetivo deste estudo é descrever as etapas realizadas no processo de adaptação cultural do Adolescent Pediatric Pain Tool (APPT) para crianças e adolescentes brasileiros com câncer. Trata-se de um instrumento multidimensional, validado apenas na língua inglesa, para avaliar a localização, a intensidade e a qualidade da dor em crianças e adolescentes, de oito a 18 anos incompletos. A escolha do APPT justifica-se pela descrição cuidadosa dos autores em relação aos aspectos que envolvem o processo de sua construção, particularmente a composição da amostra das crianças e dos adolescentes participantes, além do detalhamento de cada uma das etapas realizadas no processo de validação, o que tornou público o rigor dos estudos que culminaram com a disponibilização do instrumento.1212. Savedra MC, Tesler MD, Holzemer WL, Wilkie DJ, Ward JA. Pain location: validity and reliability of body outline markings by hospitalized children and adolescents. Res Nurs Health. 1989;12(5):307-314. doi: 10.1002/nur.4770120506
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-1616. Wilkie DJ, Holzemer WL, Tesler MD, Ward JA, Paul SM, Savedra MC. Measuring pain quality: validity and reliability of children’s and adolescents’ pain language. Pain. 1990;41(2):151-159. doi: 10.1016/0304-3959(90)90019-A
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No APPT, a localização da dor pela criança ou adolescente é feita através de uma representação gráfica do corpo humano, frente e dorso, com a identificação do lado esquerdo e direito, onde a criança deve marcar a área do corpo onde está sentindo dor.1212. Savedra MC, Tesler MD, Holzemer WL, Wilkie DJ, Ward JA. Pain location: validity and reliability of body outline markings by hospitalized children and adolescents. Res Nurs Health. 1989;12(5):307-314. doi: 10.1002/nur.4770120506
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-1313. Savedra MC, Holzemer WL, Tesler MD, Wilkie DJ. Assessment of postoperation pain in children and adolescents using the adolescent pediatric pain tool. Nurs Res. 1993;42(1):5-9. doi: 10.1097/00006199-199301000-00002
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A intensidade da dor é avaliada por uma escala, representada por uma linha reta horizontal, com 10cm de comprimento, graduada em cinco pontos (sem dor, pouca dor, dor média, muita dor, pior dor possível),1515. Tesler MD, Savedra MC, Holzemer WL, Wilkie DJ, Ward JA, Paul SM. The word-graphic rating scale as a measure of children’s and adolescents’ pain intensity. Res Nurs Health. 1991;14(5):361-371. doi: 10.1002/nur.4770140507
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onde a criança deve registrar, com um traço, de cima para baixo, a intensidade de sua dor. Por fim, a qualidade da dor é avaliada pela criança, em uma lista com 67 descritores de dor que congregam as dimensões sensorial, afetiva, avaliativa e temporal.1313. Savedra MC, Holzemer WL, Tesler MD, Wilkie DJ. Assessment of postoperation pain in children and adolescents using the adolescent pediatric pain tool. Nurs Res. 1993;42(1):5-9. doi: 10.1097/00006199-199301000-00002
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,1616. Wilkie DJ, Holzemer WL, Tesler MD, Ward JA, Paul SM, Savedra MC. Measuring pain quality: validity and reliability of children’s and adolescents’ pain language. Pain. 1990;41(2):151-159. doi: 10.1016/0304-3959(90)90019-A
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MÉTODO

Estudo metodológico e transversal1717. LoBiondo-Wood G, Haber J. Pesquisa em enfermagem: métodos, avaliação crítica e utilização. 4th ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan; 2001. que faz parte de um projeto colaborativo, multicêntrico e com participação estrangeira, cujo objetivo é realizar a adaptação cultural e a validação do APPT para o português do Brasil e de Portugal, disponibilizando, após sua validação em cada cenário, um instrumento válido e confiável para mensurar a dor de crianças e adolescentes com câncer que tenham como língua materna o português. Participam do estudo pesquisadores do Brasil, de Portugal e dos Estados Unidos, sendo este último o centro coordenador da pesquisa. Pelas características do projeto ao qual esta pesquisa está vinculada, este estudo foi submetido à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEP).

