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Álcool e outras drogas: leventamento preliminar sobre a pesquisa produzida no Brasil pela enfermagem

Alcohol and drugs: preliminary survey of Brazilian nursing research

Alcohol y otras drogas: inventario preliminario sobre la investigación producida por la enfermería brasileña

Resumos

Trata-se de pesquisa bibliográfica sobre conhecimento produzido pela enfermagem brasileira no tema álcool e outras drogas até 2004, cadastrado em bases de dados on line, com propósito de identificar sua presença; a origem desse conhecimento; os meios de sua divulgação e analisar tendências dessa produção. Utilizou-se: BIREME, CAPES, Banco de Teses e Dissertações da USP. Os resumos constituíram material base; considerou-se aqueles de autoria ou co-autoria com enfermeiros. Utilizando descritores comuns ao tema, obteve-se 218 resumos produzidos em três períodos: antes de 1980, década de 90 e de 2000 a 2004. A partir de noventa a produção incrementou (29,8% do total); predominam artigos científicos (50,4%) e dissertações (37,2%). O conhecimento tendeu para três categorias temáticas: uso de álcool e outras drogas (62,9%); populações vulneráveis (27,5%), e usuários de álcool e outras drogas (9,6%). Álcool e drogas foi resultado adicional de muitos estudos (comorbidades) e 38,4% dos artigos apareceram em revistas de outras áreas da saúde.

pesquisa em enfermagem; álcool; drogas; alcoolismo


This bibliographic study surveys knowledge about alcohol and drugs produced by Brazilian nursing until 2004 and registered in online databases, in order to identify the presence of this theme; the origin of this knowledge and means of dissemination, as well as to analyze tendencies in this production. We used: BIREME, CAPES, USP Base of Dissertations and Theses. Abstracts with nurses as the authors or co-authors served as the basic material. Using common descriptors in this area, we found 218 abstracts. Production increased from the 1990's onwards (29.8% of the total). Scientific articles (50.4%) and theses (37.2%) were predominant. Knowledge tended towards three theme categories: use of alcohol and other drugs (62.9%); vulnerable populations (27.5%), and users of alcohol and other drugs (9.6%). Alcohol and drugs appeared as comorbidities in many studies and 38.4% of the articles were published in journals from other health areas.

nursing research; alcohol; drugs; alcoholism


Esta investigación bibliográfica trata del conocimiento producido por enfermeros brasileños en el tema alcohol y otras drogas hasta 2004, catastrado en bases de datos en línea, con objeto de identificar su presencia; origen de ese conocimiento; medios para divulgación y analizar tendencias de esa producción. Se utilizó: BIREME, CAPES, Banco de Tesis y Disertaciones de la USP. Los resúmenes constituyeron el material básico, y se consideraron aquellos de autoría o coautoría con enfermeros. Utilizando descriptores comunes al tema, se obtuvo 218 resúmenes. La producción aumentó (29.8% del total) a partir de 1990; predominaron artículos científicos (50,4%) y disertaciones (37,2%). El conocimiento tendió para tres categorías temáticas: uso de alcohol y otras drogas (62,9%); poblaciones vulnerables (27,5%) y usuarios de alcohol y otras drogas (9,6%). Alcohol y drogas aparecieron como comorbilidades en muchos estudios y el 38,4% de los artículos fue publicado en revistas de otras áreas de la salud.

investigación en enfermería; alcohol; drogas; alcoholismo


ARTIGO DE REVISÃO

Álcool e outras drogas: levantamento preliminar sobre a pesquisa produzida no Brasil pela enfermagem1 1 Pesquisa realizada com apoio do CNPq

Alcohol and drugs: preliminary survey of Brazilian nursing research

Alcohol y otras drogas: inventario preliminario sobre la investigación producida por la enfermería brasileña

Margarita Antonia Villar LuisI; Ana Carolina Fuza LunettaII

IEnfermeira, Professor Titular, e-mail: margarit@eerp.usp.br

IIAluna de Graduação, Bolsista de Iniciação Científica, e-mail: anapira@terra.com.br. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o desenvolvimento da pesquisa em enfermagem

RESUMO

Trata-se de pesquisa bibliográfica sobre conhecimento produzido pela enfermagem brasileira no tema álcool e outras drogas até 2004, cadastrado em bases de dados on line, com propósito de identificar sua presença; a origem desse conhecimento; os meios de sua divulgação e analisar tendências dessa produção. Utilizou-se: BIREME, CAPES, Banco de Teses e Dissertações da USP. Os resumos constituíram material base; considerou-se aqueles de autoria ou co-autoria com enfermeiros. Utilizando descritores comuns ao tema, obteve-se 218 resumos produzidos em três períodos: antes de 1980, década de 90 e de 2000 a 2004. A partir de noventa a produção incrementou (29,8% do total); predominam artigos científicos (50,4%) e dissertações (37,2%). O conhecimento tendeu para três categorias temáticas: uso de álcool e outras drogas (62,9%); populações vulneráveis (27,5%), e usuários de álcool e outras drogas (9,6%). Álcool e drogas foi resultado adicional de muitos estudos (comorbidades) e 38,4% dos artigos apareceram em revistas de outras áreas da saúde.

