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Editorial

EDITORIAL

Antonia Regina Furegato Rodrigues

Professora Titular do Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo

A enfermagem como profissão ainda não atingiu sua maturidade, e até hoje busca sedimentar sua prática e estabelecer um corpo de conhecimentos próprios, ou seja, a construção de um saber técnico e científico específico.

No Brasil, o investimento dos profissionais de enfermagem tem seu marco na década de 70 quando pioneiros, sediados principalmente em universidades da região sudeste, realizaram as primeiras teses orientadas por pesquisadores não enfermeiros.

Estes pioneiros foram os responsáveis pela criação dos cursos de pós-graduação os quais impulsionavam a pesquisa na enfermagem.

Em 1975 teve início o curso de pós-graduação em enfermagem psiquiátrica - nível mestrado, sob a coordenação da Prof. Dra. Maria Aparecida Minzoni, o terceiro no Brasil e, até hoje, o único nesta especialidade.

Em 1978 teve início, também sob a coordenação da Prof. Dra. Maria Aparecida Minzoni, um curso de especialização em enfermagem psiquiátrica de longa duração, preparando técnicos com alto nível de competência para o desempenho profissional nesta área.

A Enfermagem, sem dúvida, é uma profissão que congrega tanto o aspecto da técnica como o da convivência com problemas sociais e convive em estreita relação com o ser humano bio-psico-social.

Da mesma forma, é difícil separar a pesquisa da prática profissional tendo em vista os mais variados problemas que se lhe apresentam no cotidiano de seu desempenho profissional.

Neste contexto, o ensino de enfermagem psiquiátrica acaba sendo o ponto de convergência de grandes contradições, ao mesmo tempo em que avança, tem que manter-se dentro da realidade, pois o conhecimento e a prática não avançam na mesma velocidade e nem sempre na mesma direção.

O Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, responsável pelo ensino, pesquisa e extensão na área de Enfermagem Psiquiátrica, através das coordenações dos Cursos de Mestrados e Especialização, realiza periodicamente o Encontro de Pesquisadores em Saúde Mental (E.P.S.M.) e o Encontro de Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica (E.E.E.P.).

Em 1975 realizou-se o IV E.P.S.M. e III E.E.E.P., no período de 05 a 07 de abril em Ribeirão Preto, congregando 120 participantes oriundos de vários Estados do Brasil ( SP, RJ, MG, PA, PR, AC, BA, MG, MS, CE, PE, RS e PB) e do exterior ( Chile).

Nos dias 03, 04 e 05 de abril, antecedendo a abertura do evento, foram oferecidos dois Cursos que contaram com a participação de profissionais de notório saber.

1- Curso de "Farmacodependência e Alcoolismo", sob a responsabilidade da Prof. Dra. Margarita Antônia Villar Luis. Contou com a presença do Grupo Interdisciplinar de Estudos do Alcoolismo e Farmacodependência (GREA) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, coordenado pelo Prof. Dr. Arthur Guerra de Andrade.

2- Curso "A Evolução do Conceito de Loucura", ministrado pelo Prof. Dr. Isaías Pessoti, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP. Os objetivos do curso foram informar sobre a gênese e evolução do conceito de loucura, desenvolver uma percepção crítica do que se publica na área e caracterizar o conceito de loucura em diferentes épocas.

Segundo a avaliação dos participantes, os Cursos corresponderam às expectativas e ofereceram oportunidades para a discussão de temas atuais.

O IV Encontro de Pesquisadores em Saúde Mental e III Encontro de Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica foi oficialmente aberto pela Profa. Dra. Toyoko Saeki que falou sobre as expectativas dos organizadores em relação ao evento.

A Conferência de Abertura, no dia 05/04/95 proferida pelo Prof. Dr. Benilton Bezerra Junior, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, provocou impacto, inquietação e reflexão no público dada a sua propriedade em abordar o tema em questão: "Saúde Mental e/ou Psiquiatria". O professor trouxe a contribuição de um grande especialista e pesquisador que abordou o assunto articulando os seus diversos aspectos filosóficos, científicos e assistenciais. Esse fato propiciou uma discussão acalorada dada a importância e atualidade da temática junto aos profissionais da área, que atuam na assistência, no ensino ou na pesquisa. Esta Conferência, preparou os participantes para uma postura crítica em relação as suas práticas inseridas em qualquer instância e também ofereceu subsídios para os trabalhos desenvolvidos nos dias subsequentes