Atendendo às diretrizes da Resolução do Conselho Nacional de Saúde 196/96,1818. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n° 196 de 10 de outubro de 1996. Estabelece as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília, DF, 10 de outubro de 1996. vigentes no período de realização do estudo, todos os membros do Comitê de Especialistas e todas as mães e/ou responsáveis legais pela criança ou adolescente assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, antes do início da coleta dos dados, durante as etapas do Comitê de Especialistas I e II e de validação semântica do instrumento, respectivamente, além da solicitação do assentimento das crianças e dos adolescentes, em respeito e consideração à sua participação.

A opção pelo método adaptado consistiu na realização da retrotradução, após avaliação pelo Comitê de Especialistas, como observado no método do The Disabkids Group.1919. The Disabkids Group. Translation & validation procedure: guidelines and documentation form. Lengerich: Pabst Science Publishers; 2004. Available from: https://www.disabkids.org/licensing-and-use/validation-guidelines/
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De acordo com a opção metodológica de um dos grupos de autores escolhido,1010. Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine. 2000;25(24):3186-3191. doi: 10.1097/00007632-200012150-00014
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a etapa de retrotradução acontece imediatamente após a síntese das traduções iniciais. Também optou-se pela inclusão da etapa de validação semântica, presente na metodologia do The Disabkids Group.1919. The Disabkids Group. Translation & validation procedure: guidelines and documentation form. Lengerich: Pabst Science Publishers; 2004. Available from: https://www.disabkids.org/licensing-and-use/validation-guidelines/
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Para o desenvolvimento desta pesquisa, decidiu-se pela utilização de um método adaptado, proposto pela equipe de pesquisadores responsáveis por esta pesquisa, que combina as diretrizes de dois grupos de referência.1010. Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine. 2000;25(24):3186-3191. doi: 10.1097/00007632-200012150-00014
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,1919. The Disabkids Group. Translation & validation procedure: guidelines and documentation form. Lengerich: Pabst Science Publishers; 2004. Available from: https://www.disabkids.org/licensing-and-use/validation-guidelines/
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A opção pelo método adaptado se deu com o objetivo de incluir no processo de adaptação a etapa de avaliação do Comitê de Especialistas.1010. Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine. 2000;25(24):3186-3191. doi: 10.1097/00007632-200012150-00014
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Dessa forma, após a tradução literal da palavra ou expressão, foram consideradas pelos especialistas participantes dessa etapa as equivalências semântica, conceitual, idiomática e cultural,1010. Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine. 2000;25(24):3186-3191. doi: 10.1097/00007632-200012150-00014
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ampliando o rigor do processo de adaptação cultural.

As etapas realizadas para o desenvolvimento desta pesquisa estão apresentadas no Tabela 1 abaixo e detalhadas nos resultados deste trabalho.

Tabela 1
Etapas da adaptação cultural do Adolescent Pediatric Pain Tool para o português do Brasil.

A etapa de validação semântica foi realizada na central de quimioterapia, ambulatório e enfermarias de pediatria de um hospital universitário do município de Ribeirão Preto-SP, onde são realizados o tratamento e o seguimento de crianças e adolescentes com câncer. Recrutou-se uma amostra de 35 crianças e adolescentes com câncer, em diferentes etapas do tratamento da doença. Nessa etapa, foram estabelecidos os seguintes critérios de inclusão: crianças e adolescentes com idade entre oito e 18 anos incompletos com diagnóstico de câncer, acompanhados da mãe ou responsável e com capacidade de compreender as questões do instrumento. Os critérios de exclusão foram: crianças e adolescentes sem condições clínicas que permitissem sua participação, que estavam sentindo dor no momento da entrevista ou que foram submetidos a procedimentos dolorosos por ocasião da coleta de dados, avaliada a partir de dados do prontuário e informações da equipe de saúde.