Descritores: pesquisa em enfermagem; álcool; drogas; alcoolismo

ABSTRACT

This bibliographic study surveys knowledge about alcohol and drugs produced by Brazilian nursing until 2004 and registered in online databases, in order to identify the presence of this theme; the origin of this knowledge and means of dissemination, as well as to analyze tendencies in this production. We used: BIREME, CAPES, USP Base of Dissertations and Theses. Abstracts with nurses as the authors or co-authors served as the basic material. Using common descriptors in this area, we found 218 abstracts. Production increased from the 1990's onwards (29.8% of the total). Scientific articles (50.4%) and theses (37.2%) were predominant. Knowledge tended towards three theme categories: use of alcohol and other drugs (62.9%); vulnerable populations (27.5%), and users of alcohol and other drugs (9.6%). Alcohol and drugs appeared as comorbidities in many studies and 38.4% of the articles were published in journals from other health areas.

Descriptors: nursing research; alcohol; drugs; alcoholism

RESUMEN

Esta investigación bibliográfica trata del conocimiento producido por enfermeros brasileños en el tema alcohol y otras drogas hasta 2004, catastrado en bases de datos en línea, con objeto de identificar su presencia; origen de ese conocimiento; medios para divulgación y analizar tendencias de esa producción. Se utilizó: BIREME, CAPES, Banco de Tesis y Disertaciones de la USP. Los resúmenes constituyeron el material básico, y se consideraron aquellos de autoría o coautoría con enfermeros. Utilizando descriptores comunes al tema, se obtuvo 218 resúmenes. La producción aumentó (29.8% del total) a partir de 1990; predominaron artículos científicos (50,4%) y disertaciones (37,2%). El conocimiento tendió para tres categorías temáticas: uso de alcohol y otras drogas (62,9%); poblaciones vulnerables (27,5%) y usuarios de alcohol y otras drogas (9,6%). Alcohol y drogas aparecieron como comorbilidades en muchos estudios y el 38,4% de los artículos fue publicado en revistas de otras áreas de la salud.

Descriptores: investigación en enfermería; alcohol; drogas; alcoholismo

INTRODUÇÃO

Segundo relatórios de organizações internacionais, estima-se que mais de 200 milhões de pessoas consumiram alguma droga ilícita entre 2000 e 2001 (3,4% da população global). Nos países desenvolvidos, o álcool desponta como terceiro fator de risco para morbi-mortalidade, responsável por 9,2% do DALYs (sigla referente aos anos de vida perdidos ou incapacitados) e as drogas ilícitas aparecem em oitavo lugar, com 1,8% do DALYs. Nos países em desenvolvimento com baixa mortalidade, como o Brasil, apenas o álcool, dentre as substâncias pscioativas, surge como principal fator de risco, com 6,2% do DALYs(1-3).

Por isso, a Organização Mundial da Saúde(2), considera que as drogas lícitas como álcool e tabaco, pelo seu impacto, em termos de mortalidade e incapacidade junto às populações, seja de países desenvolvidos ou em desenvolvimento, continuarão como importantes fatores de risco nas projeções para as próximas décadas (2010 e 2020).

As conseqüências do uso abusivo de álcool e outras drogas são poderosos determinantes para a morbi-mortalidade, nem sempre bem dimensionados pela população devido a atitudes ambivalentes e o estigma associado ao uso e ao usuário, presentes nas culturas dos diversos povos variando em intensidade de acordo com múltiplos fatores (tipo de droga, sexo e idade do usuário, classe social) e com o período histórico. No caso das drogas ilícitas soma-se ao já exposto, o caráter de ilegalidade do uso e o envolvimento do tráfico de drogas.

Esses empecilhos mostram a dimensão das dificuldades para coletar dados nos vários países, por isso os levantamentos tem sido imprecisos, não sistemáticos e com resultados que dificilmente são comparáveis(4). Mesmo assim, os dados expostos justificam a continuidade das investigações e o esforço dos pesquisadores em melhorar o delineamento metodológico e a implementação de estudos científicos, visando o avanço desse conhecimento específico.

A literatura disponível, particularmente investigações a partir da década de noventa, revela que os maiores problemas relacionados ao álcool e às outras drogas decorrem do uso abusivo ou problemático, ou seja, implicações legais e danos provocados por este padrão de uso, ou a utilização sem prescrição médica(5-6) ou ainda, exposição a situações de violência, acidentes, aquisição ou transmissão de enfermidades infecciosas, atividade sexual sem proteção (com todas suas conseqüências), ou agravamento de condição clínica, naqueles que apresentam comorbidades(6).

No Brasil, as substâncias psicoativas não tem sido área de interesse de pesquisa entre os enfermeiros, embora o uso abusivo de álcool tenha aparecido nos resultados de estudos com outros focos (hipertensão, acidentes de trabalho) caracterizando uma situação de comorbilidade.

O afastamento desse tema não constitui uma exclusividade da enfermagem, conforme mostrou um levantamento bibliográfico realizado por pesquisadores da Fiocruz, referente à produção de pesquisas sobre causas externas no Brasil e no mundo, abrangendo o período de 1990 a 2000. Mediante a análise de resumos disponíveis on line (dentre outros) e centrando-se em estudos de caráter epidemiológico, o estudo revelou que a produção brasileira no período foi de 165 trabalhos oriundos de todas as áreas da saúde(7).

