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INTERVENÇÕES GRUPAIS EM CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E DROGAS: DESAFIOS DA PRÁTICA ASSISTENCIAL

RESUMO

Objetivo:

compreender os desafios da prática assistencial com intervenções grupais em Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas.

Método:

pesquisa-intervenção de abordagem qualitativa desenvolvida com 30 profissionais de quatro Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas de um município da região central do Brasil de março e abril de 2019. Utilizou-se instrumento de caracterização profissiográfica e rodas de conversa para coleta de dados que foram submetidos à análise de conteúdo, modalidade temática.

Resultados:

evidenciou-se alguns desafios que permeiam a prática com intervenções grupais em CAPSad, sob a ótica dos profissionais, como estrutura física inadequada e escassez de recursos materiais; questões ligadas a aspectos dos usuários como a dificuldade de adesão e comprometimento com os grupos, agenda de trabalho incompatível e falta de recursos financeiros para deslocamento ao serviço; fatores da competência dos profissionais como não ter afinidade de trabalhar com grupos, ausência de formação específica, priorização de outras práticas, desmotivação, ausência de registros dos atendimentos e dificuldade de realizar a alta dos usuários e; aspectos dos processos de trabalho como cultura organizacional ambulatorial, demanda muito grande, recursos humanos insuficientes, falta de supervisão externa, poucas ofertas de grupos terapêuticos e ausência de critérios para a definição de coordenadores de grupos.

Conclusão:

os desafios vivenciados englobam questões de estrutura física inadequada e recursos materiais deficitários, dificuldades ligadas aos contextos de vida dos usuários, competência dos profissionais e fatores dos processos de trabalho dos serviços.

DESCRITORES:
Assistência à saúde mental; Centros de tratamento de abuso de substâncias; Serviços comunitários de saúde mental; Saúde mental; Processos grupais

ABSTRACT

Objective:

to understand the challenges of care practice with group interventions Psychosocial Care Centers for Alcohol and Drugs.

Method:

qualitative intervention research developed with 30 professionals from four Alcohol and Psychosocial Drug Care Centers in a municipality in central Brazil from March to April 2019. We used a professional characterization instrument and conversation wheels to collect data that were submitted to the thematic modality of content analysis.

Results:

some challenges that permeate the practice with group interventions in CAPSad were evidenced, from the professionals' perspective, such as inadequate physical structure and scarcity of material resources; issues related to aspects of users such as difficulty in adhesion and commitment to groups, incompatible work schedules and lack of financial resources for travel to the centers; factors related to the competence of professionals as not having affinity to work with groups, absence of specific training, prioritization of other practices, demotivation, absence of care records and difficulty in performing the patient discharge and; aspects of work processes such as outpatient organizational culture, very high demand, insufficient human resources, lack of external supervision, few offers of therapeutic groups and lack of criteria for the definition of group coordinators.

Conclusion:

the challenges experienced include issues of inadequate physical structure and deficient material resources, difficulties related to the life contexts of users, competence of professionals and factors of the work processes of the services.

DESCRIPTORS:
Mental health care; Substance abuse treatment centres; Community mental health services; Mental health; Group processes

RESUMEN

Objetivo

comprender los desafíos de la práctica asistencial con intervenciones grupales en Centros de Atención Psicosocial de Alcohol y Drogas.

Método

investigación de intervención desarrollada con 30 profesionales de cuatro Centros de Atención Psicosocial de Alcohol y Drogas de un municipio del centro de Brasil de marzo a abril de 2019. Utilizamos un instrumento de caracterización profesional y ruedas de conversación para recolectar datos que fueron sometidos a la modalidad temática de análisis de contenido.

Resultados:

se evidenciaron algunos desafíos que permean la práctica con intervenciones grupales en CAPSad, desde la perspectiva de los profesionales, como estructura física inadecuada y escasez de recursos materiales; cuestiones relacionadas con aspectos de los usuarios como dificultad para incorporar y compromiso de grupos, jornada laboral incompatible y falta de recursos económicos para desplazamiento al servicio; factores d la competencia de los profesionales como no tener afinidad para trabajar con grupos, ausencia de formación específica, priorización de otras prácticas, desmotivación, ausencia de registros de atención y dificultad en la realización del alta de los usuarios y; aspectos de los procesos de trabajo como cultura organizacional ambulatoria, demanda muy grande, recursos humanos insuficientes, falta de supervisión externa, pocas ofertas de grupos terapéuticos y falta de criterio para la definición de coordinadores de grupo.

Conclusión:

lo vivido incluye cuestiones de estructura física inadecuada y recursos materiales deficientes, desafíos relacionados con los contextos de vida de los usuarios, competencia de los profesionales y factores de los procesos de trabajo de los servicios.

DESCRIPTORES:
Atención a la salud mental; Centros de tratamiento de abuso de sustâncias; Servicios comunitarios de salud mental; Salud mental; Procesos de grupo

INTRODUÇÃO

O abuso e a dependência de álcool e outras drogas é um problema de saúde pública e impacta várias dimensões da vida humana e social. O adoecimento é crônico e, nem sempre diagnosticado precocemente. Fator que pode ser explicado pelas singularidades de cada indivíduo associado às características de cada substância11. Lopes LLT, Silva MRS, Santos AM, Oliveira JF. Multidisciplinary team actions of a Brazilian Psychosocial Care Center for Alcohol and Drugs. Rev Bras Enferm [Internet]. 2019 [cited 2022 Oct 14];72(6):1624-31. Available from: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0760
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No Brasil, os Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPSad), são os serviços de referência para a assistência a usuários de álcool e outras drogas, voltados para todas as faixas etárias de acordo com a sua configuração, forma de organização, funcionamento e tamanho populacional. Esses serviços de caráter comunitário são compostos por equipes de profissionais de diversas formações para um cuidado interdisciplinar e dentre as ofertas terapêuticas destacam-se os atendimentos grupais de diferentes estratégias como psicoterapia, grupo operativo e oficinas terapêuticas22. Ministério da Saúde (BR). Portaria de Consolidação n° 3, de 28 de setembro de 2017. Dispõe sobre a consolidação das normas sobre as redes do Sistema Único de Saúde [Internet]. Brasília. 2017 [cited 2022 Oct 14]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prc0003_03_10_2017.html
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Na segunda década do século XXI, os desafios das intervenções em CAPSad são mudanças nas políticas assistenciais na atualidade, com a valorização da internação. Movimento de conservadorismo da sociedade, visando um ordenamento social, o que contraria o tratamento no território de pessoas com problemas com álcool e outras drogas33. Bastos TF, Roza CN, Serrão TSM. Desafios atuais do trabalho em CAPS Ad: conservadorismo e retração da RAPS. Serv Soc Debate [Internet]. 2020 [cited 2022 Oct 14];3(2):109-20. Available from: https://revista.uemg.br/index.php/serv-soc-debate/article/view/4872/3561
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, com prejuízos imensuráveis à ressocialização psicossocial.