Para a definição do tamanho da amostra de crianças e adolescentes com câncer que participaram dessa etapa, foram utilizadas as diretrizes contidas no método do The Disabkids Group.1919. The Disabkids Group. Translation & validation procedure: guidelines and documentation form. Lengerich: Pabst Science Publishers; 2004. Available from: https://www.disabkids.org/licensing-and-use/validation-guidelines/
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No primeiro momento, os 67 descritores da dor traduzidos do APPT foram divididos em quatro tabelas de validação semântica, ficando três delas com 17 descritores e a última com 16. A opção por dividir o instrumento em subsetores foi devido ao tamanho do mesmo, uma vez que a avaliação de todas as palavras e expressões por todas as crianças e adolescentes selecionados para o estudo poderia deixá-los cansados, comprometendo seus resultados.1919. The Disabkids Group. Translation & validation procedure: guidelines and documentation form. Lengerich: Pabst Science Publishers; 2004. Available from: https://www.disabkids.org/licensing-and-use/validation-guidelines/
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Para a primeira etapa de validação semântica, participou um total de 24 crianças e adolescentes, sendo metade da amostra entre oito e 12 anos e a outra metade de 13 a 18 anos incompletos, com divisão equitativa entre os sexos.

Na segunda etapa de validação semântica, participaram três crianças de oito a 12 anos e três adolescentes de 13 a 18 anos incompletos, de ambos os sexos, dentro de cada grupo etário e, na terceira etapa, participaram duas crianças de oito a 12 anos e três adolescentes de 13 a 18 anos incompletos, de ambos os sexos. Ao final das três etapas, foi recrutado um total de 35 crianças e adolescentes com câncer.

RESULTADOS

Tradução inicial e consenso das traduções

O processo de tradução inicial do instrumento até obtenção do consenso final levou, aproximadamente, quatro meses. O primeiro processo da adaptação cultural do APPT foi a tradução inicial do inglês para o português. Nesse sentido, foram realizadas, de forma independente, duas traduções do instrumento, por três membros do grupo de pesquisadores. Nessa etapa, todos os pesquisadores envolvidos com a tradução do instrumento tinham como língua materna o português, além do profundo conhecimento da língua inglesa.

Uma vez realizadas as traduções, todas as instruções e descritores da dor do APPT foram organizados de forma que, diante das duas versões do instrumento traduzido, pudessem ser discutidas as semelhanças e divergências de cada termo ou expressão, entre todo o grupo de pesquisadores envolvidos neste estudo, a fim de chegar a um consenso das traduções (Consenso Português I).

Para a obtenção do primeiro consenso das traduções, foram realizadas diversas reuniões, presenciais (entre os pesquisadores brasileiros) e virtuais (entre todos os pesquisadores envolvidos no estudo). Durante as reuniões virtuais, foi de grande relevância a presença da equipe de pesquisadores dos Estados Unidos, pois o auxílio de pessoas nativas, como o da coordenadora-geral do estudo, cuja língua materna era a mesma do instrumento original, tornou possível a compreensão das particularidades de termos semelhantes como, por exemplo, beating e throbbling, traduzidos, respectivamente, como pulsante e latejante.

Comitê de Especialistas

Com o objetivo de verificar as equivalências semântica (equivalência entre os significados das palavras), idiomática (equivalência de expressões idiomáticas e coloquialismos), cultural (experiências próprias de cada cultura) e conceitual (conceitos e significados das palavras nos diferentes contextos culturais),99. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417-1432. doi: 10.1016/0895-4356(93)90142-N
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a versão traduzida do APPT foi enviada para profissionais da área da saúde, com amplo conhecimento da temática e da língua inglesa, para que os mesmos realizassem a comparação do instrumento original e do traduzido. Esta parte da pesquisa foi realizada em duas etapas, denominadas como Comitê de Especialistas I e Comitê de Especialistas II.

Comitê de Especialistas I

Após o primeiro consenso das versões em português do instrumento, o mesmo foi enviado a três profissionais da área da saúde, sendo duas enfermeiras e uma psicóloga, com conhecimento na temática e domínio da língua inglesa. Com o instrumento original e o traduzido, todos os membros do Comitê de Especialistas, que concordaram prontamente em participar do estudo, receberam instruções acerca das equivalências: semântica, idiomática, cultural e conceitual,99. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417-1432. doi: 10.1016/0895-4356(93)90142-N
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para que pudessem avaliar de forma adequada o instrumento traduzido.

