TECNOLOGIA EDUCATIVA SOBRE SAÚDE PARA MULHERES PRIVADAS DE LIBERDADE À LUZ DO LETRAMENTO EM SAÚDE

RESUMO

Objetivo:

validar o conteúdo de vídeos educativos para mulheres privadas de liberdade, à luz do letramento em saúde.

Método:

estudo metodológico com desenvolvimento de três vídeos para mulheres privadas de liberdade, com temas por elas escolhidos (Ciclo Menstrual, Hipertensão Arterial e Epilepsia), desenvolvidos em quatro etapas: construção dos storyboards, validação por juízes experts, construção dos vídeos e validação pelo público. O processo de validação foi realizado por sete juízes com o Instrumento de Validação de Conteúdo Educativo em Saúde, o Suitability Assessment of Materials e análise de legibilidade. Para aprovação, foi estabelecido que a concordância entre juízes devia ser superior a 80%, e a adequação, segundo o Instrumento, devia ser de 40-100%. As mulheres apenadas avaliaram os vídeos em agosto de 2022, em uma cadeia pública feminina do Ceará, com uso do Instrumento para Avaliação de Tecnologia Assistiva, considerando o nível de concordância das respostas positivas acima de 70%.

Resultados:

o resultado do Instrumento de validação dos storyboards variou de 0,92 a 1,0. Na Avaliação de adequação atingiu-se percentual de 85,2% a 88,8%, categorizando os materiais como superior. Quanto à legibilidade, os valores obtidos (70,9 a 78,1) colocam os textos como fáceis ou muito fáceis de ler. A avaliação pelo público-alvo demonstrou que os vídeos estavam adequados (97,8-100%).

Conclusão:

os três vídeos construídos mostraram-se adequados às mulheres privadas de liberdade, com evidências de validade de conteúdo e poderão ser utilizados em ações de educação em saúde para este público.

DESCRITORES:
Estudos de validação; Letramento em saúde; Prisioneiros; Recursos audiovisuais; Tecnologia educacional

ABSTRACT

Objective:

to validate the content of educational videos for incarcerated women, in the light of health literacy.

Method:

methodological study with development of three videos for incarcerated women with themes chosen by them (Menstrual Cycle, Arterial Hypertension and Epilepsy), developed in four stages: construction of storyboards, validation by expert judges, construction of videos and validation by the public. The validation process was performed by seven judges with the Health Educational Content Validation Instrument, the Suitability Assessment of Materials and readability analysis. For approval, it was established that the agreement between judges should be higher than 80%, and the adequacy, according to the SAM, should be 40-100%. The incarcerated women evaluated the videos in August 2022, in a women's public prison in Ceará, using the Assistive Technology Assessment Instrument, considering the level of agreement of the positive responses above 70%.

Results:

the validation instrument result of the storyboards ranged from 0.92 to 1.0. In the Suitability Assessment, a percentage of 85.2% to 88.8% was reached, categorizing the materials as superior. As for readability, the values obtained (70.9 to 78.1) place the texts as easy or very easy to read. The evaluation by the target audience showed that the videos were adequate (97.8-100%).

Conclusion:

the three videos constructed were suitable for incarcerated women, with evidence of content validity and may be used in health education actions for this public.

DESCRIPTORS:
Validation studies; Health literacy; Prisoners; Audiovisual resources; Educational technology

RESUMEN

Objetivo:

validar el contenido de videos educativos para mujeres privadas de libertad, a la luz de la alfabetización en salud.

Método:

estudio metodológico con la elaboración de tres videos para mujeres privadas de libertad, con temáticas elegidas por ellas (Ciclo Menstrual, Hipertensión Arterial y Epilepsia), desarrollados en cuatro etapas: construcción de storyboards, validación por jueces expertos, construcción de videos y validación por el publico El proceso de validación fue realizado por siete jueces utilizando el Instrumento de Validación de Contenido de Educación en Salud, la Evaluación de Idoneidad de Materiales y el análisis de legibilidad. Para su aprobación se estableció que la concordancia entre jueces debe ser superior al 80%, y la adecuación, según la Evaliación de Idoneidad, debe ser del 40-100%. Las mujeres privadas de libertad evaluaron los videos en agosto de 2022, en una prisión pública femenina de Ceará, utilizando el Instrumento de Evaluación de Tecnología Asistiva, considerando el nivel de acuerdo de respuestas positivas superior al 70%.

Resultados:

el resultado de la Herramienta de Validación de los guiones gráficos osciló entre 0,92 y 1,0. En la Evaluación de la idoneidad se alcanzó un porcentaje de 85,2% a 88,8% categorizando a los materiales como superiores. En cuanto a la legibilidad, los valores obtenidos (70,9 a 78,1) sitúan a los textos como fáciles o muy fáciles de leer. La evaluación por parte del público objetivo mostró que los videos eran adecuados (97,8-100%).

Conclusión:

los tres videos construidos fueron aptos para mujeres privadas de libertad, con evidencias de validez de contenido y podrían ser utilizados en acciones de educación en salud para ese público.

DESCRIPTORES:
Estudios de validación; Literatura saludable; Prisioneros; Recursos audiovisuales; Tecnologia educacional

INTRODUÇÃO

No mundo existem mais de 714.000 mulheres e meninas privadas de liberdade e esse número vem crescendo muito mais rápido do que os níveis da população carcerária masculina desde o ano 2000, aumentando em mais de 50% a população feminina, enquanto a masculina aumentou cerca de 20%1.