Para tanto, a Política Nacional de Saúde Mental (PNSM) recomenda que sejam implementadas práticas grupais nos serviços dado seu valor na socialização dos membros dos grupos44. Brasil. Lei n° 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental [Internet]. Brasília. 2001 [cited 2022 Jun 14]. Available from: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm
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. Desta forma é que no contexto da Atenção Psicossocial, a modalidade de atendimento grupal configura-se como uma das potentes ferramentas de cuidado que possibilita emergir inúmeros fatores terapêuticos aos integrantes dos grupos, contribuindo significativamente para seu desenvolvimento psicossocial55. Andrade JMM, Farinha MG, Sousa JM, Vale RRM, Esperidião E. Presence of therapeutic factors in group care in the waiting room. Rev Eletr Enferm [Internet]. 2022 [cited 2022 Jun 14];24:68907. Available from: https://doi.org/10.5216/ree.v24.68907
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As intervenções grupais em CAPSad apresentam inúmeras potencialidades aos usuários, como o compartilhamento de experiências que contribui para o fortalecimento de quem está mais fragilizado, favorece a construção de vínculos, auxilia na mudança de comportamentos não saudáveis e facilita a adesão dos mesmos aos serviços pelo grupo ser uma atividade terapêutica atrativa para eles66. Sousa JM, Farinha MG, Silva NS, Caixeta CC, Lucchese R, Esperidião E. Potential of group interventions in Psychosocial Care Centers for Alcohol and Drugs. Esc Anna Nery [Internet]. 2022 [cited 2022 Jun 14];26:e20210294. Available from: https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2021-0294
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Ademais, estudos55. Andrade JMM, Farinha MG, Sousa JM, Vale RRM, Esperidião E. Presence of therapeutic factors in group care in the waiting room. Rev Eletr Enferm [Internet]. 2022 [cited 2022 Jun 14];24:68907. Available from: https://doi.org/10.5216/ree.v24.68907
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,77. Sousa JM, Vale RRM, Pinho ES, Almeida DR, Nunes FC, Farinha MG et al. Effectiveness of therapeutic groups in psychosocial care: analysis in the light of yalom’s therapeutic factors. Rev Bras Enferm [Internet]. 2020 [cited 2022 Jun 14];73(Suppl 1):1-9. Available from: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0410
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demonstram que os atendimentos grupais no contexto dos CAPSad proporcionam diversos fatores terapêuticos aos seus integrantes, como instilação de esperança, universalidade, compartilhamento de informações, aprendizagem interpessoal, coesão grupal, fatores existenciais, altruísmo, desenvolvimento de técnicas de socialização, comportamento imitativo, reedição corretiva do grupo familiar primário e catarse. Que contribuem para o progresso do tratamento e prevenção de agravos, sobretudo na ressocialização da pessoa.

Apesar de todos os benefícios que as intervenções grupais oportunizam aos usuários de álcool e outras drogas e seus familiares, os desafios no cotidiano dos serviços se apresentam frequentes, como demonstrou uma investigação realizada em um CAPSad da região norte do Brasil. Com a finalidade de analisar as críticas, elogios e sugestões dos usuários, familiares e trabalhadores por meio da implantação de um serviço de Ouvidoria no serviço, o que na visão dos usuários, revelou as oficinas terapêuticas como insuficientes no que diz respeito à maior diversidade dessas práticas88. Bittencourt MN, Oliveira DCP, Souza RPO, Pena JLC, Pantoja PVN, Pereira MO. Ombudsman’s experience in Psychosocial Care Centers for alcohol/drugs. Rev Bras Enferm. [Internet]. 2018 [cited 2022 Oct 14];71(Suppl 5):2421-8. Available from: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0924
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Nessa direção, outra pesquisa realizada com usuários de um CAPSad apontou que eles associam os atendimentos individuais a práticas mais seguras pelo fato da confidencialidade e privacidade do que é exposto. O desafio para os profissionais foi tornarem as atividades grupais e coletivas mais acolhedoras e seguras nesse sentido99. Stahelin DM, Reis JJL, Silva JP, Vitali MM. Atitudes de usuários de um CAPSad frente às práticas de cuidado. Psi UNISC [Internet]. 2022 [cited 2022 Oct 14];6(1):69-81. Available from: https://doi.org/10.17058/psiunisc.v6i1.16451
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Dado ao exposto, todo este panorama reforça a importância de pesquisas que visem aprofundar e elucidar os dilemas enfrentados pelas equipes multiprofissionais dos CAPSad em relação a sua atuação com grupos terapêuticos no cuidado em saúde mental para subsidiar ações de resolução ou minimização de prejuízos no tratamento da dependência de drogas. Nesse sentido, a presente investigação traz como objetivo compreender os desafios da prática assistencial com intervenções grupais em Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas.

MÉTODO

Pesquisa-intervenção de abordagem qualitativa. Neste tipo de estudo, a interação entre pesquisador/objeto investigado é dinâmica no transcorrer do processo investigativo, o que caracteriza uma construção coletiva e participativa para o mapeamento e a compreensão dos fenômenos do cotidiano da vida sócio-política e suas implicações, sem se preocupar em realizar uma mudança instantânea das ações, pois essa transformação é resultante dos processos interativos entre a práxis, sujeito e objeto. Logo, a intervenção está ligada ao uso de analisadores que propiciam a captação dos sentidos1010. Aguiar KF, Rocha ML. Prácticas universitarias y formación socio-política. Rev Psicoanálisis y Cultura [Internet]. 2000 [cited 2022 Jun 14];(11). Available from: http://www.acheronta.org/acheronta11/socio-politica.htm
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-1111. Rocha ML, Aguiar KF. Pesquisa-intervenção e a produção de novas análises. Psicol Ciênc Prof [Internet]. 2003 [cited 2022 Jun 14];23(4):64-73. Available from: https://doi.org/10.1590/S1414-98932003000400010
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Participaram do estudo 30 profissionais selecionados por amostragem não probabilística, por conveniência, que atuavam em quatro CAPSad de um município da região central do Brasil. Foram incluídos os que possuíam idade igual ou superior a 18 anos, que estavam desenvolvendo intervenções grupais no período da coleta de dados ou que referiram possuir experiência com essa modalidade de cuidado por qualquer período. Foram excluídos os que estavam em afastamento oficial do serviço em decorrência de férias ou licença. Nos CAPS pesquisados haviam 89 profissionais vinculados, atendendo os critérios de inclusão e exclusão, 30 compuseram a amostra.

Inicialmente foi realizado um teste piloto em um CAPSi especializado no atendimento a crianças e adolescentes com transtornos mentais e vítimas de violência, para que fossem alinhadas a simulação das fases da coleta com a equipe de pesquisadores, além de considerar se as estratégias e técnicas de coleta de dados atenderam os objetivos inicialmente traçados.

Após os ajustes necessários, a equipe de pesquisadores agendou um encontro presencial em cada CAPSad com o intuito de sensibilizar os profissionais a participarem do estudo, explicando os objetivos e dinâmica de obtenção dos dados. Sendo assim, a coleta ocorreu nos meses de março e abril de 2019. Todos os encontros com os participantes foram acordados entre os pesquisadores e gestores de cada serviço, respeitando a disponibilidade da instituição de saúde, em dia de reunião de equipe, de forma a considerar a rotina dos processos de trabalho.

