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Idosos que foram vítimas de acidentes de trânsito no município de Ribeirão Preto-SP, em 1998

Elderly people victimized by traffic accidents in the city of Ribeirão Preto-SP, Brazil in 1998

Ancianos que fueron víctimas de accidentes de tránsito en el municipio de Ribeirão Preto, en 1998

Resumos

O aumento da população idosa mundial vem acarretando uma série de estudos sobre os efeitos dos acidentes externos nessa população. Este estudo objetivou caracterizar os idosos, vítimas de acidentes de trânsito, atendidos em um hospital governamental de Ribeirão Preto, São Paulo. Realizou-se um estudo retrospectivo, utilizando os dados coletados pelo Serviço de Vigilância Epidemiológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Analisaram-se os dados relativos a 112 vítimas, com idade entre 60 e 85 anos, de janeiro a dezembro de 1998. Assim sendo, pode-se então observar que, entre elas, 56,3% das vítimas eram do sexo masculino e 42% com idade entre 60 e 64 anos de idade. A maior parte dos sujeitos era pedestre (41,4%), tendo sido a cabeça a área corporal mais lesada (36,7%). É importante salientar que 50,9% tiveram algum tipo de seqüela decorrente do trauma sofrido. Este trabalho visou dar destaque ao tema, salientando a importância de estudos na área da gerontologia, associada aos acidentes de trânsito.

idoso; acidentes; ferimentos e lesões


The considerable increase in the elderly population is resulting in several studies on the effects of external accidents to the population included in this age band. This study aimed at characterizing the elderly people victimized by traffic accidents and assisted in a public hospital in the City of Ribeirão Preto-SP, Brazil. A retrospective study was conducted using the data collected by the Epidemiological Surveillance Services of the University of São Paulo at Ribeirão Preto Faculty of Medicine. The data referring to 112 victims aged 60 to 85 years were analyzed from January to December, 1998. In this way, it can be observed that, among them, 56,3% of the victims are males and 42% are aged 60 to 64 years. Most of the subjects were pedestrians (41,4%) and their most frequently injured body area was the head (36,7%). It is important to point out that 50,9% had some type of sequel resulting from the trauma. This work aimed at emphasizing such theme by pointing out the importance of studies in the area of gerontology associated with traffic accidents.

elderly; accidents; wounds and injuries


El aumento de la población anciana ha motivado una serie de estudios sobre los efectos de los accidentes externos en esta faja de edad. Este estudio pretendió caracterizar los ancianos víctimas de accidentes de tránsito atendidos en un hospital gubernamental de Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. Se realizó un estudio retrospectivo, utilizándose los datos recolectados por el Servicio de Vigilancia Epidemiológica del Hospital de Clínicas de la Facultad de Medicina de Ribeirão Preto de la Universidad de São Paulo. Fueron analizados los datos relacionados a 112 víctimas, con edad entre 60 y 85 años, entre enero y diciembre de 1998. Como resultados, los autores observaron que 56,3% de las víctimas son del sexo masculino y 42% con edad entre 60 y 64 años. La mayor parte de los sujetos andan a pie (41,4%), siendo la cabeza el área corporal más lesionada (36,7%). Es importante resaltar que 50,9% tuvieron algún tipo de secuela debido al traumatismo sufrido. Este trabajo buscó destacar el tema, enfatizando la importancia de estudios en el área de gerontología asociada a los accidentes de tránsito.

anciano; accidentes; heridas y traumatismos


ARTIGO ORIGINAL

Idosos que foram vítimas de acidentes de trânsito no município de Ribeirão Preto-SP, em 1998

Elderly people victimized by traffic accidents in the city of Ribeirão Preto-SP, Brazil in 1998

Ancianos que fueron víctimas de accidentes de tránsito en el municipio de Ribeirão Preto, en 1998

Renata SilveiraI; Rosalina Aparecida Partezani RodriguesII; Moacyr Lobo da Costa JúniorIII

IAluna de Graduação em Enfermagem, Bolsista Iniciação Científica-FAPESP

IIProfessor Associado, e-mail: rosalina@eerp.usp.br

IIIProfessor Doutor. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o desenvolvimento da pesquisa em enfermagem