O mesmo estudo(7) identificou o consumo de álcool e de outras substâncias como fatores de risco predominantes nos acidentes de transporte, seguido do comportamento agressivo e do não uso de equipamentos de segurança. Esse mesmo uso e o de agrotóxicos apareceram associados aos suicídios e tentativas. A overdose surgiu em vários trabalhos como um dos métodos mais utilizado com propósito de autodestruição humana. Quanto aos homicídios, o consumo de substâncias psicoativas associado à disponibilidade de armas, bem como o porte das mesmas (legal ou não), foram os principais fatores de perpetração, seguido da presença de distúrbios psicológicos e do ambiente socioeconômico desfavorável.

Outro levantamento(8) realizado no mesmo período (1990 a 2000) com o intuito de identificar o conhecimento divulgado em revistas científicas sobre drogas e violência, obteve 145 estudos de natureza diversa, realizados através de metodologias quantitativas e qualitativas e provenientes de diferentes áreas de conhecimento (Saúde Mental, Enfermagem, Saúde Pública, dentre outros). A autora do estudo verificou que o alcoolismo predominou como tema nos trabalhos. No tocante a Enfermagem, os conteúdos direcionavam-se à conscientização dos enfermeiros, no sentido de mostrar o caráter de doença da dependência do álcool ou outras drogas psicoativas e também, relatos sobre experiências de tratamento e seguimento de alcoolistas, na perspectiva deles. Houve o destaque para trabalho realizado com mulheres presidiárias (a maioria presa por envolvimento no tráfico de drogas), devido à originalidade do mesmo(8).

Outra investigação envolvendo o tema violência, realizada em 2004(9) e envolvendo 27 municípios de São Paulo, desenvolvida através de visita domiciliar, mostrou que dos 2.372 domicílios, 52,7% mencionaram situação de violência com autor embriagado e 9,7% estando intoxicados por outra droga, sendo que a situação de violência envolvia predominantemente o casal, embora com freqüência, se estendesse a outros moradores da casa.

Esses levantamentos mostraram o pouco impacto da enfermagem na investigação da temática álcool e outras substâncias psicoativas, pois foram muito poucos os trabalhos citados pelas autoras, levando a pensar que a enfermagem não está realizando investigações, estudos nessa direção ou não está divulgando adequadamente sua produção.

Com o propósito de contribuir na oferta de um panorama do estado do conhecimento sobre álcool e outras drogas na enfermagem, o presente estudo visa: identificar o conhecimento produzido pela enfermagem brasileira, presente em bases de dados; identificar a origem de tal conhecimento e a divulgação do mesmo; apresentar as tendências dessa produção científica.

METODOLOGIA

Para a realização da pesquisa bibliográfica utilizou-se consulta às seguintes bases de dados: BIREME - BDEnf (Base de dados da Enfermagem), CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), Acervo de Teses e Dissertações da Universidade de São Paulo. Como fontes adicionais, incluiu-se a consulta ao currículo Lattes de pesquisadores de enfermagem na temática álcool e drogas e os volumes correspondentes ao ano de 2004 das revistas: Revista Latino-Americana de Enfermagem, Texto e Contexto de Enfermagem, Revista de Enfermagem da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e Revista da Escola de Enfermagem da USP. As três primeiras devido a pertencerem a instituições que têm projetos e programas em parceria com a CICAD/OEA, e a última, por que docente da mesma exerceu cargo técnico na área de álcool e drogas junto ao Ministério da Saúde.

Realizou-se a consulta adicional, pois foi observada a existência de omissões nas bases de dados utilizadas. Ainda assim, julga-se que pode haver outras pesquisas e autores que não estão contemplados neste levantamento, por isso mesmo não se tem a pretensão de considerá-lo completo.

Essa busca ocorreu no período de junho a outubro de 2005, utilizando-se os seguintes descritores: 1. álcool e alcoolismo; 2. drogas; 3. substâncias psicoativas. Como critérios para a seleção dos resumos, considerou-se apenas os estudos realizados por enfermeiros (isoladamente ou em parceria com outros profissionais) que versassem sobre o tema álcool e drogas enquanto substâncias psicoativas. Exclui-se o tabaco, em que pese seu impacto em termos de conseqüências para a saúde, por considerar que o mesmo não sofre da mesma carga social negativa (preconceito, rejeição) que as outras substâncias psicoativas. Portanto, os resumos constituíram a base da informação do presente trabalho.

No total foram encontradas 6.251 resumos (excluídas as duplicações entre as bases de dados) 238 no BDEnf (última atualização em 17/02/2005); 5.974 na CAPES; 39 no Banco de Teses e Dissertações da USP. Desse total, apenas 212 resumos encaixaram-se nos critérios mencionados. Nas revistas e Currículos Lattes consultados, foram encontrados mais 6 trabalhos.

Em seguida os resumos foram organizados em função do ano de publicação, ficando agrupados em: antes de 80, década de 80, década de 90 e de 2000 a 2004. Também foram separados conforme o tipo de produção, ou seja, teses de doutorado, dissertação de mestrado, artigos de revistas, livros ou capítulos de livros. Com isso, identificou-se se o conhecimento provinha de programa de Pós-Graduação, de revistas científicas ou livros e capítulos de livros.