A população carcerária feminina cresce exponencialmente no Brasil, passando de 5.601 mulheres presas no ano 200 para 42.355 detentas em 2016, denotando crescimento de 525% no período2. Atualmente, as mulheres são 5,5% da população carcerária total brasileira, levando o Brasil ao quarto lugar dentre os países que mais encarceram mulheres, apresentando em junho de 2022 um total de 45.490 mulheres privadas de liberdade3.

A Organização Mundial da Saúde chama atenção para o negligenciamento das especificidades das necessidades de saúde dessa população, destacando o quanto a situação de prisão interfere nas condições de saúde das pessoas, em especial, das mulheres4. Fato que se destaca ao avaliar os relatórios emitidos pelo Departamento Penitenciário Nacional que só apresenta dados de agravos transmissíveis como HIV, Sífilis, Hepatite e Tuberculose. Apesar disso, estudos realizados no Brasil mostram que além desses agravos, as mulheres privadas de liberdade apresentam doenças crônicas não transmissíveis dentre outras5^,6.

Dessa forma, ações que promovam o estímulo ao autocuidado e à proteção da saúde, necessitam ser implementadas para evitar o surgimento de morbidades relacionadas ao período de encarceramento e para que mulheres saudáveis sejam devolvidas ao mercado de trabalho e à vida cotidiana7.

Isso posto, a educação em saúde nos presídios é relevante, pois leva informações às mulheres encarceradas sobre recursos para cessar ou atenuar agravos a sua saúde física, respeitando a realidade por elas vivenciada, suas crenças, valores e conhecimentos. Ademais, facilita a transição de forma mais saudável no retorno à comunidade, permitindo restabelecer relacionamentos com sua família, amigos, profissionais de saúde e instituições facilitadoras do acesso à habitação e cuidados de saúde8. Dentre as diversas estratégias para a educação em saúde que podem ser utilizadas como ferramentas que potencializam a aprendizagem autônoma, pode-se citar o vídeo educativo como estratégia didática e tecnológica, que proporciona conhecimento, favorece a consciência crítica e a promoção da saúde9.

Proporcionar a essas mulheres, educação em saúde de qualidade, com fundamentos no letramento em saúde e que propicie autocuidado a partir das demandas das mulheres encarceradas poderá favorecer seu futuro fora da prisão10^-11, pois as dotará de maior empoderamento no cuidado de sua saúde. Assim, considerando o exposto, mulheres privadas de liberdade constituem grupo prioritário para utilização destes materiais educativos. Dessa forma, objetivou-se neste estudo validar o conteúdo de vídeos educativos para mulheres privadas de liberdade, à luz do letramento em saúde.

MÉTODO

Desenho, local do estudo e período

O estudo foi realizado em dois presídios femininos, um, localizado na cidade de Cajazeiras, no interior da Paraíba (Cadeia Pública Feminina/Albergue de Cajazeiras), e o outro, localizado na cidade de Crato, interior do Ceará (Cadeia Pública Feminina do Crato), ambos no Nordeste brasileiro. A realização do estudo abrangeu o período de novembro/2019 a agosto/2022.

Infelizmente, devido a problemas estruturais, o presídio de Cajazeiras precisou passar por reforma, o que inviabilizou a avaliação dos vídeos pelas mulheres reclusas nessa Instituição, pois precisaram ser transferidas para outras Instituições prisionais do estado da Paraíba.

Etapa preliminar

Esta etapa foi representada pela identificação de temas de saúde de interesse das MPL e pelo diagnóstico do letramento em saúde e alimentar das mesmas.

A identificação dos temas de interesse ocorreu em novembro de 2019, a partir da realização de grupo focal de MPL do presídio feminino da cidade de Cajazeiras, interior da Paraíba. Os temas mais solicitados foram, Hipertensão Arterial, Epilepsia e Ciclo Menstrual.

Logo após a escolha dos temas veio a Pandemia da COVID-19, o que interrompeu a continuidade da pesquisa por 20 meses. Quando finalmente, no final de 2021, foi permitida a entrada de pessoas externas no sistema prisional, mensurou-se o letramento em saúde e alimentar das mulheres encarceradas nos dois presídios citados. Essa etapa foi relevante para adequar as informações programadas para constar nos vídeos em nível de entendimento dessas mulheres, mediante a identificação de suas limitações e potencialidade, relacionadas ao letramento em saúde e alimentar. Optou-se por incluir a aferição do Letramento Alimentar (LA), um subcampo do letramento em saúde, devido ao fato dos temas escolhidos terem conteúdo específico de nutrição e alimentação.

Para a aferição do letramento em saúde utilizou-se o Health Literacy Questionnaire, em sua versão validada para o Brasil (HLQ-Br). Esse instrumento foi criado na Austrália12 e traduzido, validado e adaptado transculturalmente pelo estudo de Moraes et al.13, e para a aferição do letramento nutricional o Nutritional Literacy Scale, na versão brasileira - NLS-Br, validada por Zanella et al.14, a partir da versão original desenvolvida nos Estados Unidos, por Diamond 15.

O HLQ-Br foi utilizado mediante licença concedida para sua utilização (Swinburne University of Technology - License Number L20017IA).

Construção e validação dos vídeos educativos

A construção dos vídeos seguiu as recomendações de referencial metodológico para elaboração de tecnologias audiovisuais, ocorrendo em três fases: pré-produção, produção e pós-produção. Na pré-produção, foram elaborados os roteiros e construídos os storyboards, que consiste em apresentação do fluxo cronológico das ilustrações e informações de cada cena a ser produzida promovendo uma visualização prévia do layout do produto final16.

