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Métodos de esterilização por baixa-temperatura e novas tecnologias

Resumos

Novos métodos de esterilização à baixa temperatura são apresentados como alternativa ao óxido de etileno. Este artigo tem como objetivo identificar evidências da atividade antimicrobiana, toxicidade, eventos adversos e aplicabilidade das tecnologias de baixa temperatura. A pesquisa foi realizada mediante consulta nas bases de dados MEDLINE e LILACS até 2005. Foram analisados 10 artigos na íntegra, nesse levantamento, cujo resultado demostrou que: a) os estudos sobre a eficácia da esterilização constituem pesquisas básicas e comparativas que demonstram a influência da extensão e diâmetro do lúmen e a presença de cristais de sais, b) a seleção do equipamento é fundamental, assim como a garantia da limpeza dos materiais, que interfere na eficácia dos processos e na toxicidade, c) a esterilização à baixa temperatura apresenta limitação para esterilizar osso para enxerto e efeitos deletérios sobre as propriedades dos materiais.

esterilização; óxido de etileno; peróxido de hidrogênio


The new low-temperature sterilization technologies are presented as an alternative to the use of ethylene oxide. This review was performed in order to identify evidences of the antimicrobial activity, toxicity, adverse events and the applicability of these technologies. The research was carried through the electronic databases MEDLINE and LILACS up to 2005. The authors analyzed 10 articles in this survey. The studies about the efficacy of these sterilization methods constitute experimental and comparative research that showed the influence of the extension and diameter of the lumen, besides the presence of crystal salts. Thus, choosing the correct equipment is essential, as well as the assurance of the cleansing of the devices, which interfere with the effectiveness of the low-temperature sterilization. These technologies present limitations regarding the sterilization of graft bone and affect the materials properties.

sterilization; ethylene oxide; hydrogen peroxide


Nuevos métodos de esterilización a baja temperatura son una alternativa frente al óxido de etileno. El artículo tiene por objetivo identificar evidencias de actividad antimicrobiana, toxicidad, efectos colaterales y la aplicación de tecnologías por bajas temperaturas. La investigación fue realizada mediante consulta en los bancos de datos MEDLINE y LILACS hasta 2005. Fueron analizados en su totalidad 10 artículos, cuyos resultados demostraron que: a) los estudios sobre la eficacia de la esterilización se constituyen en investigaciones básicas y comparativas que muestran la influencia de la extensión y diámetro del lumen y la presencia de sales de cristal, b) la selección del equipo es tan fundamental como el garantizar la limpieza de los materiales que influyen en la eficacia de los procesos y en la toxicidad, c) la esterilización a bajas temperaturas muestra limitaciones para el caso de esterilización de injerto óseo, así como deteriora las propiedades de los materiales.

esterilización; óxido de etileno; peróxido de hidrógeno


ARTIGO ORIGINAL

Métodos de esterilização por baixa-temperatura e novas tecnologias

Vania Regina GoveiaI; Silma Maria Cunha PinheiroI; Kazuko Uchikawa GrazianoII

IEnfermeira, Doutorando

IIEnfermeira, Professor, e-mail: rwgraziano@uol.com.br. Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil

RESUMO

Novos métodos de esterilização à baixa temperatura são apresentados como alternativa ao óxido de etileno. Este artigo tem como objetivo identificar evidências da atividade antimicrobiana, toxicidade, eventos adversos e aplicabilidade das tecnologias de baixa temperatura. A pesquisa foi realizada mediante consulta nas bases de dados MEDLINE e LILACS até 2005. Foram analisados 10 artigos na íntegra, nesse levantamento, cujo resultado demostrou que: a) os estudos sobre a eficácia da esterilização constituem pesquisas básicas e comparativas que demonstram a influência da extensão e diâmetro do lúmen e a presença de cristais de sais, b) a seleção do equipamento é fundamental, assim como a garantia da limpeza dos materiais, que interfere na eficácia dos processos e na toxicidade, c) a esterilização à baixa temperatura apresenta limitação para esterilizar osso para enxerto e efeitos deletérios sobre as propriedades dos materiais.