Os dados foram obtidos por meio de questionário para traçar o perfil profissiográfico dos participantes, contendo questões de caracterização sociodemográfica e de contextualização profissional como nível de escolaridade, formação técnica, graduação e especialização, se trabalha com intervenções grupais no CAPS no momento da coleta de dados ou se tinha experiências anteriores com essa modalidade de atendimento, além de aspectos da estrutura grupal que incluem informações desde o planejamento, condução, registro e avaliação dos grupos.

Também a roda de conversa com os participantes, considerada uma intervenção de pesquisa, foi utilizada para a obtenção de dados e construção de um espaço dialógico e reflexivo1212. Ribeiro LDM, Krüger-Fernandes L, Borges FT. Roda de conversa mediada por leitura dialógica com crianças: Uma proposta metodológica de pesquisa qualitativa sobre processos argumentativos. New Trends Qualiti Res [Internet]. 2020 [cited 2022 Oct 14];2:83-95. Available from: https://doi.org/10.36367/ntqr.2.2020.83-95
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dos participantes sobre a sua prática profissional. Realizou-se quatro rodas de conversa, uma em cada CAPSad, com duração aproximada de duas horas, registradas por gravação de áudio e anotações em diário de campo, as quais foram conduzidas pelo pesquisador principal, pós-graduando em dinâmica de grupo e gestão de equipes, uma professora mestre com formação em dinâmica de grupo e um acadêmico de enfermagem auxiliar de pesquisa com a função de observador participante.

A roda de conversa iniciava com o acolhimento dos participantes, que recebiam material para produzirem o próprio crachá, com o nome que gostariam que fossem chamados. A autoapresentação foi por meio de uma característica pessoal com a primeira letra do seu nome. Na sequência, os participantes foram orientados a preencherem o instrumento para a caracterização profissiográfica.

A partir daí, iniciou-se a discussão sobre a prática com grupos dos profissionais, norteada pelas questões do roteiro semiestruturado contendo 11 questões, destacando-se a seguinte: vocês identificam, nos seus atendimentos grupais, fatores que facilitam e fatores que dificultam a condução dos grupos? E para finalizar o encontro, foi utilizada a técnica do solilóquio1313. Gonçalves CS, Wolff JR, Almeida WC. Lições de psicodrama: introdução ao pensamento de J. L. Moreno. 11th ed. São Paulo: Ágora; 1988. em que cada integrante do grupo relatava uma palavra que resumia a forma como eles estavam após vivenciarem todo esse processo.

A técnica da análise de conteúdo foi a escolhida para a análise do corpus de pesquisa, na modalidade temática, seguindo o referencial de Bardin1414. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2018. que propõe três etapas: 1. pré-análise; 2. Exploração do material e; 3. Tratamento dos resultados obtidos: inferência e interpretação. Inicialmente foi feita a seleção do material que seria analisado, as transcrições das rodas de conversa, seguido da leitura flutuante para a formulação das hipóteses iniciais. Concomitantemente foi operacionalizada a codificação dos dados por meio da identificação das unidades de registro e contexto que foram agrupadas posteriormente por semelhança, o que possibilitou a criação dos núcleos de sentido. Por fim, emergiu a categoria temática Desafios da prática assistencial com intervenções grupais que descreve essas barreiras em quatro eixos temáticos: estrutura física e recursos materiais; contextos de vida dos usuários; competências dos profissionais e processos de trabalho dos serviços. O software ATLAS.ti. foi utilizado como auxílio na organização dos dados.

Em conformidade com as recomendações da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, a pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e para garantir o sigilo e anonimato, todos foram codificados com a letra P, seguidos do número de ordem de fala nas rodas de conversa (P1 a P29) e do CAPS ao qual estavam vinculados (CAPS 1 a CAPS 4).

RESULTADOS

Participaram do estudo cinco profissionais no CAPSad 1, nove no CAPSad 2, oito no CAPSad 3 e oito no CAPSad 4, a maioria composta por pessoas do sexo feminino (27), a faixa etária variou entre 28 e 64 anos e as categorias profissionais foram as seguintes: enfermagem (2); psicologia (10); serviço social (5); musicoterapia (3); terapia ocupacional (2); educação física (1); artes (3); técnico de enfermagem (3); e gestão pública (1). Em relação a formação em saúde mental, apenas seis possuíam especialização na área.

Em relação à prática com intervenções grupais, 25 dos participantes estavam trabalhando com grupos no momento da coleta de dados, sendo que destes 21 possuíam experiência superior a seis meses. Os demais cinco participantes possuíam experiências anteriores com essa modalidade de atendimento.

Do processo de análise de conteúdo emergiram quatro categorias para expressar os diferentes desafios das práticas com intervenções grupais nos CAPSad que abarcavam questões de estrutura física e recursos materiais, contextos de vida dos usuários, competências dos profissionais e processos de trabalho dos serviços comunitários de saúde mental como ilustra a árvore de códigos (Figura 1).

Figura 1 -
Árvore de códigos das categorias do estudo. Goiânia, Goiás, Brasil, 2019.

Categoria 1 - Desafios da prática assistencial com intervenções grupais relacionados à estrutura física e recursos materiais

Nesta categoria, foram incluídas as barreiras enfrentadas pelos profissionais para a coordenação dos grupos relacionadas a escassez de recursos materiais dos CAPSad, o pouco envolvimento de esferas superiores para suprirem essa fragilidade de forma que eles precisam tirar dinheiro do próprio bolso ou passam a promover ações junto à comunidade para arrecadar verba para operacionalizar os atendimentos grupais:

Eu acho que umas das coisas que dificulta na condução do grupo é a escassez de material [...] (P4 - CAPS 1).

Falta papel chamex, tinta vencida, falta material (P11 - CAPS 2).

É bom que se diga que, financeiramente, por parte da Secretaria Municipal, nós não temos material para os grupos (P24 - CAPS 4).

A pipoca no dia do filme e o refrigerante é a gente que compra (P7 - CAPS 2).

O profissional que quer fazer ele tira do bolso, quando tem bazar faz, mas é assim, é aquilo que a gente sente vontade de fazer, faz (P11 - CAPS 2).

Inadequações na estrutura física dos serviços e a precariedade do espaço físico também foram apontados como um dos aspectos dificultadores para o trabalho com grupos:

Eu quero falar um pouco da característica da sala. Eu considero que é uma sala pequena, considero que ela é inadequada porque a acústica, o isolamento é ruim (P4 - CAPS 1).

Teve um dia que o ventilador estourou e quase caiu na cabeça de um usuário (P5 - CAPS 2).