Os roteiros foram elaborados seguindo tanto referencial teórico de apoio técnico aos conteúdos dos temas propostos, como os fundamentos do letramento em saúde para elaboração de materiais educativos. Assim, o conteúdo referente à Hipertensão Arterial seguiu as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC)17 e da American Heart Association (AHA)18.

O conteúdo de Epilepsia seguiu as Diretrizes da Associação Brasileira de Epilepsia (ABE)19. Para o tema Ciclo Menstrual foram seguidas as Diretrizes da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO)20, da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo (SOGESP)21 e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM)22.

Para os três temas, os fundamentos do letramento em saúde, aplicados, foram quanto às diretrizes de produção de materiais escritos, para tornar a linguagem simples e clara, na voz ativa, com uso de palavras curtas e sentenças com no máximo 15 palavras, ausência ou explicação clara de termos técnicos23^,24, para a formulação dos storyboards seguindo uma ordem lógica e sequencial, na apresentação do tema, ilustrando cada passo25.

Foram criados três storyboards sobre Hipertensão Arterial, incluindo o seguinte conteúdo: importância do controle do peso, cuidado com a utilização do sal e importância do consumo de frutas, verduras e legumes para o controle da hipertensão.

Para o tema Epilepsia foram criados também três storyboards enfocando: o que é e o que a pessoa que tem Epilepsia sente; como podemos ajudar quem tem Epilepsia; e como podemos ajudar uma pessoa com crise epilética.

Já para o tema Ciclo Menstrual foram elaborados quatro storyboards, versando sobre o que é Ciclo Menstrual; as mudanças que acontecem no corpo das mulheres durante o Ciclo Menstrual; o que é e quando ocorre o período fértil e; menopausa.

O número de cenas foi planejado para permitir que o tempo de duração da leitura dos storyboards, bem como o tempo de duração dos vídeos, atendessem os fundamentos do letramento em saúde23. Não há um consenso quanto a este tempo, mas tem sido referido um tempo máximo de 8 minutos, sendo o limite ideal 3-5 minutos26, e de até 2 minutos27. Dessa forma, planejou-se que cada vídeo tivesse em torno de 2 a 3 minutos de duração.

Os storyboards foram construídos no Programa Canva Pro, onde pode-se juntar as imagens selecionadas com as informações contidas nos roteiros previamente elaborados. As imagens também foram selecionadas no Programa Canva Pro e algumas foram produzidas pelos próprios autores, a partir de fotografias obtidas em aparelho celular Motorola Moto One Vision modelo XT1970-1.

Foram então criados três storyboards sobre Hipertensão Arterial, incluindo o seguinte conteúdo: importância do controle do peso, cuidado com a utilização do sal e importância do consumo de frutas, verduras e legumes para o controle da hipertensão, os quais ficaram com 14, 22 e 10 cenas, respectivamente.

Para o tema Epilepsia foram criados também três storyboards enfocando: o que é e o que a pessoa que tem epilepsia sente; como podemos ajudar quem tem epilepsia; e como podemos ajudar uma pessoa com crise epilética, os quais ficaram com 22, 12 e 20 cenas, respectivamente.

Já para o tema Ciclo Menstrual foram elaborados quatro storyboards, versando sobre o que é Ciclo Menstrual; as mudanças que acontecem no corpo das mulheres durante o Ciclo Menstrual; o que é e quando ocorre o período fértil; e menopausa. Nesse caso, os storyboards foram construídos com 20, 20, 28 e 30 cenas respectivamente.

A validação do conteúdo e aparência dos storyboards ocorreu por meio da avaliação de juízes com formação na área da saúde e com expertise em letramento em saúde (LS) para se ter um material adequado e proporcionar a melhor comunicação possível com o público-alvo.

O tamanho da amostra de juízes se deu de acordo com as orientações de Pasquali28, tento participado do estudo 7 juízes selecionados por meio de consulta à Plataforma Lattes. Os critérios de inclusão utilizados foram os seguintes: ter título de doutor e ter pelo menos, uma produção científica sobre o tema LS nos últimos 5 anos. Foi considerada como produção científica pelo menos uma das seguintes situações: autoria de dissertação ou tese sobre o tema LS; orientação de dissertação ou tese sobre o tema LS; autoria ou coautoria de livros ou capítulos de livros sobre o tema LS; autoria ou coautoria de artigo sobre o tema LS; responsabilidade por disciplina de pós-graduação (Mestrado ou Doutorado) sobre o tema LS.

O processo de validação foi realizado entre novembro de 2021 e fevereiro de 2022. Para essa etapa, foram utilizados dois formulários, Instrumento de Validação de Conteúdo Educativo em Saúde (IVCES), proposto por Leite et al.29, e o instrumento Suitability Assessment of Materials (SAM), na versão em português30, para realização da avaliação dos roteiros quanto aos fundamentos do letramento em saúde, além de instruções para a interpretação dos tópicos do SAM31. O convite aos juízes para participação do estudo, bem como o envio dos formulários foi feita por meio de correio eletrônico constando o link do Google formulários para acesso ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, aos dois formulários e aos storyboards.

O IVCES utiliza uma escala tipo Likert, com pontuação que varia de zero a dois, sendo utilizadas as seguintes opções para avaliação: 0 - discordo; 1 - concordo parcialmente; e 2 - concordo totalmente e, além disso, é solicitado que os avaliadores registrem as críticas ou sugestões para a melhoria do conteúdo29.