Após as sugestões fornecidas pelos membros do Comitê de Especialistas, na primeira fase, todos os pesquisadores responsáveis pelo desenvolvimento deste estudo se reuniram para discutir as divergências acerca dos resultados. Todas as propostas fornecidas pelos especialistas foram organizadas de forma que, diante dessas sugestões, elas pudessem ser comparadas, para posterior elaboração de uma nova versão do instrumento traduzido (Síntese das sugestões do Comitê de Especialistas).

Comitê de Especialistas II

A versão final, resultante da fase I do Comitê de Especialistas, foi novamente submetida à avaliação pelos mesmos especialistas. Essa etapa teve o objetivo de checar se as sugestões da versão consensual da primeira fase foram aceitas. Como resultado dessa atividade, uma das especialistas referiu não ter novas sugestões; as outras duas contribuíram com novas sugestões.

A partir das contribuições fornecidas pelos membros do Comitê de Especialistas e de posse da planilha que sintetizava todas as sugestões, realizou-se uma discussão entre a equipe de pesquisadores para compreensão mais acurada dos descritores que, conforme o Comitê de Especialistas, estavam empregados com significados diferentes do instrumento original. Após discussão entre toda a equipe de pesquisadores, que analisou todas as palavras com sugestões de modificação pelo Comitê de Especialistas, propondo mudanças quando necessárias, obtivemos uma nova versão do instrumento traduzido (Consenso final).

Retrotradução (Back-translation)

Com o objetivo de checar se o instrumento foi adequadamente traduzido, mantendo-se o significado das palavras do instrumento original, a sua versão traduzida foi retrotraduzida para o inglês. Nessa etapa, dois tradutores independentes, fluentes e conhecedores da língua de origem do instrumento, porém sem conhecimento prévio do mesmo, versaram o instrumento para a língua inglesa. De posse das duas versões retrotraduzidas, a equipe de pesquisadores se reuniu virtualmente, e todas as palavras foram comparadas, uma a uma, e sintetizadas em uma única versão. Após, o instrumento retrotraduzido foi enviado para a autora do instrumento original, para que a mesma avaliasse a necessidade de novas traduções ou a manutenção das mesmas.

Comparação da versão retrotraduzida com o instrumento original

A maioria das traduções foi semelhante às do instrumento original, porém alguns termos e expressões divergentes foram discutidos entre toda a equipe envolvida na tradução desse instrumento (ex.: aching, like an ache e like a hurt). Nessa etapa, o parecer da autora do instrumento foi levado em consideração para a elaboração da versão final do APPT em português. De posse da versão final do instrumento, aqueles termos que necessitaram ser modificados foram encaminhados novamente para os dois tradutores que realizaram a retrotradução e que confirmaram estarem corretas as novas traduções.

Validação semântica

O processo de validação semântica foi realizado em três momentos distintos, utilizando-se instrumento elaborado para esse fim, com um total de 35 crianças e adolescentes com câncer, sendo que, destes, 17 crianças tinham de oito a 12 anos e 18 adolescentes, de 13 a 18 anos incompletos. De modo geral, observou-se uma variedade nos tipos de neoplasias apresentadas pelas crianças e adolescentes que participaram deste estudo, contudo, os mais frequentes foram as leucemias (25,7%), os tumores do sistema nervoso central (22,9%), os tumores ósseos (22,9%) e os linfomas (20,0%).

As questões formuladas visavam identificar se as crianças e adolescentes conheciam as expressões ou as palavras do APPT, se tinham dificuldades em entendê-las e se as utilizavam para descrever a própria dor. Em situações que eles referiam conhecê-las, porém sem utilizá-las para descrever a sua dor, eles poderiam sugerir uma nova palavra utilizada por eles, com o mesmo significado da primeira.