Descritores: esterilização; óxido de etileno; peróxido de hidrogênio

INTRODUÇÃO

O óxido de etileno é o mais antigo método de esterilização à baixa temperatura e vem sendo utilizado desde a década de cinqüenta, do século passado, no reprocessamento de materiais médico-hospitalares sensíveis ao calor. Diferentes fatores têm influenciado os profissionais e as instituições de saúde a buscarem novas tecnologias de esterilização. Rutala e Weber identificam as razões para essa busca, entre os profissionais da saúde dos Estados Unidos, como o atendimento à legislação ambiental que estabelece a eliminação do uso do gás CFC (clorofluorcarbono), melhor diluente do óxido de etileno, que afeta a camada de ozônio da atmosfera e a regulamentação dos níveis aceitáveis de exposição ao óxido etileno, estabelecido pelo órgão governamental de saúde ocupacional(1-2).

Em nosso meio, a busca de novas tecnologias de esterilização por baixa temperatura é justificada pelos mesmos motivos americanos, acrescidos da necessidade de maior rapidez no reprocessamento do que em óxido de etileno. O desafio para os profissionais de controle de infecção hospitalar e de centrais de materiais nos estabelecimentos de saúde consiste na avaliação das novas tecnologias disponíveis quanto à segurança microbiológica associada ao custo-efetividade e à ausência de efeitos adversos aos pacientes e profissionais. Portanto, a escolha do usuário deve estar baseada em evidências científicas.

Essa revisão bibliográfica tem como objetivo identificar, na literatura científica, as evidências da atividade antimicrobiana, toxicidade, eventos adversos e a aplicabilidade das tecnologias de esterilização à baixa temperatura.

METODOLOGIA

A pesquisa bibliográfica foi realizada mediante consulta nas bases de dados eletrônicas MEDLINE e LILACS até 2005, nos portais da BIREME e da US National Library of Medicine. Foram utilizados vocabulários livres e controlados nos idiomas português e inglês e o operador booleano AND para a especificidade. Foram inicialmente definidos os vocabulários controlados em português, Descritores em Ciências da Saúde - DeCS no portal da Bireme (www.bireme.br) e em inglês, Medical Subject Heading - MeSH no portal da US National Library of Medicine - NLM (www.pubmed.com) para, posteriormente, realizar o levantamento bibliográfico.

Foram localizados os descritores: esterilização/sterilization; óxido de etileno/ethylene oxide e peróxido de hidrogênio/hydrogen peroxide. Entretanto, não foram localizados vocabulários controlados para: esterilização baixa temperatura/low temperature sterilization; plasma de peróxido de hidrogênio/hydrogen peroxide plasma, sendo essas utilizadas na busca como vocabulários livres.

RESULTADOS

Na Tabela 1 são apresentados os resultados obtidos com a aplicação da estratégia de busca descrita.

Todos os resumos das publicações localizadas nas bases de dados foram lidos, exceto os resultados da busca exclusiva pelo descritor sterilization, devido ao grande número de publicações encontradas e pela inespecificidade. Os resumos foram analisados e aqueles que abordavam pelo menos um dos seguintes itens: atividade antimicrobiana, toxicidade, eventos adversos e aplicabilidade das tecnologias de esterilização à baixa temperatura foram selecionados, sendo que apenas 10 publicações do universo investigado atenderam os critérios de inclusão.

No sistema de busca adotado, foi localizado apenas um trabalho nacional que não preencheu o critério de inclusão, pois se tratava da apresentação da metodologia para a validação da tecnologia de esterilização à baixa temperatura e formaldeído.

Será apresentada uma síntese das publicações, de acordo com o tema e em ordem cronológica de publicação.

Eficácia: Estudos comparativos dos métodos de esterilização em baixa temperatura

Em 1996, um estudo canadense avaliou a eficácia da esterilização de quatro tecnologias de esterilização à baixa temperatura: óxido de etileno (ETO) 100%, ETO mistura 12/88 (12% de ETO e 88% de CFC), plasma de peróxido de hidrogênio e vapor de peróxido de hidrogênio. Todos os métodos foram efetivos na redução à 6log10 das cepas-teste utilizadas, exceto na presença de 10% de soro e 0,65% de sal. Nessa condição, o ETO 12/88 teve o melhor desempenho, alcançando o nível seguro de esterilidade(3).

Outro estudo de 1998 avaliou a eficácia da esterilização de quatro tecnologias de esterilização à baixa temperatura: ETO, contendo hidroclorofluorcarbono (ETO-HCFC), sistema STERIS®, contendo ácido peracético e peróxido de hidrogênio, e Sistema Sterrad 100® e 100S®, contendo plasma de peróxido de hidrogênio, de materiais de 40cm de extensão e lumens de 1-3mm de diâmetro. Lúmens mais estreitos comprometeram a eficácia dos processos de esterilização pelos sistemas Sterrad 100® e STERIS® e os demais métodos apresentaram resultados satisfatórios(4).