RESUMO

O aumento da população idosa mundial vem acarretando uma série de estudos sobre os efeitos dos acidentes externos nessa população. Este estudo objetivou caracterizar os idosos, vítimas de acidentes de trânsito, atendidos em um hospital governamental de Ribeirão Preto, São Paulo. Realizou-se um estudo retrospectivo, utilizando os dados coletados pelo Serviço de Vigilância Epidemiológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Analisaram-se os dados relativos a 112 vítimas, com idade entre 60 e 85 anos, de janeiro a dezembro de 1998. Assim sendo, pode-se então observar que, entre elas, 56,3% das vítimas eram do sexo masculino e 42% com idade entre 60 e 64 anos de idade. A maior parte dos sujeitos era pedestre (41,4%), tendo sido a cabeça a área corporal mais lesada (36,7%). É importante salientar que 50,9% tiveram algum tipo de seqüela decorrente do trauma sofrido. Este trabalho visou dar destaque ao tema, salientando a importância de estudos na área da gerontologia, associada aos acidentes de trânsito.

Descritores: idoso, acidentes, ferimentos e lesões

ABSTRACT

The considerable increase in the elderly population is resulting in several studies on the effects of external accidents to the population included in this age band. This study aimed at characterizing the elderly people victimized by traffic accidents and assisted in a public hospital in the City of Ribeirão Preto-SP, Brazil. A retrospective study was conducted using the data collected by the Epidemiological Surveillance Services of the University of São Paulo at Ribeirão Preto Faculty of Medicine. The data referring to 112 victims aged 60 to 85 years were analyzed from January to December, 1998. In this way, it can be observed that, among them, 56,3% of the victims are males and 42% are aged 60 to 64 years. Most of the subjects were pedestrians (41,4%) and their most frequently injured body area was the head (36,7%). It is important to point out that 50,9% had some type of sequel resulting from the trauma. This work aimed at emphasizing such theme by pointing out the importance of studies in the area of gerontology associated with traffic accidents.

Descriptors: elderly, accidents, wounds and injuries

RESUMEN

El aumento de la población anciana ha motivado una serie de estudios sobre los efectos de los accidentes externos en esta faja de edad. Este estudio pretendió caracterizar los ancianos víctimas de accidentes de tránsito atendidos en un hospital gubernamental de Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. Se realizó un estudio retrospectivo, utilizándose los datos recolectados por el Servicio de Vigilancia Epidemiológica del Hospital de Clínicas de la Facultad de Medicina de Ribeirão Preto de la Universidad de São Paulo. Fueron analizados los datos relacionados a 112 víctimas, con edad entre 60 y 85 años, entre enero y diciembre de 1998. Como resultados, los autores observaron que 56,3% de las víctimas son del sexo masculino y 42% con edad entre 60 y 64 años. La mayor parte de los sujetos andan a pie (41,4%), siendo la cabeza el área corporal más lesionada (36,7%). Es importante resaltar que 50,9% tuvieron algún tipo de secuela debido al traumatismo sufrido. Este trabajo buscó destacar el tema, enfatizando la importancia de estudios en el área de gerontología asociada a los accidentes de tránsito.

Descriptores: anciano, accidentes, heridas y traumatismos

CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Desde 1960, o Brasil vem sofrendo um processo denominado transição demográfica, passando de uma pirâmide de base mais larga com forma triangular e população predominantemente rural–características de regimes demográficos de altas taxas de fecundidade e de mortalidade–para uma forma mais arredondada, de base reduzida–característica de regimes demográficos de grande redução na fecundidade e com população predominantemente urbanizada(1). Os países mais desenvolvidos passam por esse processo de forma gradual, mas o Brasil, assim como outros países em desenvolvimento, está se tornando um país envelhecido de forma brusca, não conseguindo viabilizar mudanças econômicas e sociais que propiciem melhor qualidade de vida ao idoso.

O crescimento mundial da população idosa e o aumento da esperança de vida têm ocorrido devido a várias causas, dentre elas podem ser assinaladas a tecnologia aplicada à saúde e o grau de instrução da população(2).

O conceito de idoso deve levar em consideração a idade cronológica do indivíduo e o grau de desenvolvimento do país em que vive. Ele é considerado idoso ao completar 65 anos de idade num país desenvolvido, e nos países em desenvolvimento aos 60 anos(2). Entretanto, quando se pretende realizar um estudo em que será agrupada essa parcela da população, utiliza-se o ponto de vista cronológico, levando-se em consideração o limite inferior de 60 anos de idade(3).

O aumento da população idosa é relevante porque já supera o da população total. Em Ribeirão Preto, a população maior de 60 anos perfaz 8,9% do total de habitantes, segundo dados estatísticos publicados pelo IBGE no ano 2000, enquanto para a população total brasileira, os maiores de 60 anos perfazem 8,5%, nesse mesmo ano(4).