Como critério de inclusão das palavras e expressões no instrumento final, todas elas deveriam ser conhecidas por mais de 50% da amostra de crianças e adolescentes participantes do estudo. Se a palavra fosse conhecida por mais de 50% da amostra de apenas um grupo (de crianças ou de adolescentes), ela era considerada como desconhecida por todo o grupo, sendo necessária uma nova etapa de validação semântica para ambos os grupos. Tal critério foi adaptado do processo de construção do APPT, quando os autores consideravam que, para ser incluída no instrumento, a palavra deveria ser conhecida por mais de 50% da amostra de crianças e adolescentes.1616. Wilkie DJ, Holzemer WL, Tesler MD, Ward JA, Paul SM, Savedra MC. Measuring pain quality: validity and reliability of children’s and adolescents’ pain language. Pain. 1990;41(2):151-159. doi: 10.1016/0304-3959(90)90019-A
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As palavras desconhecidas por mais de 50% da amostra de crianças e de adolescentes necessitaram de uma nova etapa de validação semântica. Em algumas dessas situações, os participantes propuseram novas palavras, as quais, após apreciação pelo grupo de pesquisadores, foram submetidas à avaliação por outra amostra de crianças e de adolescentes. Até a obtenção do consenso final, quando todas as palavras foram conhecidas por mais de 50% da amostra de crianças e adolescentes, foi necessária a realização de três etapas de validação semântica. Na primeira etapa, participaram 27 crianças e adolescentes, na segunda, seis crianças e adolescentes e na terceira, cinco crianças e adolescentes.

Ao final da primeira etapa de validação semântica, do total de 67 descritores que compõe a avaliação da qualidade da dor no APPT, 52 (77,6%) foram identificados como conhecidos pela maioria das crianças e adolescentes participantes do estudo. Os outros 15 restantes (22,4%) foram identificados como desconhecidos pelas crianças e adolescentes.

Os 15 descritores identificados como desconhecidos por crianças e adolescentes foram revistos. Aqueles para os quais os participantes da primeira etapa de validação semântica propuseram novos significados foram substituídos por eles, após consenso da equipe de pesquisadores. Os demais foram mantidos, com a finalidade de checar a aceitação por uma nova amostra de crianças e adolescentes.

Ao final da segunda etapa de validação semântica, sete palavras permaneceram desconhecidas. Nesse sentido, foram propostas novas sugestões pela equipe de pesquisadores, para todas essas palavras e testadas com uma nova amostra de crianças e adolescentes, na terceira etapa de validação. Nessa etapa, todas as palavras foram conhecidas por todos os entrevistados, sendo finalizada, então, a etapa de validação semântica do APPT.

DISCUSSÃO

Atualmente, a literatura é vasta em relação aos aspectos de avaliação e mensuração da dor infantojuvenil, mas a complexidade do tema requer a necessidade de considerar determinados fatores como, por exemplo, a idade, o sexo e o tipo de patologia. Apesar de existirem muitos instrumentos para avaliar a dor na criança, algumas pesquisas apresentam limitações em relação à amostragem, outras na avaliação das propriedades psicométricas dos instrumentos.2020. Silva JA, Ribeiro-Filho NP. Avaliação e mensuração de dor: pesquisa, teoria e prática. Ribeirão Preto, SP: FUNPEC; 2006. Além disso, a maioria dos estudos foi realizada nos Estados Unidos e Canadá, trazendo, então, a necessidade de avaliação da fidedignidade e validade dos instrumentos, quando utilizados em outras populações de diferentes culturas.2121. Rajmil L, Serra-Sutton V, Estrada MD, Fernandez de Sanmamed MJ, Guillamón L, Riley A, et al. Adaptación de la versión española del perfil de salud infantil (Chile Health and Illness Profile-Child Edition, CHIP-CE). An Pediatr (Barc) [Internet]. 2004 [cited 2016 Feb 05];60(6):522-529. doi: 10.1016/S1695-4033(04)78321-6
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Todos esses aspectos devem ser levados em conta, ao se escolher um determinado instrumento para mensurar a dor. Devemos considerar, também, o contexto em que a dor se apresenta, por exemplo, na oncologia pediátrica, já que é uma experiência multidimensional, e o seu manejo envolve, inclusive, aspectos culturais da experiência de ter câncer, numa fase tão precoce do ciclo vital.

No sentido de avaliar a dor da criança e do adolescente, estudos têm sido desenvolvidos. De acordo com a revisão sistemática da literatura,2222 Von Baeyer CL. Children’s self report of pain intensity: what we know, where we are headed. Pain Res Manag. 2009;14(1):39-45. doi: 10.1155/2009/259759
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para a mensuração e interpretação da dor da criança, devem ser levadas em consideração questões relacionadas à temporalidade e à individualidade dos sujeitos, à comunicação social e às habilidades cognitivas da criança, à habilidade de utilização de escalas de autorrelato de dor e também aquelas que não possuem capacidade para tal como, por exemplo, crianças menores de seis anos de idade.