Categoria 2 - Desafios da prática assistencial com intervenções grupais relacionados aos contextos de vida dos usuários

Esta categoria se refere a fenômenos que dizem respeito aos contextos de vida integrantes dos grupos que expressam entraves com as intervenções grupais ou permanência no serviço como a dificuldade de alguns usuários aderirem ao tratamento psicossocial. Além disso, a inconstância de frequência no grupo também foi apontada, o que acaba gerando sentimento de frustração no coordenador do grupo que planeja o encontro de acordo com a demanda dos usuários:

Aconteceu com uma grávida, usuária de álcool e crack, né? As meninas reviraram meio mundo pra ela ficar na instituição, pelo menos no período da gravidez, ela foi e ficou um dia e foi embora (P23 - CAPS 4).

Tem usuários que não vem no meu grupo há três meses, a gente pede que outra pessoa acolha, ou eu acolha ele em outro momento para repactuar o PTS (P3 - CAPS 1).

E, às vezes, a gente prepara também um conteúdo pensando naqueles indivíduos e eles não vem [risos], aí você prepara: ‘Cadê aqueles fulanos? Não vieram hoje?’ Então, é assim, eu tenho que lidar com isso (P11 - CAPS 2).

O pouco comprometimento de alguns usuários com o grupo também foi exteriorizado como barreira para o trabalho com grupos, prejudicando a construção de vínculo:

A pessoa não tem compromisso com o grupo, às vezes, ela não vem no grupo dela, então, ela não tem nenhum compromisso, nenhum vínculo com esse grupo, aí ela chega a qualquer hora: ‘Ah, eu quero ser atendida por alguém’ (P6 - CAPS 2).

A situação laboral e financeira foi verbalizada como obstáculos para que os membros dos grupos permaneçam nos encontros, como a falta de dinheiro para deslocamento até o CAPS e agenda de trabalho incompatível com os horários de determinados grupos:

O grupo de familiares era muito cheio, né? Porque eles recebiam o passe de ônibus da prefeitura, aí, a partir do momento que esse passe não foi mais enviado, foi, talvez, um dos primeiros fatores de esvaziamento desse grupo de família (P21 - CAPS 3).

O trabalho prejudica porque, talvez, o usuário se identifica com o grupo que é na terça-feira, né? E, talvez, no dia que é mais flexível devido às folgas, tem funcionário que talvez tenha uma folga na semana só, e eles atribuem essa folga a vinda dele aqui, então, acaba ele vindo para um grupo que dê para ele conciliar trabalho e grupo (P27 - CAPS 4).

Categoria 3 - Desafios da prática assistencial com intervenções grupais relacionadas às competências dos profissionais

Nessa categoria expressa-se as percepções dos profissionais de saúde mental sobre o que dificulta a implementação dos atendimentos grupais nos CAPS como, por exemplo, aqueles que não gostam de trabalhar com essa modalidade terapêutica, por desmotivação dos coordenadores dessas atividades, ou ainda a priorização de práticas de cuidado individual o que culmina com a escassez de ofertas terapêuticas grupais:

É, a gente tem aqui no caso alguns profissionais que já de antemão falam que não gostam de grupo, não querem fazer grupo (P14 - CAPS 3).

[...] muitas vezes, eles [usuários] vêm também quando eles percebem que a gente está empolgado com a atividade. Quando o profissional não está motivado, acaba com o grupo com certeza (P14 - CAPS 3).

[...] porque se for fazer verificação de sinais vitais em todos os pacientes não tem como fazer grupo não (P9 - CAPS 2).

Vocês vieram num horário de atendimento do CAPS que mais tem grupo, porque no vespertino é onde mais tem grupo, de manhã a gente tem grupo de família, o restante é atendimento individual (P14 - CAPS 3).

A ausência de formação específica sobre tecnologia grupal no ambiente acadêmico, especialmente na psicologia, foi uma fragilidade levantada. Ademais, a escassez de capacitações sobre a temática de grupos como ferramenta de cuidado também foi apontada:

Eles [profissionais] colocam muito da questão da formação, principalmente na faculdade de psicologia eles não têm uma formação específica para isso (P14 - CAPS 3).

[...] atendimento de família em conjunto, usuário/familiar, a gente percebe que isso é importante, mas, às vezes, a gente não se sente capacitado o suficiente para fazer isso (P7 - CAPS 2).

A falta de registro da avaliação dos grupos foi outra barreira evidenciada que dificulta revisitar a memória do grupo, a progressão das intervenções grupais a médio e longo prazo e o desenvolvimento dos participantes:

Do grupo a gente não anota não, mas a gente sabe, a gente que conduz o grupo por muito tempo, a gente sabe como que aquele grupo começou, assim, como foi se vinculando, como que ele foi mudando (P7 - CAPS 2).

É uma coisa que nos incomoda demais, essa dificuldade que nós temos de refletir a prática de avaliar. Todos nós fazemos a nossa avaliação, cada um à sua maneira, e o que falta é isso, é um desafio que nós temos (P24 - CAPS 4).

A dificuldade em interromper o tratamento em grupo por meio da alta de alguns usuários dos CAPSad e dar um suporte nesse período de transição foi uma dificuldade relatada. Também foi mencionado que esse movimento de não finalização do cuidado grupal enquanto o sujeito já se encontra fortalecido, cria a sensação de dependência do serviço:

Há um grupo de alta, porque nós não conseguimos definir o tempo, tempo nenhum para isso. É como se a porta de saída não existisse, a gente precisa de abrir, ela existe, a gente precisa abrir essa porta de saída, mas... (P24 - CAPS 4).

Categoria 4 - Desafios da prática assistencial com intervenções grupais relacionados aos processos de trabalho

Nessa categoria, foram incluídos os relatos dos profissionais a respeito de fatores dos processos de trabalho dos CAPSad que interferem negativamente para o trabalho com grupos como a consolidação de uma cultura organizacional ambulatorial da assistência ofertada pelos médicos e a predominância de atendimentos individuais que acabam influenciando os usuários a não frequentarem os grupos de forma assídua:

A gente tem uma restrição também que ela é bem séria, que é o não envolvimento dos médicos, então, eles acabam desenvolvendo uma atividade ambulatorial dentro do CAPS (P23 - CAPS 4).

Os meninos [adolescentes] estavam aqui com uma cultura de não ter grupo também, então, tirar os meninos dessa cultura é muito difícil, então, durante algum tempo não vai ter essa frequência tão maravilhosa (P14 - CAPS 3).

[...] sem ter nada para oferecer também não tem como montar os grupos, então a gente teve que fazer esse processo de pensar no que poderia ser atrativo para essa nossa clientela. Esse é um processo que aconteceu, está acontecendo principalmente no grupo vespertino, no matutino ainda não aconteceu esse processo (P14 - CAPS 3).

Poucos profissionais que compõem a força de trabalho, demanda muito grande que sobrecarrega a equipe e ausência de definição de critérios sistematizados para a escolha dos profissionais que desenvolverão grupos também foram citados como barreiras:

[...] no CAPSad também se a gente tivesse mais profissionais a gente poderia abrir mais grupos (P25 - CAPS 4).