Concluída a fase de classificação do tipo de publicação iniciou-se o processo de classificação dos resumos quanto aos temas que faziam alusão às substâncias psicoativas.

Essa parte da pesquisa exigiu um tratamento de natureza qualitativa, do tipo análise de conteúdo, com leitura exaustiva dos resumos, procurando determinar como os temas álcool e outras drogas psicoativas estavam inseridos no contexto dos trabalhos.

Nessa análise o material foi organizado a partir de dados evidentes nos resumos (elementos componentes), agrupados por semelhanças, dando lugar às subcategorias (10) a partir das quais se compuseram às categorias temáticas amplas: uso de álcool e outras drogas; populações vulneráveis; usuários de álcool e outras drogas.

Nesse processo resultou a elaboração de três esquemas que permitiram sintetizar os resultados, facilitando sua apresentação bem como mensurar a freqüência de temas investigados e dos grupos populacionais abrangidos.

RESULTADOS

Conhecimento produzido conforme o tipo e a origem no período anterior aos anos oitenta até 2004

Quanto ao montante de trabalhos produzido no período compreendido entre antes de 1980 até 2004, considerando os resumos (presentes nas fontes investigadas), percebe-se na Tabela 1, que a partir da década de noventa houve um aumento considerável (29,8%) de produções sobre o tema álcool e outras drogas psicoativas (ou em que houve a menção do mesmo). Porém o destaque cabe aos primeiros quatro anos do século XXI, pois compreende 62,8% de toda a produção do período.

Verifica-se ainda nessa tabela que o tipo de produção predominante foi à divulgação através de artigos de revistas científicas (50,4%), seguido das dissertações de mestrado (37,0%). As teses tiveram porcentagem pouco significativa (9,6%) muito menos ainda o conhecimento divulgado em livros e capítulos de livros (2,8%).

O aumento considerável na produção a partir da década de 90 deve ser olhado com reservas, dado que pode ser um reflexo do aumento da produção científica da enfermagem em geral, pois nesse espaço de tempo, os critérios de avaliação dos programas de pós-graduação, estipulados pela CAPES, tornaram-se mais rigorosos exigindo mais publicações científicas e diminuição no tempo de obtenção das titulações (mestres e doutores), consequentemente, na elaboração da dissertação ou tese. Além disso, a partir dos anos 90 também houve o credenciamento de novos programas de pós-graduação (principalmente em nível de mestrado).

Portanto, justifica-se a cautela na interpretação desses dados como uma indicação de maior interesse pelo tema em questão. Todavia, na década de 90, governos nacionais enfatizaram acentuadamente as medidas de redução da demanda de drogas lícitas e ilícitas, com isso os organismos internacionais de Saúde (OMS, OPS, OEA) procuraram desenvolver estratégias de monitoramento da saúde e prevenção do uso de substâncias psicoativas nos níveis nacional e mundial(10).

Desde 1996 a Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas da Organização dos Estados Americanos (CICAD/OEA) tem implementado e apoiado financeiramente programas e projetos em países das Américas com o objetivo de redução da demanda das drogas na região(10).

Nessa mesma década quatro instituições de ensino superior de Enfermagem se beneficiaram dessa estratégia: o Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), a Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, a Faculdade de Enfermagem da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e o Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina. Todas elas com programas de pós-graduação e responsáveis por editar revistas científicas.

Sem dúvida, a ação de mobilizar docentes para o desenvolvimento de programas ou projetos visando alguma ação direcionada ao tema álcool e drogas, incentivou a discussão, o olhar para a própria instituição e o desejo de disseminar esse movimento para outras; fato esse ocorrido na primeira experiência de implantação de projeto (discussão do currículo e inserção de conteúdos sobre álcool e outras drogas) junto ao Departamento de Enfermagem da UNIFESP, o qual convidou outras escolas de Enfermagem de nível superior brasileira, para uma discussão ampliada sobre conteúdos curriculares e a inserção do tema álcool e drogas. Essa foi uma oportunidade única para muitos dos representantes de Escolas de Enfermagem de nível superior.

No intuito de manter a discussão, a Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP através do Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas (DEPCH), promoveu em 2000 o já tradicional Encontro de Pesquisadores em Saúde Mental e de Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica, cujo tema versou sobre álcool e drogas psicoativas contando com a participação de enfermeiros de escolas e serviços de saúde, além de outros profissionais de diversas partes do estado e do Brasil.

Certamente, esses movimentos influenciaram o desenvolvimento de outros semelhantes em diferentes locais, de maneira que o tema álcool e droga começou a ser pensado na Enfermagem como possibilidade de ensino, pesquisa e atuação profissional.

No que concerne à Enfermagem brasileira nota-se que a atuação da CICAD junto às instituições de ensino superior exerceu e continua exercendo (através da manutenção de seus programas e projetos) um papel importante no incentivo à geração de conhecimento na área das substâncias psicoativas. Como as instituições participantes dos empreendimentos da CICAD são importantes centros de formação de recursos humanos (graduação, pós-graduação e especialização) tornaram-se agentes disseminadores de uma proposta, ação essa que pode ser potencializada através das revistas científicas de Enfermagem que editam.