A Mesa Redonda do dia 06/04, pela manhã, coordenada pelo Prof. Dr. José Onildo Betioli Contel (Professor do Departamento de Neuropsiquiatria e Psicologia Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP) desenvolveu-se, com o tema "Saúde Mental e/ou Psiquiatria na Atualidade". Contou com os seguintes expositores: Dr. Roberto Tikanori, falou sobre a experiência bem sucedida na desinstitucionalização do doente mental assim como das dificuldades encontradas no desenvolvimento da proposta assistencial da Casa de Saúde Anchieta-Santos; Dr. Flávio J. M. Resmini, da Equipe Multidisciplinar - Nossa Casa de São Lourenço do Sul, expôs sobre sua experiência alternativa, bem como comunitária e participativa servindo como um modelo, de como um município pode contribuir na assistência ao doente mental; Ana Luiza Aranha da Silva do CAPs - Luiz Cerqueira (São Paulo), fez uma descrição do serviço que é organizado em 04 núcleos de Assistência, funcionando 24 horas, atento às altas, à reabilitação, acompanhando-se a evolução de cada paciente, abrangendo ainda a família na comunidade e o trabalho de outros profissionais; Jorge Urrita Rodrigues, de Santiago - Chile, apresentando o trabalho "Corporación de ayuda al paciente mental". A contribuição foi no sentido de abordagem e reabilitação integral de pacientes crônicos na versão tradicional - Educar, Treinar e Adaptar que na realidade chilena vem se mostrando eficiente. Este trabalho em desenvolvimento há 10 anos, pretende, ser ampliado em escala maior, em serviços Estaduais de Saúde de seu país.

Após o término de todas as apresentações foi aberto espaço para os debates entre os presentes, para esclarecimento , dúvidas, discussões e contribuições.

O período da tarde ficou reservado para apresentação dos Temas Livres, Posters e Exposição de Fotos e Vídeos. A programação mostrou o empenho dos profissionais da área ao divulgarem suas experiências, estudos e reflexões, com pesquisas de bom nível que possibilitaram conhecimentos novos, trocas de experiências e discussões evidenciados pela maciça participação e envolvimento dos congressistas. Na sessão de vídeos foram expostos alguns trabalhos de reabilitação em instituições que investem nesta meta há anos. Discutiram-se os avanços, retrocessos e dificuldades, mas sobretudo, os bons resultados em serviços que investem no resgate do cidadão.