Para a validação do conteúdo pelo IVCES foi utilizado o Índice de Validade de Conteúdo (IVC). Para obter o IVC satisfatório para cada storyboard foi considerada a concordância mínima de 0,80 (domínio e geral) que foi estabelecida pelo seguinte cálculo, soma das respostas “concordo parcialmente (1) e concordo plenamente (2)” dividido pela soma de todas as respostas32.

No caso de discordância de algum item, os especialistas preencheram um espaço destinado a observações e sugestões de modificações. Os itens que obtiveram concordância de 0,80 ou mais foram considerados validados. Aqueles com médias entre 0,75 e 0,80 foram modificados de acordo com as sugestões dos especialistas para serem considerados validados33^,34.

O SAM é um instrumento americano, adaptado para a Língua Portuguesa, e consiste em uma listagem ou checklist, com seis categorias, conteúdo, compreensão do texto, ilustração gráfica, apresentação, motivação e adaptação cultural, distribuídas em 22 itens. Pode ser atribuída pontuação de zero a dois para cada item, sendo que 0 é inadequado, 1 adequado e 2 totalmente, adequado30.

Em relação à análise pelo SAM, verificou-se a adequação do material avaliado aos fundamentos do letramento em saúde. Foi calculado o escore total a partir da soma dos escores obtidos, dividido pelo total de itens do questionário e multiplicado por 100, para transformar em percentual. Este é categorizado em: 70 - 100%; material superior; 40 - 69% material adequado; e 0 - 39% material inadequado31.

O perfil profissional dos juízes foi organizado no software Excel 365, para realização da análise descritiva, com cálculo de frequências absolutas e relativas, além das medidas de tendência central (média) e de dispersão (desvio padrão).

Validação dos vídeos pelas mulheres privadas de liberdade

Após a validação dos storyboards pelos juízes e realização dos ajustes propostos por eles, iniciou-se a fase de produção dos vídeos. Para tanto, utilizou-se narração em áudios, imagens e vídeos do narrador. Os áudios foram produzidos por locução informativa leve, realizada pela própria autora através de um aplicativo de celular gratuito chamado Gravador de Voz versão 3.18 18 e, após a gravação, os áudios foram enviados para o computador.

Os vídeos em que o narrador aparece, foram gravados com o Smartphone, editados no aplicativo InShot 1.815.1352, e enviados para o computador. Após todas as partes que compõem os vídeos estarem prontas utilizou-se o programa Wondershare Filmora 11 para conversão de edições de imagens, vídeos e áudios no formato de vídeo. O formato final de codificação foi o MP4, e os dispositivos para armazenamento foram DVD, pendrive e notebook.

Para avaliação dos vídeos pelo público-alvo, foram utilizados os seguintes critérios para seleção das participantes: não estarem nas celas de isolamento, nem nas celas de reconhecimento e terem bom comportamento. Para as mulheres que atenderam a estes critérios foi informado que seriam exibidos vídeos educativos sobre os temas, Hipertensão Arterial, Epilepsia e Ciclo Menstrual, convidando todas para participar e aquelas que aceitaram o convite foram incluídas no estudo. Para que a seleção fosse feita de forma adequada e tivesse o menor risco para os pesquisadores, a direção do presídio designou agentes penitenciários para realizar essa seleção e o convite.

Esta etapa foi realizada na Cadeia Pública Feminina de Crato com a participação de 92 MPL, em agosto de 2022. Os vídeos foram avaliados por meio do instrumento para avaliação de Tecnologia Assistiva (TA) desenvolvido e validado por Guimarães, Carvalho e Pagliuca35, pois, como referido por Sterns e Riley36, vídeos educativos elaborados sob a perspectiva de baixo letramento em saúde podem se caracterizar como uma tecnologia assistiva.

O instrumento é composto por 19 itens e caracterizado em seis atributos: objetivos, acesso, clareza, estrutura e apresentação, relevância e eficácia, interatividade. A participante deve atribuir nota 0, quando julgar o item inadequado, 1 - parcialmente adequado ou 2 - quando considerar o item adequado. Para se considerar o questionário válido é importante que todos os itens sejam respondidos35.

Realizou-se a seguinte categorização: as respostas parcialmente adequadas e adequadas foram agrupadas como adequada e as respostas inadequadas como inadequadas35. O instrumento de avaliação utilizado não estabelece ponto de corte quanto à concordância de juízes. Desta forma, foi considerado o nível de concordância das respostas positivas acima de 70% para a validação dos vídeos pelas mulheres privadas de liberdade37.

Os vídeos foram reproduzidos por meio de projetor e áudio por caixa de som com potência de alta qualidade. As mulheres foram acomodadas em um espaço utilizado para desenvolver atividades educativas, com cadeiras e espaço para todas estarem sentadas. Logo após a apresentação de cada vídeo foi solicitado às MPL que preenchessem o formulário referente ao vídeo que tinham acabado de assistir. Os vídeos foram apresentados na seguinte ordem: Câncer de Mama (vídeo 1 e 2), Hipertensão Arterial (vídeos 1, 2 e 3), apresentados no período da manhã; Epilepsia (vídeos 1, 2 e 3) e Ciclo Menstrual (vídeos 1, 2, 3 e 4), apresentados no período da tarde.

As avaliações dos vídeos foram feitas todas em único dia por solicitação da direção da Instituição, devido a questões organizacionais. Além do formulário de avaliação, as mulheres foram estimuladas a fazer perguntas, tirar dúvidas ou expressar sua opinião sobre o vídeo, pois o instrumento utilizado para avaliação, não tem espaço destinado a observações e sugestões de modificações. Estes relatos foram registrados em um diário de campo.