Origem da produção científica e veículos de divulgação utilizados

Em consonância com as novas exigências da CAPES, os cursos de pós-graduação brasileiros vem se tornando mais exigentes em termos de tempo de titulação dos trabalhos de pesquisa de seus alunos e da publicação dos resultados (dentre outros), parciais ou totais, das dissertações ou teses, antes mesmo da defesa ou logo após a mesma.

Nesse sentido, em relação ao primeiro requisito, (tempo de titulação) através do banco de dados da CAPES, verifica-se que as teses e dissertações, sobre a temática, álcool ou outras drogas psicoativas ou contendo alguma referência à mesma, seguem a mesma tendência de aumento a partir da década de 90, já mencionada. No período anterior a esse se verifica a ocorrência de apenas cinco dissertações de mestrado, sobre ou mencionando o tema em questão.

A Tabela 2 contém dados sobre a origem dessas produções e foi elaborada no intuito de informar as instituições envolvidas e de solicitar sua colaboração, caso os dados apresentados, referentes à temática, não estejam completos.

Percebe-se na referida tabela que todas as instituições relacionadas são públicas, isto porque até recentemente a CAPES não havia credenciado cursos de pós-graduação estrito-senso em enfermagem em instituições privadas.

Na Tabela 2 constata-se que a EERP-USP responde por 31% das dissertações e 38% das teses defendidas no período. Destacando que desse volume, 66,6% foi proveniente do programa de Enfermagem Psiquiátrica do Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas. Destaca-se ainda a EE-USP, particularmente na modalidade teses, com 28,6% e a UFRS - Escola de Enfermagem Anna Nery, também nesse tipo de produção, com 14,2%. Os Departamentos de Enfermagem da UNIFESP e da UFSC são as outras duas instituições que apresentam maiores porcentagens nas duas modalidades. Cabe ressaltar que nem todas as escolas ou departamentos de enfermagem têm programas de pós-graduação completo com mestrado e doutorado.

Como justificativa para a liderança da EERP-USP, destaque-se o fato da existência de um departamento que aglutina o maior número de docentes de enfermagem psiquiátrica e saúde mental do país, o que permitiu sua dispersão nos diversos serviços de atenção à saúde mental, possibilitando o contato com outras populações e suas necessidades.

Embora os problemas psiquiátricos relacionados ao alcoolismo tenham sido uma constante no hospital psiquiátrico, foi a partir de um serviço de atendimento a urgências psiquiátricas de um hospital geral (de emergências) que o interesse pelo tema álcool e outras drogas psicoativas se consolidou no Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas.

No final dos anos noventa o mesmo encaminhou proposta à direção da EERP-USP e esta à Reitoria, de contratação de especialista em laboratório (enfermeiro) e de docente para ajudar no desenvolvimento de atividades de ensino, pesquisa e extensão na área de substâncias psicoativas. Ambas propostas foram aceitas e os recursos humanos concedidos, de modo que criou-se um grupo de trabalho que consolidou, com a colaboração de outros docentes do departamento, uma linha de pesquisa nessa temática, cujos resultados podem ser apreciados na produção do Programa de Enfermagem Psiquiátrica.

Fazer o levantamento dos artigos científicos produzidos por enfermeiros atualmente, não é uma tarefa fácil e principalmente de temas onde transita a multidisciplinaridade. Isso pressupõe entender que os pesquisadores buscam as revistas que tenham penetração em várias áreas do conhecimento, buscando disseminar o saber produzido entre outros profissionais; neste caso o grupo que compõe a saúde.

Nos dados da Tabela 3 confirma-se essa colocação, dado que entre as revistas científicas de origem do artigo publicado, encontraram-se várias revistas médicas e outras, principalmente da saúde pública.

De maneira geral observa-se o mesmo fenômeno do incremento da produção a partir da década de noventa. Entretanto, sobre as revistas científicas que publicaram os temas já mencionados, observa-se o predomínio do grupo composto por revistas médicas diversas (26,4% do total) confirmando que o enfermeiro pesquisador está procurando outras áreas e participando de pesquisas em grupos multiprofissionais. A maioria dos trabalhos publicados nesse grupo, provém de enfermeiros pesquisadores do tema álcool e drogas, que vêm publicando desde antes de 1990 nessas revistas. Outro fator a ser ponderado nessa opção, refere-se à disponibilidade das revistas de enfermagem para publicar as questões sobre álcool e drogas investigadas pelos pesquisadores enfermeiros.

A Revista Latino Americana de Enfermagem desponta como veículo de divulgação da temática, entre as revistas de enfermagem (21%), seguida da Texto e Contexto (16%). Ambas mostram um crescimento significativo nas publicações do último período. De comum elas têm o fato de as instituições de enfermagem responsáveis pela sua editoração, desenvolverem programa e projeto, apoiado pela CICAD/OEA. Particularmente a Revista Latino Americana tem recebido financiamento para viabilizar a publicação dos trabalhos de conclusão de três cursos de Especialização em Investigação para enfermeiros no fenômeno das drogas, financiado pela entidade mencionada. Desnecessário dizer que isso tem revertido em aumento nas publicações sobre o assunto, além de ter incorporado visões do problema relativas a outros países da América Latina.

Pode-se afirmar que os investimentos feitos pelas duas instituições, somados aos de uma organização internacional, tem tido reflexos na produção científica no tema álcool e outras drogas; fato esse constatado através do aumento das publicações de suas revistas.