Ressalta-se que a opção pelo APPT levou em consideração a descrição cuidadosa dos autores em relação aos aspectos que envolvem o processo de sua construção,1212. Savedra MC, Tesler MD, Holzemer WL, Wilkie DJ, Ward JA. Pain location: validity and reliability of body outline markings by hospitalized children and adolescents. Res Nurs Health. 1989;12(5):307-314. doi: 10.1002/nur.4770120506
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-1616. Wilkie DJ, Holzemer WL, Tesler MD, Ward JA, Paul SM, Savedra MC. Measuring pain quality: validity and reliability of children’s and adolescents’ pain language. Pain. 1990;41(2):151-159. doi: 10.1016/0304-3959(90)90019-A
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particularmente a composição da amostra das crianças e dos adolescentes participantes, além do detalhamento de cada uma das etapas realizadas no processo de validação, o que tornou público o rigor dos estudos que culminaram com a disponibilização do instrumento. Além disso, o APPT é uma escala multidimensional de avaliação da dor, que congrega as dimensões sensorial, afetiva, avaliativa e temporal e da avaliação cuidadosa da localização e intensidade da dor.

Diversos estudos têm sido conduzidos utilizando o APPT para avaliar a dor de crianças e adolescentes nas diversas condições de dor, crônicas e agudas, tendo auxiliado equipes de saúde e pesquisadores de língua inglesa na avaliação da dor de seus pacientes.2323. Fernandes AM, De Campos C, Batalha L, Perdigão A, Jacob E. Pain assessment using the Adolescent Pediatric Pain Tool: a systematic review. Pain Res Manag [Internet]. 2014 [cited 2016 Feb 05];19(4):212-218. doi: 10.1155/2014/979416
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A necessidade de adaptação cultural do APPT para a língua portuguesa se deu, principalmente, pela ausência de instrumentos válidos e confiáveis para a avaliação da dor em crianças e adolescentes com câncer, no cenário brasileiro. Nesse contexto, a tradução e a adaptação cultural do APPT são de grande importância, para que profissionais de saúde tenham disponível um instrumento de grande especificidade para a avaliação da dor dessa população.

Espera-se com este estudo, além de contribuir para a disponibilização de um instrumento válido para avaliação da dor em crianças e adolescentes com câncer, propor diretrizes para novos estudos de adaptação cultural de instrumentos. Nesse sentido, especificar as etapas percorridas e o rigor dos pesquisadores para o cumprimento de cada uma delas tornou-se uma das prioridades. O processo de adaptação do APPT, até a etapa de retrotradução, levou aproximadamente 18 meses, pois em cada uma das etapas foram necessárias exaustivas discussões, entre toda a equipe de pesquisadores, a fim de garantir o rigor do estudo, mantendo as características do instrumento inicial, mas considerando as particularidades do contexto para o qual estava sendo adaptado.

Para que um instrumento seja válido e confiável para ser utilizado em uma cultura diferente daquela para o qual foi construído, todo o processo percorrido merece igual atenção, desde a tradução inicial até o estudo de campo. Dedicar tempo ao processo de tradução pode significar economia futura também de tempo e de recursos, pois uma tradução que reflita exatamente a realidade da população-alvo pode resultar em sucesso nas etapas futuras, como na validação semântica. Para a validação de um instrumento, é essencial seguir uma metodologia que reflita a transparência do processo e permita demonstrar a sua validade e a confiabilidade.