O perfil sociodemográfico das participantes foi organizado no Software Excel 365, para realização da análise descritiva, com cálculo de frequências absolutas e relativas, além das medidas de tendência central (média) e de dispersão (desvio-padrão).

Aspectos éticos

O estudo atendeu à Resolução n° 466/12 do Conselho Nacional de Saúde e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará. Todos os participantes do estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

De acordo com a validação realizada pelos juízes e a avaliação das MPL, os vídeos educativos produzidos foram sofrendo alterações para se tornar mais atrativos, instrutivos, interativos e adequados ao nível de letramento em saúde e ao letramento alimentar das mulheres. As Figuras 1, 2 e 3 apresentam algumas cenas dos storyboards produzidos para cada tema.

Figura 1 -
Partes extraídas dos storyboards sobre Hipertensão Arterial. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2022.

Figura 2 -
Partes extraídas dos storyboards sobre Epilepsia. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2022.

Figura 3 -
Partes extraídas dos storyboards sobre Ciclo Menstrual. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2022.

Na validação do tema Hipertensão Arterial dos itens avaliados pelo IVCES todos tiveram concordância entre os juízes ficando com IVC de 1,0. Já o tema Epilepsia teve um IVC total de 0,92 e o tema Ciclo Menstrual ficou com IVC de 0,99, como se observa na Tabela 1.

Tabela 1
Cálculo do Índice de Validade de Concordância dos juízes dos domínios Objetivos, Estrutura/Apresentação e Relevância contidos no Instrumento de Validação de Conteúdo Educativo em Saúde. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2022.

Temas	Hipertensão Arterial		Epilepsia		Ciclo Menstrual
Domínios	Concordo parcialmente e Concordo totalmente	IVC*	Concordo parcialmente e Concordo totalmente	IVC*	Concordo parcialmente e Concordo totalmente	IVC*
Objetivos	100	1	99	0,94	100	1
Estrutura/Apresentação	100	1	99	0,96	99	0,96
Relevância	100	1	97	0,86	100	1
Total	300	1	295	0,92	299	0,99

• * Índice de Validade de Concordância.

Apesar dessa concordância dos juízes acerca do tema Hipertensão Arterial, alguns solicitaram alterações de algumas imagens, como a que mostrava uma pessoa magra, podendo influenciar um padrão de magreza que fosse difícil de ser atingido, e as que ilustravam o sódio e o sal por imagens sem os símbolos NaCl, sendo substituídas por imagem de um saleiro derramando sal. As modificações solicitadas pelos juízes nos storyboards dos três temas foram acatadas e estão descritas no Quadro 1.

Quadro 1 -
Modificações nas informações contidas nos storyboards sugeridas pelos juízes. Fortaleza, 2022.

Hipertensão Arterial		Epilepsia		Ciclo Menstrual
Antes	Depois	Antes	Depois	Antes	Depois
O que a pressão alta tem a ver com o peso?	Como a pressão alta é influenciada pelo peso?	Mas também pode não acontecer isso.	Pode não acontecer nada disso que falei.	Você sabe como funciona nosso ciclo menstrual?	Esse processo de todo mês a mulher ter menstruação alguns dias se chama ciclo menstrual. Você sabe como funciona nosso ciclo menstrual?
Aí você pergunta: como eu faço para diminuir o sódio?	Aí você pergunta: como eu faço para diminuir a quantidade de sódio que eu como todos os dias?	Como aparece de vez em quando, a gente chama de crise epilética.	Como esses sintomas aparecem de vez em quando, a gente chama de crise epilética.	Por isso não esqueça. Não tenha relações sexuais ou use camisinha	Por isso não esqueça. Peça para seu parceiro usar camisinha ou não tenha relações sexuais.

Para o tema Epilepsia, foram realizados ajustes tanto na mudança de imagem como na escrita das informações, pois alguns juízes fizeram sugestões para deixar as informações mais claras e uma imagem mais adequada ao texto. No tema Ciclo Menstrual apesar dos itens referentes às ilustrações e exigência de alfabetização não terem recebido nenhuma avaliação “Inadequado”, foram feitas sugestões pelos juízes para tornar as informações mais claras e as imagens mais adequadas, conforme o Quadro 1.

A análise dos dados obtidos por meio do SAM é apresentada na Tabela 2. Verificou-se que a pontuação geral do SAM foi superior a 80%, classificando os storyboards como material superior para o tema Hipertensão Arterial (85,2%), Epilepsia (88,8%), e Ciclo Menstrual (87,8%).

Tabela 2 -
Avaliação dos juízes quanto ao conteúdo, exigência de alfabetização, ilustrações, layout e apresentação, estimulação/motivação do aprendizado e adequação cultural dos dois storyboards construídos sobre Hipertensão Arterial, Epilepsia e Ciclo Menstrual e destinados a mulheres privadas de liberdade. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2022.