Outra publicação de 1998 avaliou o sistema STERIS®, o ETO 100% e o ETO-HCFC, para materiais com 125cm de extensão e lúmens de 3mm de diâmetro. Diferente dos resultados do estudo apresentado anteriormente, o sistema STERIS® foi significativamente mais eficiente em relação aos demais processos na redução da carga microbiana, porém, não alcançando esterilidade. Convém observar que, nessa situação, o material era mais longo, mas com lúmen menos estreito(5).

Como limitação da análise comparativa dos trabalhos, ressalta-se, aqui, que cada um dos estudos apresenta diferentes desafios para avaliar o desempenho das tecnologias quanto à eficácia na esterilização.

Eventos adversos: epidemia de destruição de córnea - 1998

Em 1998, o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) interrompeu o uso de uma nova tecnologia de esterilização, nos Estados Unidos, que esteriliza através do vapor de ácido peracético e de peróxido de hidrogênio, devido à ocorrência de um surto de destruição de córnea entre pacientes submetidos à cirurgia oftalmológica intra-ocular. Na época, essa tecnologia não estava aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA) para esterilizar instrumentais cirúrgicos com lúmens ou dobradiças, mesmo assim foi introduzida no Hospital e a investigação do surto concluiu que o método de esterilização degradou o metal de instrumentos cirúrgicos canulados, em cobre e zinco, resultando em destruição de células endoteliais da córnea(6-7).

Análise de custos da esterilização em baixa temperatura - 1998

A escolha da tecnologia de esterilização, em geral, é baseada no custo e comparada com as disponíveis. Um estudo alemão comparou os custos das esterilizações por plasma de peróxido de hidrogênio (Sterrad 100®), ETO e formaldeído. Os autores incluíram a esterilização por vapor e todos os custos diretos e indiretos relacionados. A esterilização por plasma é mais rápida e econômica do que ETO e dispensa a aeração, portanto, é necessário menor quantidade de instrumentais em estoque; o tempo de esterilização por formaldeído foi três vezes maior do que plasma, mas, quando comparado com ETO, o tempo foi menor e implica em menores custos, contudo, há necessidade de maior inventário. O vapor foi considerado o método mais rápido e mais econômico, além de ser a escolha para instituições pequenas e médias, entretanto, causa maior dano aos instrumentais a longo prazo(8).

Aplicação: reutilização de cateteres de eletrofisiologia - 1998

A reutilização de artigos de uso único de alta complexidade e alto custo tem sido avaliada, e o reprocessamento de cateteres de eletrofisiologia tem-se mostrado factível, tanto do ponto de vista da segurança como da eficácia. Nesse estudo americano, os autores avaliaram cateteres de eletrofisiologia (sem lúmen), reprocessados cinco vezes cada, e cateteres de ablação, reprocessados vinte vezes cada e esterilizados em plasma de peróxido de hidrogênio, com resultados satisfatórios. A economia é significativa com 5 reusos de cada cateter. Os autores apontam como limitações desse estudo: a ausência de resultados clínicos quanto à segurança, apesar de testes de esterilidade se mostrarem satisfatórios e o fato de os testes não terem sido realizados com cateteres de todas as marcas comerciais disponíveis(9).

Limitações: esterilização de enxerto ósseo - 2001

O enxerto ósseo tem sido usado extensivamente em cirurgias ortopédicas, apesar do risco de transmissão de agentes infecciosos que originam do doador, mesmo com a realização de testes sorológicos pelos bancos de ossos. Atualmente não há tecnologia de esterilização que não tenha efeitos adversos às propriedades biológicas do enxerto ósseo. Um estudo experimental avaliou o efeito da esterilização por plasma de peróxido de hidrogênio na capacidade osteoindutiva da matriz óssea humana desmineralizada, que resultou em efeito negativo na capacidade de osteoindução, portanto, essa tecnologia não pode ser aplicada para esterilizar enxertos ósseos(10).