O Simpósio "Assistência/ Estudo/ Pesquisa", ocorreu no dia 07/04 pela manhã, coordenado pela Profa. Dra. Margarita Antônia Villar Luis, com a participação dos seguintes expositores: Dr. Jairo Ideo Goldberg do CAPs - Luiz Cerqueira (São Paulo), que falou sobre o trabalho do CAPs, sublinhando as etapas pelas quais se passou de uma assistência na qual o paciente era considerado como objeto (visto sob a perspectiva "causa" e "efeito" no processo saúde-doença) para a perspectiva do indivíduo "sujeito" dotado de "autonomia" que necessita ser acolhido, ser "ajudado". O conferencista salientou que nesse processo, todos os membros da equipe de saúde sentem-se envolvidos e comprometidos, que o CAPs funciona 24 horas diariamente, atento às altas, à reabilitação, à doença lenta e progressiva de cada paciente, envolvendo a família do paciente, sua comunidade e outros profissionais; Dr. Alfredo Schechtman, da Coordenadoria de Saúde Mental do Ministério da Saúde - Brasília, que destacou os esforços da Coordenadoria de Saúde Mental do Ministério da Saúde, através de portarias, no sentido de reverter a situação política da saúde mental no Brasil, de dar apoio ao programa de desospitalização e outras alternativas de assistência a serem oferecidas ao doente mental; Profa. Dra. Cristina Loyola Miranda, do Instituto de Psiquiatria da UFRJ (Rio de Janeiro), que abordou a questão do "Ensino em Saúde Mental" partindo da constatação de que o aumento do conhecimento não tem melhorado a prática da assistência médica e de enfermagem nesta especialidade e que o ensino deve estar mais voltado para a realidade. Propõe, para isso uma Enfermagem em Saúde Mental que interesse a todos e supere a crise de conceitos, de hierarquização, de burocratização e que a carga teórica e os estágios sejam suficientes e capazes de superar o impacto do encontro do estagiário com o paciente. Propõe ainda que se busque a mudança do cenário da prática desproporcional de 01 enfermeiro para cada 70 pacientes, que se acabe com a dicotomia "pedagogia x assistência" , com o descompasso entre " sala de aula e estágio" e com a questão do "turno do trabalho" , onde o enfermeiro fica sem ver o paciente por 05 dias. A conferencista questionou como o enfermeiro pode ser agente terapêutico nesta situação? Propôs também que se reveja o conceito de avaliação como um ato pedagógico e não uma punição e com ela verificar se o aluno atingiu o perfil esperado, ou seja, se aprendeu o relacionamento terapêutico; Dr. João de Azevedo Marques, Coordenador do Programa de Saúde Mental do Município, que falou sobre a proposta para a cidade de Ribeirão Preto. Mostrou que a área de Saúde Mental nunca teve a atenção necessária, sendo portanto muito recente a implantação da coordenação voltada à articulação da execução dos serviços de atendimento à Saúde Mental (pelo município). Mencionou a aprovação da Lei 6.820 de 07/06/1994, publicada D .O .M. em 15/07/1994, que regulamenta a reforma psiquiátrica em Ribeirão Preto e dá outras providências. Propõe a curto prazo, a implantação de alguns núcleos/centros de Atenção Psicossocial (NAPs/CAPs) em locais estratégicos, possivelmente em algumas Distritais de Saúde, mas como primeira experiência o primeiro NAPs não será articulado a qualquer Serviço de Saúde. Refere no entanto, a necessidade de articulação com outros serviços já existentes, de serem referenciados, integrados a uma rede descentralizada e hierarquizada em saúde mental. O processo esta sendo implantado lentamente, mas acredita em novas propostas e condições para concretizar melhor e expandir a assistência em Saúde Mental; a Profa. Dra. Antonia Regina Furegato Rodrigues, do Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto -USP, expôs sobre o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem de Saúde Mental e/ou Psiquiatria. Primeiramente enfocou a questão do pesquisador em enfermagem, analisando os requisitos e predisposição para a pesquisa, para a leitura, etc...; historiou a pesquisa em enfermagem psiquiátrica, seus problemas, questões metodológicas, apresentou as qualidades do pesquisador (interesse, competência e disciplina) e a necessidade de um meio estimulante. Depois tratou da pesquisa em si, sublinhando as dificuldades de definição da Enfermagem, da definição de campo de atuação, e da importância do avanço das ciências com o uso de novos paradigmas. Também foi mencionada a questão da temática e do método bem como as novas atitudes do pesquisador na área da Psiquiatria e Saúde Mental e os rumos da pesquisa na área. Após esta apresentação, abriu-se o espaço aos presentes para os debates.

A Sessão de Encerramento do IV Encontro de Pesquisadores em Saúde Mental e III Encontro de Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica focalizou a importância deste evento e os agradecimentos a todos que colaboraram e prestigiaram ( CNPq - FAPESP - FAEPA - Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto - EERP-USP -Banespa ).

A avaliação dos participantes do EPSM e III EEEP mostrou que o evento constituiu-se em um espaço importante e necessário aos profissionais da área que desejam discutir tendências atuais, rever posturas assistenciais e adquirir conhecimentos, bem como trocar informações e experiências realizadas em diversas regiões do país e do exterior.

A Comissão Organizadora do Encontro, elaborou ainda, um questionário solicitando avaliação dos trabalhos. Os resultados mostraram que as comissões trabalharam a contento, dentro de suas atribuições. Foram feitas importantes sugestões, que muito contribuirão para elaboração dos próximos Encontros. Os temas sugeridos para os futuros eventos foram relevantes e um desafio para começar desde já o planejamento de novas empreitadas. Os temas mais indicados foram: O trabalho multidisciplinar em Saúde Mental (formação, capacitação, Treinamento em serviço e supervisão do pessoal de Enfermagem); A humanização da assistência de Enfermagem em saúde mental e psiquiatria; O enfermeiro em atividades grupais - atitudes e ações; Gerenciamento em Saúde Mental; Ensino em Saúde Mental (estágio curricular, tendências atuais); Saúde Mental com populações sadias - prevenção; Práticas alternativas em Saúde Mental; e Inter consulta em Saúde Mental.

A comissão de temas empenhou-se ainda em duas tarefas importantes, a montagem dos Anais do IV Encontro de Pesquisadores em Saúde Mental e III Encontro de Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica e a seleção dos melhores trabalhos para publicações neste número especial da Revista Latino Americana de Enfermagem.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Nov 2005
  • Data do Fascículo
    Maio 1997
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