É relevante destacar o crescimento da população de idosos no Estado de São Paulo. Em 1980, a população idosa perfazia um total de 1,3%, em 2000, esse número foi para 1,7%, em relação ao total da população brasileira. Segundo dados estatísticos, 20% da população idosa brasileira está concentrada nesse Estado(4).

A idade mediana da população brasileira (idade que separa os 50% mais jovens dos 50% mais velhos) aumentou dois anos e meio em nove anos, alcançando, em 2000, o patamar dos 24,2 anos, sendo de 23,5 anos para os homens e 24,9 anos para as mulheres. A idade mediana em 1991 era 21,7 anos(4).

Na composição por idade, no País como um todo, a contribuição do segmento de crianças de 0 a 14 anos no total da população caiu de 34,73% em 1991, para 29,60% em 2000. O grupo de idosos de 65 anos ou mais, por sua vez, seguiu, no mesmo período, trajetória ascendente: 4,83% em 1991, contra 5,85%, em 2000(4).

A preocupação com o aumento da população idosa tem repercutido nos meios sociais, econômicos, políticos e educacionais e têm sido divulgados relatos de experiências relativas ao ensino, à assistência e à pesquisa com o idoso. Para esse grupo etário, as necessidades de recursos financeiros para a questão da assistência médica e reabilitação são também apreciáveis, em razão da alta prevalência de doenças crônicas não transmissíveis.

O aumento da vida média do ser humano gerou a necessidade da gerontologia social, com o objetivo de cuidar das leis que protegem os idosos no que se refere às suas interações, ou seja, seu relacionamento na sociedade e na família, estabelecendo programas de recreação, de ocupação do tempo livre e de aprendizado.

No meio científico, vários trabalhos sobre o envelhecer vêm sendo divulgados, principalmente devido ao crescente conhecimento da Gerontologia1 1 Gerontologia: diz respeito ao estudo científico do fenômeno do envelhecimento . Já a área da saúde tem investigado as morbidades mais freqüentes entre os idosos, associadas muitas vezes ao processo de envelhecimento. O envelhecimento da população implica em uma série de alterações físico-biológico-sociais, possibilitando aumentar o grau de doenças, acarretando mais gastos para o Sistema de Saúde. Outro aspecto é que também tem-se elevado o número de aposentadorias, onerando a Previdência Social Brasileira, considerando que, cada vez mais, a população ativa tem saído do mercado de trabalho.

Os idosos são afetados por vários problemas e dentre eles estão os acidentes, sejam domiciliares ou de trânsito. Os idosos afetados por causas externas são normalmente pessoas independentes que, após os acidentes, muitas vezes, perdem essa condição, deteriorando sua saúde física e mental. A invalidez é definida "como uma limitação parcial ou total das atividades da vida normal de uma pessoa"(5). Muitos dos idosos observados pelos pesquisadores apresentam apenas problemas que se relacionam às suas perdas físicas e psíquicas, decorrentes da própria idade, o que não os incapacitam de viver uma vida normal. Por trabalharem e transitarem pelas ruas de forma natural, eles se defrontam com um dos maiores problemas de saúde pública de nossos dias, os acidentes de trânsito.

A relevância desses acidentes engloba três enfoques: a alta morbimortalidade, sua predominância em populações jovens e/ou economicamente ativas e o seu elevado custo aos sistemas de saúde e previdência(6).

Na literatura, há vários trabalhos que discorrem sobre a violência no trânsito, demonstrando assim a sua importância no comprometimento da saúde das pessoas de diversas faixas etárias. Os dados sobre mortalidade no Brasil, obtidos pelo Sistema de Informação de Mortalidade do Ministério da Saúde, entre os anos de 1984 e 1994, comparado aos dados relativos a mortes por causas externas, mostram que as taxas para o sexo masculino saltam a partir da faixa dos 15 aos 19 anos, mantendo-se em níveis elevados nas idades subseqüentes, dando outro salto a partir dos 70 anos(7).

A violência no trânsito afeta os idosos, pois esses são mais vulneráveis a traumas, têm capacidade reduzida de recuperação, ficam maior tempo hospitalizados com traumatismos e lesões mais graves e a mortalidade é significativamente maior do que aquela dos pacientes mais jovens, devido ao próprio processo de envelhecimento.