Temas	Hipertensão		Epilepsia		Ciclo Menstrual
Itens avaliados	Classificação		Classificação		Classificação
	Adequado %	Ótimo %	Adequado %	Ótimo %	Adequado %	Ótimo %
1 Conteúdo
1.1 O propósito está evidente	28,6	71,4	14,3	71,4	14,3	85,7
1.2 O conteúdo trata de comportamentos	42,9	57,1	42,9	57,1	14,3	71,4
1.3 O conteúdo está focado no propósito	28,6	71,4	14,3	71,4	14,3	85,7
1.4 O conteúdo destaca os pontos principais	28,6	71,4	14,3	71,4		71,4
2 Exigência de alfabetização
2.1 Nível de leitura	28,6	71,4	14,3	85,7	42,9	57,1
2.2 Usa escrita na voz ativa	28,6	71,4	14,3	85,7	28,6	71,4
2.3 Usa vocabulário com palavras comuns no texto	14,3	85,7	14,3	85,7	28,6	71,4
2.4 O contexto vem antes de novas informações	28,6	71,4		85,7	28,6	71,4
2.5 O aprendizado é facilitado por tópicos	14,3	85,7		85,7	28,6	71,4
3 Ilustrações
3.1 O propósito da ilustração referente ao texto está claro	28,6	71,4	28,6	71,4	28,6	71,4
3.2 Tipos de ilustrações	42,9	42,9	28,6	71,4	28,6	71,4
3.3 As figuras/ilustrações são relevantes	28,6	57,1	14,3	85,7	28,6	71,4
3.4 As listas, tabelas etc têm explicação	28,6	28,6		42,9	42,9	42,9
3.5 As ilustrações têm legenda	28,6	28,6		57,1	14,3	42,9
4. Layout e apresentação
4.1 Característica do layout	42,9	57,1	14,3	85,7	14,3	85,7
4.2 Tamanho e tipo de letra	14,3	57,1	14,3	57,1	28,6	57,1
4.3 São utilizados subtítulos	14,3	57,1		57,1	14,3	42,9
5 Estimulação/Motivação do aprendizado
5.1 Utiliza a interação		71,4		85,7	14,3	71,4
5.2 As orientações são específicas e dão exemplos	28,6	71,4	14,3	85,7	28,6	71,4
5.3 Motivação e autoeficácia	28,6	71,4	14,3	71,4	14,3	71,4
6. Adequação Cultural
6.1 É semelhante à sua lógica, linguagem e experiência	14,3	71,3		85,7	14,3	71,4
6.2 Imagem cultural e exemplos	28,6	57,1		71,4	28,6	71,4

Após a validação dos storyboards pelos juízes e sua adequação quanto às sugestões solicitadas, os vídeos foram avaliados por MPL com idade média de 32,3±10,0 anos (variando 19 - 60), que se autodenominam pardas (69,0%), solteiras, divorciadas ou viúvas (72,7%), com Ensino Fundamental completo (51,9%), sendo que apenas 13,2% tinham Ensino Médio completo.

Com relação ao nível de letramento em saúde e alimentar, elas apresentavam médias baixas de LS, com limitações em ter informações suficientes para cuidar da saúde, ter um cuidado ativo da saúde, ter capacidade de encontrar boas informações sobre saúde e conseguir navegar no sistema de saúde. Em contrapartida, apresentaram potencialidades em ter suporte social para saúde, compreensão e apoio dos profissionais de saúde e compreender as informações sobre saúde e saber o que fazer com elas. Em relação ao LA, 85% delas, tinham letramento alimentar adequado e nenhuma apresentou LA inadequado (Tabela 3).

Tabela 3 -
Letramento em saúde e alimentar de mulheres privadas de liberdade. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2022.

	Média Geral (DP)
Letramento em saúde
Compreensão e apoio dos profissionais de saúde	2,79(0,80)
Informações suficientes para cuidar da saúde	2,10(0,76)
Cuidado ativo da saúde	2,56(0,69)
Suporte social para saúde	2,90(0,87)
Avaliação das informações em saúde	2,72(0,68)
Capacidade de interagir ativamente com os profissionais de saúde	3,49(1,08)
Navegar no sistema de saúde	3,43(1,05)
Capacidade de encontrar boas informações sobre saúde	3,18(1,07)
Compreender as informações sobre saúde e saber o que fazer	3,04(1,17)
Letramento alimentar	N(%)
Adequado Marginal	93(85,0) 16(15,0)

Acerca da avaliação da linguagem quanto à adequação ao nível de letramento das MPL, para o tema Hipertensão arterial foi encontrado um índice de 81,0 antes e de 78,1 depois da avaliação dos juízes, que classificou as informações contidas nos storyboards como um texto muito fácil, exigindo escolaridade de 1º ao 5º ano. Já o tema Epilepsia teve um índice de 71,2 antes e de 70,9 depois, sendo classificado como de fácil entendimento, exigindo escolaridade de 6º ao 9º ano. Para o tema Ciclo Menstrual, obteve-se um índice de 71,0 antes e de 73,6 depois, classificando, dessa forma, os storyboards como material de fácil entendimento.

Todos os vídeos foram considerados adequados, conforme avaliação das MPL, já que a concordância das respostas variou entre 97,8 a 100%, resultados superiores aos estabelecidos para considerar aprovação (Tabela 4). Dos quatro domínios avaliados, a clareza foi o que obteve o maior número de respostas positivas, ficando apenas o item “permite refletir sobre o conteúdo apresentado” do vídeo 3 de Hipertensão Arterial com 98,9%.

Tabela 4 -
Avaliação dos vídeos sobre Hipertensão Arterial, Epilepsia e Ciclo Menstrual por mulheres privadas de liberdade de uma cadeia pública feminina do interior do Ceará. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2021.