[...] tem essa nossa dificuldade que é fazendo esse tanto de grupo que nós fazemos com tantos atendimentos nessa região que é cheia de demandas. Nós não temos CAPS aqui o suficiente, não temos CAPS infantil, às vezes, até a demanda das escolas chegam até aqui no CAPS, então a gente tem que acudir o que é mais urgente (P25 - CAPS 4).

Eu acho um pouco solto nesse sentido assim, que não tem essa definição de qual profissional faz grupo, geralmente fica mais em cima de quem é psicólogo (P7 - CAPS 2).

A ausência de supervisão externa dos serviços também foi apontada por um dos gestores que participaram do estudo para enfrentar as dificuldades que emergem no cotidiano do CAPS, incluindo os atendimentos grupais:

[…] uma supervisão de fora para nos auxiliar, tem hora que eu vou em encontros e quando eu falo daqui parece que a gente está sabendo mais do que as pessoas que estão lá. Eu não tenho encontrado alguém que nos auxilie, que nos dê um apoio (P23 CAPS 4).

DISCUSSÃO

Em geral, os participantes expressaram a ausência de estrutura física e materiais apropriados para o trabalho com grupos em saúde mental, o que coloca em risco todo o aparato assistencial e evidencia a precarização das condições de trabalho e dos serviços e da proposta do modelo de cuidado da atenção psicossocial. Estudo realizado em um serviço comunitário de saúde mental da Amazônia Ocidental com o objetivo de compreender as concepções dos profissionais sobre a sua prática cotidiana, apontou a presença de insatisfação pela ausência de recursos materiais no serviço1515. Batista EC, Ferreira DF, Batista LKS. O cuidado em saúde mental na perspectiva de profissionais de um CAPSi da Amazônia. Rev PsicoFAE [Internet] 2018 [cited 2022 Jun 14];7(1):77-92. Available from: https://revistapsicofae.fae.edu/psico/article/view/152
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. Nessa direção, uma revisão da literatura com o intuito de identificar as dificuldades enfrentadas pelo enfermeiro em serviços comunitários de saúde mental, incluindo CAPSad, identificou que a estrutura física do serviço se caracteriza como uma barreira1616. Souto RSF, Silva TV, Souza SAN, Santos WL. As dificuldades enfrentadas pelo enfermeiro no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) - revisão de literatura. Rev Inic Cient Ext [Internet]. 2018 [cited 2022 Jun 14];1(2):226-36. Available from: https://revistasfacesa.senaaires.com.br/index.php/iniciacao-cientifica/article/view/84
https://revistasfacesa.senaaires.com.br/...
, o que repercute na qualidade dos atendimentos grupais.

Ao implementar grupos em um espaço que não garante o sigilo e confidencialidade e que coloca em risco a integridade dos usuários pelo sucateamento dos serviços e fragilidades estruturais juntamente com a falta de uma diversidade de materiais como apontado pelos profissionais, revelou o desmonte e retrocessos das políticas de saúde mental. Em um ambiente terapêutico às pessoas com transtornos mentais tem direito garantido ao sigilo das informações expostas e, de serem cuidadas,44. Brasil. Lei n° 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental [Internet]. Brasília. 2001 [cited 2022 Jun 14]. Available from: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm
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os CAPSad deveriam conter espaço adequado para atendimento em grupo22. Ministério da Saúde (BR). Portaria de Consolidação n° 3, de 28 de setembro de 2017. Dispõe sobre a consolidação das normas sobre as redes do Sistema Único de Saúde [Internet]. Brasília. 2017 [cited 2022 Oct 14]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prc0003_03_10_2017.html
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. Há um descompasso com a realidade dos CAPSad investigados, tanto na presente pesquisa, quanto em outra realizada em serviços comunitários de atenção psicossocial da região central do Brasil, que apontou número insuficiente de salas para grupos nas unidades, ambientes com rachaduras e infiltrações, com risco de desabamento1717. Nunes FC, Sousa JM, Pinho ES, Caixeta CC, Barbosa MA, Cósta PA. Driving and restrictive factors of group practice in community psychosocial care services. Cien Saude Colet [Internet]. 2022 [cited 2022 Jun 14];27(1):183-92. Available from: https://doi.org/10.1590/1413-81232022271.19992021
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Os participantes mencionaram a dificuldade dos usuários em aderirem e terem compromisso com os grupos, alguns casos relatados ficaram meses sem frequentar o grupo, o que prejudicou o vínculo. Nessa direção, conhecer e analisar os contextos de vida dos usuários de álcool e outras drogas e suas necessidades pela equipe multiprofissional dos CAPSad é fundamental para viabilizar estratégias para impulsionar a participação nos grupos ofertados pelos serviços e assim evitar modelos de atenção que culpabilizam os usuários por contratempos no decorrer do desenvolvimento de atendimentos grupais.

Os contextos de vida dos usuários, sendo a tríade substância - indivíduo - sociedade, é uma premissa importante para a compreensão ampliada do uso de drogas por eles. É comum tratar sobre a substância e sua ação no organismo, mas não considerar o indivíduo como ser biopsicossocial e a influência sobre os efeitos da droga e os padrões de seu consumo1818. Alves YDD, MacRae E. Uma abordagem teórica sobre o contexto social do uso de drogas. Rev Tomo [Internet]. 2019 [cited 2022 Oct 28];(34):81-114. Available from: https://seer.ufs.br/index.php/tomo/article/view/9850
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Ademais, para compreender o indivíduo é preciso considerar a interação entre sujeito biopsíquico de um lado e o contexto de outro com os fatores macro-sociais, as diferenças culturais, os eventos externos, as condições sócio-econômicas, a falta de apoio social adequado, o ambiente relacional adverso. Todos esses elementos impactam o indivíduo e sua condição de saúde1919. Saraceno B. A cidadania como forma de tolerância. Rev Ter Ocup Univ [Internet]. 2011 [cited 2022 Oct 28];22(2):93-101. Available from: https://doi.org/10.11606/issn.2238-6149.v22i2p93-101
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. Dessa forma, os profissionais dos CAPSad devem considerar os contextos de vida dos usuários para uma maior compreensão dos fatores que interferem na adesão aos grupos.

Haja vista que, muitas vezes, as condições socioeconômicas dos usuários atendidos pelos CAPSad são de muita vulnerabilidade e a falta de uma rede de apoio que dê sustentação para o tratamento é um fenômeno que interfere na permanência deles nos serviços. Em relação ao perfil de 369 usuários atendidos em três CAPSad do Triângulo Mineiro, (80,5%) eram do sexo masculino, faixa etária entre 41 e 60 anos (45,8%), sem parceiro(a) (55,2%), sem emprego fixo (34,7%) e o álcool foi a droga mais consumida ao longo da vida (89,7%)2020. Trevisan ER, Castro SS. Centros de Atenção Psicossocial - álcool e drogas: perfil dos usuários. Saúde Debate [Internet]. 2019 [cited 2022 Jun 14];43(121):450-63. Available from: https://doi.org/10.1590/0103-1104201912113
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. Conhecer as características dos usuários e seus familiares em âmbito biopsicossocial é essencial para a compreensão dos fatores restritivos que influenciam no seu envolvimento nas atividades terapêuticas ofertadas pelos serviços comunitários de saúde mental, incluindo os grupos.