Ratificando a escolha dos enfermeiros pesquisadores por revistas de outras áreas (saúde pública, psicologia, etc.) o grupo "Outras revistas", apareceu como o próximo mais freqüente (13%). Volta, portanto a indagação: as revistas de enfermagem estão receptivas a acolher publicações sobre o tema? Particularmente, se estas não estiverem centradas em aspectos exclusivos de e para a enfermagem? Questão essa bastante comum em se tratando de um problema multidisciplinar.

Verificam-se nas demais revistas que o aumento de artigos nesse tema, ocorreu com mais freqüência no período de 2000 a 2004, com algumas exceções. Podem ter influenciado esse incremento, as políticas de Saúde Mental relativas ao atendimento do usuário em álcool e outras drogas com a aprovação de portarias específicas (nº816/GM de 30 de abril de 2001 - Ministério da Saúde), além de outros fatores já expostos no item anterior.

Categorias temáticas predominantes no conhecimento produzido

A leitura geral dos conteúdos dos resumos, aliado a subsídios da literatura específica que contribuíram para a realização deste estudo, evidenciou a caracterização de períodos em que um determinado tema sobressaía sobre os demais sendo investigado por vários pesquisadores, ou ainda o surgimento de um estudo isolado, mas de grande relevância em termos de saúde.

Nessa perspectiva, identificou-se na década de 70, trabalho associando o consumo de álcool e tabaco com a tuberculose(11) (tema pouco explorado e muito atual) e sobre o cuidado de enfermagem ao dependente(12). Já na década de 80, destacaram-se os estudos relativos à percepção negativa do aluno de enfermagem frente ao alcoolista(13), estudo sobre as necessidades alimentares desse cliente(14) (o único encontrado nesse tema) e sobre hospitalizações decorrentes do abuso de álcool(15-16). Na década de 90 começaram a aparecer estudos ouvindo as pessoas alcoolistas(17), sobre a necessidade de atualização específica do enfermeiro(18-19), sobre álcool e comorbidades(20-21), e atitudes dos enfermeiros com relação ao alcoolismo(22). De 2000 em diante verifica-se que essas temáticas se repetem, especialmente os estudos sobre atitudes(23-26), mas também sobressaem os trabalhos sobre ensino e educação em enfermagem(27-29), e revisões(29) buscando fornecer material para isso. Particularmente, do final de 90 em diante os assuntos relativos ao tema álcool e drogas se diversificam muito, abrangendo vários segmentos da população e problemáticas específicas.

Tal percepção confirma-se na apresentação dos resultados provenientes da análise qualitativa, expostos a seguir, agrupados por categoria (no seu esquema respectivo).

Nessa distribuição de conteúdos sobressaiu-se a categoria uso de álcool e outras drogas com aproximadamente 62,9% do total de trabalhos incluídos, seguida da categoria populações vulneráveis, com 27,5%, da categoria usuários de álcool e outras drogas com 9,6%.

Na Tabela 4, em termos de inclusão de volume de trabalhos, predomina a subcategoria enfermagem ou equipe de saúde com 33,6% do total produzido, vindo a seguir as subcategorias comorbidades, e abuso e dependência com 24,1% e 23,4%, respectivamente e a subcategoria, políticas com 18,9%, não aparecendo tão distante das anteriores. Dessas, apenas a subcategoria comorbidades abrange investigações com objetivo não direcionado ao tema álcool e outras drogas, sendo as mais prevalentes desse grupo (24: 72,7%).

Quanto aos componentes, o tratamento sobressai dentre os demais (13,8%), com destaques também para ensino (12,3%), atuação (11,6%), doenças clínicas (por conta das cardiovasculares atingiu 10,9%) e trabalho (refere-se à área de saúde ocupacional, com 9,5%). Esses formam o grupo dos cinco componentes temáticos de maior freqüência de aparecimento no material analisado.

Entretanto, percebe-se um segundo grupo que agregado ao anterior caracteriza os dez componentes predominantes. São eles: percepções, atitudes, significados... (7,3%), programas e projetos de saúde ou prevenção (7,3%), reinserção social (7,3%), aparecendo com a mesma porcentagem. Seguem os transtornos psiquiátricos, (6,6%) e as doenças infecto-contagiosas (devido à tuberculose e a Aids, com 5,1%).

Na Tabela 5, em relação às populações vulneráveis, constata-se que prevalece a subcategoria crianças e adolescentes, com 63,3% da produção científica, sucedida pela subcategoria mulheres, responsável por 31,7% do total. As duas últimas subcategorias (situações específicas e idosos) responderam por 5% e foram mantidas separadas das demais devido a sua especificidade e no intuito de evidenciar a escassez de trabalhos.

Sobre os componentes de maior freqüências de aparecimento, destacam-se os estudos com estudantes com 33,3% (particularmente os de ensino médio e fundamental com 15 trabalhos) e em continuação despontam as gestantes perfazendo 20%. Cabe ressaltar que mais da metade (7) desses estudos investigaram o uso entre gestantes; gravidez e associação com drogas psicoativas, a vulnerabilidade da gestante a substâncias analgésicas. Nos demais, o tema apareceu como resultado adicional dos estudos.