Atributos/Itens	Hipertensão Arterial			Epilepsia			Ciclo Menstrual
	Vídeo 1 (n=91)	Vídeo 2 (n=90)	Vídeo 3 (n=92)	Vídeo 1 (n=91)	Vídeo 2 (n=90)	Vídeo 3 (n=88)	Vídeo 1 (n=88)	Vídeo 2 (n=88)	Vídeo 3 (n=89)	Vídeo 4 (n=89)
1.Interatividade
1.1 O conteúdo está adequado às suas necessidades	100	100	100	97,8	97,8	97,8	100	100	100	100
1.2. Oferece interação e envolvimento no processo educativo	100	100	100	100	100	100	100	100	100	100
1.3. Possibilita acessar os tópicos apresentados	100	100	100	98,9	100	100	100	100	100	100
1.4. Fornece autonomia ao usuário em relação à sua operação	100	100	100	100	100	100	100	100	100	100
2. Objetivos
2.1. Estimula aprendizagem sobre conteúdo abordado	100	100	98,9	100	100	100	100	100	100	100
2.2. Estimula aprendizagem de novos conceitos	100	98,9	100	100	100	100	100	100	100	100
2.3. Permite buscar informações sem dificuldades	100	100	97,8	98,9	97,8	100	98,9	100	100	100
2.4. Possui estratégia de apresentação atrativa	100	100	100	100	100	100	100	100	100	100
3. Relevância e eficácia
3.1. Disponibiliza recursos adequados para utilização	100	100	98,9	100	100	100	100	100	100	100
3.2. Desperta interesse para utilizá-la	100	98,9	100	100	100	100	100	100	100	98,9
3.3. Estimula mudança de comportamento	100	100	98,9	100	100	100	100	100	100	100
3.4. Reproduz o conteúdo abordado em diferentes contextos	100	100	100	100	100	100	100	100	100	100
4. Clareza
4.1. Apresenta informações de modo simples	100	100	100	100	100	100	100	100	100	100
4.2. Permite refletir sobre o conteúdo apresentado	100	100	98,9	100	100	100	100	100	100	100

DISCUSSÃO

Os resultados evidenciaram altos índices de concordância dos especialistas quanto ao conteúdo produzido (92,0-100%) e à qualidade do material (superior 80,0%), outrossim, os vídeos foram considerados adequados pelo público-alvo com concordância entre 97,8-100,0%, o que permitiu considerar os vídeos válidos para promover ações educativas com MPL.

A produção do conteúdo dos vídeos baseou-se em diretrizes nacionais e internacionais17^-22, as quais respaldaram cientificamente a construção dos materiais educativos acerca de cada tema.

Ainda são incipientes as pesquisas voltadas à produção de tecnologias educativas para o público privado de liberdade no Brasil. Um estudo que buscou identificar na literatura os tipos de tecnologias educativas utilizadas para abordar o tema Infecções Sexualmente Transmissíveis dentro de presídios femininos, demonstrou que apenas um estudo era brasileiro e que utilizou material impresso e simulador de órgãos genitais, enquanto os estudos realizados nos Estados Unidos, por exemplo, utilizaram vários tipos de materiais como: vídeos e jogos interativos em computadores38.

Além disso, uma publicação recente acerca do cárcere feminino no Brasil demonstrou que os principais temas na área das ciências da saúde estudados pelas universidades brasileiras são relacionados com a prevalência dos agravos à saúde32, demonstrando, portanto, a necessidade de abordar temas que proponham o desenvolvimento de tecnologias educativas e estratégias de educação em saúde para essa população, fato esse apontado também, por outro estudo brasileiro38.

Dessa forma, para que o processo de ensino-aprendizagem seja efetivo é necessário que se empregue tecnologia educativa validada, por conceder maior confiabilidade tanto no uso do material, como conferir maior segurança para as orientações realizadas39.

Além disso, sabe-se que mesmo os indivíduos que sabem ler e escrever podem apresentar incapacidades para compreender e interpretar informações relacionadas à saúde, existindo um desencontro entre o que é dito e o que é realmente compreendido pelo usuário40^-41. Por esse motivo, preocupou-se em desenvolver os vídeos educativos letrados em saúde mediante as demandas identificadas na população-alvo do estudo.

O LS das MPL apresentou limitações tornando necessário o fornecimento de materiais educativos simples e compreensíveis para a população, bem como o aperfeiçoamento da comunicação verbal evitando informações de difícil compreensão42. Diante disso, o conteúdo dos vídeos desenvolvidos neste estudo, buscou incluir temas em saúde de interesse dessas mulheres, levando em consideração, suas necessidades de receber informações e seu nível de LS e LA.

O processo de validação do vídeo educativo proposto nesta pesquisa manteve o rigor metodológico em todas as suas etapas, desde a construção do roteiro e do storyboard até a produção do vídeo propriamente dito. Estudos38^,43 demonstram a importância da avaliação de conteúdo ser feita por profissionais com expertise na área de interesse, visto que contribuem para que o material contenha informações corretas, objetivas e com destaques necessários para garantir a clareza do conteúdo39.

À vista disso, os juízes avaliaram os storyboards com respostas positivas, resultando em IVC’s com a confiabilidade e concordância alta, de acordo com o que é preconizado pela literatura e por estudos que validam materiais educativos, evidenciando assim, a adequabilidade do material ao público a que se destina.

Em relação aos escores do SAM, os storyboards atingiram escores superiores, estando desse modo, adequados para a utilização pelas MPL, demonstrando que a apresentação, ilustrações e layout são atrativos e compreensíveis, comprovando um ganho para o público e para o profissional educador, já que materiais educativos validados conferem uma maior qualidade ao processo de ensino-aprendizagem, reforçando a confiabilidade das orientações apresentadas, salientando o grau de coerência das informações em atender os objetivos propostos44.