A produção do cuidado em saúde mental, álcool e outras drogas no contexto da RAPS ainda é carregada por julgamento moral, estigmatização e a ausência de acolhimento das necessidades dos usuários por parte dos profissionais que ainda perduram nos serviços2121. Leão A, Taño BL, Jacob DG, Pimentel KS. Obstáculos à produção do cuidado em álcool e outras drogas na perspectiva dos trabalhadores de saúde mental: prelúdios do cenário atual? Pesq Práticas Psicossocais [Internet]. 2021 [cited 2022 Oct 28];16(3):e3733. Available from: http://www.seer.ufsj.edu.br/revista_ppp/article/view/e3733/2707
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. Consideração essa a ser enfrentada pela prática psicossocial numa dimensão sociocultural. Logo, se faz imperiosa a transformação epistemológica das práticas assistenciais destinadas a usuários de álcool e outras drogas que devem se pautar no modelo de atenção psicossocial, cuja finalidade centra-se no desenvolvimento da autonomia da pessoa para a reconstrução de seus projetos de vida.

O modelo de atenção psicossocial é um processo dinâmico, em construção no Brasil, norteador no saber e fazer em saúde mental. Nesse modelo não se questiona a sua assertividade e capacidade de atender às necessidades de saúde da comunidade, mas sim, alerta-se para sua vulnerabilidade na ausência da crítica-reflexiva, da criatividade, de políticas sólidas e permanentes, que garantam investimento e sensibilidade para o adoecimento mental, ocasionado inclusive pelo abuso ou dependência de drogas.

Outro aspecto a ser considerado é que, na prática cotidiana dos CAPS, o Projeto Terapêutico Singular deve ser instrumento de organização dos processos de trabalho e ampliação da clínica, com metas terapêuticas claras e evolução cuidadosa. A falta desse planejamento do cuidado pelos profissionais e de corresponsabilização do usuário/família dificulta a vinculação e a adesão dos usuários às atividades terapêuticas, inclusive grupais2222. Silva NS, Sousa JM, Nunes FC, Farinha MG, Bezerra ALQ. Challenges in the operationalization of singular therapeutic projects in Psychosocial Care Centers. Psicol Estud [Internet]. 2020 [cited 2022 Oct 28];25:e49996. Available from: https://doi.org/10.4025/psicolestud.v25i0.49996
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Nessa direção, a baixa adesão ao tratamento de pessoas que abusam de álcool e outras drogas vem sendo objeto de estudo, por ser constante nos espaços de CAPSad e torna-se um desafio ainda não compreendido em sua totalidade. Especificamente, em relação a atendimentos grupais em serviços comunitários de saúde mental, a baixa adesão também é apontada como fator restritivo para o trabalho grupal pois muitos usuários não permanecem até o fim dos encontros ou do grupo como um todo, pois possuem preferência por atendimento individual, o que dificulta a compreensão da necessidade das intervenções grupais, ocasionando faltas e atrasos constantes1818. Alves YDD, MacRae E. Uma abordagem teórica sobre o contexto social do uso de drogas. Rev Tomo [Internet]. 2019 [cited 2022 Oct 28];(34):81-114. Available from: https://seer.ufs.br/index.php/tomo/article/view/9850
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. Entretanto, a ausência de preparo profissional e sistematização da prática com grupos, colaboradores que não se identificam com trabalhar com essa modalidade de atendimento e, a pouca flexibilização dos dias e horários das intervenções grupais, são fatores que foram identificados na fala dos participantes que refletem na baixa adesão dos usuários.

A indisponibilidade de horário dos usuários para participarem dos encontros devido a agenda de trabalho também é outro aspecto que interfere nas práticas grupais. Considerando que o abuso de drogas impacta para além da saúde do usuário e, estende-se às suas famílias e toda a comunidade e, quando se refere às populações vulneráveis economicamente, as consequências são ainda mais danosas. Situação que limita a assertividade das ações terapêuticas, uma vez que os efeitos da abordagem e participação familiar são expressivos e positivos para o tratamento do uso de drogas, seja qual for a orientação terapêutica aplicada, sempre haverá ganhos2323. Ignaszewski MJ. The Epidemiology of Drug Abuse. J Clin Pharmacol [Internet].2021[cited 2022 Jun 14];61(Suppl 2):S10-S17. Available from: https://doi.org/10.1002/jcph.1937
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-2424. Filges T, Andersen D, Jorgensen AMK. Effects of Multidimensional Family Therapy (MDFT) on nonopioid drug abuse: a systematic review and meta-analysis. Res Social Work Pract [Internet]. 2015 [cited 2022 Jun 14];28(1):68-83. Available from: https://doi.org/10.1177/1049731515608241
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Recursos financeiros deficitários dos familiares dos usuários do CAPSad para frequentarem o grupo de família foi citado como uma barreira para esse tipo de atendimento. Uma investigação implementada em um CAPSad de Minas Gerais revelou que 34,7% dos usuários do serviço estavam desempregados2020. Trevisan ER, Castro SS. Centros de Atenção Psicossocial - álcool e drogas: perfil dos usuários. Saúde Debate [Internet]. 2019 [cited 2022 Jun 14];43(121):450-63. Available from: https://doi.org/10.1590/0103-1104201912113
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. Estes dados dialogam com os resultados encontrados no estudo e demonstram uma situação financeira deficitária desse grupo que interfere no deslocamento aos serviços e consequente permanência nos grupos terapêuticos ofertados.

A fragilidade em apoiar as famílias a participarem das atividades no serviço comunitário de saúde mental soma-se aos riscos à qualidade da atenção à saúde mental das pessoas com transtornos mentais. O modelo de atenção psicossocial que norteia a assistência ofertada pelo CAPS percebe a família como um importante agente de cuidado que também necessita de acompanhamento terapêutico, porém, a abordagem a esse público ainda é um desafio enfrentado pelas equipes dos serviços2525. Ferreira TPS, Sampaio J, Oliveira IL, Gomes LB. A família no cuidado em saúde mental: desafios para a produção de vidas. Saúde Debate [Internet]. 2019 [cited 2022 Jun 14];43(121):441-9. Available from: https://doi.org/10.1590/0103-1104201912112
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Todas as dimensões devem ser vistas, sobretudo a gestão, as políticas de atenção à saúde, formatação da rede, os recursos disponíveis; pois o que se apresentou neste estudo foi a voz do profissional que está isolado e desolado na ponta do processo de atenção em saúde mental. Do mesmo modo, o contexto que vivenciamos de desmonte do sistema de saúde e da lógica de atenção psicossocial refletem diretamente na qualidade e valorização de um serviço (CAPSad). Dispositivo que está na contramão do isolamento social, desejado contemporâneo para a pessoa com problemas com álcool e outras drogas.