Os outros componentes apareceram com bem menos representatividade, destacando-se as crianças e adolescentes no que tange à exposição a fatores de risco familiar (pais usuários), com 11,7% e ainda nessa mesma população os componentes educação em saúde e exposição a fatores de risco social, ambos com 8,4%. Com alguma expressividade surgem os componentes relativos às mulheres: usuárias de álcool ou drogas (6,7%), e em situação de exposição a fatores de risco social (5%).

Na Tabela 6, referente à categoria usuários de álcool e outras drogas psicoativas, abarca os trabalhos em que o foco principal eram os usuários de substâncias psicoativas e verifica-se que os seus componentes concentram-se em temas sobre a representação ou atitudes que os vários grupos da sociedade (incluindo os profissionais e até o próprio usuário) constroem ou manifestam frente a esse personagem real. Complementam a subcategoria os componentes que dizem respeito à família dos usuários.

Observa-se na Tabela 6, que o componente relativo às representações predomina tanto no que se refere ao usuário de álcool (52,4%) quanto ao de drogas (28,6%), já a família aparece pouco representado nas duas subcategorias. Em comparação com as duas outras categorias, esta aparece com uma produção científica bem menos expressiva.

DISCUSSÃO

Esta pesquisa confirma que o conhecimento em álcool e drogas teve um avanço significativo na Enfermagem a partir da década de noventa, tal como outros estudos(28,30) haviam assinalado. Lembrando que a produção científica da Enfermagem como um todo, a partir dessa década, deve ter aumentado em função, das influências contextuais já mencionadas tal como ocorreu em outras áreas do saber(31).

Em relação ao tipo de itens produzidos, observa-se desse período em diante um aumento pronunciado nas dissertações de mestrado e nos artigos publicados em revistas científicas. Destacando-se neste último, a Revista Latino Americana e a Texto e Contexto como veículos de divulgação de enfermagem nos temas referentes a álcool e outras drogas ou em que os mesmos, de alguma maneira, estiveram presentes em artigos por elas publicados.

Fato esse relacionado aos programas e projetos que as instituições universitárias, editoras dessas revistas, desenvolvem em parceria com a CICAD/OEA e também, à existência de grupos de pesquisa ou de interesse nessa área temática.

Devido ao caráter multidisciplinar do assunto as publicações de artigos em veículos fora da enfermagem superou as demais, não fosse as revistas anteriormente citadas poder-se-ia dizer que os pesquisadores de enfermagem, direcionados para temas relativos a álcool e outras drogas, têm-se voltado para outras áreas do conhecimento.

Contudo o aumento de publicações em revistas científicas de modo geral é positivo, pois amplia a divulgação e dá a visibilidade aos trabalhos. Essa tendência deve manter-se dado que há um número significativo de dissertações e algumas teses defendidas nos anos 2000, das quais derivarão artigos, por exigência dos próprios programas de pós-graduação.

No que se refere aos temas abordados destacam-se no mesmo nível aqueles relacionados ao tratamento (principalmente do alcoolismo) ao ensino (devido ao interesse na capacitação específica do enfermeiro, observado no último período) e à atuação de enfermagem (presente inclusive em estudos dos períodos anteriores aos anos 90).

As doenças clínicas caracterizando comorbidades constituem um grupo no qual as substâncias psicoativas, principalmente o álcool estiveram presentes embora não fossem alvo principal dos estudos. O mesmo pode se afirmar no tocante às investigações sobre transtornos psiquiátricos e a comorbidade com o uso; tema cada vez mais enfatizado por outros profissionais e pesquisadores da saúde mental(32).

No que tange às populações vulneráveis encontraram-se resultados parecidos aos reportados por estudos que seguiram o mesmo perfil deste. Evidenciou-se que os pesquisadores de enfermagem, assim como os demais, nos estudos de grupos populacionais enfatizam os jovens de maneira geral. Trabalho semelhante ao presente, abordando a temática violência(33), abrangeu a década de 90 e início do século XXI e observou uma maior tendência dos estudos com crianças e adolescentes para três grupos: situação de rua; situação de maus tratos; e conflito com a lei. Outro levantamento sobre drogas e vulnerabilidade à violência, identificou os escolares como sujeitos mais maciçamente investigados(8).

Os dois levantamentos indicam a carência de investigações sobre o comportamento de uso e dependência na população em geral (nas diferentes faixas etárias, nas populações internadas, nas encarceradas, nos acidentados, dentre outros), assim como estudos relativos ao papel que as drogas representam nas vidas dos diversos grupos populacionais.

O trabalho em questão, também identificou lacunas semelhantes nos estudos produzidos pela enfermagem, no que se refere aos idosos, apesar das indicações de que o uso de substâncias psicoativas, particularmente o alcoolismo, será uma condição cada vez mais freqüente devido ao envelhecimento da população brasileira(34). O mesmo se constata na relação álcool e violência, tema mais investigado por outros profissionais(8,31,33).

A preocupação com percepções, opiniões e mais recentemente, atitudes dos profissionais em relação ao uso, em especial do álcool, reflete uma busca da sensibilização dos mesmos e de incentivo à busca de formação e conhecimento nessa área. Nesse sentido a enfermagem mostra-se pioneira, pois os estudos sobre essa questão surgiram antes da década de 90(12), intensificando-se a partir da mesma(18-19, 22-26).