As tecnologias voltadas para a educação em saúde devem levar em consideração o contexto popular do público-alvo45, otimizando o texto para que a linguagem não seja confusa e incompreensível e de difícil visualização. Assim, com as alterações realizadas, procurou-se criar um formato atrativo, com conteúdos apresentados de forma clara e simples, para que o material fosse adequado para a educação em saúde de MPL. Esse aspecto foi corroborado pela avaliação das mulheres que julgaram os vídeos adequados.

Outra recomendação feita pelos juízes foi a substituição de algumas imagens. No storyboard de Hipertensão Arterial foi solicitado a substituição de uma imagem que demonstrava pessoa magra por outra que não mostrasse a magreza de uma modelo, mas sim, um corpo magro mais comum. No storyboard de Epilepsia foi solicitada a substituição de uma explicação do narrador por imagem que demonstrasse o tipo de convulsão em que a pessoa fica parada com o olhar fixo, que é mais comum nas crianças. Já no storyboard de Ciclo Menstrual foi realizada a substituição da imagem de um calendário que aparecia na diagonal por outro que aparecia de frente para a tela, dessa forma a visualização ficou melhor.

Vale destacar que as MPL foram incluídas desde o início do processo da criação dos storyboards por meio da escuta de suas necessidades de informações em saúde e a maneira como gostariam de receber essas informações, além de buscar identificar o nível de letramento em saúde e alimentar para adequar as informações em nível de entendimento dessas mulheres. Isso se deve ao fato de acreditar-se que conhecer a realidade do público a que se destina o material educativo torna a abordagem mais participativa, comunicativa e coletiva. A preocupação em abordar os temas com uma linguagem adequada em nível de entendimento dessas mulheres, melhora a efetividade do material educativo e possibilita um maior alcance da estratégia34^,46.

Para evitar que o material tivesse uma linguagem muito avançada em nível de entendimento das mulheres os textos foram produzidos seguindo as instruções encontradas em dois guias para elaboração de materiais digitais23^,47^,48: utilizar palavras claras, curtas, simples e familiares ao público; utilização de sentenças curtas, com no máximo 40 a 50 caracteres; evitar termos técnicos e, na impossibilidade de evitá-los, explicar o termo; utilizar voz ativa; dirigir-se ao usuário quando descrever ações; identificar claramente ao menos uma ação que o usuário possa executar, dividindo-a em passos explícitos e fáceis de seguir; utilizar recursos visuais para facilitar a compreensão; seguir uma ordem lógica e sequencial na apresentação do tema, ilustrando cada passo.

A esse respeito, um estudo avaliou os materiais de educação on-line para pacientes da Academia Americana de Cirurgiões Ortopédicos (AAOS), que servem para melhorar o letramento em saúde de pacientes ortopédicos, e demonstrou que os materiais tinham um nível de legibilidade muito avançado para muitos dos pacientes compreenderem, enfatizando que esforços deveriam ser feitos para ajustar os materiais em nível de legibilidade dos pacientes49.

Para conseguir atingir um grau de legibilidade alto, utilizou-se os fundamentos do letramento em saúde, tendo sido melhorado após a avaliação dos juízes, ficando os storyboards com um ótimo nível de compreensão das informações, o que possibilitará a compreensão do material por pessoas com baixo letramento, bem como as que tenham um nível mais alto. Dessa forma, acredita-se que tenham sido minimizadas as limitações de aprendizagem em consequência da baixa escolaridade ou do baixo nível de letramento em saúde, o que confere ao material uma maior credibilidade30.

Como os vídeos produzidos são voltados à educação em saúde de MPL, tornou-se necessário que, além dos juízes, representantes do público-alvo avaliassem do material. Essa avaliação é necessária, porque oferece oportunidade de sugestões das pessoas visadas pela tecnologia, de forma a permitir a correção de mal-entendidos e adaptações. Estudos realizados nos Estados Unidos e na Alemanha mostraram que as tecnologias educacionais construídas, embora consideradas por profissionais, não foram compreendidas pelo público-alvo49^-50.

CONCLUSÃO

Os vídeos educativos produzidos e validados nesse estudo foram considerados adequados para uso em ações educativas com MPL, configurando-se como uma tecnologia confiável para auxiliar na orientação e estímulo ao autocuidado e à prevenção de agravos como a Hipertensão Arterial, além de promover conhecimento sobre a Epilepsia e as características do Ciclo Menstrual.

O estudo é pioneiro em vários aspectos: construção de material educativo letrado em saúde, para população feminina privada de liberdade e por não restringir os temas abordados ao período reprodutivo, dessa forma, o material elaborado e validado poderá servir de subsídio para várias Instituições prisionais femininas promoverem educação em saúde.

Além disso, a viabilidade do material para uso pelas MPL, constatada neste estudo, pode estimular a produção e validação de tecnologias educativas voltadas às necessidades dessas mulheres, visando facilitar a aprendizagem durante o período do encarceramento e promover um melhor autocuidado e uma melhor qualidade de vida. Como forma de viabilizar o acesso ao material produzido foram disponibilizados de forma gratuita em uma plataforma de vídeos que pode ser acessada por meio de celular, televisão, tablet e notebook, além de ter sido enviado o link de acesso tanto para a direção das duas unidades prisionais como para a Secretaria se Segurança do Estado do Ceará.

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NOTAS

• APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA

  Aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará, parecer n° 5.543.570, Certificado de Apresentação para Apreciação Ética n° 69459317.0.0000.5534.

Editado por

EDITORES

Editores Associados: Glilciane Morceli, Maria Lígia dos Reis Bellaguarda. Editor-chefe: Elisiane Lorenzini.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  10 Jul 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  02 Mar 2023
• Aceito
  18 Abr 2023