A violência contra a população em geral é muito discutida no meio científico mundial, mas infelizmente sua ação na crescente população idosa ainda é um fato despercebido. Isso ocorre em virtude de opiniões equivocadas que defendem a tese de que o investimento para a pesquisa na área da velhice pode ser aplicado em outros campos, pois consideram a produção internacional, particularmente a americana e a inglesa, bastante intensa e suficiente para o delineamento global da situação dos idosos e para uma tomada de decisões.

O tipo de acidente que provocou maior número de vítimas fatais entre os pacientes internados em hospitais gerais foi o atropelamento(6). O número de atropelamentos é considerado alto na população menor de 20 anos e maior de 70 anos de idade(8); sendo esses últimos as principais vítimas, devido às alterações físicas próprias do envelhecimento (mobilidade mais restrita, falta de atenção, dificuldades visuais e auditivas, e outras), mesmo nos idosos mais ativos, e, também, como resultado da intransigência de nossos motoristas.

A relação dos acidentes de trânsito com a medicina não está restrita apenas aos óbitos que provocam. Há necessidade de assistência médica, principalmente de urgência e emergência, nas complicações que podem levar à incapacidade física, a amputações, à invalidez e à morte.

Na situação de acidentes de trânsito, o maior problema é o tipo de atendimento de emergência dado a esses pacientes, pois o sistema de saúde no Brasil ainda não implantou uma especialidade relativa ao tratamento de urgência voltado à população idosa, por serem a Gerontologia e a Geriatria2 2 Geriatria: refere-se ao tratamento médico do idoso e de suas doenças especialidades ainda em desenvolvimento. Os objetivos específicos de atendimento pré-hospitalar são: estabilizar as funções respiratórias, ventilatórias e hemodinâmicas; não agravar o dano, evitando condutas inadequadas durante a remoção do paciente, resguardando as funções vitais durante o transporte do paciente(9). Entretanto, o que se observa é a inexistência de pesquisas nessa área, em nosso país, fato que tem levado a inquietações frente às mudanças demográficas.

Dessa forma, este trabalho tem como objetivo a caracterização dos idosos, vítimas de acidentes no trânsito, que deram entrada em um Hospital governamental no município de Ribeirão Preto-SP, no ano de 1998.

MATERIAL E MÉTODOS

A proposta deste trabalho foi a realização de estudo retrospectivo com pessoas maiores de 60 anos de idade, de ambos os sexos, que foram expostas a algum tipo de acidente de trânsito e que foram atendidas em um hospital público do município de Ribeirão Preto-SP, no período de janeiro a dezembro de 1998.

O hospital público escolhido foi o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, e as vítimas foram atendidas na Unidade de Emergência desse hospital.

Utilizou-se o instrumento de coleta de dados do Serviço de Vigilância Epidemiológica do mesmo hospital e as variáveis de estudo escolhidas foram:

1. variáveis pessoais:

– idade: em anos completos, quando ocorreu o acidente, a partir dos 60 anos, analisados segundo intervalos qüinqüenais;

– sexo: masculino e feminino.

2. variáveis do acidente:

– local: área da cidade;

– descrição do acidente de acordo com a décima Classificação Internacional de Doenças (CID X);

– período: dia da semana e hora.

3. tipos de lesões:

– área corporal atingida;

– lesão principal, com base na décima Classificação Internacional de Doenças (CID X).

4. evolução do paciente:

– duração média da internação;

– condições de saída: alta, óbito ou transferência.

Foram realizados agrupamentos, segundo os capítulos XIX e XX da décima Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID X), diferenciando o tipo de acidente e o trauma envolvido. Elaborou-se um banco de dados, utilizando-se o programa Epi-info de domínio público.

Quanto aos aspectos éticos, manteve-se o anonimato da clientela estudada, tendo sido esta pesquisa aprovada pela Comissão de Ética do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os indicadores de mortalidade no Brasil, assim como em Ribeirão Preto, mostram a importância de estudos que demonstrem como essa população é mais afetada, principalmente no que se refere a causas externas. No município de Ribeirão Preto, observa-se índice de mortalidade maior que o do restante do país como um todo. Enquanto as causas externas representam 13% dos óbitos no Brasil, no município de Ribeirão Preto elas chegam 15%, aproximadamente, como pode ser detectado na Tabela 1.

Em números absolutos, no período entre 1996 e 1997, ocorreram no Brasil 8552 acidentes envolvendo pessoas com mais de 60 anos de idade; desses, 2138 ocorreram no Estado de São Paulo(11). Em Ribeirão Preto, os dados colhidos apontaram 185 casos referentes a 8,6% do Estado, número bastante elevado, levando-se em consideração as taxas de mortalidade.