Os achados do estudo mostram que o usuário que trabalha precisa se adequar aos grupos do CAPSad e não o contrário. É importante que tanto a gestão, quanto os profissionais dos serviços possam refletir sobre possibilidades de acolhimento dessas especificidades, pois o que se percebe que uma grande parcela dos usuários atendidos no CAPSad possui vínculos empregatícios inexistentes ou fragilizados, como revela um estudo realizado em um CAPSad III da região nordeste do Brasil que identificou que a maioria dos usuários são autônomos ou desempregados2626. Carvalho IAB, Menezes KS, Magalhães JM, Amorim FCM, Fernandes MA, Carvalho CMS. Psychoactive substances users’ profile. Rev Fun Care Online [Internet]. 2020 [cited 2022 Jun 14];12:326-31. Available from: https://doi.org/10.9789/2175-5361.rpcfo.v12.7095
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, portanto, se faz necessário que os CAPS disponibilizem atendimento em dias e horários diferentes do habitual para que as pessoas que estejam trabalhando possam continuar com o seu tratamento.

Sobre os desafios da prática com grupos relacionados aos profissionais, emergiu a questão de colaboradores desmotivados, que não gostam de trabalhar com a modalidade de atendimento grupal nos CAPSad e acabam priorizando outras ações, o que gera um baixo repertório de grupos para serem ofertados para os usuários. Uma alternativa para transformar essa realidade é a inserção dos recursos da tecnologia grupal no contexto do processo de ensino-aprendizagem em saúde mental, fazendo com que os futuros profissionais já tenham uma aproximação com estratégias grupais durante o seu processo formativo, como demonstra uma experiência realizada com acadêmicos de enfermagem2727. Sousa JM, Esperidião E, Nunes FC, Caixeta CC, Landim JSS, Farinha MG, et al. Ensino de enfermagem em saúde mental: foco na tecnologia grupal. Res Soc Develop [Internet]. 2021 [cited 2022 Jun 14];10(12):e117101220057. Available from: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i12.20057
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Ademais, é importante frisar que os processos formativos extrapolem os muros das instituições formadoras por meio de ações de educação permanente e continuada juntamente com a responsabilização dos profissionais no seu aperfeiçoamento contínuo. Pois o estudo evidenciou o baixo compromisso das equipes multiprofissionais com o cuidado psicossocial, uma vez que ao atribuírem seu despreparo à falta de capacitação, não consideram a sua responsabilidade com a própria formação, inclusive a pós-graduação. Esses achados corroboram com estudos que explicitam o frágil conhecimento sobre tecnologia grupal e movimentos grupais1717. Nunes FC, Sousa JM, Pinho ES, Caixeta CC, Barbosa MA, Cósta PA. Driving and restrictive factors of group practice in community psychosocial care services. Cien Saude Colet [Internet]. 2022 [cited 2022 Jun 14];27(1):183-92. Available from: https://doi.org/10.1590/1413-81232022271.19992021
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,2828. Nunes FC, Caixeta CC, Pinho ES, Souza ACS, Barbosa MA. Group technology in psychosocial care: a dialogue between action-research and permanent health education. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2019 [cited 2022 Jun 14];28:e20180161. Available from: https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-2018-0161
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A ausência de registros sobre os atendimentos grupais foi outra barreira para o trabalho com grupos, identificada especialmente para a avaliação das repercussões dos encontros, sendo que quando realizada, é feita de forma intuitiva. Quando se tem poucos ou nenhum registro das intervenções grupais, a percepção da evolução terapêutica dos usuários pode ficar comprometida77. Sousa JM, Vale RRM, Pinho ES, Almeida DR, Nunes FC, Farinha MG et al. Effectiveness of therapeutic groups in psychosocial care: analysis in the light of yalom’s therapeutic factors. Rev Bras Enferm [Internet]. 2020 [cited 2022 Jun 14];73(Suppl 1):1-9. Available from: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0410
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, o que prejudica a visualização pelos coordenadores dos avanços e retrocessos dos usuários, do grupo e da atuação dos facilitadores.

A dificuldade de determinar a alta dos usuários atendidos, inclusive em grupos com esta finalidade, é um empecilho sinalizado. Uma investigação realizada em cinco CAPSad de São Paulo demonstrou que não existiam critérios sistematizados para a concretização dos processos de alta, revelando muitas barreiras, dentre elas a dificuldade de rompimento dos vínculos e a dependência institucional dos usuários2929. Silva LLP, Almeida AB, Amato TC. A perspectiva dos profissionais sobre o processo de alta de pacientes do Caps-AD: critérios e dificuldades. Saúde Debate [Internet]. 2019 [cited 2022 Jun 14];43(122):819-35. Available from: https://doi.org/10.1590/0103-1104201912213
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A fragilidade na formação durante a graduação sobre tecnologia grupal, especialmente no curso de psicologia juntamente com a escassez de capacitações durante o exercício profissional foram mencionados como barreiras. A formação do coordenador de grupos precisa ser baseada em competências, o que compreende os aspectos teóricos, prática supervisionada e análise pessoal2727. Sousa JM, Esperidião E, Nunes FC, Caixeta CC, Landim JSS, Farinha MG, et al. Ensino de enfermagem em saúde mental: foco na tecnologia grupal. Res Soc Develop [Internet]. 2021 [cited 2022 Jun 14];10(12):e117101220057. Available from: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i12.20057
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. Experienciar o processo grupal que no âmbito dos serviços comunitários de saúde mental proporciona a identificação da terapeuticidade dos grupos77. Sousa JM, Vale RRM, Pinho ES, Almeida DR, Nunes FC, Farinha MG et al. Effectiveness of therapeutic groups in psychosocial care: analysis in the light of yalom’s therapeutic factors. Rev Bras Enferm [Internet]. 2020 [cited 2022 Jun 14];73(Suppl 1):1-9. Available from: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0410
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, que também é outro fator igualmente importante para o aperfeiçoamento da prática de coordenação de grupos.