As preocupações com o ensino do tema na profissão de enfermagem, também aparecem como uma iniciativa importante da área, presente em vários estudos(27-30), inclusive com interfaces com o componente anteriormente citado(24-26).

Como destaque surgiu às mulheres como grupo pouco explorado pelos investigadores da área da saúde em geral(8), embora sua presença deva-se aos estudos com gestantes, em que foi identificado o uso no decorrer de trabalhos referentes à gestação ou em mulheres (gestantes ou não) na condição de elemento vulnerável pela convivência com parceiro usuário, (HIV positivo ou não). Muito poucos foram os estudos sobre usuárias de álcool ou outras drogas psicoativas em mulheres pertencentes a grupos de excluídos como as que se dedicam à prostituição.

Levantamento realizado acerca da temática mulheres e violência(35), mostrou que mesmo não tão participativa, a enfermagem havia contribuído, até a década de 90, com seis estudos (16% do total encontrado, sendo a maioria dos anos 1999 e 2000). Na produção total, os autores identificaram temas sobre: "a violência contra a mulher como reflexo das relações de gênero", "violência sexual como expressão da violência contra a mulher", "implicações para o campo da saúde" e "vitimização da mulher". Nesse trabalho, referente aos estudos brasileiros, o tráfico de entorpecentes aparece como líder na freqüência de crimes femininos.

Esse tema foi encontrado em apenas dois trabalhos(36-37) no presente levantamento. Também apareceu com relativo destaque, investigações sobre o nexo uso de substâncias psicoativas e trabalho (principalmente álcool), representado por estudos que buscavam identificar o padrão de uso, tema esse bastante esquecido pelos pesquisadores em geral(8).

O componente compreensão e representações dos usuários de álcool e de drogas (estudado com menos freqüência) merece ser ressaltado como um tema bastante investigado por enfermeiros pesquisadores(17, 38-39).

Entretanto, o uso de substâncias psicoativas, (em especial o álcool) e sua co-ocorrência com doenças clínicas e infecto-contagiosas (neste caso álcool e outras drogas) a despeito de significativamente, presente parece não estar sendo considerado pelos pesquisadores enfermeiros, embora não seja uma prerrogativa exclusiva dos mesmos(32).

Cabe, portanto assumir essa possível relação nas condições que estudos indicaram sua presença e incluir entre os objetivos das futuras investigações a identificação do uso de álcool e/ou drogas, e buscar parcerias experientes no tema para ajudar no desenvolvimento dos estudos e de ações terapêuticas, buscando minimizar os agravos resultantes dessa relação.

A mesma recomendação se aplica aos pesquisadores enfermeiros de saúde mental dado que a comorbidade psiquiátrica e uso de substâncias psicoativas mostrou-se bastante freqüente neste estudo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O acervo pertinente ao conhecimento sobre álcool e outras drogas produzido pelos pesquisadores em geral, possui lacunas(8), não seria diferente em relação à enfermagem enquanto área específica. Por isso, certamente, textos deixaram de ser incluídos. Portanto, não se tem a pretensão de que este estudo esgote toda a produção da enfermagem brasileira em álcool e outras drogas.

Houve bastante dificuldade na análise de alguns resumos, pois careciam de informações referentes à metodologia ou resultados, ou outros dados essenciais para sua compreensão. Alguns ainda eram muito sintéticos em suas informações. Enfim, pareceu que os autores atribuíram pouca importância a essa parte da redação do trabalho, o que é um equívoco, pois um resumo incluindo o máximo de informações sobre o estudo, bem estruturado e redigido, estimula o leitor a buscar o texto na íntegra, além de ser uma fonte importante de pesquisa.

Em razão dessa evidência, a presente investigação não incluiu análise sobre a natureza do estudo, a metodologia utilizada, bem como sobre o referencial teórico utilizado. Deixando essa tarefa para outra oportunidade.

Uma dificuldade adicional foi à própria atividade de classificação, pois os resumos apresentavam mais de um tema sendo necessário, devido à categorização, encaixá-lo em um único campo.

Sobre os resultados da pesquisa, o panorama geral permitiu observar que a produção cadastrada nas bases de dados, disponíveis on line, é pequena, pois dos 6.251 resumos selecionados pelos descritores, apenas 3,4% foram produzidos por enfermeiros e se referiam ou faziam alusão ao tema álcool e outras substâncias psicoativas.

Considerando essa produção intelectual houve um avanço indiscutível dos anos noventa em diante, verificando-se uma maior abrangência e distribuição dos trabalhos por locais de origem e também por assuntos investigados. Cabe ressaltar ainda que não foram incluídas bibliografias de todos os trabalhos encontrados por limitação de espaço.

A expectativa é de que esse conhecimento avance, através da consolidação da importância do tema entre os enfermeiros, e que componentes relativos ao tema álcool e outras drogas, tanto os mais investigados como os ainda incipientes, possam ser aprofundados em estudos futuros.

Recebido em: 30.8.2005

Aprovado em: 4.11.2005

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    Pesquisa realizada com apoio do CNPq
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Fev 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2005

    Histórico

    • Aceito
      04 Nov 2005
    • Recebido
      30 Ago 2005
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