Limitações: Efeitos da esterilização sobre a força tênsil dos materiais de artigos de uso-único - 2002

O estudo foi conduzido por pesquisadores do FDA, que avaliaram o efeito dos processos de esterilização sobre os materiais usados para a fabricação dos artigos: látex, silicone, dois tipos de poliuretano, nylon, polietileno de alta densidade. As amostras foram previamente avaliadas quanto à força tênsil, submetidas a diferentes tecnologias de desinfecção e esterilização por baixa temperatura e, posteriormente, reavaliadas. Resultados finais mostram que o silicone é minimamente afetado enquanto látex, polietileno e nylon tiveram a força tênsil reduzida. O poliuretano, dependendo da formulação, apresentou alterações reforçando ou fragilizando a força tênsil. Os autores do trabalho ressaltam que há poucas evidências científicas sobre os efeitos nas propriedades dos materiais em função da metodologia de esterilização empregada(11).

CONCLUSÕES

Esta revisão bibliográfica sobre novas tecnologias de esterilização à baixa temperatura permitiu chegar às seguintes conclusões:

- o número de publicações científicas é reduzido e consiste em pesquisas básicas laboratoriais, com desafios superdimensionados, que nem sempre refletem a prática clínica;

- em alguns experimentos o ETO, considerado padrão-ouro como método de esterilização à baixa temperatura, não alcançou o efeito desejado de esterilidade, sendo superado por novos métodos;

- presença de soro e sal no material testado apresentou ação protetora aos microrganismos no processo de esterilização;

- frente aos métodos de esterilização à baixa temperatura, materiais com lúmens estreitos são mais desafiadores ao sucesso da esterilização do que comprimentos longos;

- a literatura atual disponível é insuficiente para eleger o método à baixa temperatura em substituição ao ETO.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em: 4.4.2005

Aprovado em: 13.12.2006

  • 1. Rutala WA, Weber DJ. Low-Temperature Sterilization Technologies: Do We Need to Redefine "Sterilization"? Infect Control Hosp Epidemiol 1996; 17(2):87-91.
  • 2. Rutala WA, Weber DJ. Vlinacal Effectiveness of Low Temperature Sterilization Technologies. Infect Control Hosp Epidemiol 1998; 19(10):798-804.
  • 3. Alfa MJ, DeGagne P, Olson N, Puchalski T. Comparison of ion plasma, vaporized hydrogen peroxide and 100% ethylene oxide sterilizers to the 12/88 ethylene oxide gas sterilizer. Infect Control Hosp Epidemiol 1996; 17:92-100.
  • 4. Rutala WA, Gergen MF, Weber DJ. Comparative evaluation of the sporicidal activity of new low-temperature sterilization technologies: ethylene oxide, 2 plasma sterilization systems an liquid peracetic acid. Am J Infect Control 1998; 26:393-8.
  • 5. Alfa MJ, DeGagne P, Olson N, Hizon R. Comparison of liquid chemical sterilization with peracetic acid and ethylene oxide sterilization for long narrow lumens. Am J Infect Control 1998; 26:469-77.
  • 6. Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Corneal Decompensation After Intraocular Ophtalmic Surgery - Missouri, 1998. MMWR 1998; 47(15):306-9.
  • 7. Duffy RE, Brown SE, Caldwell KL, Lubniewski A, Anderson N, Edelhauser H, et al. An Epidemic of Corneal Destruction Caused by Plasma Gas Sterilization. Arch Ophtalmol 2000; 118:1167-76.
  • 8. Adler S, Scherrer M, Daschner FD. Costs of low-temperature plasma sterilization compared with other sterilization methods. J Hosp Infect 1998; 40:125-34.
  • 9. Bathina MN, Mickelsen S, Brooks C, Jaramillo J, Hepton T, Kusumoto FM. Safety and Efficacy of Hydrogen Peroxide Plasma Sterilization for Repeated Use of Electrophysiology Catheters. J Am Coll Cardiol 1998; 32:1384-8.
  • 10. Ferreira SD, Dernell WS, Powers BE, Schochet RA, Kuntz CA, Withrow SJ, et al. Effect of Gas-Plasma Sterilization on the Osteoinductive Capacity of Demineralized Bone Matrix. Clin Orthop 2001; 388:233-9.
  • 11. Brown SA, Merritt K, Woods TO, McNamee SG, Hitchins VM. Effects of Different Disinfection and Sterilization Methods on Tensile Strength of Materials Use for Single-Use Devices. Biomed Instrum Technol 2002; 36(1):23-7.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jul 2007
  • Data do Fascículo
    Jun 2007

Histórico

  • Aceito
    13 Dez 2006
  • Recebido
    04 Abr 2005
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