Em relação aos processos de trabalho das instituições, a perpetuação de uma cultura organizacional ambulatorial foi mencionada pelos profissionais como dificultadora, o que se caracteriza como um empecilho para a consolidação das práticas coletivas e em grupo no contexto da atenção psicossocial. Realidade que pode ser agravada pela formação em saúde mental ainda não ser uma prioridade para se trabalhar em CAPS, o que pode contribuir para o cultivo do modelo ambulatorial, como revela uma revisão integrativa que visou investigar as principais dificuldades enfrentadas pelos enfermeiros em serviços comunitários de saúde mental, em que 11 estudos apontaram essa variável1616. Souto RSF, Silva TV, Souza SAN, Santos WL. As dificuldades enfrentadas pelo enfermeiro no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) - revisão de literatura. Rev Inic Cient Ext [Internet]. 2018 [cited 2022 Jun 14];1(2):226-36. Available from: https://revistasfacesa.senaaires.com.br/index.php/iniciacao-cientifica/article/view/84
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Outro desafio para a prática com grupos nos CAPSad foi a menor oferta dessa modalidade de cuidado para os usuários de uma das instituições do estudo, o que está em descompasso com as recomendações do modelo de cuidado pautado na atenção psicossocial. Os serviços comunitários de saúde mental devem dispor de práticas grupais e coletivas como as oficinas terapêuticas e atividades comunitárias para a comunidade, sendo que vivenciar atendimentos grupais possibilita o surgimento de inúmeros fatores terapêuticos aos usuários77. Sousa JM, Vale RRM, Pinho ES, Almeida DR, Nunes FC, Farinha MG et al. Effectiveness of therapeutic groups in psychosocial care: analysis in the light of yalom’s therapeutic factors. Rev Bras Enferm [Internet]. 2020 [cited 2022 Jun 14];73(Suppl 1):1-9. Available from: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0410
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A escassez de profissionais foi mencionada como um desafio para a prática com grupos nos CAPSad, aliada a uma demanda muito grande do serviço. Nessa direção, as intervenções grupais implementadas no contexto da atenção psicossocial, precisam ser sistematizadas levando em consideração um caráter multidisciplinar55. Andrade JMM, Farinha MG, Sousa JM, Vale RRM, Esperidião E. Presence of therapeutic factors in group care in the waiting room. Rev Eletr Enferm [Internet]. 2022 [cited 2022 Jun 14];24:68907. Available from: https://doi.org/10.5216/ree.v24.68907
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. Logo, quando a equipe dos serviços é reduzida ou insuficiente, a integração de distintas categorias profissionais para a coordenação de grupos fica prejudicada e consequentemente não conseguem atender a toda a demanda de forma assertiva.

A ausência de critérios sistematizados para a definição dos profissionais que irão coordenar grupos nos serviços foi relatada por um participante como um fator dificultador, sinalizando que esta prática fica mais na responsabilidade dos psicólogos do serviço. Nessa direção, é importante que as demais categorias tenham conhecimento específico para implementarem intervenções grupais, porém, nem todos os integrantes das equipes multiprofissionais de serviços comunitários de saúde mental detêm fundamentação teórica e prática sobre tecnologia grupal77. Sousa JM, Vale RRM, Pinho ES, Almeida DR, Nunes FC, Farinha MG et al. Effectiveness of therapeutic groups in psychosocial care: analysis in the light of yalom’s therapeutic factors. Rev Bras Enferm [Internet]. 2020 [cited 2022 Jun 14];73(Suppl 1):1-9. Available from: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0410
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A falta de supervisão externa foi apontada por um profissional de um dos CAPSad pesquisados como fator dificultador de ações realizadas pelo serviço. Em relação às intervenções grupais, é necessário que os facilitadores de grupo integrem momentos de capacitação constantes, além de supervisão clínica institucional da sua atuação para um melhor aprimoramento da sua prática profissional55. Andrade JMM, Farinha MG, Sousa JM, Vale RRM, Esperidião E. Presence of therapeutic factors in group care in the waiting room. Rev Eletr Enferm [Internet]. 2022 [cited 2022 Jun 14];24:68907. Available from: https://doi.org/10.5216/ree.v24.68907
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O estudo traz contribuições para o campo da formação profissional, pois ao evidenciar fragilidades na competência dos profissionais que coordenam grupos, sinaliza os aspectos teóricos e práticos que precisam de investimento durante o processo formativo das equipes atuantes nos serviços, que carecem de sistematização em relação ao cuidado psicossocial das pessoas em abuso de álcool e outras drogas, para que não sejam atividades meramente burocráticas e atendam de fato a finalidade da reabilitação psicossocial.

Nessa direção, pesquisa realizada com 66 trabalhadores de serviços especializados em saúde mental de base comunitária revelou que apesar de todos os benefícios advindos das intervenções grupais ofertadas pelos serviços, as equipes enfrentam fatores restritivos em relação a essa prática assistencial relacionadas a aspectos dos serviços, usuários e dos próprios profissionais1717. Nunes FC, Sousa JM, Pinho ES, Caixeta CC, Barbosa MA, Cósta PA. Driving and restrictive factors of group practice in community psychosocial care services. Cien Saude Colet [Internet]. 2022 [cited 2022 Jun 14];27(1):183-92. Available from: https://doi.org/10.1590/1413-81232022271.19992021
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, o que evidencia a importância de olhar para essas questões para minimizar prejuízos para o pleno êxito da coordenação de grupos.

Desse modo, espera-se que os resultados dessa pesquisa possam fomentar outras reflexões dos sujeitos que estão envolvidos na assistência aos usuários de substâncias psicoativas para trabalharem essas barreiras que interferem na resolutividade do cuidado em saúde mental. Sobretudo, considerar as provocações apontadas como norteadoras para a transformação das práticas nos serviços, por meio de educação permanente. Dessa forma, sugere-se a realização de novos estudos em demais modalidades de CAPS para mapear esses desafios, para que posteriormente sejam minimizados ou solucionados.

Como limitação do estudo, destaca-se a realização da pesquisa apenas com os profissionais de saúde mental, sendo que a incorporação dos usuários membros dos grupos seria importante para melhor compreensão do fenômeno, o que sugere a realização de novos estudos com este público. Além disso, destaca-se a limitação da comparação com os estudos internacionais sobre terapia de grupo ou intervenções grupais considerando as diferentes orientações conceituais e políticas do modo psicossocial de cuidado aos usuários de álcool e outras drogas.

CONCLUSÃO

Os resultados deste estudo possibilitaram ampliar a compreensão acerca dos desafios da prática assistencial com intervenções grupais em CAPSad, dando voz aos trabalhadores que vivenciam esse processo. Foi possível identificar que os desafios vivenciados englobam questões de estrutura física inadequada e recursos materiais deficitários, dificuldades ligadas aos contextos de vida dos usuários, competência dos profissionais e fatores dos processos de trabalho dos serviços. Logo, somente com a resolução desses obstáculos por meio de ações articuladas entre o poder público, instituições formadoras, gestão dos serviços comunitários de saúde mental e equipes multiprofissionais é que se poderá reafirmar e colocar em prática toda a potencialidade da modalidade terapêutica grupal.

AGRADECIMENTO

À Fernanda Costa Nunes, Raquel Rosa Mendonça do Vale, Eurides Santos Pinho e Daniel Ribeiro de Almeida pela colaboração na coleta dos dados.

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NOTAS

  • ORIGEM DO ARTIGO

    Extraído da dissertação - Intervenções grupais em Centros de Atenção Psicossocial AD apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, da Universidade Federal de Goiás, em 2020.
  • APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA

    Aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Goiás, parecer inicial n. 821.767/2014, Certificado de Apresentação para Apreciação Ética 33417714.2.0000.5083 e parecer final n. 3.951.500/2020, Certificado de Apresentação para Apreciação Ética 33417714.2.0000.5083.

Editado por

EDITORES

Editores Associados: Laura Cavalcanti de Farias Brehmer, Monica Motta Lino. Editor-chefe: Elisiane Lorenzini.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    26 Jul 2022
  • Aceito
    03 Nov 2022
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