As vítimas de acidente de trânsito que foram a óbito nos hospitais de Ribeirão Preto-SP e região somaram: em 1993, 213 pacientes; em 1994, 297 e, em 1995, 242(11). Os hospitais de Ribeirão Preto e região têm contribuído significativamente para o atendimento de pacientes, vítimas de trauma, sendo o Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, Unidade de Emergência, o centro de referência para esse tipo de atendimento na região.

O número total de vítimas socorridas por acidentes de trânsito no hospital público estudado, no município de Ribeirão Preto–SP, no ano de 1998, foi de 2882, sendo 3,9% maiores de 60 anos de idade. Vale ressaltar, entretanto, que 10,7% das vítimas foram a óbito.

Ao proceder à análise das vítimas de acidentes de trânsito, verificou-se que 56,3% dos casos eram do sexo masculino e 43,7% do feminino. Pode-se observar, na Figura 1, a distribuição da freqüência dos acidentados, de acordo com sexo e idade.


A análise dos coeficientes, segundo a idade, mostra que a mortalidade masculina aumenta progressivamente com o passar da idade(12). A Figura 1 apresenta os homens que estão na faixa etária de 60 a 64 anos como as maiores vítimas dos acidentes de trânsito. A provável hipótese para tal índice é que os homens, nessa faixa etária, estão mais expostos a acidentes por circularem com maior freqüência no perímetro urbano, enquanto as mulheres ficam mais nas proximidades de suas casas.

Os dados referentes às descrições de acidentes ocorridos em Ribeirão Preto, no ano de 1998, demonstram: em 41,4% dos casos as vítimas eram pedestres; 32,4% eram passageiros de automóvel; 11,7% eram ciclistas, e 11,7% passageiros de ônibus. Em 0,9% dos casos, as vítimas eram condutores de veículos agrícolas e em 1,8%, motociclistas.

Quanto à área corporal das vítimas, 36,7% apresentaram lesões na cabeça e/ou pescoço; 15,6% tiveram traumatismo em múltiplas regiões do corpo; 14,7% nos membros superiores; 14,7% nos membros inferiores e 6,4% no tronco. Em 6,4% dos casos houve internação da vítima para observação pós-acidente e em 8,1% o campo do formulário correspondente ao item não foi preenchido.

No que se refere à seqüela das vítimas, observa-se, na Figura 2, a distribuição dos idosos acidentados, segundo a condição de alta e faixa etária. A maioria, 50,9% das vítimas, apresentou algum tipo de seqüela. Os tipos de seqüela foram considerados: de grau leve, moderado ou grave. Tais seqüelas, associadas muitas vezes às condições crônicas dos idosos, podem contribuir para proporcionar-lhes incapacidade física, após o acidente de trânsito. O número de vítimas idosas que evoluiu para óbito perfaz 10,7%. Esses dados mostram um alto coeficiente de mortalidade causado pelo acidente.


Os politraumas3 3 Politraumatismo: lesão em abdome, tórax ou cabeça associado a significativas fraturas de ossos longos ou uma grande fratura de osso em combinação com uma fratura de pelve (14) em idosos são casos incomuns(13) e o número de vítimas com esse tipo de lesão perfaz um total de 15,1%, enquanto aquelas que apresentaram algum tipo de lesão na cabeça e/ou pescoço totalizaram 35,7%.

Os índices de gravidade foram quase iguais, comparando-se idosos e adultos jovens, mas os maiores índices de mortalidade em idosos devem-se às condições preexistentes nessa faixa etária(14).

Com relação ao tempo de internação dos idosos, verificou-se que 67,9% deles não permaneceram internados após o atendimento de urgência; 14,4% ficaram internados por um dia, 11,6% por uma semana e 6,3% por um período maior que uma semana, chegando até mesmo a 30 dias.

Analisando-se o horário dos acidentes constatou-se que 25% dos casos ocorreram entre 15 e 20 horas. Ao analisar a anotação dos dados, verificou-se a falta de preenchimento de alguns, prejudicando a análise. Nas estradas, o período que concentrou maior número de acidentes foi entre 21 e 8 horas, totalizando 8% dos casos.

Os finais de semana foram o período com maior concentração de acidentes com os idosos. Fato semelhante ocorre nas faixas etárias mais jovens.

Quanto ao local em que ocorreram os acidentes, de acordo com a Figura 3, pode-se observar que a maior parte deles ocorreu no município de Ribeirão Preto-SP (42% das vítimas estudadas), sendo essas as mais prejudicadas por esse tipo de violência urbana.