Ainda não há consenso sobre qual o melhor método a ser seguido para se realizar uma adaptação cultural de um instrumento,99. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417-1432. doi: 10.1016/0895-4356(93)90142-N
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particularmente em função do número limitado de pesquisas dessa natureza na oncologia pediátrica. Nesse sentido, tornam-se válidas a definição e a descrição detalhadas das etapas a serem realizadas, de modo a contribuir com as pesquisas metodológicas, especificamente, com as de validação de instrumentos. Neste estudo, optou-se pela reunião das diretrizes propostas por dois grupos de referência,1010. Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine. 2000;25(24):3186-3191. doi: 10.1097/00007632-200012150-00014
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,1919. The Disabkids Group. Translation & validation procedure: guidelines and documentation form. Lengerich: Pabst Science Publishers; 2004. Available from: https://www.disabkids.org/licensing-and-use/validation-guidelines/
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além da inclusão de passos e alterações na ordem dos mesmos, de forma que a retrotradução fosse o último passo a ser seguido, conforme utilizado por outros autores,2121. Rajmil L, Serra-Sutton V, Estrada MD, Fernandez de Sanmamed MJ, Guillamón L, Riley A, et al. Adaptación de la versión española del perfil de salud infantil (Chile Health and Illness Profile-Child Edition, CHIP-CE). An Pediatr (Barc) [Internet]. 2004 [cited 2016 Feb 05];60(6):522-529. doi: 10.1016/S1695-4033(04)78321-6
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no processo de adaptação do instrumento de avaliação da autopercepção da saúde por crianças de seis a 11 anos de idade, o Child Health and Illness Profile-Child Edition, do inglês para o espanhol. Ao optar por esse percurso, buscou-se atingir a etapa de retrotradução com uma versão do instrumento que pudesse realmente refletir as particularidades do contexto-alvo, ao mesmo tempo em que preservou as características do instrumento original. Essa decisão teve também o potencial de otimizar os recursos humanos e financeiros disponíveis para a validação do instrumento.

Apesar de ter sido finalizado o processo de adaptação cultural do APPT, culminando com a versão APPT-P-Brasil, o mesmo só poderá ser utilizado para avaliação da dor em crianças e adolescentes com câncer, após término do processo de validação, em uma etapa subsequente. Para o processo de validação do APPT-P-Brasil, deverão ser avaliadas suas propriedades psicométricas e, dessa forma, torná-lo aplicável para avaliar a dor em crianças e adolescentes com câncer.

Ressalta-se, ainda, que, apesar da avaliação da dor através de instrumentos validados para este fim, é importante que o profissional de saúde tenha a sensibilidade e desenvolva habilidades para articular e compartilhar seus próprios conhecimentos com os de seus pacientes e cuidadores, possibilitando o diálogo com tal clientela, na busca por alcançar medidas de conforto que apresentem os melhores resultados no alívio da dor.2424. Rocha AFP, Sposito AMP, Bortoli PS, Silva-Rodrigues FM, Lima RAG, Nascimento LC. Oncologic pain relief: strategies told by adolescents with cancer. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2015 Jan-Mar [cited 2016 Feb 05];24(1):96-104. doi: 10.1590/0104-07072015002120013
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Nesse processo, entende-se que a realização da validação semântica com crianças e adolescentes recrutadas a partir de uma única instituição de saúde pode representar uma limitação, pois as diferenças regionais brasileiras podem não estar representadas na amostra do estudo.

CONCLUSÃO

A adaptação cultural e validação de instrumentos são importantes estratégias para disponibilizar ferramentas válidas e confiáveis para utilização, em diferentes contextos. Particularmente, a construção de novos instrumentos de mensuração e avaliação de dor demandaria custos e tempo, os quais podem não ser viáveis. Nesse caso, as etapas do processo de adaptação cultural do APPT, que englobaram a tradução, retrotradução, avaliação pelo Comitê de Especialistas e validação semântica, foram alcançadas, e sua descrição detalhada evidenciou o rigor na condução do estudo.

Com o objetivo de oferecer às crianças e aos adolescentes com câncer um cuidado atraumático, a avaliação global da dor torna-se necessária. Nesse sentido, a disponibilização do APPT-Brasil, após o término do processo de validação, irá fornecer para os profissionais de saúde informações úteis, sobre a dor que a criança e o adolescente estão sentindo, de forma a auxiliá-los a propor intervenções que sejam efetivas para o alívio da dor dessas crianças e adolescentes, minimizando seu sofrimento, assim como o de seus familiares.

De posse do APPT traduzido, o mesmo deverá passar pelo processo de validação, em uma etapa subsequente, sendo avaliadas suas propriedades psicométricas e, dessa forma, adequá-lo para sua utilização em pesquisas e na prática clínica. Assim, o APPT ainda não pode ser aplicado na população-alvo, e estudos futuros, com objetivo de realizar a sua validação, serão necessários.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    29 Abr 2016
  • Aceito
    25 Out 2016
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