Analisando-se os dados referentes à característica do acidentado e suas condições de alta, na Figura 4, é possível observar que os pedestres são os mais afetados pelos acidentes que envolvem veículos a motor, já que dos 46 pedestres estudados, 27 tiveram algum tipo de seqüela. Nessa Figura, o número total de vítimas foi igual a 110, em conseqüência de algumas falhas encontradas no sistema de notificação.


À GUISA DE ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

O estudo sobre violência no trânsito envolvendo idosos é emergente. Face ao problema de saúde pública, as seqüelas, incapacitações e a morte são ocorrências mais freqüentes.

Nesta pesquisa, em particular, estudou-se apenas um município importante localizado na região Nordeste do Estado de São Paulo. Entretanto, pode-se observar nos dados que a questão merece atenção especial da sociedade e dos pesquisadores, uma vez que a maioria dos sujeitos era pedestre, seguido de passageiros de automóveis, ciclistas e passageiros de ônibus.

Frente ao achado, questiona-se como a sociedade deve se organizar com o objetivo de prevenir as violências de trânsito com os idosos.

Tendo em vista os danos causados pelo trauma, a prevenção seria a melhor forma de solucioná-lo e, como isso não ocorre, os acidentes continuam acontecendo no meio urbano. Para enfrentar a problemática, o poder público juntamente com as instituições educacionais e de saúde deveriam criar sistemas de atendimento ao traumatizado em suas grandes vertentes: prevenção, atendimento pré-hospitalar, atenção hospitalar e reabilitação biopsicossocial(11).

A implementação de medidas preventivas para esses casos torna-se necessária, principalmente em relação às leis vigentes no País, que poderiam contribuir para diminuir o número de acidentes em geral. É difícil pensar que o maior responsável por tais atos seja o próprio ser humano. A maior parte dos acidentes de trânsito é conseqüência de falhas do condutor do veículo(11). Em razão desses dados, é evidente a necessidade da implantação de programas de educação no trânsito, extensivos a todos os motoristas brasileiros, tais como: cursos e palestras de direção defensiva, mecânica básica de carros e primeiros socorros, cursos esses que estão sendo realizados em todas as cidades do Brasil, de acordo com a nova Legislação Brasileira de Trânsito.

O poder público juntamente com os meios de comunicação deveriam realizar projetos que intensificassem a educação no trânsito, para maior divulgação da sinalização nas ruas e rodovias, para que, assim, não só os motoristas, mas também os pedestres se familiarizassem com a mesma. Outro meio que pode ser utilizado na orientação de pedestres seria a implantação de disciplinas, nas escolas, sobre educação no trânsito.

Algumas medidas de prevenção são ainda recomendadas, entre elas, podem-se citar: canalização do tráfego; melhoria das condições físicas das ruas e adjacências; evitar situações ambíguas para os condutores; uso de capacete, roupas brilhantes e faróis acesos também durante o dia para motociclistas, e à noite para os demais motoristas; alerta contínuo à população sobre o uso do álcool e seus efeitos e conscientização dos políticos sobre o que representam os acidentes de trânsito, de modo que a distribuição de verbas seja melhor estudada(15).

A violência é um fenômeno social, uma construção histórica. Não se conhece nenhuma sociedade que não seja violenta. Ela está relacionada às questões sociais e culturais, e como se observa atualmente os acidentes de trânsito são, entre os tipos de violência urbana, o que mais preocupa a saúde pública. Por isso, a educação é uma ferramenta importante na prevenção.

Utilizando como base o presente estudo, outra proposta de prevenção de acidentes de trânsito, envolvendo a população idosa, é a realização de programas que orientem os idosos a caminhar em locais menos movimentados, já que a maior parte das vítimas de acidentes de trânsito são pedestres.

Recebido em: 16.6.2001

Aprovado em: 6.9.2002

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  • 1
    Gerontologia: diz respeito ao estudo científico do fenômeno do envelhecimento
  • 2
    Geriatria: refere-se ao tratamento médico do idoso e de suas doenças
  • 3
    Politraumatismo: lesão em abdome, tórax ou cabeça associado a significativas fraturas de ossos longos ou uma grande fratura de osso em
    combinação com uma fratura de pelve
    (14)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Set 2003
    • Data do Fascículo
      Dez 2002

    Histórico

    • Aceito
      06 Set 2002
    • Recebido
      16 Jun 2001
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